
| D.E. Publicado em 17/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor para reconhecer o labor rural do autor entre 12/12/1962 e 30/12/1973, mantendo-se, no mais, a r. sentença de primeiro grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001445-84.2003.4.03.6125/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por SEBASTIÃO FRANDINA, em ação previdenciária pelo rito ordinário proposta em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o reconhecimento de períodos de labor rural e urbano, não registrados em CTPS, bem como período especial, tudo a fins de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
A r. sentença de fls. 216/230 julgou improcedente o pedido inicial e condenou o autor no pagamento dos ônus da sucumbência, suspensa a exigibilidade em razão de ser beneficiário da assistência judiciária gratuita.
Em razões recursais de fls. 235/243, preliminarmente, argui o peticionário nulidade da r. sentença a quo, sob o fundamento de que houve, in casu, cerceamento de defesa, com o indeferimento de prova pericial. No mérito, pugna o autor pela reforma da sentença, uma vez que a atividade de motorista pode ser reconhecida como especial pelo mero enquadramento, além de os documentos juntados aos autos comprovarem a ocorrência dos períodos de labor rural e urbano não registrados. De tal forma, faz jus, pois, ao benefício de aposentadoria pleiteado.
Contrarrazões ofertadas (fls. 250/260).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, afasto a preliminar de cerceamento de defesa. O conjunto probatório constante dos autos é suficiente para a resolução das questões controvertidas, tendo o juízo a quo conduzido adequadamente a instrução, e dispensado dilação probatória desnecessária para o deslinde da causa.
Demais disso, cumpre por ora repisar que, uma vez intimado o autor para especificar provas que pretendia produzir (fl. 101), não mencionou, em nenhum momento oportuno, a produção de prova pericial, de tal modo que não há que se falar, mais uma vez, por tais fundamentos, em cerceamento de defesa - até porque não houve, propriamente, indeferimento de prova, no caso em tela (fl. 106).
Passo, propriamente, ao exame do mérito recursal.
Cumpre primeiramente salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Sendo assim, no tocante aos períodos de 01/11/79 a 22/04/80 e de 02/05/80 a 31/05/91, foi instruída a presente demanda com cópia da CTPS do autor (fl. 206), em que se verifica o exercício, no primeiro período, da função de "motorista", na empresa J. Maria Rocha, e, no segundo termo, como "outros condutores", na Importadora São Marcos Ltda, de tal modo que não há como prosperar a tese de enquadramento do suplicante, in casu, no código 2.4.4. do Decreto nº 53.831/64, visto ser o mesmo aplicável somente para aqueles que dirigem ônibus, bondes, ou caminhão, o que não se verifica comprovado na hipótese.
Demais disso, no que diz respeito ao pleito de reconhecimento do suposto labor urbano exercido sem registro formal, cumpre verificar a dicção da legislação afeta ao tema em questão, qual seja, a aposentadoria por tempo de contribuição, tratado nos artigos 52 e seguintes da Lei nº 8.213/1991.
A esse respeito, é expressa a redação do artigo 55, § 3º, do diploma citado, no sentido de que não se admite a prova exclusivamente testemunhal para a comprovação do tempo de serviço para a aquisição do benefício vindicado, exigindo-se ao menos o denominado início de prova material para a sua comprovação.
No mesmo sentido é o posicionamento da jurisprudência pátria. Confira-se:
Portanto não há que se reconhecer os períodos de labor urbano não registrados em CTPS, ora alegados pelo apelante como sendo de vínculo empregatício, quais sejam: de 01/09/77 a 30/10/79, de 01/06/91 a 12/01/95 e de 14/01/95 a 28/12/97. Tudo com base na r. sentença a quo, que ora passa-se a reproduzir, verbis:
Não está minimamente evidenciada, portanto, a existência do alegado vínculo laboral, seja por meio de início de prova material, seja pela pretensa prova testemunhal colhida nos autos.
Desta feita, pelo exame do conjunto probatório, não é possível considerar como tempo de serviço o interregno pretendido. Desprovejo o apelo quanto a este tópico. Passo, pois, ao exame do labor rural da parte autora.
