
| D.E. Publicado em 17/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, mantendo íntegra, com acréscimo de fundamentos, a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001025-12.2003.4.03.6115/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, ou, ainda, benefício assistencial de prestação continuada (LOAS).
A r. sentença, de fls. 176/179, julgou improcedente o pedido deduzido na inicial, ante a ausência de incapacidade laboral/impedimento de longo prazo, bem como a não comprovação da hipossuficiência econômica. Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Em razões recursais de fls. 182/210, a requerente pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que preenche as condições para concessão dos benefícios ora vindicados.
Contrarrazões do INSS às fls. 213/216.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
De início, analiso a pretensão quanto aos benefícios por incapacidade.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo, com base em exame pericial de fls. 100/104, diagnosticou a parte autora como portadora de "hipertensão arterial Sistêmica (CID10 - I.10)", "diabetes mellitus tipo II (CID10 - E10.9)", "hipercolesterolemia (CID10 - E.78)" e "lombalgia".
Assevera que a autora apresenta Hipertensão Arterial de "difícil controle medicamentoso". Relata, também, que "conforme orientação médica faz uso de vários medicamentos sem melhora dos sintomas".
Concluiu, por conseguinte, que a demandante "encontra-se inapta a exercer atividade remunerada para a sua subsistência".
Não fixou a data de início da incapacidade (DII).
A despeito dessa indeterminação, tenho que, conforme as máximas da experiência subministradas pelo que ordinariamente acontece (arts. 335 do CPC/1973 e 375 do CPC/2015), em cotejo com a análise apurado dos autos, que a incapacidade surgiu quando a autora já não era mais segurada da Previdência Social.
Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, as quais seguem anexas aos autos, dão conta que a parte autora teve encerrado seu último vínculo empregatício, junto à IBATE S/A, em 06/08/1998. Portanto, permaneceu como filiado ao RGPS, computando-se o total de 12 (doze) meses de manutenção de segurado, até 15/10/1999 (art. 30 da Lei 8.212/91 c/c art. 14 do Decreto 3.048/99).
Os documentos médicos acostados aos autos pela parte autora, que indicam grave cardiopatia, são datadas de período no qual esta já não era mais filiada ao RGPS.
Com efeito, relatório emitido pelo Departamento de Hemodinâmica da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Araraquara/SP, de 10/07/1997, atestou que não havia lesão obstrutiva importante no coração da requerente (fl. 57).
Os exames de fls. 58/66 não indicam alterações importantes no estado de saúde da autora, a não serem índices pouco acima do normal de glicemia.
À fl. 67, consta nível de colesterol considerado de alto risco, porém, o exame é datado de 28/03/2001, quando de há muito, a requerente não era mais segurada da Previdência Social.
Por sua vez, declaração médica de fl. 69, a qual assevera estar a demandante "impossibilitada de exercer suas atividades profissionais", é datada de 11/12/2002.
Cabia a parte autora demonstrar que já estava incapacitada para o trabalho, quando ainda era filiada no RGPS, seja por meio da juntada de outros documentos, seja por meio de impugnação do laudo pericial, conforme determina o art. 333, I, do CPC/1973 (reproduzido pelo art. 373, I, do CPC/2015).
Como bem destacado pelo MM. Juiz a quo, "apesar das alegações da autora de que a doença surgiu quando ainda detinha a condição de segurada, tal fato não restou comprovado já que a declaração médica de fls. 69 é datada de 11/12/2002, quando já havia perdido a condição de segurada. Infere-se, daí, que a autora não deixou de trabalhar por estar incapacitada para o trabalho. Assim, a autora não produziu qualquer outra prova de que tenha deixado de filiar-se à Previdência Social, após o término de seu último vínculo empregatício, em razão da doença".
Cumpre lembrar que ainda que a autora comprovasse a situação de desemprego, nos termos do disposto do §2º do artigo 15, da Lei 8.213/91, permanecendo como segurada por mais 12 (doze) meses, até 15/10/2000, portanto, a incapacidade teria surgido mais de 2 (dois) anos depois.
Em suma, não tendo demonstrado a qualidade de segurada quando da DII, como exigem os já citados artigos 42 e 59 da Lei 8.213/91, de rigor o indeferimento dos pedidos de auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez.
Passo a análise da pretensão relativa ao benefício assistencial de prestação continuada (LOAS).
O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a concessão do referido benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
Nessa senda, reconhecida a incapacidade absoluta e permanente para o labor, inequívoca a presença, por conseguinte, do impedimento de longo prazo, característica que qualifica a Pessoa com deficiência, para os fins do disposto no artigo 20, §§2º e 10º, da Lei 8.742/93.
