
| D.E. Publicado em 21/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora para, reformando em parte a r. sentença de 1º grau, reconhecer os intervalos de labor especial de 05/08/1997 até 14/12/1998 e de 19/11/2003 a 23/11/2011, determinando à Autarquia previdenciária que proceda à respectiva averbação, com a necessária conversão, alfim estabelecendo a sucumbência recíproca, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000699-27.2012.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por JOSÉ MARCELO LUCINDO DA SILVA, em ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", mediante o reconhecimento de períodos trabalhados em atividades sujeitas a condições especiais.
A r. sentença (fls. 88/91) julgou improcedente a ação, no tocante a ambos os pedidos. Condenou-se a parte autora no pagamento de verba honorária arbitrada em 10% sobre o valor atribuído à causa (de R$ 38.000,00), suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade processual concedida nos autos (fl. 57). Não houve condenação em custas, porquanto tramitam os autos sob os auspícios da justiça gratuita.
Descontente com o resultado do julgamento, a parte autora apelou (fls. 94/101), aduzindo que a documentação carreada aos autos (PPP - Perfil Profissiográfico) seria hábil à comprovação de sua exposição a agentes insalubres, sem que houvesse necessidade de se apresentarem outros documentos, sendo que, além disso, a informação acerca do uso de EPI eficaz não descaracteriza a nocividade do labor. Por fim, insiste na concessão do benefício.
Devidamente processado o recurso, sem o oferecimento de contrarrazões pelo INSS, foram os autos remetidos a esta Corte Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da presente demanda dera-se em 03/02/2012 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 22/05/2012 (fl. 62) e a prolação da r. sentença aos 19/02/2013 (fl. 91vº), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Da narrativa contida na exordial, depreende-se a pretensão do autor como sendo o reconhecimento do labor de cunho especial desempenhado de 05/08/1997 até 23/11/2011, com vistas à concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", a partir da data do requerimento administrativo formulado em 30/11/2011 (sob NB 159.139.130-7 - fl. 13).
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Do labor especial.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial, e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso concreto.
A petição inicial encontra-se secundada por documentos (fls. 12/55), dentre os quais merecem relevo as cópias de CTPS do autor, revelando todo seu percurso laborativo (fls. 21/38), e o PPP emitido pela empresa Rassini-NHK Auto Peças Ltda. (fls. 39 e verso), constando que o autor, no período compreendido entre 05/08/1997 e 23/11/2011 (ora na condição de serralheiro industrial, ora de mecânico de manutenção, ora de líder de manutenção), estivera exposto a agentes agressivos ruído e óleos, graxas e solventes.
Restou, portanto, evidenciada a atividade pretérita excepcional, conforme segue:
* de 05/08/1997 a 14/12/1998, sob agentes químicos óleos, graxas e solventes (hidrocarbonetos), à luz dos itens 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79;
* de 19/11/2003 a 23/11/2011, sob ruído de 88 dB(A), à luz dos itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97, e 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
Diga-se, quanto à periodização a partir de 15/12/1998 e até 18/11/2003, não ser admitido o reconhecimento da especialidade, isso porque desautorizado, à época, o enquadramento por categoria, sendo que, quanto à sujeição a agentes agressivos, infere-se a sujeição do autor a níveis de ruídos abaixo de 90 dB(A), e a agentes de natureza química sob uso eficaz de EPI (com menção expressa no PPP, neste sentido).
Relativamente ao tema, cumpre realçar que o art. 58, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91 sofreu alteração por meio da Lei nº 9.732/98, publicada em 14/12/1998, exigindo-se, no bojo do laudo técnico, informação acerca da existência de tecnologia de proteção - quer coletiva, quer individual - passível de atenuar a intensidade de agentes nocivos a limites toleráveis, apartando a insalubridade da atividade desempenhada.
Esta Turma julgadora já se pronunciara a respeito, em julgado anterior, cujo excerto ora se colaciona:
Neste cenário, plausível reconhecer-se a especialidade nos termos retromencionados.
Da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Por fim, consigne-se que o próprio INSS disciplinou, internamente, a questão da cumulatividade, conforme orientação expressa no art. 223, II, da Instrução Normativa nº 45/2010.
Conforme planilha anexa, procedendo-se ao cômputo dos intervalos especiais ora reconhecidos, acrescidos do tempo laboral entendido como incontroverso (consoante tabelas confeccionadas pelo INSS, fls. 45/46 e 49/50, e resultado de pesquisa ao sistema informatizado CNIS, fls. 40/41), verifica-se que o autor, à ocasião do pedido administrativo, em 30/11/2011, contava com 33 anos, 06 meses e 15 dias de serviço, tempo insuficiente à concessão de "aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição".
E quanto à hipótese de concessão de aposentadoria na modalidade proporcional, melhor sorte não há, porque descumpridas as exigências impostas pela Emenda Constitucional nº 20/98, quanto aos pedágio e quesito etário (53 anos exigíveis para o sexo masculino), eis que o autor, nascido aos 10/09/1964 (fl. 12), completá-lo-ia somente em 10/09/2017.
Desta feita, resta improcedente a demanda quanto ao deferimento do benefício.
Por outro lado, o pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo especial correspondente a 05/08/1997 até 14/12/1998 e de 19/11/2003 a 23/11/2011, com a necessária conversão.
Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a gratuidade da justiça conferida ao autor (fl. 57) e por ser o INSS delas isento.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora para, reformando em parte a r. sentença de 1º grau, reconhecer os intervalos de labor especial de 05/08/1997 até 14/12/1998 e de 19/11/2003 a 23/11/2011, determinando à Autarquia previdenciária que proceda à respectiva averbação, com a necessária conversão, alfim estabelecendo a sucumbência recíproca.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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