
| D.E. Publicado em 24/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do recurso do INSS, ante a intempestividade configurada, e negar provimento às remessa necessária, tida por interposta, e apelação da parte autora, mantendo hígida a r. sentença prolatada, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0036947-87.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas, pela parte autora IRENE PROTANO DA SILVA e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural em regime familiar, a ser considerado, inclusive, como de natureza especial.
A r. sentença proferida (fls. 120/126) julgou parcialmente procedente a ação, reconhecendo tempo de labor rural da autora desde 01/01/1965 até 31/12/1978. Declarada a sucumbência recíproca, condenou-se as partes (autora e ré) a arcarem com suas respectivas custas e despesas processuais, ressaltando-se a gratuidade processual deferida à parte autora (fl. 40).
Inconformada, a parte autora apelou (fls. 129/140); defende que, diante do conjunto probatório trazido aos autos, faz jus ao acolhimento de todo o período rural declinado na peça vestibular - de 09/08/1959 (a partir dos 12 anos) a 22/06/1979 - além do reconhecimento de sua (do período) especialidade, com vistas à obtenção da benesse vindicada.
Apelou, também, a autarquia (fls. 143/144), pela reversão do julgado, sob argumento de que as provas ofertadas não lograram demonstrar o labor campesino - máxime a prova testemunhal, que teria se revelado frágil e genérica em seu conteúdo. Também sustentou autarquia a impossibilidade de utilização de tempo de labor rural para cômputo de carência.
Devidamente processados os recursos, com o oferecimento de contrarrazões pela parte autora (fls. 147/151) - nas quais pleiteia a condenação do INSS em verba honorária no importe de 20% sobre a condenação até o trânsito em julgado - foram enviados os autos a esta Corte Regional.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da presente demanda dera-se em 26/07/2010 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 29/11/2010 (fl. 45) e prolação da r. sentença em 29/03/2012 (fl. 126), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, desde a data do requerimento administrativo formulado em 16/12/2009 (sob NB 150.014.429-8, fl. 10), mediante o reconhecimento de atividades rurais em regime familiar exercidas entre 09/08/1959 e 22/06/1979 em propriedades rurais situadas no Município de Santa Amélia, no Estado do Paraná (Sítios "Roque Otenio", "do Sogro" e "Guanabara"). Assevera, por mais, que tais tarefas mereceriam o reconhecimento da especialidade laborativa.
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS à averbação de tempo de serviço rural da parte autora. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado, e da Súmula 490 do STJ.
Observo ser intempestivo o recurso interposto pelo INSS.
Dispõe o artigo 6º da Lei nº 9.028/1995 que, in verbis, "A intimação de membro da Advocacia-Geral da União, em qualquer caso, será feita pessoalmente". Por sua vez, o artigo 17 da Lei nº 10.910/2004 assegura que, in verbis, "Nos processos em que atuem em razão das atribuições de seus cargos, os ocupantes dos cargos das carreiras de Procurador Federal e de Procurador do Banco Central do Brasil serão intimados e notificados pessoalmente".
De acordo com a certidão lavrada por serventuário sob a autoridade do Juízo a quo, a intimação pessoal do INSS efetivara-se aos 04/06/2012, com a vista dos autos ao representante da autarquia previdenciária (fl. 142), sendo que a contagem de prazo para interposição recursal principiara aos 05/06/2012, encerrando-se, pois, em 04/07/2012.
Neste cenário, o protocolo realizado pela autarquia previdenciária aos 05/07/2012, consoante fl. 143, reconhece-se-o fora da fluência do prazo recursal, considerando o disposto nos artigos 188 e 508 do Código de Processo Civil em vigor à época.
Por mais, esclareço ser incabível a formulação de pedido, pela parte autora, em sede de contrarrazões de apelação.
E restando impossibilitada a apreciação do apelo do INSS, passa-se ao exame das questões sub judice por força da remessa atribuída.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Do caso em tela.
A síntese do pedido contido nas razões recursais: o acolhimento legal da atividade laborativa da autora no campo, junto a familiares, remotamente principiada em 09/08/1959 (aos 12 anos de idade, eis que nascida em 09/08/1947 - fl. 11), a qual teria perdurado, de forma ininterrupta, até 22/06/1979.
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra, ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Prosseguindo no exame dos autos, observa-se cópia do procedimento administrativo de benefício (fls. 70/92) e das CTPS da autora (fls. 12/17) - que, a propósito, evidenciam contratos de emprego notadamente urbanos, passíveis de conferência junto ao sistema informatizado CNIS (fls. 64/67).
