
| D.E. Publicado em 04/04/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, acolher a arguição preliminar, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de sentença condicional e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgar parcialmente procedente a ação, para reconhecer o labor especial nos períodos de 01/10/1992 a 28/04/1995 e 19/11/2003 a 31/10/2011, bem como para condenar a autarquia no pagamento e implantação da "aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição", com data de início do benefício a partir da postulação administrativa (31/10/2011), sendo que os valores em atraso serão corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, bem como na verba honorária fixada em 10% sobre as parcelas vencidas, contadas até a data de prolação da sentença, isentando-a, por, fim das custas processuais, restando prejudicada a análise do mérito da apelação do INSS, assim como a remessa necessária, a apelação do autor e o recurso adesivo, também do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0028003-62.2013.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária, apelações interpostas - pelo autor MAURÍLIO BERTASSOLI e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - e recurso adesivo, também do autor, em ação previdenciária objetivando o reconhecimento de períodos laborativos especiais, com ulterior concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição".
A r. sentença prolatada (fls. 78/83) julgou parcialmente procedente a ação, condenando o INSS a considerar o intervalo de 01/10/1991 a 28/04/1995 como tempo especial, convertendo-o para tempo comum, bem como proceder à nova contagem do tempo laboral do autor e, se presentes todos os requisitos, incluindo o tempo, conceder-lhe a aposentadoria pleiteada, retroativamente à data do requerimento administrativo, com incidência de juros de mora e correção monetária sobre os atrasados verificados. Condenou a autarquia, ainda, no pagamento de honorários advocatícios equivalentes a 10% sobre o valor das diferenças apuradas (em caso de concessão da aposentadoria) ou, noutra hipótese, de R$ 600,00 (em caso de não concessão). Por fim, a sentença foi submetida ao reexame obrigatório.
Insatisfeito com o resultado do julgamento, o autor protocolizou recurso de apelação (fls. 86/89), insistindo no reconhecimento da especialidade também quanto ao período de 04/01/1999 a 31/10/2011 e, por consequência, a concessão da aposentadoria pretendida, com o adiantamento da tutela jurisdicional.
Irresignado também, apelou o INSS (fls. 92/99), pugnando, preliminarmente, pelo reexame necessário de toda a matéria desfavorável, e pela decretação de nulidade da r. sentença, eis que, tendo sido julgada sob modelo condicional, violara o art. 460, parágrafo único, do CPC/73. Em mérito, aduziu a inviabilidade de conversão do período, à falta de apresentação de laudo técnico para fins de mostra da exposição a níveis de ruído acima dos limites legais. Doutra via, requer a observância dos critérios insculpidos na Lei nº 11.960/09, no tocante à correção monetária e aos juros de mora.
Na sequência, exsurge nos autos recurso de apelação adesivo protocolizado em nome da parte autora (fls. 103/104), defendendo a anulação da r. sentença, com a devolução do feito à Vara originária, para produção de prova oral (oitiva de testemunhas).
Devidamente processados os recursos, com o oferecimento de contrarrazões pela parte autora (fls. 105/108), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da demanda dera-se em 23/01/2012 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 19/03/2012 (fl. 61vº) e a prolação da r. sentença aos 28/09/2012 (fl. 83), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Na peça vestibular, aduz o autor ter desenvolvido parte de seu ciclo laborativo em atividades profissionais nas quais estivera submetido a agentes nocivos, nestes interregnos: de 01/10/1991 a 30/11/1998 e de 04/01/1999 até tempos hodiernos; pretende seja reconhecida a correspondente especialidade, com sua contagem aderida aos intervalos integrantes de seu histórico laboral, tudo em prol da concessão de "aposentadoria por tempo de serviço/contribuição", a partir do requerimento administrativo formulado aos 31/10/2011 (sob NB 155.788.841-5, fl. 06).
Da nulidade da r. sentença.
Inicialmente, saliente-se que, fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante art. 492 do CPC/2015.
Em sua decisão, a d. Juíza a quo condicionou a concessão do benefício vindicado à presença dos requisitos (ensejadores a tanto), a ser averiguada, pois, pelo INSS.
Desta forma, está-se diante de sentença condicional, eis que, deveras, não foi analisado o pedido formulado na inicial, restando violado o princípio da congruência, insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil em vigor:
Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável.
Resta, pois, acolhida, a arguição preliminar tratada no apelo do INSS.
Doravante, ao cerne da demanda.
Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Do labor especial.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial, e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
No caso sub judice.
