
| D.E. Publicado em 17/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, para restringir a r. sentença de 1º grau, ultra petita, aos termos do pedido, reconhecendo, entretanto, o labor rural tão somente no período de 19/09/1964 a 31/12/1984, exceto para fins de carência, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 07/11/2017 16:29:41 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0037595-04.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação ajuizada por MARIA APARECIDA VERGA RUIZ, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de fls. 70/74 julgou parcialmente procedente o pedido. Reconheceu como tempo de atividade rural os períodos de 01/02/1957 a 16/07/1985 e de 12/04/1987 ao ano de 2005. Dada a sucumbência recíproca, as custas processuais e a verba honorária foram proporcionalmente distribuídas e compensadas entre as partes, observada a gratuidade processual da autora (CPC/73, art. 21, caput).
Em razões recursais de fls. 80/86, o INSS requer, preliminarmente, que a r. sentença se adeque aos limites do pedido, eis que houve julgamento ultra petita. No mérito, pugna pela reforma da r. sentença ao fundamento de que, no seu entender, não restou comprovado o labor rural. Por fim, prequestiona a matéria.
Devidamente processado o recurso, com contrarrazões da parte autora, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Ressalto, de início, que, fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015.
Todavia, verifico que o magistrado a quo não se ateve aos termos do pedido ao reconhecer o labor rural nos períodos de 01/02/1957 a 16/07/1985 e de 12/04/1987 ao ano de 2005 - quando o pedido da autora restringe-se aos períodos de 1957 a 1984 e de 1988 a 2005 -, enfrentando questão que não integrou a pretensão efetivamente manifesta.
Logo, a sentença, neste aspecto, é ultra petita, eis que considerou como labor rural lapso temporal não pleiteado na inicial, extrapolando os limites do pedido; restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
Conveniente esclarecer que a violação ao princípio da congruência traz, no seu bojo, agressão ao princípio da imparcialidade, porquanto concede algo não pedido, e do contraditório, na medida em que impede a parte contrária de exercer integralmente seu direito de defesa.
Dessa forma, é de ser reduzida a sentença aos limites do pedido inicial, excluindo-se o reconhecimento do labor rural nos interregnos não indicados pela autora.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
No entanto, não há necessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Impende registrar que é pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
As provas apresentadas para a comprovação do exercício de labor rural foram as seguintes:
a) Certidão de casamento, realizado em 19/09/1964, em que seu marido, Armando Ruiz, é qualificado como "lavrador" (fl. 16);
b) Certidão de nascimento da autora, nascida em 01/02/1945, em que seu pai, José Verga, é qualificado como "lavrador" (fl. 17);
c) Título eleitoral, de 04/08/1966, em que aparece "lavrador" como sendo a profissão de seu marido (fl. 32);
d) Certidão de casamento de seus pais, realizado em 20/05/1933, em que seu genitor é qualificado como "lavrador" (fl. 33);
e) Certidão de nascimento de seus filhos, Nelson Antônio Ruiz, nascido em 02/06/1965 (fl. 34), e Adriano José Ruiz, nascido em 07/11/1969 (fl. 36), em que seu marido é qualificado como "lavrador"; e
f) Imposto de renda de seu marido, de 1972-1973, 1973-1974, 1974-1975, 1975-1976, 1976-1977, em que consta "Sítio Santa Maria" como domicílio da família (fls. 38/53).
Ressalte-se que viável a extensão da condição de rurícola de seu genitor e de seu marido, mormente porque se deseja a comprovação em juízo de atividade rurícola em regime de economia familiar.
Além da documentação trazida como início de prova material hábil para comprovar o exercício de labor rural, em 06/04/2011, foram ouvidas três testemunhas, Josefa Vieira Dantas (fl. 75), Tereza Alves Ferreira (fl. 76) e Oswaldo Carlos Antônio (fl. 77).
