
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0015102-69.2010.4.03.6183/SP
VOTO-VISTA
EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de ação movida por EGNO ALVES FERREIRA em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a obtenção do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante averbação de labor em condições especiais, bem como a condenação da autarquia no pagamento por danos morais.
Processado o feito, na r. sentença, foi julgada parcialmente procedente a ação, acolhendo a especialidade dos intervalos de 02/08/2004 a 10/02/2010 e 18/02/2010 a 26/08/2010 e condenando o INSS à concessão de "aposentadoria por tempo de contribuição" ao autor, a partir da data do requerimento administrativo (30/09/2010), com incidência de juros de mora e correção monetária sobre as parcelas atrasadas. Condenado o ente previdenciário, ainda, no pagamento de R$ 2.500,00, a título de danos morais. Fixada a verba honorária em 15% sobre o total condenatório, não havendo condenação em custas processuais, dada a isenção legal do Instituto. Ao final, determinaram-se o reexame obrigatório da sentença e a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional.
O INSS apelou. Pugnou o recebimento do recurso não apenas no efeito devolutivo como também no efeito suspensivo; no mais, aduziu a ausência de comprovação da especialidade laboral, nos moldes da legislação de regência da matéria. Em caso de entendimento diverso, requereu a redução da verba honorária, a alteração dos critérios relativos aos juros e à correção da moeda, isenção das custas e afastamento da condenação por danos morais.
O recurso foi levado a julgamento na sessão do dia 09 de setembro de 2019.
O e. Relator, Desembargador Federal Carlos Delgado, em seu judicioso voto, não conheceu de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dou-lhe provimento, assim como à remessa necessária, para reformar a r. sentença, julgando improcedente o pedido, com inversão do ônus de sucumbência e revogação da tutela anteriormente concedida.
Pedi vista para um exame mais aprofundado dos autos.
Peço vênia para divergir no que diz respeito ao labor especial nos períodos requeridos.
Consta dos PPP's às fls. 23/24 e 64/66 que, nos períodos de 02/08/2004 a 10/02/2010 e 18/02/2010 a 26/08/2010, o autor esteve exposto aos agentes químicos hidrocarbonetos (óleo e gasolina) e ácido clorídrico, hidróxido de sódio, peróxido de hidrogênio, poeiras, gases e vapores tóxicos, névoas e neblinas, o que permite o enquadramento especial dos períodos nos itens 1.0.17, 1.0.19 e 4.0.0 do Anexo IV dos Decretos n.º 2.172/1997 e 3.048/99.
Em que pese haja menção do uso de EPI eficaz no PPP, aludida informação não é suficiente a afastar a especialidade do labor, eis que se trata de dado fornecido unilateralmente pelo empregador.
Explico.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". (destaquei).
Sendo assim, apresentando o segurado um PPP que indique sua exposição a um agente nocivo, e inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no particular, deve-se reconhecer o labor como especial.
Nesse ponto, convém observar que o fato de o PPP consignar que o EPI é eficaz não significa que ele seja capaz de neutralizar a nocividade, tal como exigido pelo E. STF para afastar a especialidade do labor.
Conforme se infere do Anexo XV, da Instrução Normativa 11/2006, do INSS, o campo 15.7 do PPP deve ser preenchido com "S - Sim; N - Não, considerando se houve ou não a atenuação, com base no informado nos itens 15.2 a 15.5, observado o disposto na NR-06 do TEM, observada a observância: [...]".
Portanto, quando o PPP consigna que o EPI era eficaz, tal eficácia diz respeito à sua aptidão de atenuar ou reduzir os efeitos do agente nocivo. Isso não significa, contudo, que o EPI era "realmente capaz de neutralizar a nocividade". A dúvida, nesse caso, beneficia o trabalhador.
Noutras palavras, o fato de o PPP consignar que o EPI era "eficaz" (para atenuar os efeitos do agente nocivo) não significa que tal equipamento era capaz de "neutralizar a nocividade". Logo, não se pode, com base nisso, afastar a especialidade do labor, até porque, nos termos do artigo 264 § 5º, do RPS, "sempre que julgar necessário, o INSS poderá solicitar documentos para confirmar ou complementar as informações contidas no PPP, de acordo com § 7º do art. 68 e inciso III do art. 225, ambos do RPS".
Nesse sentido, são os precedentes desta Corte:
Desta feita, reconheço como especiais os períodos de 02/08/2004 a 10/02/2010 e 18/02/2010 a 26/08/2010.
