Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1591776 / SP
0005613-21.2001.4.03.6119
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. RETIRADA DOS AUTOS EM CARGA. PROCURADOR DO INSS.
APELO INTERPOSTO FORA DO PRAZO LEGAL. LABOR RURAL. PROVAS MATERIAL E
TESTEMUNHAL. PERÍODO ACOLHIDO, NOS MOLDES DA R. SENTENÇA. ATIVIDADE
ESPECIAL. CARACTERIZAÇÃO. BENEFÍCIO. TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO
SUFICIENTE À CONCESSÃO, TANTO PELAS REGRAS ANTERIORES QUANTO PELAS
REGRAS POSTERIORES À EC Nº 20/98. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
BENEFÍCIO CONCEDIDO ADMINISTRATIVAMENTE. AUTOR. OPÇÃO PELO MAIS
VANTAJOSO. APELO DO INSS NÃO CONHECIDO. REMESSA NECESSÁRIA
PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Descrita na exordial a pretensão da parte autora como sendo o reconhecimento de atividade
rural exercitada em regime familiar, entre janeiro/1967 e janeiro/1971, além de labor especial de
01/07/1972 a 05/07/1973, 05/12/1973 a 08/06/1976, 14/02/1977 a 18/02/1988, 15/07/1988 a
31/12/1989, 05/02/1990 a 23/05/1991 e 14/08/1991 a tempos hodiernos, com vistas à
concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", a partir da postulação
administrativa, aos 21/09/2000 (sob NB 117.559.259-2).
2 - Intimada pessoalmente a autarquia previdenciária da r. sentença, em 05/04/2010, mediante
carga dos autos ao Procurador autárquico (consoante certificado), o início do prazo recursal
corresponde àquela mesma data.
3 - Com efeito, a retirada dos autos de cartório constitui ato de inequívoca ciência da sentença,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
passando a designar o termo inicial do prazo recursal.
4 - O prazo para interposição de apelo, pela autarquia previdenciária, encerrara-se em
04/05/2010. E como o recurso fora protocolizado apenas em 05/05/2010, dele não se conhece,
visto que a interposição dera-se notadamente fora do prazo legal.
5 - Restando impossibilitada a apreciação do apelo do INSS, passa-se ao exame das questões
sub judice por força da remessa atribuída.
6 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
7 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
8 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
9 - Compõe o conjunto probatório nos autos a documentação que instrui a inicial e a cópia do
procedimento administrativo de benefício. E da coleção documental ora mencionada, os que
efetivamente guardam relação com o alegado labor rural em regime familiar são os documentos
que referem a terras rurais loteadas, localizadas na Comarca de Mallet/PR, adquiridas pelo Sr.
Basílio Turek e pela Sra. Rosa Turek (genitores do autor), aquele qualificado nos anos de 1948
e 1970 como lavrador, e ambos qualificados, no ano de 1978, como agricultores. Para além,
observa-se declaração fornecida pelo INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária, informando constar em seus registros dados da propriedade rural cadastrada em nome
do Sr. Basílio Turek (localizada em solo paranaense, sem assalariados permanentes), atinentes
a anos de 1967 até 1970.
10 - Os depoimentos testemunhais colhidos em audiência coincidem com o teor da prova
material apresentada (aqui, as falas abreviadas): o Sr. Miguel Guel declarou ter sido vizinho do
autor, desde que ele (autor) era criança ...que ele (autor) teria laborado na propriedade do pai,
com plantio de feijão, milho, arroz e mandioca, e na criação de animais ...sendo que na
propriedade não havia nem empregados nem maquinários ...o autor teria trabalhado na lavoura
até por volta dos 20 anos (ano de 1973), quando se mudara para Curitiba, e depois para São
Paulo. O Sr. Marciano Marciniuk esclareceu que fora vizinho do autor, o qual teria começado a
lidar com lavoura ainda criança ...no plantio de feijão, milho, arroz, etc. ...na propriedade do pai,
a qual teria 08 alqueires ... sendo que a maior parte da produção seria para consumo próprio,
apenas uma parte vendida para comerciantes da região ...o autor teria permanecido assim até
20 anos, passando então a exercer outras atividades.
11 - De toda a análise, vislumbra-se que a documentação juntada é suficiente à configuração do
exigido início de prova material, devidamente corroborado por idônea e segura prova
testemunhal, sendo possível, portanto, reconhecer o trabalho campesino do autor, em núcleo
familiar, de 01/01/1967 a 30/01/1971, em idênticos moldes àqueles da r. sentença prolatada.
Apenas cumpre enfatizar que o período rural que ora se reconhece não poderá ser aproveitado
para fins de cômputo da carência, nos termos do art. 55, § 2º c/c art. 25, II, da Lei nº 8.213/91.
