
| D.E. Publicado em 10/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento parcial à remessa necessária, apenas para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e parcial provimento à apelação do INSS, para que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, sejam fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo-se, no mais, a r. sentença de primeiro grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 03/04/2018 16:22:54 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0019823-96.2009.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária pelo rito ordinário proposta por ANTONIO GALVÃO MOREIRA, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço, mediante reconhecimento de períodos de labor rural e especial.
A r. sentença de fls. 123/128 julgou procedente o pedido, condenando a autarquia a reconhecer e averbar como tempo de serviço rural o intervalo compreendido entre 21/09/65 e 07/07/75, bem como especiais os períodos de 01/12/80 a 17/02/82, de 01/11/84 a 04/06/91 e de 02/03/92 a 11/02/93, com a consequente concessão da aposentadoria integral por tempo de serviço, desde a data do requerimento administrativo (27/02/07), acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês e correção monetária. Fixou os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, excluindo-se as parcelas vencidas após a sentença, nos termos da Súmula 111, do STJ. Sem custas. Sentença submetida à remessa necessária.
Em razões recursais de fls. 132/153, pugna o INSS, pela reforma da sentença, pela improcedência da ação, sob o fundamento de que não há nos autos prova do labor campesino que se pretende reconhecido, bem como que ocorre, na hipótese, a impossibilidade jurídica de reconhecimento de trabalho rural antes dos 14 anos de idade. Demais disso, não haveria, tampouco, prova da especialidade pretendida, bem como não preencheria o requerente os demais requisitos para a aposentadoria proporcional. Subsidiariamente, requer que o termo inicial do benefício, se mantido, seja o da data da citação do réu, bem como que os juros de mora sejam reduzidos ao patamar mínimo legal. Requer, ainda, por fim, o prequestionamento da matéria.
Contrarrazões do autor às fls. 156/159.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Cumpre primeiramente salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Sendo assim, no tocante aos períodos de 01/12/80 a 17/02/82, de 01/11/84 a 04/06/91 e de 02/03/92 a 11/02/93, foi instruída a presente demanda com os laudos periciais de fls. 84/90 e 100/104, os quais confirmam ter o autor laborado, na função de motorista, respectivamente, na empresa "Gervásio de Zanetti Beneton", no primeiro período, e na pessoa jurídica "Comércio de Gás Zanettini Ltda.", nos outros dois últimos - sempre em condições perigosas e insalubres, o que, in casu, é mais que o suficiente para o reconhecimento da especialidade da atividade, por enquadramento no código 2.4.4, do Decreto nº 53.831/64 e no código 2.4.2, do Decreto nº 83.080/79.
Destarte, oportuno por ora de se salientar, na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Assim sendo, reputo enquadrados como especiais os períodos indicados na r. sentença de primeiro grau, nos termos do suprafundamentado.
Passo, pois, ao exame do labor rural da parte autora.
Cumpre ressaltar, primeiramente, que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Nesta senda, portanto, registro que constitui início razoável de prova material da atividade campesina exercida pelo requerente as fichas de matrícula dos alunos, em que consta o genitor do autor, Benedito Moreira, qualificado como "lavrador" (fls. 32/36), bem como o Certificado de Dispensa de Incorporação, emitido pelo Ministério do Exército, em 10/04/72, em que o próprio requerente resta qualificado profissionalmente como "rural" (fl. 38).
Assim sendo, a documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal colhida em audiência realizada em 14/01/2009.
Onofre Paulo Gonçalves, inquirido à fl. 120, afirmou que "...conhece o autor desde criança. Que o autor trabalhou na roça dos 12 anos até quando veio para a cidade. Que o pai do autor tinha terras próprias e lá o autor trabalhava. Que não tinham empregados... ...que a renda da família era exclusivamente do serviço rural no período em que o autor trabalhou na roça. Que o autor plantava, colhia milho, arroz, feijão e café. Lidava com ferramentas agrícolas, entre outros. Que o autor estudava na escola do sítio até o horário de almoço e depois trabalhava na roça com o pai..."
Por fim, Leonaldo Fernandes asseverou, à fl. 121, que "conhece o autor desde criança... ...Que o autor trabalhava em terra própria e para outras pessoas... Que o autor começou a trabalhar na roça com 10 ou 12 anos..."
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Possível, portanto, o reconhecimento do labor campesino, nos exatos termos do r. decisum a quo, por seus próprios fundamentos.
Como se vê, a prova oral reforça o labor campesino tal como delimitado na r. sentença de origem. Sendo assim, mantenho o r. decisum a quo, quanto a este tópico, pelos seus próprios fundamentos, reconhecendo o labor campesino do apelado entre 21/09/1965 e 07/07/1975.
Acresça-se, por fim, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o "1,4", nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Em assim sendo, conforme planilha anexa, portanto, considerando-se a atividade especial mais o período de labor rural, estes somados aos períodos incontroversos, verifica-se que o autor contava com 35 anos, 10 meses e 15 dias de serviço, por ocasião do requerimento administrativo (27/02/07), de modo a fazer, portanto, jus ao benefício pretendido de aposentadoria integral por tempo de serviço. Todos os demais requisitos também foram implementados.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo (27/02/07).
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto, dou provimento parcial à remessa necessária, apenas para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e parcial provimento à apelação do INSS, para que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, sejam fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo-se, no mais, a r. sentença de primeiro grau.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 03/04/2018 16:22:50 |