Assim, somando aludidos intervalos, convertidos em comum, pelo fator de conversão de 1,4 e somados aos períodos já averbado pelo INSS, observa-se que o autor, na data do requerimento administrativo, 30/09/2010, reúne apenas 31 anos, 9 meses e 10 dias, nos termos da planilha em anexo, não fazendo jus ao benefício vindicado.
No mais, acompanho o voto do Ilustre Relator.
Ante o exposto, acompanho o Ilustre Relator para não conhecer de parte da apelação do INSS, dele divergindo, apenas, para na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, assim como à remessa necessária, em menor extensão, para julgar improcedente o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, com inversão do ônus de sucumbência e revogação da tutela anteriormente concedida.
É como voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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| D.E. Publicado em 06/11/2020 |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. LABOR COM ESPECIALIDADE. DANOS MORAIS. ISENÇÃO DE CUSTAS. FALTA DE INTERESSE RECURSAL. ATIVIDADE ESPECIAL. DESCARACTERIZAÇÃO. EPI EFICAZ. TEMPO INSUFICIENTE À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. REVOGAÇÃO DE TUTELA. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA. APELO DO INSS NÃO CONHECIDO DE PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, PROVIDO EM PARTE, ASSIM COMO A REMESSA NECESSÁRIA.
1 - A pretensão do demandante resume-se ao reconhecimento dos intervalos laborativos especiais de 02/08/2004 a 10/02/2010 e 18/02/2010 a 26/08/2010, a serem computados com outros intervalos, então de natureza comum, alfim possibilitando o deferimento de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", a partir da data da postulação administrativa, em 30/09/2010 (sob NB 154.236.140-8). Outrossim, a condenação do INSS no pagamento de indenização equivalente a R$ 20.000,00, por danos morais causados.
2 - Não se conhece de parte da apelação do INSS, em que requer a isenção das custas de processo, por lhe faltar interesse recursal, haja vista que a r. sentença assim já o decidira.
3 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
4 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
5 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
6 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
7 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
8 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
9 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
10 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
11 - Processado o feito, na r. sentença, foi julgada parcialmente procedente a ação, acolhendo a especialidade dos intervalos de 02/08/2004 a 10/02/2010 e 18/02/2010 a 26/08/2010 e condenando o INSS à concessão de "aposentadoria por tempo de contribuição" ao autor, a partir da data do requerimento administrativo (30/09/2010), com incidência de juros de mora e correção monetária sobre as parcelas atrasadas. Condenado o ente previdenciário, ainda, no pagamento de R$ 2.500,00, a título de danos morais. Fixada a verba honorária em 15% sobre o total condenatório, não havendo condenação em custas processuais, dada a isenção legal do Instituto. Ao final, determinaram-se o reexame obrigatório da sentença e a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional.
12- Observam-se documentos instruindo a exordial e a íntegra do procedimento administrativo de benefício, do que importam: * cópias de CTPS, revelando o histórico laboral do autor; * Certidão de Tempo de Serviço (CTS) emitida pela Divisão Regional de Ensino da Capital - 3, subordinada à Secretaria de Estado da Educação, por sua vez sob o Governo do Estado de São Paulo, consignado no documento período funcional do autor, na condição de estatutário, correspondente a 04/11/1977 a 12/03/1990; * declaração fornecida pelo Hospital Municipal Dr. Arthur Ribeiro de Saboya, informando a vinculação do autor sob regime de contratação emergencial, no interregno de 31/10/2002 a 30/10/2003.
12 - Consta dos PPP's juntados aos autos que, nos períodos de 02/08/2004 a 10/02/2010 e 18/02/2010 a 26/08/2010, o autor esteve exposto aos agentes químicos hidrocarbonetos (óleo e gasolina) e ácido clorídrico, hidróxido de sódio, peróxido de hidrogênio, poeiras, gases e vapores tóxicos, névoas e neblinas, o que permite o enquadramento especial dos períodos nos itens 1.0.17, 1.0.19 e 4.0.0 do Anexo IV dos Decretos n.º 2.172/1997 e 3.048/99.
13 - Em que pese haja menção do uso de EPI eficaz no PPP, aludida informação não é suficiente a afastar a especialidade do labor, eis que se trata de dado fornecido unilateralmente pelo empregador. Isso porque no julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". (destaquei). Precedentes desta Corte.
