
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0045884-81.2015.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: PEDRO CAMILO RODRIGUES DUARTE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: MARCELO BASSI - SP204334-N
Advogado do(a) APELANTE: DANIEL DE FREITAS TRIDAPALLI - SP210142-N
APELADO: PEDRO CAMILO RODRIGUES DUARTE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: MARCELO BASSI - SP204334-N
Advogado do(a) APELADO: DANIEL DE FREITAS TRIDAPALLI - SP210142-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0045884-81.2015.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas, pelo autor PEDRO CAMILO RODRIGUES DUARTE e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária objetivando a concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", mediante o reconhecimento de labor rural e especial.
A r. sentença prolatada (ID 106866446 – fls. 172/175) julgou procedente o pedido, reconhecendo o exercício de atividade rural desde 29/06/1972 até 29/06/1987, e labor especial de 01/10/2005 a 11/09/2013, condenando, assim, o INSS no pagamento de "aposentadoria integral por tempo de contribuição" ao postulante, desde a data da citação, com incidência de juros de mora e correção monetária sobre os valores atrasados. O INSS foi condenado, ademais, a arcar com honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o montante vencido, observada a Súmula 111 do C. STJ. Isenção das custas processuais.
Os embargos de declaração opostos pela parte autora (ID 106866446 – fls. 179/182) foram sumariamente rejeitados (ID 106866446 – fl. 183).
Apelou o demandante (ID 106866446 – fls. 185/190), insistindo no reconhecimento de período rural correspondente a 29/06/1968 a 28/08/1970, bem como do período especial de 29/04/1995 a 05/03/1997. Requereu a fixação do termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (28/10/2013).
Em seu apelo (ID 106866446 – fls. 193/206), o INSS defende a total improcedência da ação, haja vista a falta de comprovação do labor rural, sendo que, por sua vez, a documentação relativa ao labor especial encontrar-se-ia desprovida de indicação do responsável técnico pela aferição dos agentes agressivos. Sustenta que o uso de EPI eficaz afastaria eventual nocividade, acarretando, por sua vez, a ausência de prévia fonte de custeio ao benefício.
Devidamente processados os recursos, com o oferecimento de contrarrazões pela parte autora (ID 106866446 – fls. 210/217), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0045884-81.2015.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: PEDRO CAMILO RODRIGUES DUARTE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da presente demanda dera-se em
07/03/2014
, com a prolação da r. sentença aos14/05/2015
(ID 106866446 – fl. 175), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973. Justiça gratuita deferida (ID 106866446 – fl. 115).
Da remessa necessária, tida por interposta
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
"Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).
§1º Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.
§2º Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.
§3º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente."
O INSS foi condenado a averbar tempo de serviço rural e especial, e implantar aposentadoria em nome da parte autora. E não havendo como se apurar, nesta fase processual, com exatidão, o valor condenatório, considera-se a sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Da questão de fundo
Nestes autos, a pretensão da parte autora recai sobre o reconhecimento de labor rurícola exercido de 29/06/1968 a 28/08/1970 e de 29/06/1972 a 29/06/1987, além de labor especial desenvolvido nos interregnos de 29/04/1995 a 05/03/1997 e de 01/10/2005 a 11/09/2013. Aduz que todos os intervalos, ao serem devidamente computados com seus demais períodos de labuta, propiciariam a concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", a partir de 28/10/2013 (data do requerimento administrativo, sob NB 164.847.714-0) (ID 106866446 – fl. 21).
De partida, cumpre destacar o reconhecimento, em sede administrativa, do intervalo especial de 01/08/1991 a 28/04/1995 (ID 106866446 – fl. 101).
Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
Do labor rural
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS. 1. (...). 3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento.(...)"
(APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº 0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/12/2015).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória. (...)"
(AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP
, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(omissis)
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. (grifos nossos).
§1º - Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes." (grifos nossos)
É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS PARA SANAR OMISSÃO SEM EFEITO MODIFICATIVO.
(...)
2. No presente caso, impõe-se sanar omissão para asseverar que a jurisprudência do STJ possui entendimento no sentido de que é dispensável o recolhimento de contribuições previdenciárias, para fins de reconhecimento de tempo de serviço rural, quanto ao labor exercido antes da Lei 8.213/1991.(...)"
(EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 05/11/2015).
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 485, V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 55, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. OCORRÊNCIA. SEGURADA VINCULADA AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL-RGPS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. APOSENTADORIA. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. ANTES DA VIGÊNCIA DA REFERIDA LEI. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A autora sempre esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social.