12 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
13 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
14 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
15 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
16 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
17 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
18 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
19 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
20 - As CTPS revelam a íntegra de ciclo laborativo do autor, sendo que, aos documentos
específicos (relacionados à atividade especial), cabe a demonstração dos contornos da
especialidade. E de sua leitura minudente (destes documentos), infere-se que o autor estivera
sob circunstâncias insalubres, conforme segue: * de 01/07/1972 a 05/07/1973 (Metalúrgica
Industrial Picolino Ltda.), com exposição a agentes nocivos chumbo em processo de soldagem,
óleo de corte e graxa, possível o reconhecimento da especialidade conforme itens 1.2.4 e
1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 (formulários); * de 05/12/1973 a 08/06/1976 (Cetenco
Engenharia S.A.), com exposição a agentes nocivos, dentre outros, óleos lubrificantes, gasolina
e graxas, possível o reconhecimento da especialidade conforme item 1.2.11 do Decreto nº
53.831/64 (formulários e laudos técnicos); * de 14/02/1977 a 18/02/1988 (Holdercim Brasil S/A),
com exposição a agentes nocivos, dentre outros, óleos combustíveis, lubrificantes e graxas,
possível o reconhecimento da especialidade conforme itens 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e
1.2.10 do Decreto nº 83.080/79 (formulários e laudos técnicos); * de 15/07/1988 a 31/12/1989
(Schwing Equipamentos Industriais Ltda.), com exposição a agente nocivo ruído acima de 90
dB(A), possível o reconhecimento da especialidade conforme itens 1.1.6 do Decreto nº
53.831/64 e 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79 (formulários e laudos técnicos); * de 05/02/1990 a
23/05/1991 (Centralbeton Ltda.), com exposição a agentes nocivos, dentre outros, óleos
minerais, possível o reconhecimento da especialidade conforme itens 1.2.11 do Decreto nº
53.831/64 e 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79 (formulários e laudos técnicos); * de 14/08/1991 a
21/09/2000 (Engemix S/A), com exposição a agente nocivo ruído acima de 91 dB(A), possível o
reconhecimento da especialidade conforme itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.5 do
Decreto nº 83.080/79, 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99 (formulários
e laudos técnicos).
21 - Conforme planilhas cuidadosamente confeccionadas pelo d. Juízo a quo (computando-se
intervalos rural e especial reconhecidos nesta demanda, acrescidos do tempo entendido como
incontroverso - consubstanciado nas anotações em CTPS, contribuições previdenciárias,
tabelas elaboradas pelo INSS), verifica-se que o autor totaliza até 16/12/1998 39 anos, 03
meses e 08 dias de labor, e até 21/09/2000 41 anos, 08 meses e 27 dias (data do pedido de
aposentadoria pleiteada sob NB 117.559.259-2), tendo o autor, portanto, direito adquirido ao
benefício de "aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição", anteriormente ao
advento da EC nº 20/98, assim como à aposentadoria integral por tempo de
serviço/contribuição, pelas regras permanentes posteriores à citada Emenda.
22 - Correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob
a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de
variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
23 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por
refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
24 - Por meio das informações prestadas em petição, pelo INSS, verifica-se que foi deferida "
aposentadoria por tempo de contribuição" ao autor, em caráter administrativo, a partir de
16/01/2009 (sob NB 144.912.954-1). Sendo assim, faculta-se ao demandante a opção pela
percepção do benefício que se lhe afigurar mais vantajoso, vedado o recebimento em conjunto
de duas aposentadorias, sendo que a execução dos valores atrasados é condicionada à opção
pelo benefício concedido em Juízo.
25 - Apelo do INSS não conhecido. Remessa necessária provida parcialmente.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da apelação
do INSS, em face da intempestividade configurada, e dar parcial provimento à remessa
necessária, para estabelecer que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até
a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação
do IPCA-E, e juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o
mesmo Manual, mantendo o r. julgado de Primeiro Grau nos demais termos ordenados,
facultando-se ao demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais
vantajoso, vedado o recebimento em conjunto de duas aposentadorias, e, por maioria, decidiu
condicionar a execução dos valores atrasados à opção pelo benefício concedido em Juízo, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
LEG-FED EMC-20 ANO-1998***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-149***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-543C***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-25 INC-2 ART-55 PAR-2 PAR-3LEG-FED LEI-9528 ANO-
1997LEG-FED LEI-9711 ANO-1998 ART-28***** RPS-99 REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ART-70 ITE-2.0.1LEG-FED DEC-53831 ANO-1964 ITE-1.2.4
ITE-1.2.11 ITE-1.1.6***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-1.2.10 ITE-1.1.5LEG-FED DEC-2172 ANO-1997 ITE-
2.0.1LEG-FED EMC-20 ANO-1998LEG-FED LEI-11960 ANO-2009
Veja
STF RE 870.947/SEREPERCUSSÃO GERALTEMA 810;
STJ RESP 1.348.633/SPREPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIATEMA 638.