14- Assim, somando aludidos intervalos, convertidos em comum, pelo fator de conversão de 1,4 e somados aos períodos já averbado pelo INSS, observa-se que o autor, na data do requerimento administrativo, 30/09/2010, reúne apenas 31 anos, 9 meses e 10 dias, nos termos da planilha em anexo, não fazendo jus ao benefício vindicado.
15 - Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) é tema cuja análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo (STJ, Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo ao andamento do feito; determina-se que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
16 - Inverte-se, pois, o ônus sucumbencial, condenando-se a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais ficam arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, suspendendo-se a exigibilidade por 5 anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.
17 - Apelação do INSS não conhecida de parte e, na parte conhecida, provida em parte, assim como a remessa necessária.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer de parte da apelação do INSS, e por maioria, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, assim como à remessa necessária, nos termos do relatório e votos que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Relatora para o acórdão
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0015102-69.2010.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por EGNO ALVES FERREIRA, objetivando o reconhecimento de atividade laborativa especial, com vistas à concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", além da condenação da autarquia no pagamento por danos morais.
A r. sentença prolatada (fls. 213/223) julgou parcialmente procedente a ação, acolhendo a especialidade dos intervalos de 02/08/2004 a 10/02/2010 e 18/02/2010 a 26/08/2010, assim condenando o INSS à concessão de "aposentadoria por tempo de contribuição" ao autor, a partir da data do requerimento administrativo (30/09/2010), com incidência de juros de mora e correção monetária sobre as parcelas atrasadas. Condenado o ente previdenciário, ainda, no pagamento de R$ 2.500,00, a título de danos morais. Fixada a verba honorária em 15% sobre o total condenatório, não havendo condenação em custas processuais, dada a isenção legal do Instituto. Ao final, determinaram-se o reexame obrigatório da sentença e a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional.
Irresignado, o INSS apelou (fls. 228/239 e 240/245), propugnando o recebimento do recurso não apenas no efeito devolutivo como também no efeito suspensivo; no mais, aduzindo a ausência de comprovação da especialidade laboral, nos moldes da legislação de regência da matéria. Em caso de entendimento diverso, requer: a) a redução do montante honorário para 5% sobre parcelas apuradas até a sentença, consoante letra da Súmula 111 do C. STJ; b) a alteração dos critérios relativos aos juros e à correção da moeda; c) a isenção das custas; e d) o afastamento da condenação por danos morais.
Processado o recurso, com o oferecimento de contrarrazões pela parte autora (fls. 348/353), foram os autos encaminhados a esta Corte Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da presente demanda dera-se em 06/12/2010 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 13/01/2011 (fl. 106) e a prolação da r. sentença aos 12/03/2013 (fl. 223), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Conforme narrada na inicial, a pretensão do demandante resume-se ao reconhecimento dos intervalos laborativos especiais de 02/08/2004 a 10/02/2010 e 18/02/2010 a 26/08/2010, a serem computados com outros intervalos, então de natureza comum, alfim possibilitando o deferimento de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", a partir da data da postulação administrativa, em 30/09/2010 (sob NB 154.236.140-8, fl. 21). Outrossim, a condenação do INSS no pagamento de indenização equivalente a R$ 20.000,00, por danos morais causados.
Da apelação do INSS
Não se conhece de parte da apelação do INSS, em que requer a isenção das custas de processo, por lhe faltar interesse recursal, haja vista que a r. sentença assim já o decidira.
Quanto ao pedido de suspensão da antecipação da tutela, consubstanciado no pleito do INSS, de recepção do recurso em ambos os efeitos - devolutivo e suspensivo - cumpre salientar que, nesta fase processual, a análise será efetuada juntamente com o mérito das questões trazidas a debate pelo recurso, conjugado com a remessa necessária determinada expressamente em sentença.
Do labor especial
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial, e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso concreto.
Compulsados, detidamente, os autos, observam-se documentos instruindo a exordial (fls. 21/101) e a íntegra do procedimento administrativo de benefício (fls. 125/200), do que importam:
* cópias de CTPS, revelando o histórico laboral do autor (fls. 35/61 e 133/159);
* Certidão de Tempo de Serviço (CTS) emitida pela Divisão Regional de Ensino da Capital - 3, subordinada à Secretaria de Estado da Educação, por sua vez sob o Governo do Estado de São Paulo, consignado no documento período funcional do autor, na condição de estatutário, correspondente a 04/11/1977 a 12/03/1990 (fl. 63);
* declaração fornecida pelo Hospital Municipal Dr. Arthur Ribeiro de Saboya, informando a vinculação do autor sob regime de contratação emergencial, no interregno de 31/10/2002 a 30/10/2003 (fl. 62).