Josefa "conhece a autora há 45 anos da Fazenda Santa Maria, localizada em Braúna. O sítio da depoente era vizinho da propriedade Santa Maria onde a autora residia. A autora trabalhava tocando café com seu marido no sítio Santa Maria. O referido sítio pertencia ao sogro da autora. A autora trabalhou por bastante tempo na propriedade de seu sogro. A autora plantava café, carpia e realizava serviços de roça. A autora mudou-se posteriormente para Campinas e depois retornou para Braúna. A autora começou a trabalhar na roça quando casou-se, com vinte e poucos anos de idade. (...) Após retornar de Campinas, a autora passou a fazer faxina em algumas casas. A autora também trabalhava na roça quando retornou de Campinas. O sogro da autora vendeu o sítio há bastante tempo".
Tereza "conhece a autora há 40 anos do bairro Baguaçu, onde a autora morava com seu marido, no sítio de seu sogro. A autora trabalhava na lavoura no referido bairro rural, na roça de café e roça em geral, juntamente com seu marido. A autora trabalhou na propriedade de seu sogro desde o seu casamento até 1985. Posteriormente, a autora mudou-se para a cidade de Campinas, retornando para o sítio em 1987. Ao retornar, a autora passou a residir no sítio de seu sogro, onde continuou trabalhando na lavoura. A autora trabalhou na propriedade rural em questão até 2005, ocasião em que a mesma foi vendida. O marido da autora continua morando em Campinas. Não sabe que atividade o mesmo exerce em Campinas. Quando era solteira a autora trabalhava com seus familiares no sítio Santa Maria, no bairro Guaporanga. A autora trabalhava na lavoura de café com seus pais. A autora comentou com a depoente que trabalhou com seus pais no sítio Guaporanga até se casar. (...) A autora trabalhou na cidade somente quando residiu em Campinas, de 1985 a 1987".
Oswaldo "conhece a autora há mais de 30 anos do bairro Baguaçu, onde a autora morava com seu sogro. A autora trabalhava na lavoura no referido bairro rural, na roça de café, milho, feijão, etc, juntamente com seu marido. A autora trabalhou na propriedade de seu sogro desde o seu casamento até 1985. Posteriormente, a autora mudou-se para a cidade de Campinas, retornando para o sítio em 1987. Ao retornar, a autora passou a residir no sítio de seu sogro, onde continuou trabalhando na lavoura. A autora trabalhou na propriedade rural em questão até 2005, ocasião em que a mesma foi vendida. O marido da autora continua morando em Campinas. Não sabe que atividade o mesmo exerce em Campinas. Quando era solteira, a autora trabalhava com seus familiares no sítio Santa Maria, no bairro Guaporanga. A autora trabalhava na lavoura de café com seus pais e a propriedade tinha cerca de 4 alqueires. A família da autora não possuía empregados. A autora trabalhou com seus pais desde criança até seu casamento. (...) O depoente era vizinho do sítio Santa Maria e atualmente é vizinho do sítio que era do sogro da autora. O depoente via a autora trabalhando na roça. A autora não trabalhou na cidade, a não ser quando morou em Campinas".
Assim, a prova oral reforça o labor no campo e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos; tornando possível o reconhecimento do labor rural no período de 19/09/1964 (data do casamento) a 31/12/1984 (pedido inicial), exceto para fins de carência, eis que apesar das testemunhas Tereza e Oswaldo terem mencionado o labor da autora com os pais, só a conheceram quando ela já estava casada e trabalhando no sítio do sogro.
Em relação ao período de 1988 a 2005, impossível seu reconhecimento, eis que além de não haver provas materiais referentes ao período, as testemunhas afirmaram que "após retornar de Campinas, a autora passou a fazer faxina em algumas casas" e que "o marido da autora continua morando em Campinas".
Diante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, para restringir a r. sentença de 1º grau, ultra petita, aos termos do pedido, reconhecendo, entretanto, o labor rural tão somente no período de 19/09/1964 a 31/12/1984, exceto para fins de carência.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 07/11/2017 16:29:38 |