Referentemente ao labor na seara rural, foram acostadas cópias dos seguintes documentos (em ordem necessariamente cronológica, para melhor apreciação):
* certidão de nascimento da autora, lavrada em 09/08/1947, consignada a profissão de seu genitor como "lavrador" (fl. 18);
* certidão do casamento da autora, contraído em 02/07/1966, referindo à profissão do cônjuge varão como sendo a de "lavrador" (fl. 19);
* certidão de inteiro teor, emitida pelo "Registro de Imóveis" da Comarca de Bandeirantes, no Estado do Paraná (fl. 26), aludindo a certa gleba rural, "Fazenda Posse do Laranjinha", situada no Município de Santa Amélia, adquirida em 27/04/1968 pelo Sr. José Simão da Silva (sogro da autora), qualificado como "lavrador";
* certidões de nascimento da prole da autora, datadas de 03/01/1968, 03/06/1969, 27/03/1971, 27/12/1973 e 22/06/1976, referindo à profissão paterna como a de "lavrador" (fls. 20/25, respectivamente);
* certidão de matrícula (referente ao imóvel descrito em parágrafo anterior) comprovando a transmissão das terras, por venda, aos 27/12/1976 (fls. 27/28).
E bem se vê que os depoimentos colhidos em audiência (fls. 117/118 - aqui, em breve escrita) alinham-se aos elementos contidos na documentação retro transcrita: a testemunha Antônio Anâncio da Silva afirmou conhecer a autora desde 1965 ...ocasião em que ela ajudava o pai na roça, na propriedade de um terceiro ...após ela se casar, teria passado a laborar no sítio do sogro ...sendo que, após, o marido da autora teria arrendado um terreno, no qual trabalharam e residiram por aproximadamente dez anos ...eram cultivados milho, feijão, café e algodão ...sendo que tanto no sítio do sogro quanto no local arrendado, o labor era em condição familiar, sem empregados ...informa o declarante que a autora teria chegado na cidade de Limeira no ano de 1978, não mais trabalhando na roça. O testemunho de Honório de Souza destacou ter conhecido a autora em 1965, quando ela ajudaria o pai na roça, no Sítio do Roque ...após se casar, teria passado a morar e trabalhar no sítio do sogro, Sr. José Simão ...acrescentando que após a vinda (da autora) a Limeira, não tivera mais informações a respeito do trabalho da mesma.
Ante o conteúdo material indiciário, conjugado com o discurso de testemunhas idôneas, conclui-se pelo acolhimento das atividades rurais da autora, junto à sua parentela, no período de 01/01/1965 até 31/12/1978.
Derradeira e breve remissão à única prova dos autos a que não se pode atribuir valia: o laudo pericial, de hipotética insalubridade laborativa (fls. 33/39).
Isso porque a atividade exercida exclusivamente na lavoura é absolutamente incompatível com a ideia de especialidade, eis que não exige, sequer, o recolhimento de contribuições para o seu reconhecimento. Neste sentido, aliás, é a orientação jurisprudencial do Colendo STJ e desta Eg. 7ª Turma, in verbis:
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Por fim, consigne-se que o próprio INSS disciplinou, internamente, a questão da cumulatividade, conforme orientação expressa no art. 223, II, da Instrução Normativa nº 45/2010.
De acordo com a planilha em anexo, somando-se o período rural ora reconhecido àqueles verdadeiramente incontroversos (constantes de CTPS, conferíveis da tabela confeccionada pelo INSS, fls. 29/30), verifica-se que a autora, na data do ajuizamento da ação, contava com 26 anos e 01 dia de tempo de serviço, o que, num primeiro olhar, permitiria o deferimento de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição em seus moldes proporcionais; entretanto, à época, a autora não detinha o pedágio necessário, mencionado na planilha confeccionada, restando, pois, improcedente a demanda neste ponto específico.
Por sua vez, o pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo rural correspondente a 01/01/1965 a 31/12/1978, nos moldes já delineados na r. sentença.
Mantida, igualmente, a sucumbência recíproca destacada em sentença.
Ante o exposto, não conheço do recurso do INSS, ante a intempestividade configurada, e nego provimento às remessa necessária, tida por interposta, e apelação da parte autora, mantendo hígida a r. sentença prolatada.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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