Dentre os documentos reunidos nos autos, são observáveis cópias de CTPS do autor (fls. 14/34) e documentação remanescente, específica. E da leitura acurada de todos estes elementos processuais, infere-se a prática laborativa do autor com contornos de atividade especial, como segue:
* de 01/10/1992 a 28/04/1995, ora como ½ oficial soldador, ora como prático - oficial soldador, ora como oficial soldador, ora como oficial "B" soldador, junto à empresa Móveis de Aço Flórida Ltda.: por meio de CTPS (fls. 23, 24 e 27), permitido o enquadramento profissional nos moldes definidos pelos itens 2.5.3 do Decreto nº 53.831/64, e 2.5.1 do Decreto nº 83.080/79. Insta destacar que, no tocante ao lapso de 01/10/1991 a 30/09/1992, o ofício do autor, como ajudante de montagem de móveis (fl. 21), não se encontra inserido nos róis relativos às atividades listadas como insalubres, sendo que, por sua vez, com relação ao interstício de 29/04/1995 a 30/11/1998, somente se permitiria o acolhimento da especialidade laborativa se efetivamente comprovada a exposição a agentes agressivos, nos termos da Legislação de regência da matéria; e
* de 19/11/2003 a 31/10/2011, como soldador A, junto à empresa Isma Indústria Silveira de Móveis de Aço Ltda.: por meio do PPP (fl. 35), a evidenciar a exposição a ruído de 86 dB(A), nos moldes definidos pelos itens 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79; 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97; e 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99. Esclareça-se, quanto ao período anterior - entre 04/01/1999 e 18/11/2003 - para que se pudesse caracterizar a especialidade laboral, o nível de pressão sonora estabelecido deveria ultrapassar 90 dB(A), conforme ditames legais, o que, de fato, não ocorreu.
Eis que reconhecida a excepcionalidade dos intervalos retro descritos, servem, pois, à totalização do tempo de serviço do autor, com a devida conversão, de tempo especial para tempo comum.
Da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
A aposentadoria proporcional, por sua vez, foi extinta pela Emenda Constitucional 20/98, que, de forma expressa, assegurou no art. 3º o direito aos que já haviam implementado, até a data de sua publicação, em 16/12/98, o requisito temporal, ou seja, 30 (trinta) anos de trabalho no caso do homem e 25 (vinte e cinco) no caso da mulher, independentemente de qualquer outra exigência (direito adquirido).
A citada Emenda Constitucional também manteve a aposentadoria proporcional para os que já se encontravam filiados ao RGPS na data de sua publicação e não possuíam tempo suficiente para requerê-la, porém estabeleceu na regra de transição, verbis:
Conforme planilha anexa, procedendo-se ao cômputo dos intervalos especiais reconhecidos nesta demanda, acrescidos do tempo entendido como incontroverso (tabelas confeccionadas para apuração administrativa de tempo de serviço - fls. 47/48, e resultado de pesquisa ao banco de dados CNIS - fls. 39/43 e 68/69), verifica-se que o autor contava com 36 anos, 08 meses e 13 dias de serviço na data da postulação administrativa, em 31/10/2011, o que lhe assegura, deveras, o direito à aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição, não havendo que se falar em aplicação do requisito etário, nos termos do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal.
O requisito carência restou também comprovado, mediante elementos extraídos das CTPS, cotejados com a base de dados CNIS.
O marco inicial do benefício fica estabelecido na data da postulação administrativa, em 31/10/2011 (fl. 06), considerado o momento da resistência inicial do INSS à pretensão do segurado.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da elaboração da conta, aplicando-se o IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), com efeitos prospectivos.
Ressalto que os embargos de declaração opostos contra referido acórdão tem por escopo a modulação dos seus efeitos - atribuição de eficácia prospectiva -, sendo que a concessão de efeito suspensivo não impede o julgamento do presente recurso, haja vista que o quanto lá decidido deverá ser observado apenas no momento da liquidação deste julgado.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Isento a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais, em se tratando de autos que tramitam sob os auspícios da assistência judiciária gratuita (fl. 58).
Ante o exposto, acolho a arguição preliminar, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de sentença condicional e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedente a ação, para reconhecer o labor especial nos períodos de 01/10/1992 a 28/04/1995 e 19/11/2003 a 31/10/2011, bem como para condenar a autarquia no pagamento e implantação da "aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição", com data de início do benefício a partir da postulação administrativa (31/10/2011), sendo que os valores em atraso serão corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, bem como na verba honorária fixada em 10% sobre as parcelas vencidas, contadas até a data de prolação da sentença, isentando-a, por, fim das custas processuais, restando prejudicada a análise do mérito da apelação do INSS, assim como a remessa necessária, a apelação do autor e o recurso adesivo, também do autor.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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