No que se refere à Hipossuficiência econômica, a Medida Provisória nº 1.473-34, de 11.08.97, transformada na Lei nº 9.720, em 30.11.98, alterou o conceito de família para considerar o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo teto. Com a superveniência da Lei nº 12.435/11, definiu-se, expressamente para os fins do art. 20, caput, da Lei Assistencial, ser a família composta pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, §1º).
Já no que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
O v. acórdão, cuja ementa ora transcrevo, transitou em julgado em 19.09.2013:
Entretanto, interpretando tal decisão, chega-se à conclusão de que a Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova.
Tal entendimento descortina a possibilidade do exame do requisito atinente à hipossuficiência econômica pelos já referidos "outros meios de prova".
A questão, inclusive, levou o Colendo Superior Tribunal de Justiça a sacramentar a discussão por meio da apreciação da matéria em âmbito de recurso representativo de controvérsia repetitiva assim ementado:
No que pertine à exclusão, da renda do núcleo familiar, do valor do benefício assistencial percebido pelo idoso, conforme disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, referido tema revelou-se polêmico, por levantar a discussão acerca do discrímen em se considerar somente o benefício assistencial para a exclusão referida, e não o benefício previdenciário de qualquer natureza, desde que de igual importe; sustentava-se, então, que a ratio legis do artigo em questão dizia respeito à irrelevância do valor para o cálculo referenciado e, bem por isso, não havia justificativa plausível para a discriminação.
Estabelecido o dissenso inclusive perante o Superior Tribunal de Justiça, o mesmo se resolveu no sentido, enfim, de se excluir do cálculo da renda familiar todo e qualquer benefício de valor mínimo recebido por pessoa maior de 65 anos, em expressa aplicação analógica do contido no art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.
Refiro-me, inicialmente, à Petição nº 7203/PE (Incidente de Uniformização de Jurisprudência), apreciada pela 3ª Seção do STJ em 10 de agosto de 2011 (Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura) e, mais recentemente, ao Recurso Especial nº 1.355.052/SP, processado segundo o rito do art. 543-C do CPC/73 e que porta a seguinte ementa:
Pois bem, o estudo social realizado em 06 de maio de 2009 (fls. 163/165) informou ser o núcleo familiar composto por 4 (quatro) pessoas: a autora, seu cônjuge, um filho e um neto.
Segundo relatado pela assistente social, "no que se refere às condições de moradia a construção é de alvenaria, com laje, as paredes são rebocadas e pintadas, o banheiro é azulejado, o piso é de cerâmica. Possui água encanada, rede esgoto e energia elétrica. O quintal nos fundos tem uma parte cimentada onde fica o tanque para lavar roupa e o varal para secar roupa, outra parte de terra. Na frente tem uma garagem coberta e um portão de ferro. No que tange à limpeza, higiene e organização pude observar que tudo estava muito limpo e organizado".
A renda familiar conforme indicado no estudo social, é composta pela aposentadoria do cônjuge da requerente, no valor de R$2.200,00, pelo salário percebido por seu filho, no montante de R$790,00, totalizando, à época, a quantia de R$2.990,00, além de uma cesta básica recebida por este último.
Em contrapartida, os gastos informados pela família, giram em torno de R$2.686,19, por mês, incluindo financiamento de 2 (duas) motocicletas e da residência, gastos com supermercado, alimentação, luz, água, gás, IPTU, medicações, combustível, transporte intermunicipal, dentre outros.
Acresce a assistente que "todas as contas estão devidamente em dia" e que a demandante recebe parte dos medicamentos do Poder Público, além de fazer acompanhamento em Unidade Básica de Saúde, vinculada ao SUS.
Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifico que o núcleo familiar não se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, não fazendo jus a autora, também, ao benefício assistencial de prestação continuada.
É preciso que reste claro ao jurisdicionado que o benefício assistencial da prestação continuada é auxílio que deve ser prestado pelo Estado, portanto, por toda a sociedade, in extremis, ou seja, nas específicas situações que preencham os requisitos legais estritos, bem como se e quando a situação de quem o pleiteia efetivamente o recomende, no que se refere ao pouco deixado pelo legislador para a livre interpretação do Poder Judiciário.
O benefício assistencial da prestação continuada existe para auxiliar a sobrevivência das pessoas portadoras de incapacidade, por idade avançada, ou outras restrições físicas ou psíquicas para o trabalho e que não possuam parentes próximos em condições de lhes prover o sustento. O dever, portanto, é, em primeiro lugar, da família.
Repito que o benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à complementação da renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador exerça a ingrata tarefa de distinguir faticamente entre as situações de pobreza e de miserabilidade, eis que tem por finalidade precípua prover a subsistência daquele que o requer.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora, mantendo íntegra, com acréscimo de fundamentos, a r. sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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