No tocante aos períodos reclamados como sob agentes agressivos, os autos não dispõem de comprovação.
O PPP fornecido pela empresa Servmar Serviços Técnicos Ambientais Ltda. (fls. 64/66), referente ao intervalo de 02/08/2004 a 10/02/2010, indica que o trabalhador estivera exposto a calor (de fonte natural - sol), umidade (de fonte natural - chuva) e hidrocarbonetos (representados por óleo e gasolina). Contudo, cumpre destacar que não há previsão legal para o reconhecimento de especialidade por exposição a sol, chuva e calor (fonte natural), sendo que, no tocante aos agentes químicos hidrocarbonetos, infere-se o uso eficaz de EPI (com menção expressa na documentação, neste sentido).
Relativamente ao tema, cumpre realçar que o art. 58, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91 sofreu alteração por meio da Lei nº 9.732/98, publicada em 14/12/1998, exigindo-se, no bojo do laudo técnico, informação acerca da existência de tecnologia de proteção - quer coletiva, quer individual - passível de atenuar a intensidade de agentes nocivos a limites toleráveis, apartando a insalubridade da atividade desempenhada. Esta Turma julgadora já se pronunciara a respeito, em julgado anterior, cujo excerto ora se colaciona:
E o PPP fornecido pela empresa SGW Services Engenharia Ambiental Ltda. (fls. 23/24), acerca do intervalo de 18/02/2010 a 26/08/2010, indica que o trabalhador estivera exposto a calor, frio, ruído, eletricidade, produtos inflamáveis, insetos, além de agentes químicos: ácido clorídrico, hidróxido de sódio, peróxido de hidrogênio, poeiras, gases e vapores tóxicos, névoas e neblinas. Inexiste previsão legal para o reconhecimento de especialidade por contato com insetos, sendo que, no tocante aos eletricidade, calor, frio e ruído, não houve indicação das respectivas intensidades, não podendo, assim, ser genericamente considerados. No que concerne aos agentes químicos e produtos inflamáveis, confere-se o uso eficaz de EPI, também com expressa menção documental.
Em síntese: nenhum dos períodos em tela pode ser considerado representativo da especialidade laboral, merecendo, pois, reparo, a r. sentença, neste aspecto.
Da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
A aposentadoria proporcional, por sua vez, foi extinta pela Emenda Constitucional 20/98, que, de forma expressa, assegurou no art. 3º o direito aos que já haviam implementado, até a data de sua publicação, em 16/12/98, o requisito temporal, ou seja, 30 (trinta) anos de trabalho no caso do homem e 25 (vinte e cinco) no caso da mulher, independentemente de qualquer outra exigência (direito adquirido).
A citada Emenda Constitucional também manteve a aposentadoria proporcional para os que já se encontravam filiados ao RGPS na data de sua publicação e não possuíam tempo suficiente para requerê-la, porém estabeleceu na regra de transição, verbis:
Conforme planilha anexa, computando-se todos os períodos empregatícios pertencentes ao ciclo produtivo do autor (observáveis das tabelas confeccionadas pelo INSS, fls. 86/90, 93/97, 185/189 e 192/196, e da pesquisa frente ao banco de dados CNIS, fls. 69/72, 84/85, 120 e 240/245), constata-se que, na data do pedido administrativo, aos 30/09/2010, o autor cumprira 29 anos, 02 meses e 18 dias de serviço, tempo insuficiente à sua aposentação.
Obtempere-se que, com o afastamento da especialidade laboral (outrora reconhecida em sentença), descabe a concessão da benesse e, consequentemente, deve ser revogada a tutela antes adiantada.
Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) é tema cuja análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo (STJ, Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo ao andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
Inverte-se, pois, o ônus sucumbencial, condenando-se a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais ficam arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (CPC/73, art. 20, §3º), suspendendo-se a exigibilidade por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 103), a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Ante o exposto, não conheço de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dou-lhe provimento, assim como à remessa necessária, para reformar in totum a r. sentença de 1º grau de jurisdição, julgando improcedente o pedido inaugural, com inversão do ônus de sucumbência e revogação da tutela anteriormente concedida, observando-se o acima expendido quanto à devolução dos valores recebidos a esse título.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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