
| D.E. Publicado em 19/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, para restringir a r. sentença de 1º grau, ultra petita, aos limites do pedido, assim como dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, para excluir da condenação o reconhecimento da especialidade no período de 27/11/1996 a 24/02/1997, e estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, o julgado de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0045754-33.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por ANTÔNIO APARECIDO DE JESUS, objetivando a concessão de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento e averbação de labor rural e especial.
A r. sentença de fls. 311/319 julgou parcialmente procedente o pedido, condenando o INSS a reconhecer o trabalho rural exercido no intervalo de 23/02/1967 a 12/02/1974, e como especiais as atividades desenvolvidas nos períodos de 14/02/1974 a 07/03/1975, 07/04/1975 a 14/09/1978, 15/01/1979 a 02/05/1981, 09/12/1986 a 25/12/1992, 27/11/1996 a 24/02/1997, 18/09/1997 a 16/12/1997, 17/12/1997 a 31/10/1998, 18/11/1998 a 20/11/1998, 14/02/2000 a 14/03/2000, 03/11/2003 a 16/12/2003, 26/01/2004 a 04/02/2004, 22/02/2004 a 17/03/2004 e 29/03/2004 a 30/04/2004, concedendo ao autor aposentadoria por tempo de contribuição proporcional (percentual de 70% sobre o salário-de-benefício), a partir do requerimento administrativo (26/11/2008). Prestações em atraso a serem pagas de uma só vez, acrescidas de juros de mora de 0,5% ao mês e correção monetária, ambos desde a citação, respeitada a prescrição quinquenal e eventuais pagamentos feitos na esfera administrativa. Isenção de custas. Fixou-se verba advocatícia de 10% sobre o valor das prestações vencidas (Súmula 111 do STJ).
Em razões recursais de fls. 323/340, o INSS alega que não restou comprovada a prestação rural, por ausência de início de prova material. Ademais, sem o recolhimento das co respectivas contribuições, o tempo rural não poderia ser utilizado para efeito de carência. No que tange ao labor especial, afirma a impossibilidade de conversão, de tempo especial para comum, após 28/05/1998, além da necessidade de observância das disposições transitórias contidas na EC 20/98. Pede, em suma, a reforma da sentença. Caso seja outro o entendimento, requer: a) a fixação do termo inicial do benefício na data da citação; b) que os juros de mora sejam fixados em 0,5% ao mês; e c) a redução dos honorários advocatícios para 5% sobre as prestações vencidas até a sentença.
Devidamente processado o recurso, com o oferecimento de contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 17/06/2011, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, § 2º do CPC/73:
No caso, o INSS foi condenado a averbar labor rural e especial e conceder aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, desde o requerimento administrativo, em 26/11/2008. E não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Na peça vestibular, aduz a parte autora que, no passado, teria iniciado seu ciclo laborativo na lavoura, assim permanecendo de 23/02/1967 a 12/02/1974. Pretende seja tal intervalo reconhecido, assim como a especialidade dos períodos laborativos de 14/02/1974 a 07/03/1975, 07/04/1975 a 14/09/1978, 15/01/1979 a 02/05/1981, 29/09/1981 a 01/01/1982, 05/04/1982 a 01/07/1982, 18/11/1982 a 22/08/1983, 15/10/1984 a 24/11/1984, 16/04/1986 a 21/10/1986, 09/12/1986 a 25/12/1992, 20/01/1995 a 09/06/1995, 14/05/1996 a 30/05/1996, 27/11/1996 a 24/02/1997 e 17/12/1997 a 02/03/1998 (todos estes assinalados na tabela de fls. 02/03, designados como Tempo Especial), visando à concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015.
Todavia, verifica-se que o magistrado a quo não se ateve aos termos do pedido inaugural ao considerar como tempo especial os intervalos de 18/09/1997 a 16/12/1997, 03/03/1998 a 31/10/1998, 18/11/1998 a 20/11/1998, 14/02/2000 a 14/03/2000, 03/11/2003 a 16/12/2003, 26/01/2004 a 04/02/2004, 22/02/2004 a 17/03/2004 e 29/03/2004 a 30/04/2004, enfrentando tema que não integrou a pretensão efetivamente manifesta.
Logo, a sentença, neste aspecto, é ultra petita, eis que considerou atividade especial desempenhada em lapsos temporais não pleiteados na inicial, extrapolando os limites do pedido, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73 (atual art. 492 do CPC/2015).
Conveniente esclarecer que a violação ao princípio da congruência traz, no seu bojo, agressão ao princípio da imparcialidade, porquanto concede algo não pedido, e do contraditório, na medida em que impede a parte contrária de exercer integralmente seu direito de defesa.
