
| D.E. Publicado em 19/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e ao reexame necessário para dar parcial provimento ao pedido formulado na inicial, tão somente para condenar o INSS ao reconhecimento e averbação do tempo de labor rural, em regime de economia familiar, no período compreendido entre 21/10/1970 e 30/05/1978, reconhecendo, por fim, a ocorrência de sucumbência recíproca, dando a verba honorária por compensada entre as partes, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0009683-95.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de reexame necessário e de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária pelo rito ordinário, em face dele ajuizada por JOSÉ APARECIDO DA SILVA, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento do trabalho rural sem registro em CTPS.
A r. sentença de fls. 98/100 julgou procedente o pedido, para declarar justificados os períodos de trabalho rural sem registro em CTPS a partir de 21/10/1970 até 30/05/1978 e de 24/07/1979 até 02/07/1996, e condenar o INSS na concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, desde a data da citação (02/07/2010), acrescidas as parcelas em atraso de correção monetária e juros moratórios na forma prevista no art. 1º-F da Lei 9.494/97, a partir da citação, incidente sobre o valor principal devidamente corrigido, ressalvada a prescrição quinquenal que antecedeu o ajuizamento da ação. Condenou a autarquia, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula 111, STJ). Sem condenação em custas, por ser isento delas o INSS.
Em razões recursais de fls. 104/112, pugna o INSS pela reforma da sentença, ao fundamento de que não há nos autos início de prova material referente a todo o período que se pretende reconhecer, e que não foi cumprida a carência mínima necessária para fazer jus ao benefício. Requer o provimento do recurso para julgar improcedente do pedido do autor.
Contrarrazões do autor nas fls. 117/120.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Por ausência de interesse em composição amigável por parte do INSS (fls. 122 e 135), o Gabinete da conciliação devolveu os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, com reconhecimento e cômputo de trabalho rural sem registro em CTPS.
Verifico que o pedido formulado pelo autor encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios, e no art. 201, § 7º, inc. I, da CF/88.
A aposentadoria por tempo de serviço está prevista nos arts. 52 e 53 da Lei 8.213/91, in verbis:
O período de carência exigido é de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais (art. 25, II, da Lei 8.213/91), observadas as regras de transição previstas no art. 142 da referida Lei.
Sendo assim, passo ao exame do labor rural.
Cumpre ressaltar que o art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Na petição inicial o autor pleiteava o reconhecimento de atividade rural exercida entre 21/10/1970 e 30/05/1978 e entre 24/07/1979 e 02/07/1996, tendo sido provido integralmente o seu pedido.
O INSS, por sua vez, alega que somente o período compreendido entre os anos de 1975 e 1978 pode ser reconhecido como tempo de labor rural, para fins de contagem de tempo para concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Argumenta que os períodos não compreendidos pelos documentos apresentados como início de prova material não podem ser considerados para fins de contagem de tempo.
A fim de comprovar a atividade rural em regime de economia familiar, o autor coligiu aos autos os seguintes elementos de prova:
a) Cópia da Certidão de Casamento (Registro Civil), na qual consta qualificado como lavrador, em 30/07/1977 (fl. 11);
b) Cópia da Certidão de Nascimento de sua filha Marciana Viana da Silva, na qual consta qualificado como lavrador, em 13/09/1978 (fl. 12);
c) Cópia do Certificado de Dispensa de Incorporação, no qual consta que foi dispensado do Serviço Militar Inicial, em 31 de dezembro de 1974, por residir em município não tributário (fl. 13);
d) Cópia do Título de Eleitor, no qual consta qualificado como lavrador, em 16 de dezembro de 1975 (fl. 14);
e) Cópia da Matrícula de Registro de Imóveis relativa ao imóvel rural denominado "Sítio Santo Antônio", adquirido por escritura pública por Antônio Lourenço de Oliveira, em 29/07/1976 (fls. 28/34vº);
f) Cópia da Matrícula de Registro de Imóveis relativa ao imóvel rural denominado "Sítio São Manoel", de propriedade de Manoel Elizeu Viana e Higino José Santana, hipoteca datada de 16/03/1976 (fls. 20/21);
g) Declaração original, firmada por Assuer Manuel Viana, em 18 de março de 2010, em que foi declarado, para fins de aposentadoria do autor, "que ele trabalhou em regime de economia familiar, na propriedade agrícola denominada Sítio São Manoel situado no Bairro Córrego Olímpia, neste município de Pacaembu-SP, e que os produtos colhidos eram vendidos no nome do Sr Manoel Elizeu Viana (sogro já falecido) no período de 1980 a 1996", sendo que era proprietário do sítio desde 1976, como se depreende do documento no item anterior (fl. 40);
De outra parte, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que a prova testemunhal possui a capacidade de ampliar o período do labor documentalmente demonstrado, como ocorre no caso dos autos.
