
| D.E. Publicado em 12/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS para afastar a especialidade do período de 06/03/1997 a 16/12/1998, bem como dar parcial provimento à remessa necessária, ora tida por interposta, em maior extensão, para estabelecer, primeiramente, que os efeitos financeiros da presente revisão somente incidirão a partir da data da citação do INSS (19/11/08) e que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, bem como que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo-se, no mais, a r. sentença de primeiro grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017535-44.2010.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, nos autos da ação previdenciária ajuizada por ADÃO DONIZETI NUNES GOMES, objetivando a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço, mediante o reconhecimento de períodos rurícolas, bem como outros trabalhados em atividades sujeitas a condições especiais.
A r. sentença de fls. 215/218 julgou procedente a demanda, condenando o requerido à concessão, em favor do autor, da aposentadoria integral por tempo de serviço, equivalente a 100% (cem por cento) do salário de contribuição, atualizado, desde a data de início do benefício (06/09/1999). Por consequência, condenou ainda o requerido ao pagamento das diferenças, respeitada a prescrição quinquenal, desde a data de início do benefício, já mencionada, em uma só vez, acrescidas de juros moratórios, desde a citação, e de correção monetária, desde a respectiva data em que deveriam ter sido pagas. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor total das diferenças. Custas ex lege.
Em razões de apelação, irresignada, a Autarquia Previdenciária, em às fls. 220/233, requer, preliminarmente, seja dado o duplo efeito ao recurso, e, no mérito, pugna pela decretação de improcedência da ação, vez que não comprovou o autor, nos autos, os requisitos para a concessão da especialidade, referente ao período de 06/03/1997 a 16/12/1998, até porque não teria sido colacionado aos autos laudo contemporâneo ao período laborativo, bem como o uso de EPI, in casu, afastaria a insalubridade pretendida. Demais disso, não houve qualquer início de prova quanto ao labor campesino afirmado na vestibular. Subsidiariamente, caso mantido o r. decisum a quo, pede para que não seja admitida conversão de especial para comum o período laborado após 28/05/98, bem como que os honorários advocatícios sucumbenciais sejam reduzidos para o percentual de 5% (cinco por cento). Requer, por derradeiro, o prequestionamento da matéria.
Contrarrazões do autor ofertadas (fls. 236/243).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 04/12/2009, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS a revisar a renda mensal inicial do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço do autor, "pagando as diferenças correspondentes", acrescidas de correção monetária e juros de mora.
Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Ainda preliminarmente, insta salientar que, nesta fase procedimental de julgamento colegiado de apelação, não cabe a análise do pedido de revogação ou suspensão da antecipação da tutela, restando o mesmo prejudicado, ante a apreciação de mérito do presente recurso.
Pretende, pois, no mérito principal do referido recurso, o INSS, o afastamento do reconhecimento do labor rural desempenhado entre 01/01/70 e 21/04/77 pelo autor, bem como da especialidade relativa ao interregno compreendido entre 06/03/97 e 16/12/98, em função do agente insalubre "ruído". Por consequência, não faria, pois, o interessado, jus à revisão de seu benefício previdenciário.
Cumpre ressaltar, primeiramente, que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Nesta senda, portanto, registro que constitui início razoável de prova material da atividade campesina exercida pelo requerente: a-) Certidão, emitida pelo MM. Juízo da 52ª Zona Eleitoral da Comarca de Itapetininga/SP, em que atesta que, aos 08/12/77, o autor declarou sua profissão como a de "lavrador" (fl. 33); b-) Certidão, emitida pelo Ministério do Exército, na qual se atesta que, aos 25/02/75, o autor ali também se declarara "lavrador" (fl. 34).
Assim sendo, a documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal colhida em audiência realizada sob o crivo do Contraditório e da Ampla Defesa.
Luiz Anunciato Leite, inquirido à fl. 212, afirmou que "...conhece o autor desde o ano de 1968, aproximadamente. Que ambos moravam no bairro da Chapada Grande, neste município. Que o autor começou a trabalhar ainda criança, com cerca de dez ou onze anos. Que o autor trabalhava com a família em atividade rural, citando lavouras de feijão e milho, entre outras. Que a família não tinha empregados. Que o autor trabalhou em atividade rural até 1977, quando passou a trabalhar na então Alplan."
Por fim, Benedito Ribeiro Pinto asseverou, à fl. 213, que "conhece o autor desde o ano de 1973, aproximadamente. Que ambos moravam no bairro da Chapada Grande, neste município. Que nesta época o autor trabalhava com a família em atividade rural, citando lavouras de feijão, milho e batata, entre outras. Que a família não tinha empregados. Que o autor trabalhou em atividade rural até 1977, quando passou a trabalhar na então Alplan..."
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Possível, portanto, o reconhecimento do labor campesino, nos exatos termos do r. decisum a quo, por seus próprios fundamentos.
Como se vê, a prova oral reforça o labor campesino tal como delimitado na r. sentença de origem. Sendo assim, mantenho o r. decisum a quo, quanto a este tópico, pelos seus próprios fundamentos, reconhecendo o labor campesino do autor entre 01/01/1970 e 21/04/1977.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Entretanto, quanto ao período de 06/03/97 a 16/12/98, laborado pelo autor junto à empresa "Duratex Madeira Industrializada S/A", tanto o formulário DSS-8030 (fl. 24), quanto o laudo técnico pericial (fls. 25/27) revelam que, ao desempenhar a função de "operador de mesa de comando", o autor esteve exposto a ruído, na intensidade de 87 dB, de modo habitual e permanente. Tal limite, entretanto, é inferior ao tolerado à época da respectiva prestação laboral, de modo que a especialidade, in casu, deve ser afastada. Sentença reformada quanto a tal ponto.
Conforme planilha anexa, procedendo ao cômputo do labor rural reconhecido nesta demanda, acrescido dos períodos incontroversos, verifica-se que, até a data da EC 20/98, anterior ao requerimento administrativo de aposentadoria (16/12/98), o autor já contava com 36 anos, 10 meses e 28 dias de serviço, o que lhe assegura o direito ao benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, sendo devida, portanto, a revisão pleiteada.
O termo inicial deve ser mantido na DIB (06/09/1999), uma vez que se trata de revisão do coeficiente de cálculo e da renda mensal inicial, em razão do reconhecimento de período laborado em atividade rural. No entanto, os efeitos financeiros, em especial quanto aos valores em atraso, somente incidirão a partir da data da citação da ré (19/11/2008), ante a ausência de prévio requerimento administrativo de revisão de aposentadoria.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, ante a sucumbência mínima da parte autora, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser reduzida para 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para afastar a especialidade do período de 06/03/1997 a 16/12/1998, bem como dou parcial provimento à remessa necessária, ora tida por interposta, em maior extensão, para estabelecer, primeiramente, que os efeitos financeiros da presente revisão somente incidirão a partir da data da citação do INSS (19/11/08) e que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, bem como que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo-se, no mais, a r. sentença de primeiro grau.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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