Dessa forma, é de ser reduzida a sentença aos limites do pedido inicial, excluindo-se tempo de serviço nos interregnos não-indicados pelo autor como sendo de atividade especial.
Por outro lado, desconsiderando-se os períodos indevidamente acrescidos na sentença (ora reduzida), atendo-se àqueles que efetivamente pertencem à pretensão inaugural e, destes, àqueles admitidos em sentença, conclui-se, alfim, que dentre os pretendidos e não reconhecidos no julgado encontram-se os interstícios de 29/09/1981 a 01/01/1982, 05/04/1982 a 01/07/1982, 18/11/1982 a 22/08/1983, 15/10/1984 a 24/11/1984, 16/04/1986 a 21/10/1986, 20/01/1995 a 09/06/1995 e 14/05/1996 a 30/05/1996.
E como não houve insurgência recursal da parte autora, no tocante a supra aludidos lapsos, doravante não serão examinados, homenageando-se, assim, o princípio da devolutividade da matéria a esta Instância.
Prosseguindo, verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Do labor rural.
Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
No entanto, não há necessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Impende registrar que é pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Para comprovar o suposto labor rural, foram apresentados os seguintes documentos:
a) Certidão emitida pelo Juízo da 10ª Zona Eleitoral do Estado de São Paulo, informando que o autor requerera seu título eleitoral em 21/03/1973, declarando, à época, sua profissão como lavrador (fl. 125);
b) título eleitoral, expedido em 21/03/1973, no qual o autor está qualificado como lavrador (fl. 126);
c) certificado de dispensa de incorporação, emitido em 03/01/1974, constando a profissão de arador (fl. 127);
Ressalte-se que a declaração sindical (fls. 128) não foi homologada por órgão oficial, razão pela qual não tem aptidão como prova material do trabalho rural.
Nessa diretriz o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça e desta 3ª Seção:
Os demais documentos por certo configuram início de prova material do trabalho rural.
Além desta documentação, foram ouvidas duas testemunhas (fls. 35).
A testemunha Vandir Martins de Lima afirmou: "Que o depoente conhece o autor desde a época de criança; que o depoente tem 53 anos de idade, sendo que o autor deve ter um pouco mais; que o depoente começou a trabalhar com 13 anos de idade; que o depoente a partir de então começou a comprar feijão da família do autor; que naquele tempo Antônio ajudava sua família na lavoura; que como faz muito tempo não se recorda se chegou a comprar feijão do autor, mas reafirma que comprava de sua família; que procurava a família de Antônio na época da safra, ou seja, duas vezes ao ano; que não sabe até quando o autor trabalhou na lavoura. Que conheceu o pai de Antônio pelo nome 'Paulino Rosa'."
A testemunha Oraci Rodrigues de Paula asseverou: "Que o depoente conhece o autor desde a época de criança; que o depoente tem 57 anos de idade, sendo que o autor deve ter 56; que o depoente atualmente é motorista; mas trabalhou na lavoura até os 28 anos de idade; que era vizinho de sítio do autor, sabendo que o mesmo começou a trabalhar já desde criança na lavoura, auxiliando seu pai, Paulo Rosa; que se recorda que somente trabalhava a família de Antônio; que o produto do cultivo destinava-se à subsistência, vendendo o que sobejava; que não sabe até quando o autor trabalhou na lavoura; que já adulto o autor começou a trabalhar fora, ocasião em que perdeu contato com o mesmo. Que o autor trabalhava no bairro Lageado, em Itaóca."
Assim, a prova oral reforça o labor no campo e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, tornando possível o reconhecimento do labor rural no interregno de 23/02/1967 (desde os 12 anos de idade, eis que nascido em 23/02/1955 - fl. 08) até 12/02/1974 (que antecede primeiro registro anotado em CTPS).
Do labor especial.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso concreto.
A par dos intervalos referidos anteriormente, não reconhecidos em sentença e não recorridos pela parte autora (quais sejam, 29/09/1981 a 01/01/1982, 05/04/1982 a 01/07/1982, 18/11/1982 a 22/08/1983, 15/10/1984 a 24/11/1984, 16/04/1986 a 21/10/1986, 20/01/1995 a 09/06/1995 e 14/05/1996 a 30/05/1996), a controvérsia ora paira sobre os intervalos de 14/02/1974 a 07/03/1975, 07/04/1975 a 14/09/1978, 15/01/1979 a 02/05/1981, 09/12/1986 a 25/12/1992, 27/11/1996 a 24/02/1997 e 17/12/1997 a 02/03/1998.