Em audiência realizada em 21/03/2011, valeu-se o autor, portando, dos depoimentos de testemunhas Assuer Manoel Viana e Carlos Augusto Dornelas, ambos qualificados como agricultores, sendo que alegam tê-lo conhecido à época em que o autor laborava nas lides campesinas, detalhando períodos, proprietários, tipos de lavouras e localidades.
Assuer Manoel Viana afirmou conhecer o autor desde quando o autor era criança e que, com sua genitora, mudou-se para uma propriedade localizada no Bairro Novo Roberto, pertencente a Otávio. Nessa época, o autor ainda não trabalhava, em razão de ter cerca de 7 anos de idade. Passados cerca de 2 anos, o autor e sua genitora mudaram-se para o Bairro Limoeiro, no município de Flórida Paulista, local onde o autor passou a trabalhar na lavoura de amendoim, como parceiro. Depois, o autor e sua genitora foram morar em outra propriedade próxima à subestação, local onde trabalhavam como diaristas, na retirada de pragas da pastagem. Relata que foi nessa época que o autor se casou, tendo se mudado, depois mudou-se para uma propriedade localizada no Bairro Córrego Olímpia, pertencente à família Cavalkame e, posteriormente, para a propriedade pertencente à família Toda. Passado um tempo, o autor mudou-se com sua família para a propriedade da família Viana, da qual o depoente é membro, também no Córrego Olímpia. Alega o depoente que em todas essas propriedades o autor trabalhou na lavoura e que, por volta de 1996, mudou-se para a cidade de Jundiaí (fl. 82);
Carlos Augusto Dornelas, a seu turno, afirmou que conhecia o autor desde o ano de 1981, quando passou a morar no bairro Córrego Olímpia, onde também morava o autor, numa propriedade da família Viana. Nessa propriedade cultivava-se café, algodão, amendoim, dentre outras culturas, onde o autor exercia seu labor juntamente com sua família, sendo que sua esposa também trabalhava no local. Afirmou que o depoente mudou-se para a cidade de Jundiaí por volta de 1995 e 1996. Perguntado, respondeu que acreditava que o autor trabalhasse em regime de parceria, quando era lavrador (fl. 83).
Como se vê, a prova testemunhal confirma, de forma uníssona, a faina campesina exercida pelo requerente ao longo do período de sua vida entre 1970 e 1996.
Não se trata, portanto, de prova exclusivamente testemunhal, como quer o INSS. Os depoimentos testemunhais estão confirmados por conjunto probatório idôneo.
No entanto, o conjunto probatório não dispõe de documentos suficientes para comprovar todos os períodos pleiteados pelo autor, esbarrando na incidência da ressalva do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91. Aliás, o caso presente enquadra-se, sim, nesse dispositivo, mas na parte em que admite a prova testemunhal "baseada em início de prova material".
A lei processual atribui ao Juiz no nosso sistema judiciário livre convencimento quanto à prova carreada aos autos. Em princípio, penso que poderia essa disposição ser mitigada por dispositivo de igual hierarquia, como é o caso da Lei nº 8.213/91, vedadas constitucionalmente somente as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI). O livre convencimento e a exigência de início de prova material, de certa forma, podem ser tidos como não excludentes; conjugam-se ambas disposições, que se integram e complementam no sentido de que, havendo o resquício de prova documental, há plena aplicação do princípio do livre convencimento quanto à prova testemunhal.