2. Não é exigível o recolhimento das contribuições previdenciárias, relativas ao tempo de serviço prestado como trabalhador rural, antes da vigência da Lei n 8.213/91, para fins de aposentadoria urbana pelo Regime Geral de Previdência Social. Precedentes da Terceira Seção.
Ação rescisória procedente"
(AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015, DJe 04/12/2015).
"APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR A PROVA DOCUMENTAL.
1. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de vigência da Lei n.º 8.213/1991, é de ser computado e averbado, independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, mas não se presta para efeito de carência.(...)"
(AC nº 0029462-51.2003.4.03.9999, 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/12/2015).
Contudo, o tempo de serviço do trabalhador rural poderá ser computado, independentemente do recolhimento de contribuição, até o dia 31/10/1991, conforme o disposto no art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99,
in verbis
:
"Art. 60. Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição, entre outros:
(...)
X - o tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior à competência novembro de 1991;"
Do labor rural desde os 12 anos de idade
Por sua vez, a respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registre-se ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra, ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, encontrava-se a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhassem os pais na lavoura e eventualmente os auxiliassem em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudessem exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contarem com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
"ACIDENTE DO TRABALHO. SEGURO OBRIGATORIO ESTABELECIDO NO ART. 165- XVI DA CONSTITUIÇÃO: ALCANCE. CONTRATO LABORAL COM AFRONTA A PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL DO TRABALHO DO MENOR DE DOZE ANOS. MENOR DE DOZE ANOS QUE PRESTAVA SERVIÇOS A UM EMPREGADOR, SOB A DEPENDÊNCIA DESTE, E MEDIANTE SALARIO. TENDO SOFRIDO O ACIDENTE DE TRABALHO FAZ JUS AO SEGURO PRÓPRIO. NÃO OBSTA AO BENEFÍCIO A REGRA DO ART. 165-X DA CARTA DA REPUBLICA, QUE FOI INSCRITA NA LISTA DAS GARANTIAS DOS TRABALHADORES EM PROVEITO DESTES, NÃO EM SEU DETRIMENTO. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS CONHECIDOS E PROVIDOS."
(RE nº 104.654/SP, Relator Ministro Francisco Rezek, 2ª Turma, DJ 25/04/1986) (grifos nossos).
"Agravo de instrumento.
2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de tempo de serviço. Art. 11, VII, da Lei nº. 8213. Possibilidade. Precedentes.
3. Alegação de violação aos arts. 5º, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte.
4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.04.86; e RE 104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86.
5. Agravo de instrumento a que se nega provimento".
(AI nº 529.694/RS, Rel. Ministro Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJ de 11/03/2005) (grifos nossos).
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
"PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ULTRA PETITA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. TEMPO DE LABOR NA FAINA RURAL.
(...)
- Admite-se o cômputo do período laborado no campo pelo menor de idade (a partir dos 12 - doze - anos), uma vez que as regras insculpidas nos Ordenamentos Constitucionais, vedando o trabalho infantil, não podem prejudicá-lo.
- Dado parcial provimento tanto à remessa oficial (tida por interposta) como ao recurso de apelação da autarquia previdenciária e negado provimento ao recurso de apelação da parte autora."
(AC nº 2012.03.99.028461-0/SP, Rel. Des. Federal Fausto de Sanctis, DJe 16/03/2017).
"PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. POSSIBILIDADE. DISPENSA DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES.
(...)
4. É possível o reconhecimento do tempo de atividade rural prestado já aos 12 (doze) anos de idade, consoante precedentes dos Tribunais Superiores.
5. De acordo com os documentos anexados aos autos, corroborados pela prova testemunhal, a autora comprovou o exercício de atividade rural no período de 07/1975 a 07/1988, devendo ser procedida a contagem do referido tempo de serviço, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do artigo 55, §2º, da Lei 8.213/91.
6. Apelação provida."
(AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, Rel. Des. Federal Toru Yamamoto, DJe 13/03/2017).
Diante disso, cravando as vistas na data de nascimento consignada no documento pessoal da parte autora - 29/06/1956 (ID 106866446 – fl. 13) - depreende-se ser possível o exame do suposto labor rurícola a partir de 29/06/1968 (aos 12 anos de idade), assim postulado na exordial.
Senão vejamos.
