
| D.E. Publicado em 10/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora para, reformando em parte a r. sentença de 1º grau, reconhecer o labor rural no intervalo de 01/01/1975 a 09/06/1985, determinando à Autarquia previdenciária que proceda à respectiva averbação, alfim estabelecendo a sucumbência recíproca, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020419-75.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por MARCOS ANTÔNIO LAZARINI, em ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", mediante o reconhecimento de labor rural e especial.
A r. sentença proferida (fls. 122/123) julgou improcedente a ação, condenando a parte autora no pagamento de custas processuais e verba honorária arbitrada em 10% sobre o valor atribuído à causa (de R$ 6.120,00), ressaltando, contudo, o trâmite processual sob os auspícios da justiça gratuita (fl. 48).
Inconformado, o autor apelou (fls. 125/129), sob argumento de que o conjunto probatório - composto por documentação e declarações de testemunhas - seria suficiente ao reconhecimento de suas atividades rurais, fazendo jus à concessão do benefício pretendido.
Com o oferecimento de contrarrazões pelo INSS (fls. 131/137), foram encaminhados os autos a esta Corte Regional.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da presente demanda dera-se em 19/08/2010 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 01/10/2010 (fl. 48) e prolação da sentença em 30/11/2011 (fl. 123), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Aduz a parte autora ter principiado suas atividades laborativas em meio rural, ainda na infância, junto à sua parentela, requerendo, pois, o reconhecimento do trabalho desempenhado desde ano de 1973 (aos 12 anos de idade) ou, alternativamente, desde janeiro/1975 e até maio/1985 e também de julho/1985 a agosto/1986, asseverando também a prestação laboral de natureza insalubre (em diversos períodos), a merecer reconhecimento.
Nesta cena, espera pela concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", a partir do requerimento administrativo formulado em 16/09/2010 (sob NB 152.906.829-8, fl. 51).
Em preâmbulo: parte da apelação ofertada não possui fundamentação jurídica, cingindo-se (a peça recursal) tão-apenas aos delineamento e defesa do labor de essência rural - enquanto a exordial e a sentença versam, ambas, sobre labores de índole campesina e especial.
Assim, consideram-se desatendidos os ditames do art. 514, II, do CPC/73, cuja orientação aponta no sentido de que o recorrente deve, necessariamente, fundamentar as razões de sua dissonância frente ao pronunciamento do Juiz sentenciante.
Por certo que, ao exercício do duplo grau de jurisdição (erigido na Magna Carta, insculpido no tema do amplo acesso ao Judiciário, este, por sua vez, contido no artigo 5º, XXXV), impõe-se que a apresentação de recurso encerre os fatos e os fundamentos de direito, por meio dos quais o insurgente defenda, sólida e motivadamente, seu pleito de reparação do julgado, a ser apreciado pelas Instâncias Judiciárias (art. 128 do CPC/73).
Neste diapasão, desdourada a peça recursal, inviável a incursão sobre eventual desempenho laborativo especial, haja vista a carência de fundamentação a respeito, considerada desnuda a apelação, neste ponto específico.
Colaciona-se excerto, em idêntica via:
No mais, verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Do caso em tela.
No limiar da exordial, o pedido de acolhimento da atividade laborativa do autor no campo, remotamente principiada aos 12 anos de idade, no ano de 1973 ou, alternativamente, desde janeiro/1975 e até maio/1985 e também de julho/1985 a agosto/1986.
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra, ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Dito isto, considerada como começo do suposto labor rural do autor, deve prevalecer a data em que completara 12 anos de idade - a saber, 27/02/1973, eis que nascido aos 27/02/1961 (fl. 12).
Prosseguindo em exame, observa-se nos autos documentos diversificados (fls. 12/47), dentre os quais cópia de CTPS do autor (fls. 14/23), evidenciando contratos de empregos com predominância urbana. As fls. 31/45, 80/87, 90/94 e 101/111 guardam tema específico (da insalubridade), ora apartado da análise.
Referentemente à seara rural, fora acostado o "certificado de dispensa de incorporação" (fl. 46) emitido em 03/10/1980, com anotação da profissão do demandante como lavrador.
E se a prova acima listada é considerada apta ao fim proposto, as demais (provas) não se revelaram proveitosas nos autos: os documentos relativos a propriedades rurais (fls. 25/30) encontram-se em nome de terceiros, considerados parte alheia ao feito; e a declaração particular asseverando o labor rural do autor (fl. 24) não fora submetida ao crivo do contraditório, assemelhando-se, pois, a mero depoimento de caráter unilateral, no interesse único do autor.
E bem se vê que os depoimentos colhidos em audiência (fls. 69/74 - aqui, em breve escrita) alinham-se aos elementos contidos na documentação retro transcrita: a testemunha Carlos Roberto Vialli afirmou conhecer o autor há muito tempo ...tendo laborado juntos na mesma propriedade rural de 1980 até 1987 ...sendo que o autor teria desempenhado tarefas como tratorista e também na lavoura, na lida com cana, café e também com animais. O testemunho de Domingos Bettiol Neto destacou ter conhecido o autor ainda criança ...trabalhando juntos na propriedade de Carlos Rabelato no período de 1975 a 1988 ...o autor seria tratorista e também trabalharia em lavoura. E o depoente José Maurício Boarolli asseverou ter trabalhado com o autor na propriedade do "Rabelato" ...desde 1975 ...tendo saído (o declarante) no ano de 1987 ...o autor permanecido.
Ante o conteúdo material indiciário, conjugado com o discurso de testemunhas idôneas, conclui-se pelo acolhimento das atividades rurais do autor no período de 01/01/1975 a 09/06/1985 (data que antecede o primeiro labor anotado em CTPS).
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Por fim, consigne-se que o próprio INSS disciplinou, internamente, a questão da cumulatividade, conforme orientação expressa no art. 223, II, da Instrução Normativa nº 45/2010.
De acordo com a planilha em anexo, somando-se o período rural ora reconhecido àqueles verdadeiramente incontroversos (constantes de CTPS), verifica-se que o autor contava com 31 anos, 08 meses e 17 dias de tempo de serviço na data do ajuizamento da ação (19/08/2010), tempo nitidamente insuficiente à concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, quer na modalidade integral, quer na versão proporcional - quanto a esta última, não comprovado o quesito etário (53 anos impostos ao sexo masculino), nem tampouco o pedágio necessário, mencionado na planilha confeccionada. Resta, pois, improcedente a demanda neste ponto específico.
Por sua vez, o pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo rural correspondente a 01/01/1975 a 09/06/1985.
Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a gratuidade da justiça conferida ao autor (fl. 48) e por ser o INSS delas isento.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora para, reformando em parte a r. sentença de 1º grau, reconhecer o labor rural no intervalo de 01/01/1975 a 09/06/1985, determinando à Autarquia previdenciária que proceda à respectiva averbação, alfim estabelecendo a sucumbência recíproca.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 01/08/2018 20:00:07 |