Extrai-se, portanto, do conjunto probatório, que o autor efetivamente comprovou que exercera as lides campesinas em regime de economia familiar em propriedades alheias, sendo possível manter o reconhecimento de sua atividade rural a partir de 21/10/1970 (data em que completou 14 anos) até 30/05/1978, nos termos da sentença recorrida.
Logo, os argumentos recursais no sentido de que não seja reconhecido o período anterior à data de emissão do documento mais antigo, no caso, o Certificado de Dispensa de Incorporação (1974), não procedem, uma vez que restou comprovado que o autor laborava em regime de economia familiar desde a tenra idade, com sua genitora, nas roças das propriedades da região citadas pelas testemunhas, sendo passível de reconhecimento o labor rural a partir da data em que o autor completou 14 (quatorze) anos de idade.
No entanto, o período que vai de 24/07/1979 até 02/07/1996 não está lastreado em início de prova material, uma vez que o documento da fl. 40 tem a mesma força e alcance que a prova testemunhal, a despeito de ter sido reduzida a termo. Assim, procedem em parte os argumentos recursais, sendo de rigor o indeferimento do reconhecimento do exercício do labor rural em regime de economia familiar no período de 24/07/1979 até 02/07/1996.
Analisando as anotações existentes na cópia da Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS nº 44005, Série 573ª, expedida em 12 de junho de 1978, verifica-se a existência dos seguintes vínculos empregatícios:
1) Família Chideto Toda, agricultura, como tratorista, de 1º de junho de 1978 até 23 de julho de 1979 (fls. 16); (Observo que este vínculo não está registrado nos dados do CNIS, em razão de eventual ausência de recolhimento das contribuições previdenciárias a ele correspondentes, eventualmente devidas pelo empregador. No entanto, a despeito de não constar o registro dessas contribuições, entendo que o período deve ser contemplado no cálculo de tempo de serviço em favor do autor).
2) Advance - Industria Têxtil Ltda, atividade industrial têxtil, como ajudante de malharia, de 3 de julho de 1996, sem registro da data de desligamento (fl. 16); (Observo que a data do desligamento não foi registrada na CTPS pelo empregador e que, como este vínculo está registrado nos dados constantes do CNIS, é possível afirmar que o autor permanece trabalhando lá até dos dias de hoje).
Portanto, extrai-se do conjunto probatório que o autor, efetivamente, exercera as lides campesinas em regime de economia familiar, devendo ser mantido o reconhecimento, nos termos da sentença recorrida, tão somente a partir de 21/10/1970 até 30/05/1978, não sendo possível manter o reconhecimento do período de 24/07/1979 até 02/07/1996, pelas razões acima expostas.
Passo à análise dos pressupostos para a concessão do benefício vindicado.
Conforme planilha anexa, somando-se a atividade rural reconhecida nesta demanda aos períodos incontroversos constantes da CTPS e do CNIS anexo, verifica-se que o autor contava com 22 anos 8 meses e 11 dias de serviço na data da propositura da ação (01/06/2010).
Portanto, o autor não faz jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, uma vez que não possui tempo de serviço suficiente.
Sendo assim, as razões recursais merecem parcial acolhimento.
Sem condenação ao pagamento de custas processuais por ser o autor beneficiário da justiça gratuita, e isento delas o INSS.
Tendo a parte autora decaído de parte do pedido, reconheço a ocorrência de sucumbência recíproca, nos termos do disposto no art. 21 do CPC/73, e tenho a verba honorária por compensada entre as partes.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS e ao reexame necessário para dar parcial provimento ao pedido formulado na inicial, tão somente para condenar o INSS ao reconhecimento e averbação do tempo de labor rural, em regime de economia familiar, no período compreendido entre 21/10/1970 e 30/05/1978, reconhecendo, por fim, a ocorrência de sucumbência recíproca, dando a verba honorária por compensada entre as partes, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença prolatada em 1º grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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