No intuito de comprovar as alegações postas na inicial - concernentes ao pretérito labor na zona rural, em conjunto com familiares rurícolas, e em terras próprias - a parte autora carreou aos autos as seguintes cópias documentais (aqui, cronologicamente ordenadas):
1)
em nome doSr. Paulo Rodrigues Duarte, genitor do autor
:
* certidão de casamento dos genitores do autor, celebrado em 13/02/1954, anotada a qualificação paterna de lavrador (ID 106866446 – fl. 67);
* documento referente a imóvel rural adquirido pelo genitor em 11/07/1972, constando, em averbação posterior, sua condição de lavrador (ID 106866446 – pág. 59/60 e 72);
2)
em nome doSr. Luiz Carlos Rodrigues Duarte, irmão do autor
:
* certificado de dispensa de incorporação emitido em 20/12/1979, indicando a profissão de lavrador (ID 106866446 – pág. 69);
3)
em nomepróprio do autor
:
* título eleitoral expedido em 16/09/1975, constando a profissão de lavrador (ID 106866446 – pág. 61);
* certificado de dispensa de incorporação emitido em 30/04/1976, indicando, igualmente, a profissão de lavrador (ID 106866446 – pág. 63);
* certidão do "Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt - IIRGD", na qual consta a profissão de lavrador declarada em 21/05/1976, ocasião da requisição de seu documento de identidade (ID 106866446 – pág. 65).
A documentação retratada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, a ser corroborado por idônea e segura prova testemunhal.
Em audiência de instrução realizada, disseram as testemunhas (ID 106866446 – pág. 162/163) (aqui, em linhas brevíssimas):
Sr. Ademir de Fátima Rudi
declarou conhecer o autor desde criança, de Cesário Lange/SP ...sendo que ele teria trabalhado em atividade na roça com o pai e o restante da família, desde os 14 ou 15 anos de idade (anos de 1970 ou 1971) ...em lavoura de milho, arroz ...até o sítio ser vendido. OSr. Lázaro Escolástico Ricei
afirmou conhecer o autor desde criança ...sendo que ele teria começado o trabalho em atividade rural aos 14 anos (ano de 1970) ...com o pai, a mãe e os irmãos dele ...permanecendo até o sítio ser vendido. Por fim, oSr. Lucas Manoel Pereira
asseverou conhecer o labor rural do autor desde ano de 1972 ou 1973 ...no sítio com o genitor ...plantando milho, arroz ...sem contar com empregados.
A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória da documentação carreada aos autos, sendo possível reconhecer-se o trabalho campesino já a partir do ano de 1970. Quanto ao ano de 1968 em diante (e até o ano de 1970), não houve menção, por nenhum dos depoentes, em alusão ao trabalho campal do autor.
Assim sendo, resta confirmado o tempo laborativo do autor de 01/01/1970 até 28/08/1970 (data-fim indicada na exordial), mantendo-se, por sua vez, a sentença, quanto ao reconhecimento do intervalo de 29/06/1972 a 29/06/1987.
Do labor especial
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial, e em obediência ao aforismo
tempus regit actum
, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Período Trabalhado | Enquadramento | Limites de Tolerância |
Até 05/03/1997 | Anexo do Decreto nº 53.831/64, e Decretos nºs 357/91 e 611/92 | 80 dB |
De 06/03/1997 a 18/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 2.172/97, e Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, redação original | 90 dB |
A partir de 19/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03 | 85 dB |
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
"(...) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete";
(...)
a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria"
(STF, ARE 664.335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJe n. 29, de 11.02.2015, public. 12.02.2015)"
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça,
in verbis
:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS PARA COMUM. FATOR DE CONVERSÃO. INCIDÊNCIA DO DECRETO N. 4.827/2003, QUE ALTEROU O ART. 70 DO DECRETO N. 3.048/1999. MATÉRIA DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. AGRAVO DESPROVIDO.
1. "A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do REsp.1.151.363/MG, representativo da controvérsia, realizado em 23.3.2011 e de relatoria do douto Ministro JORGE MUSSI, firmou o entendimento de que, de acordo com a alteração dada pelo Decreto 4.827/2003 ao Decreto 3.048/99, a conversão dos períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época será realizada de acordo com as novas regras da tabela definida no artigo 70 que, para o tempo de serviço especial correspondente a 25 anos, utiliza como fator de conversão, para homens, o multiplicador 1,40". (AgRg no REsp n.1.080.255/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 15.04.2011)
2. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1172563/MG, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), SEXTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 01/07/2011)
Do caso concreto.
