Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1914830 / SP
0003024-60.2008.4.03.6103
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
10/06/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADES RURAL E ESPECIAL. SENTENÇA ULTRA PETITA.
REDUÇÃO AOS LIMITES DO PEDIDO. DEVOLUTIVIDADE. LABOR RURAL. PROVA
MATERIAL INDICIÁRIA. PROVA ORAL. AMPLIAÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL.
CARACTERIZAÇÃO. APOSENTAÇÃO. EC Nº 20/98. REGRAS DE TRANSIÇÃO. QUESITO
ETÁRIO NÃO CUMPRIDO. BENEFÍCIO INDEVIDO. AVERBAÇÃO. SUCUMBÊNCIA
RECÍPROCA. TUTELA REVOGADA. REMESSA NECESSÁRIA PROVIDA EM PARTE, PARA
REDUÇÃO DA SENTENÇA ULTRA PETITA AOS LIMITES DO PEDIDO. APELO DO INSS
PROVIDO EM PARTE.
1 - Pretende a parte autora a concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição",
a partir da postulação administrativa (sob NB 142.277.720-8, datada de 20/03/2007, com
reafirmação da DER para 16/08/2007), mediante reconhecimento de atividade rural na condição
de "lavrador" na propriedade de Noé Simeão de Oliveira, situada Município de Fernandes
Tourinho/MG, supostamente prestada desde 02/01/1977 até 30/06/1979, além de
reconhecimento de labor especial exercido entre 06/04/1983 e 30/07/1984 e de 10/11/1986 até
28/05/1998.
2 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do
CPC/2015.
3 - O d. Magistrado a quo não se ateve aos termos do pedido inaugural ao considerar como
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
tempo especial período de 10/11/1986 até 19/04/2006, quando o pedido do autor restringe-se a
até 28/05/1998, enfrentando tema que não integrou a pretensão efetivamente manifesta.
4 - A sentença, neste aspecto, é ultra petita, eis que considerou atividade especial
desempenhada em lapso temporal não pleiteado na inicial, extrapolando os limites do pedido,
restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73 (atual art. 492 do
CPC/2015).
5 - É de ser reduzida a sentença aos limites do pedido inicial, excluindo-se tempo de serviço no
interregno não-indicado pelo autor como sendo de atividade excepcional.
6 - Observado o resultado da r. sentença de Primeiro Grau, e considerando que a parte autora
não se insurgira, pela via recursal, ante referido julgado, tem-se que a controvérsia ora paira
sobre atividade rurícola compreendida entre 02/01/1977 e 31/12/1977, e sobre a (hipotética)
especialidade do intervalo ininterrupto de 10/11/1986 até 28/05/1998, homenageando-se,
assim, o princípio da devolutividade recursal a esta Instância.
7 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
8 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
9 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
10 - Do conjunto material reunido nos autos, a prova considerada hábil à comprovação da
atividade campesina do autor, doutrora, corresponde à declaração fornecida pelo Ministério da
Defesa - Exército Brasileiro, confirmando que, à ocasião de seu alistamento, o autor informara
sua profissão como lavrador, sendo certo que a "ficha de alistamento militar" que secunda o
termo declaratório indica a data de recrutamento em 11/01/1977, bem como a residência do
autor na zona rural do Município de Fernandes Tourinho/MG.
11 - A documentação retratada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, a
ser corroborado por idônea e segura prova testemunhal. Consigne-se, quanto aos documentos
considerados inservíveis como provas: a declaração de exercício de atividade rural, fornecida
por sindicato rural local, não apresenta a homologação legalmente exigida; a documentação de
imóvel pertencente a terceiro (Noé Simeão de Oliveira) revela, tão somente, a existência de
certa gleba; e a declaração firmada por particular assemelha-se a mero depoimento de caráter
unilateral (unicamente no interesse do autor), sem a imprescindível sujeição ao crivo do
contraditório.
12 - Em audiência de instrução realizada, disseram as testemunhas (aqui, em linhas
brevíssimas): o Sr. José Manoel da Silva afirmara ter sido criado no Município de Fernandes
Tourinho/MG ...tendo conhecido o autor, que trabalhava na propriedade de Noé Simeão
...sendo que o pai do declarante possuiria uma propriedade vizinha a esta ...o autor colheria
verduras, extrairia leite, etc. O Sr. Jadson Nunes Pereira asseverara ter visto quando o autor
passava para ir trabalhar na fazenda de propriedade de Noé Simeão ...onde eram produzidos
feijão, milho, leite.
13 - A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória da documentação
carreada aos autos, sendo possível reconhecer-se o trabalho da parte autora desde 02/01/1977
até 31/12/1977, em idênticos moldes àqueles da r. sentença.
14 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
15 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
16 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
17 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
18 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
19 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
20 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
21 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
22 - As cópias de CTPS são tangenciadas por documentos específicos, que guardam no bojo
informações acerca da atividade laborativa especial exercida pelo autor junto à empresa Parker
Hannifin Ind. e Com. Ltda. - Jacareí: o PPP e o LTCAT revelam, conjuntamente, a exposição a
agente agressivo ruído de 87 dB(A) no intervalo de 10/11/1986 a 31/08/1994, e ruído de 92
dB(A) no intervalo de 01/09/1994 a 28/05/1998, possibilitando o acolhimento da especialidade à
luz dos códigos 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, e 2.0.1 do
Decreto nº 2.172/97.
23 - Procedendo-se ao cômputo dos intervalos reconhecidos nesta demanda, acrescidos do
tempo laboral entendido como incontroverso (consoante tabelas confeccionadas pelo INSS),
verifica-se que o autor, à ocasião do pedido administrativo, em 16/08/2007, contava com 33
anos, 02 meses e 23 dias de serviço, deixando de cumprir exigência imposta pela Emenda
Constitucional nº 20/98, quanto ao quesito etário (53 anos exigíveis para o sexo masculino):
completá-lo-ia somente em 28/04/2012, eis que nascido aos 28/04/1959.
24 - Improcedente a demanda quanto ao deferimento do benefício - restando, pois, prejudicado
o exame da prescrição, requerido no recurso do INSS.
25 - O pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia
previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo rural equivalente a 02/01/1977 a
31/12/1977 e labor especial correspondente a 10/11/1986 a 28/05/1998, com a necessária
conversão.
26 - Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários
advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a
gratuidade da justiça conferida ao autor e por ser o INSS delas isento.
27 - Tutela revogada.
28 - Remessa necessária parcialmente provida, para reduzir a sentença ultra petita aos limites
do pedido.
29 - Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
remessa necessária, para restringir a r. sentença de 1º grau, ultra petita, aos limites do pedido
e, dar parcial provimento à apelação do INSS para, mantendo os termos da r. sentença no
tocante ao tempo rural de 02/01/1977 a 31/12/1977 e ao labor especial correspondente a
10/11/1986 a 28/05/1998, julgar improcedente o pedido de concessão de "aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição", com revogação da tutela anteriormente concedida, observando-
se o acima expendido quanto à devolução dos valores recebidos a esse título, por fim
decretando a sucumbência recíproca entre as partes, autora e ré, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