Para comprovar a natureza especial das atividades, a parte autora apresentou a seguinte documentação:
* de 14/02/1974 a 07/03/1975: cópia de formulário (fl. 92) e laudo pericial (fl. 93), emitido pela empresa "Camargo Correia Cimentos S/A", informando que se ativou na função de "servente", com exposição a ruído de 88,3 dB(A);
* de 07/04/1975 a 14/09/1978: cópia de formulário (fl. 241) e laudo técnico (fls. 243/245) relativos à empresa "Robert Bosch Limitada/Fábrica Wapsa", informando que exerceu as funções de "ajudante de produção e montagem", "operador montador" e "operador de máquinas C", permanecendo exposto a ruído de 89 dB(A);
* de 15/01/1979 a 02/05/1981: cópia de formulário (fl. 97) - no qual consta informação da existência de laudo técnico depositado na Agência Cidade Dutra do INSS em São Paulo - relativo à empresa "Ina Brasil Ltda", informando que exerceu a função de "Operador máquina produção", permanecendo exposto a ruído de 88 dB(A);
* de 09/12/1986 a 25/12/1992: cópias de formulários (fls. 98 e 100) e laudos periciais (fls. 99 e 101), expedidos pela empresa "Camargo Corrêa Cimentos S/A", informando que exerceu as funções de "Mecânico de Manutenção" e "Mecânico de Manutenção II", permanecendo exposto a ruído de 100,8 dB(A);
* de 17/12/1997 a 02/03/1998: cópias de Perfis Profissiográficos Previdenciários (fls. 103/122), emitidos pela empresa "ENGEMAN - Walter Machado e Lineu Moraes LTDA", dando conta de que exerceu a função de "mecânico", permanecendo exposto a ruído de 89,4 dB(A) e agentes químicos cromo, manganês, poeira mineral, óleo lubrificante, graxa, silício e radiação não ionizante. A atividade é enquadrada como especial, nos termos do Anexo IV do Decreto 2.172/97 e Anexo VI do Decreto 3.048/99, código 1.0.10 - Cromo e seus compostos tóxicos -, código 1.0.14 - Manganês e seus compostos - e código 1.0.7, "b" - Utilização de óleo mineral; bem como conforme anexo 13 da NR 15 do MTE, "Hidrocarbonetos e outros compostos de carbono", e Anexo 13A da mesma NR 15, que prevê cromo.
Todos os intervalos retro descritos têm sua especialidade reconhecida, à vista de previsão legal.
Quanto ao período de 27/11/1996 a 24/02/1997, embora haja formulário (fl. 102) emitido pela empresa "MB - Comércio e Instalações Elétricas Ltda", informando que exercida a função de "Mecânico II", não houve expressa indicação de agentes agressivos, o que impede seja a atividade enquadrada como especial.
Da aposentadoria.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
A aposentadoria proporcional, por sua vez, foi extinta pela Emenda Constitucional 20/98, que, de forma expressa, assegurou no art. 3º o direito aos que já haviam implementado, até a data de sua publicação, em 16/12/98, o requisito temporal, ou seja, 30 (trinta) anos de trabalho no caso do homem e 25 (vinte e cinco) no caso da mulher, independentemente de qualquer outra exigência (direito adquirido).
A citada Emenda Constitucional também manteve a aposentadoria proporcional para os que já se encontravam filiados ao RGPS na data de sua publicação e não possuíam tempo suficiente para requerê-la, porém estabeleceu na regra de transição, verbis:
Assim, conforme planilha anexa, somando-se a atividade rural (23/06/1967 a 12/02/1974) e as atividades especiais (14/02/1974 a 07/03/1975, 07/04/1975 a 14/09/1978, 15/01/1979 a 02/05/1981, 09/12/1986 a 25/12/1992 e 17/12/1997 a 02/03/1998) ora reconhecidas, aos períodos incontroversos constantes das carteiras de trabalho (fls. 09/91), do "Resumo de Documentos para Cálculo do Tempo de Contribuição" (fls. 272/276) e do CNIS, ora anexado, excluindo-se as concomitâncias, verifica-se que na data do requerimento administrativo (26/11/2008), o autor contava com 30 anos, 06 meses e 18 dias de contribuição, insuficientes para a concessão de aposentadoria integral. Entretanto, tal lapso de tempo de labor/contribuição mostra-se favorável à concessão da aposentadoria proporcional por tempo de serviço/contribuição, cumpridos também, a contento, o pedágio e o quesito etário (53 anos, para o sexo masculino) - este último, cumprido em 23/02/2008, anteriormente ao requerimento administrativo.
O requisito da carência restou também completado, consoante anotações em CTPS.
O termo inicial do benefício é mantido na data do requerimento administrativo, em 26/11/2008, momento da resistência à pretensão do autor.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser mantida em 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, dou parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, para restringir a r. sentença de 1º grau, ultra petita, aos limites do pedido, assim como dou parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, para excluir da condenação o reconhecimento da especialidade no período de 27/11/1996 a 24/02/1997, e estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, o julgado de 1º grau.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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