Dentre os documentos que instruem a exordial, encontram-se cópias de CTPS (ID 106866446 – pág. 43/53), cujos contratos empregatícios são conferíveis do resultado de pesquisa ao banco de dados CNIS (ID 106866446 – pág. 91), bem como da tabela confeccionada pelo INSS (ID 106866446 – pág. 101).
Por sua vez, subsiste documentação técnica, referindo à sujeição habitual e permanente do autor a agentes de natureza insalubre, assim descrita:
* de 29/04/1995 a 05/03/1997, sob
ruído de 83 dB(A)
, conforme PPP - Perfil Profissiográfico juntado (ID 106866446 – pág. 73/75);* de 01/10/2005 a 11/09/2013 (data de emissão documental), sob
ruído de 94 dB(A)
, conforme PPP - Perfil Profissiográfico juntado (ID 106866446 – pág. 79/81).
Diferentemente do quanto alegado pela autarquia previdenciária, ambos os PPP supra mencionados contêm indicação clara de profissional dotado de capacidade técnica para atestar a insalubridade laborativa.
Da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
"Observado o disposto no art. 4º desta Emenda e ressalvado o direito de opção a aposentadoria pelas normas por ela estabelecidas para o regime geral de previdência social, é assegurado o direito à aposentadoria ao segurado que se tenha filiado ao regime geral cumulativamente aos seguintes requisitos
I - contar com cinquenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de idade, se mulher; e
II - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que, na data da publicação desta Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea anterior.
§ 1º - O segurado de que trata este artigo, desde que atendido o disposto no inciso I do "caput", e observado o disposto no art. 4º desta Emenda, pode aposentar-se com valores proporcionais
I - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta anos, se homem, e vinte e cinco anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a quarenta por cento do tempo que, na data da publicação desta Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea anterior" (grifos nossos).
Conforme planilha que segue junto a este
decisum
, procedendo-se ao cômputo dos labores - rural e especial - àqueles de ordem notadamente incontroversa, verifica-se que a parte autora, em 28/10/2013, contava com41 anos, 05 meses e 29 dias
de labor, assegurando-lhe o direito à aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição.
O marco inicial dos pagamentos do benefício deverá coincidir com a data da provocação administrativa, aos 28/10/2013, eis que comprovados, já à época, os requisitos necessários ao deferimento da benesse.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto,
nego provimento ao recurso de apelação do INSS
,dou parcial provimento à apelação do autor
, reconhecendo o labor rural desde 01/01/1970 até 28/08/1970, e o labor especial de 29/04/1995 a 05/03/1997, e fixando o termo inicial do benefício na data do requerimento (28/10/2013), edou parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta,
para estabelecer que sobre os valores em atraso incidirão correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, mantidos os demais termos consagrados na sentença de Primeira Jurisdição.
Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso excepcional ou a certificação do trânsito em julgado.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO. LABOR RURAL E ESPECIAL. ATIVIDADE RURAL. ECONOMIA FAMILIAR. PROVA MATERIAL. DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. COMPROVAÇÃO PARCIAL. LABOR ESPECIAL. RUÍDO. APOSENTADORIA INTEGRAL. TEMPO SUFICENTE À CONCESSÃO. TERMO INICIAL. DER. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR, E REMESSA NECESSÁRIA, TIDA POR INTERPOSTA, PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - O INSS foi condenado a averbar tempo de serviço rural e especial, e implantar aposentadoria em nome da parte autora. E não havendo como se apurar, nesta fase processual, com exatidão, o valor condenatório, considera-se a sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
2 - A pretensão da parte autora recai sobre o reconhecimento de labor rurícola exercido de 29/06/1968 a 28/08/1970 e de 29/06/1972 a 29/06/1987, além de labor especial desenvolvido nos interregnos de 29/04/1995 a 05/03/1997 e de 01/10/2005 a 11/09/2013. Aduz que todos os intervalos, ao serem devidamente computados com seus demais períodos de labuta, propiciariam a concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", a partir de 28/10/2013 (data do requerimento administrativo, sob NB 164.847.714-0).
3 - Reconhecimento, em sede administrativa, do intervalo especial de 01/08/1991 a 28/04/1995.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
7 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registre-se ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
8 - Cravando as vistas na data de nascimento consignada no documento pessoal da parte autora - 29/06/1956 - depreende-se ser possível o exame do suposto labor rurícola a partir de 29/06/1968 (aos 12 anos de idade), assim postulado na exordial.