Cumpre ressaltar, primeiramente, que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Nesta senda, portanto, registro que constituem início razoável de prova material da atividade campesina exercida pelo requerente o Certificado de Dispensa de Incorporação, emitido pelo Ministério do Exército, em 14/03/69, em que o próprio requerente resta qualificado profissionalmente como "lavrador" (fl. 20); seu Título Eleitoral, emitido em 27/05/69 (fl. 51), e sua certidão de casamento, de 31/05/69, em que também consta como "lavrador".
Assim sendo, a documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal colhida em audiências realizadas em 20/09/05 e 17/04/07.
Israel Barbarini, inquirido à fl. 127, afirmou que "...conhece o autor desde que nasceu; que o depoente era vizinho do autor no Bairro Jacaré de Baixo, área rural do Município de Siqueira Campos; que quando o autor residia no bairro acima referido exercia atividade rural no sítio do pai; que no referido sítio trabalhavam os pais do autor, o autor e os irmãos, que plantavam de tudo, milho, arroz, feijão, batata, etc.; que os produtos eram para sustento da família, sendo que o que sobrava era comercializado; que o autor se mudou do sítio em 1974, época em que já era casado... ...que até 1974 o autor exerceu exclusiva atividade rural."
Eugênio Florentino dos Santos asseverou, à fl. 128, que "conhece o autor desde quando este ainda era criança; que o autor morava e trabalhava no sítio do pai, sendo que se casou e continuou no sítio; que no referido sítio trabalhavam os pais e os irmãos do autor; que plantavam para o sustento da família e o que sobrava era vendido; que o depoente era vizinho do autor no referido sítio, o qual se localiza no Bairro Jacaré de Baixo, Município de Siqueira Campos..."
Vicente Baptista de Souza, por sua vez, à fl. 129, disse que "conhece o autor desde 1950, sendo que eram vizinhos na área rural, no Bairro Jacaré de Baixo; que o autor desde criança trabalhava na lavoura; que o autor trabalhava juntamente com a família no sítio de propriedade do pai do autor; que o depoente também trabalhava na lavoura, mas em sítio diverso; que o autor ficou no referido sítio até 1974; que nesta data o autor já era casado; que até 1974 o autor exerceu atividade exclusiva de lavrador, sendo que, após a data mencionada o autor veio para a cidade onde exerceu atividade de motorista; que no sítio o autor plantava um pouco de tudo, ou seja, plantava milho, feijão, arroz, etc.; que plantavam para o sustento da família, sendo que o que sobrava era comercializado."
Por derradeiro, a respeito do labor campesino, a última testemunha, Sebastião Messias dos Santos, às fls. 190/191 dos autos, disse que: "conhece o autor desde criança, por volta de 1950, do município de Siqueira Campos. São amigos de infância. Eram vizinhos e trabalharam juntos diversas vezes. Desde criança, o autor trabalhou na lavoura com seus familiares (pais e irmãos) numa área de terra pertencente a seu pai... ...plantavam de tudo nessa área de terra, como, por exemplo, feijão, milho, café e outras culturas. Utilizavam o produto da lavoura para consumo próprio e comercializavam o excedente..."
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Como se vê, pois, a prova oral reforça o labor campesino. Sendo assim, determino a reforma, neste tópico, do r. decisum a quo, reconhecendo o labor campesino do apelante entre 12/12/1962 (data em que completou 12 anos) e 30/12/1973 (nos termos da exordial).
Assim sendo, conforme tabela ora anexa a este voto, verifica-se que, considerando-se o interregno campesino ora reconhecido, mais os períodos incontroversos, contava o autor, até a véspera de seu requerimento administrativo, com 28 anos, 04 meses e 16 dias de serviço, tempo este insuficiente, pois, para a obtenção da aposentadoria pretendida.
Tendo o requerente decaído de parte do pedido, de rigor o reconhecimento da ocorrência de sucumbência recíproca, nos termos do disposto no art. 21 do CPC/73.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do autor para reconhecer o labor rural do autor entre 12/12/1962 e 30/12/1973, mantendo-se, no mais, a r. sentença de primeiro grau.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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| Data e Hora: | 10/04/2018 12:17:29 |
