
| D.E. Publicado em 24/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da autora para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição, reconhecer o labor rural no período de 26/10/1965 a 01/01/1974 e condenar a autarquia a conceder a aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, a partir data do requerimento administrativo (06/10/2010), acrescidas as parcelas em atraso de correção monetária calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o mesmo Manual; além do pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o sobre o valor das parcelas devidas até a sentença; concedendo a tutela antecipada, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007405-24.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, ESTER PONTES DE OLIVEIRA, em ação previdenciária ajuizada objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de fls. 107/109, proferida pela Vara Única da Comarca de Duartina, julgou improcedente o pedido inicial com fundamento no artigo 269, I, do Código de Processo Civil, condenando a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$800,00, ressalvados os benefícios da gratuidade.
Em razões de apelação de fls. 116/124, a autora pugna pela reforma da sentença alegando que a magistrada "a quo" não considerou as provas materiais trazidas aos autos, corroboradas pelos depoimentos das testemunhas, que sua pretensão está amparada na lei 8.213/1991 e na CF, requerendo o reconhecimento do período de labor rural, de 02/01/1962 a 18/06/2004, para contagem do benefício/aposentadoria por tempo de contribuição, com antecipação da antecipação da tutela para implantação do benefício a partir de 06/10/2010.
O INSS apresentou contrarrazões às fls. 127/128.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o cômputo de labor rural.
Passo ao exame do labor rural.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Do caso concreto.
Pretende a parte autora o reconhecimento e cômputo do labor rural exercido de 02/01/1962 a 01/01/1974 e de 18/06/2004 a 21/09/2010, bem como a soma ao tempo de contribuição comprovado por meio de registros em CTPS, e a consequente concessão de aposentadoria integral por tempo de contribuição e alternativamente, a aposentadoria proporcional.
As provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo da parte autora, são:
- Certidão de casamento, datada de 28/07/1971, na qual consta como profissão do seu marido, Benedito Antônio de Oliveira, a de lavrador (fls. 18);
É remansosa a jurisprudência no sentido de ser extensível à mulher a condição de rurícola nos casos em que os documentos apresentados, para fins de comprovação de atividade campesina exercida em regime de economia familiar, indiquem familiar próximo como trabalhador rural.
Assim, os documentos apresentados são suficientes à configuração do exigido início de prova material.
Foi produzida prova testemunhal para comprovar a atividade campesina, conforme gravação dos depoimentos contida em CD-ROM, acostado às fls. 114.
A testemunha da autora, Ana Aparecida Morcine, afirmou conhecer a autora "desde menina"; que desde os 13 anos de idade a autora trabalhou na fazenda do Sr. Manuel, depois casou e continuou trabalhando naquela fazenda; que a autora sempre trabalhou na lavoura de café, laranja, "toda vida", que se lembra bem da fazenda do Sr. Manuel, em que a autora trabalhou quando era solteira, que se lembra de vários lugares em que a autora trabalhou posteriormente, mas não se recorda do nome das fazendas; que por volta de 2000 e (não se lembra exatamente, há uns 4 anos), a autora teve que parar de trabalhar para cuidar da mãe, que caiu e se machucou. Que o bairro de "Moeiro" é um conglomerado de vários sítios e que a autora trabalhou muito tempo no sítio Cachoeira.
A depoente, Ignésia Pierim de Carvalho, relatou que conhece a autora desde 1976, quando chegou em Cabrália, e que a autora já estava trabalhando no "Pinho" e que depois daquele tempo trabalharam na Granja juntas; que sabe que antes de 1976 a autora trabalhou no sítio, em Limoeiro, na lavoura de café, mesmo antes de se conhecerem, pois seu marido já a conhecia e havia trabalhado junto com a família da autora; que desde 2004 a autora trabalhou na lavoura de laranja, mas que como a mãe dela quebrou o fêmur, teve que parar de trabalhar, isso há dois ou três anos aproximadamente.
Por fim, a testemunha da autora, Odenil Ortiz de Camargo, afirmou que conhece a autora desde 1976, mas que sabe que antes de 1976 a autora trabalhava na fazenda, na lavoura de café, junto com seus pais; que era vizinho dela e que a autora trabalhou na laranja, na granja; que a autora teve que parar de trabalhar porque sua mãe ficou doente, em 2004. Ao ser inquerido pelo patrono, assentiu que a autora trabalhou no sítio Cachoeira, no Limoeiro, isso antes de 1974.
Cumpre esclarecer que não é possível reconhecer atividade rural exercida posteriormente ao advento da Lei de Benefícios sem o respectivo recolhimento das contribuições previdenciárias.
Com efeito, a dispensa de tais recolhimentos, conforme disposto no § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/91, aplica-se ao tempo de labor rural exercido antes da vigência do mencionado diploma legal. A partir de 24/07/1991, portanto, a mera demonstração de que o autor atuava nas lides campesinas, sem a prova de que houve a respectiva contribuição ao sistema da Previdência Pública, não autoriza seu cômputo como tempo de serviço, para fins de concessão da aposentadoria.
A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino no período de 26/10/1965 a 01/01/1974, período anterior à data de vigência da Lei nº 8.213/1991.
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reconheço o labor rural desempenhado no período de 26/10/1965 a 01/01/1974.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto à aposentadoria proporcional, seus requisitos etário e contributivo estão estabelecidos na EC nº 20/98, em seu art. 9º:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
"Do mesmo modo, os trabalhadores que tenham cumprido todos os requisitos legais para a obtenção de sua aposentadoria ou de qualquer outro benefício, terão também os seus direitos respeitados, podendo valer-se da legislação vigente.
Além disso, serão reconhecidas as expectativas de direito dos atuais segurados da Previdência Social segundo regras baseadas no critério de proporcionalidade, considerando-se a parcela do período aquisitivo já cumprida".
Conforme planilha anexa, somando-se o labor rural reconhecido nesta demanda (de 26/10/1965 a 01/01/1974) ao período incontroverso constante da CTPS (fls. 19/23) e do CNIS, que passa a integrar a presente decisão, verifica-se que a autora contava com 27 anos e 9 meses de contribuição na data do requerimento administrativo (06/10/2010), o que lhe assegura o direito à aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, haja visa o cumprimento do pedágio e o implemento do requisito etário.
O requisito carência restou também completado, conforme se depreende dos registros em CTPS e extrato CNIS.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (06/10/2010 - fl. 43), ocasião em que a entidade autárquica tomou conhecimento da pretensão.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Por derradeiro, a hipótese da ação comporta a outorga de tutela específica nos moldes do art. 497 do Código de Processo Civil. Dessa forma, em atenção a expresso requerimento da parte autora, visando assegurar o resultado concreto buscado na demanda e a eficiência da prestação jurisdicional, independentemente do trânsito em julgado, determino seja enviado e-mail ao INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, instruído com os documentos da parte autora, a fim de serem adotadas as providências cabíveis ao cumprimento desta decisão, para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço no prazo máximo de 20 (vinte) dias.
Isento a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais, registrando ser a parte autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição, reconhecer o labor rural no período de 26/10/1965 a 01/01/1974 e condenar a autarquia a conceder a aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, a partir data do requerimento administrativo (06/10/2010), acrescidas as parcelas em atraso de correção monetária calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o mesmo Manual; além do pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o sobre o valor das parcelas devidas até a sentença; concedendo a tutela antecipada. Comunique-se o INSS.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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