9 - No intuito de comprovar as alegações postas na inicial - concernentes ao pretérito labor na zona rural, em conjunto com familiares rurícolas, e em terras próprias - a parte autora carreou aos autos as seguintes cópias documentais (aqui, cronologicamente ordenadas):
1)
em nome doSr. Paulo Rodrigues Duarte, genitor do autor
: * certidão de casamento dos genitores do autor, celebrado em 13/02/1954, anotada a qualificação paterna de lavrador; * documento referente a imóvel rural adquirido pelo genitor em 11/07/1972, constando, em averbação posterior, sua condição de lavrador;2)
em nome doSr. Luiz Carlos Rodrigues Duarte, irmão do autor
: * certificado de dispensa de incorporação emitido em 20/12/1979, indicando a profissão de lavrador;3)
em nomepróprio do autor
: * título eleitoral expedido em 16/09/1975, constando a profissão de lavrador; * certificado de dispensa de incorporação emitido em 30/04/1976, indicando, igualmente, a profissão de lavrador; * certidão do "Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt - IIRGD", na qual consta a profissão de lavrador declarada em 21/05/1976, ocasião da requisição de seu documento de identidade.10 - Em audiência de instrução realizada, disseram as testemunhas (aqui, em linhas brevíssimas):
Sr. Ademir de Fátima Rudi
declarou conhecer o autor desde criança, de Cesário Lange/SP ...sendo que ele teria trabalhado em atividade na roça com o pai e o restante da família, desde os 14 ou 15 anos de idade (anos de 1970 ou 1971) ...em lavoura de milho, arroz ...até o sítio ser vendido. OSr. Lázaro Escolástico Ricei
afirmou conhecer o autor desde criança ...sendo que ele teria começado o trabalho em atividade rural aos 14 anos (ano de 1970) ...com o pai, a mãe e os irmãos dele ...permanecendo até o sítio ser vendido. Por fim, oSr. Lucas Manoel Pereira
asseverou conhecer o labor rural do autor desde ano de 1972 ou 1973 ...no sítio com o genitor ...plantando milho, arroz ...sem contar com empregados.11 - A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória da documentação carreada aos autos, sendo possível reconhecer-se o trabalho campesino já a partir do ano de 1970. Quanto ao ano de 1968 em diante (e até o ano de 1970), não houve menção, por nenhum dos depoentes, em alusão ao trabalho campal do autor.
12 - Resta confirmado o tempo laborativo do autor de 01/01/1970 até 28/08/1970 (data-fim indicada na exordial), mantendo-se, por sua vez, a sentença, quanto ao reconhecimento do intervalo de 29/06/1972 a 29/06/1987.
13 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo
tempus regit actum
, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.14 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
15 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
16 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
17 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
18 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
19 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
20 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
21 - Dentre os documentos que instruem a exordial, encontram-se cópias de CTPS, cujos contratos empregatícios são conferíveis do resultado de pesquisa ao banco de dados CNIS, bem como da tabela confeccionada pelo INSS.
22 - Subsiste documentação técnica, referindo à sujeição habitual e permanente do autor a agentes de natureza insalubre, assim descrita: * de 29/04/1995 a 05/03/1997, sob
ruído de 83 dB(A)
, conforme PPP - Perfil Profissiográfico juntado; * de 01/10/2005 a 11/09/2013 (data de emissão documental), sobruído de 94 dB(A)
, conforme PPP - Perfil Profissiográfico juntado.23 - Ambos os PPP contêm indicação clara de profissional dotado de capacidade técnica para atestar a insalubridade laborativa.
24 - Procedendo-se ao cômputo dos labores - rural e especial - àqueles de ordem notadamente incontroversa, verifica-se que a parte autora, em 28/10/2013, contava com
41 anos, 05 meses e 29 dias
de labor, assegurando-lhe o direito à aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição.25 - Marco inicial dos pagamentos do benefício na data da provocação administrativa, aos 28/10/2013, eis que comprovados, já à época, os requisitos necessários ao deferimento da benesse.
26 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.27 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
28 - Apelação do INSS desprovida. Apelação do autor e remessa necessária, tida por interposta, providas em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso de apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação do autor, reconhecendo o labor rural desde 01/01/1970 até 28/08/1970, e o labor especial de 29/04/1995 a 05/03/1997, e fixando o termo inicial do benefício na data do requerimento (28/10/2013), e dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, para estabelecer que sobre os valores em atraso incidirão correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, mantidos os demais termos consagrados na sentença de Primeira Jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
