Processo
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1870246 / SP
0020160-46.2013.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
08/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/04/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO
DE OFÍCIO. ATIVIDADE RURAL. ECONOMIA FAMILIAR. 12 ANOS DE IDADE. PROVA
MATERIAL. DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. COMPROVAÇÃO PARCIAL. LABOR
ESPECIAL. RUÍDO. COMPROVAÇÃO. APOSENTADORIA. TEMPO INSUFICENTE À
CONCESSÃO. AVERBAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APELO DO INSS
DESPROVIDO. REMESSA NECESSÁRIA, TIDA POR INTERPOSTA, E APELAÇÃO DA
PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - A pretensão da parte autora recai sobre o reconhecimento de labor rurícola exercido sob
economia familiar, desde 17/04/1967 até 01/03/1983, além de labor especial desenvolvido nos
interregnos de 18/03/1983 a 26/06/1989 e de 02/10/1991 a 05/12/1994. Aduz que todos os
intervalos, ao serem devidamente computados com seus demais períodos de labuta,
propiciariam a concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição".
2 - O INSS foi condenado a averbar períodos laborativos rural e especial. E assim, considera-se
a sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro
mencionado e da Súmula 490 do STJ.
3 - Existência de erro material na r. sentença, proferida pelo douto Juiz singular, nos seguintes
termos, partim:"...JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente ação, com resolução do
mérito, nos termos do art. 269, inciso I do Código de Processo Civil, para: (...) II) reconhecer
que a parte autora exerceu atividade especial nos períodos de 18/03/1983 a 26/07/1989 e de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
02/10/1991 a 05/12/1994...".
4 - A data correta do vínculo, constante de CTPS, corresponde a 18/03/1983 até 26/06/1989.
5 - A teor do disposto no art. 494, inciso I, do Novo Código de Processo Civil (correspondente
ao art. 463, I, do Código anterior), corrige-se, de ofício, o erro material contido na r. sentença, a
fim de que dela passe a constar, no dispositivo, partim: "...JULGO PARCIALMENTE
PROCEDENTE a presente ação, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, inciso I do
Código de Processo Civil, para: (...) II) reconhecer que a parte autora exerceu atividade especial
nos períodos de 18/03/1983 a 26/06/1989 e de 02/10/1991 a 05/12/1994...".
6 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
7 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
8 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
9 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registre-se ser histórica a
vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a
alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as
Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
10 - Cravando as vistas na data de nascimento consignada no documento pessoal da parte
autora - 17/11/1957 - depreende-se ser possível o exame do suposto labor rurícola a partir de
17/11/1969, ou seja, a partir de seus 12 anos de idade.
11 - No intuito de comprovar as alegações postas na inicial - concernentes ao pretérito labor na
zona rural, em conjunto com familiares, na Fazenda Caminho Velho, situada no Município de
Mirangaba, em solo baiano - a parte autora carreou aos autos as seguintes cópias documentais
(aqui, cronologicamente ordenadas): 1) em nome do Sr. Manoel Pedro dos Santos, genitor do
autor: * carteira de filiação junto a sindicato rural em Mirangaba/BA, expedida em 19/01/1978; *
comprovantes de cadastro/lançamento/pagamento/notificação de "Imposto sobre a Propriedade
Territorial Rural - ITR", relativos ao imóvel Fazenda Caminho Velho, localizado no Município de
Mirangaba/BA, classificado como minifúndio, com enquadramento sindical de trabalhador rural,
nos exercícios de 1991, 1994, 1995, 1996, 1998 e 1999. 2) em nome próprio do autor: * certidão
de casamento, contraído em 13/02/1988, anotada a profissão do cônjuge varão como lavrador.
12 - Em audiência de instrução realizada, disseram as testemunhas (aqui, em linhas
brevíssimas): Sr. Valdevino Pereira dos Santos declarou ter conhecido o autor quando ele
contava com 18, 19 anos (anos de 1975, 1976) ...sendo que ele já trabalhava na roça. O Sr.
José Manoel de Souza afirmou conhecer o autor há uns 40 anos (ano de 1971) ...em trabalho
sempre na roça ...na propriedade da família dele ...plantando feijão, mandioca, milho, mamona.
E o Sr. Adenilton Santos de Souza asseverou que o autor sempre trabalhou na roça ...com a
família, ajudando o pai ...desde os 07 anos (ano de 1964) ...plantando milho, feijão, mandioca,
mamona.
13 - A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória da documentação
carreada aos autos, sendo possível reconhecer-se o trabalho da parte autora desde 17/11/1969
(aos 12 anos de idade) até 01/03/1983.
14 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
15 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
16 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
17 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
18 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
19 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
20 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
21 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
22 - Dentre os documentos que instruem a exordial, merecem destaque aqueles que, sem
dúvida pairante, comprovam a periodização das atividades laborais prestadas pelo autor, sob
insalubridade: * de 18/03/1983 a 26/06/1989: os formulário e laudo técnico fornecidos pela
empresa Jacobina Mineração e Comércio Ltda. revelam a sujeição do autor - ora como operário
de subsolo, ora como operador de carregadeira de subsolo, ora como operador de equipamento
de subsolo - a agente agressivo, dentre outros, ruídos oscilantes entre 85 e 110 dB(A),
merecendo reconhecimento a especialidade laboral, à luz dos itens 1.1.6 do Decreto nº
53.831/64 e 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79; * de 02/10/1991 a 05/12/1994: os formulário e laudo
técnico fornecidos pela empresa Parmalat Brasil S/A Indústria de Alimentos revelam a sujeição
do autor - como ajudante geral - a agente agressivo ruído de 89 dB(A), merecendo
reconhecimento a especialidade laboral, à luz dos itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e 1.1.5
do Decreto nº 83.080/79.
23 - Procedendo-se ao cômputo dos labores - rural e especial - reconhecidos nesta demanda,
àqueles de ordem notadamente incontroversa (consoante registros em CTPS, cotejáveis com o
resultado de pesquisa ao banco de dados CNIS, constatando-se, inclusive, a presença de
contribuições previdenciárias vertidas em caráter individual, de março/2004 a fevereiro/2005),
verifica-se que a parte autora, à época do ajuizamento da ação, contava com 28 anos, 05
meses e 24 dias de tempo de serviço, tempo notadamente insuficiente à aposentação.
24 - O pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia
previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo rural correspondente a 17/11/1969 até
01/03/1983, bem como tempo especial de 18/03/1983 a 26/06/1989 e de 02/10/1991 a
05/12/1994, considerado improcedente o pedido de concessão de aposentadoria.
25 - Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários
advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a
gratuidade da justiça conferida à parte autora e por ser o INSS delas isento.
26 - Erro material corrigido.
27 - Apelação do INSS desprovida.
28 - Apelação da parte autora e remesse necessária, tida por interposta, providas em parte.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, corrigir de ofício o erro
material contido na r. sentença, negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à
apelação do autor, para reconhecer a atividade rural em regime familiar também no intervalo de
17/11/1969 até 18/01/1978, e dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta,
para decretar a sucumbência recíproca, mantidos os ulteriores termos da r. sentença de
Primeira Jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
