
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0007156-34.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA ISTER DE OLIVEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE DE OLIVEIRA SILVA - SP106707
Advogado do(a) APELANTE: ERICO TSUKASA HAYASHIDA - SP192082-N
APELADO: MARIA ISTER DE OLIVEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: JOSE DE OLIVEIRA SILVA - SP106707
Advogado do(a) APELADO: ERICO TSUKASA HAYASHIDA - SP192082-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0007156-34.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA ISTER DE OLIVEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE DE OLIVEIRA SILVA - SP106707
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelações interpostas por MARIA ISTER DE OLIVEIRA e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada pela primeira, que se seguiu a demanda cautelar de produção antecipada de provas (autos nº 0012505-77.2008.8.26.0152), objetivando o restabelecimento de benefício de auxílio-doença e, caso preenchidas as condições legais, sua conversão em aposentadoria por invalidez.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de aposentadoria por invalidez, desde a data do início da incapacidade estabelecida pelo segundo
expert
em 01.03.2009 (ID 103015843, p. 138). Fixou correção monetária e juros de mora nos termos da Lei 11.960/09. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas em atraso, contabilizadas até a data da sua prolação. Por fim, determinou a imediata implantação do benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada (ID 103015843, p. 179-181).Em razões recursais, a parte autora pugna pela reforma parcial da sentença, para que a DIB seja fixada na data da alta médica ocorrida em meados de 2006 (ID 103015843, p. 188-195).
O INSS também interpôs recurso de apelação, no qual alega que a demandante não demonstrou estar incapacitada definitivamente para o labor, não fazendo jus à aposentadoria por invalidez. Em sede subsidiária, requer o desconto das parcelas relativas aos meses nos quais desenvolveu atividade laboral após a DIB estabelecida pela sentença, bem como a redução da verba honorária (ID 103015843, p. 223-233). Apresentou, ainda, contrarrazões (ID 103015843, p. 209-210).
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Já em sede recursal, o feito foi sobrestado, em virtude de decisão proferida pelo C. STJ, em sede de julgamento de recursos repetitivos (Tema 1.013) (ID 122866026).
O julgamento da
quaestio
pela Corte Superior se deu em 24.06.2020, com a consequente revogação da suspensão dos processos que tratavam da mesma matéria (REsp nº 1.786.590/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe 01/07/2020).É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0007156-34.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA ISTER DE OLIVEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE DE OLIVEIRA SILVA - SP106707
Advogado do(a) APELANTE: ERICO TSUKASA HAYASHIDA - SP192082-N
APELADO: MARIA ISTER DE OLIVEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto
.No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado na ação cautelar de antecipação de prova (autos nº 0012505-77.2008.8.26.0152), com fundamento em exame realizado em 15 de junho de 2011 (ID 103015102, p. 133-137), quando a demandante possuía 59 (cinquenta e nove) anos, consignou:
"
Após análise do histórico, exames físico e complementares, e documentos anexados aos autos, verifica-se que a autora é portadora de hipertensão arterial sistêmica, incontinência urinária, lombalgia crônica, osteoatrite de joelho esquerdo e depressão.
Do ponto de vista da hipertensão, incontinência urinária e depressão, essas são doenças passíveis de controle ambulatorial sem necessidade de afastamento do trabalho. Do ponto de vista da lombalgia crônica e osteoartrite de joelho, essas condições determinam uma incapacidade parcial e permanente, uma vez que são doenças crônicas sem possibilidade de cura ou reversão. Incapacitam parcialmente para atividades de características braçais e que determinem sobrecarga do joelho e coluna.
Não foram caracterizadas a tuberculose e problema pulmonar relatados pela autora, por falta de documentos que sustentem tal acometimento, e não foram encontrados alterações sugestivas no exame físico.
Considerando a idade da autora, as características de suas doenças, grau de escolaridade e o tipo de ocupação que sempre exerceu (braçal - doméstica), sugere-se aposentadoria por invalidez. Início da incapacidade de difícil precisão por relatos vagos e imprecisos, e prontuários sem dados referentes a capacidade laborativa. Pode-se considerar o início da incapacidade no ano de 2005, quando do prontuário anexado aparecem as queixas ortopédicas limitantes
”.Em sede de esclarecimentos complementares, todavia, fixou a DII em meados de março 2009, já que a autora continuou a laborar, após a cessação do auxílio-doença em 2006, até aquele momento (ID 103015102, p. 177-179).
Nomeado outro profissional médico, já nos autos da ação principal, este, por sua vez, com base em exame realizado em 30 de maio de 2014 (ID 103015843, 112-119, 137-138 e 161-162), quando a requerente já tinha 62 (sessenta e dois) anos, relatou:
“
Pericianda total e permanentemente incapaz para a atividade laborativa.
Não é possível precisar o início das doenças pelas suas características, sendo que quadro atual se iniciou entre 2005/2006 pelo relato/registros (DID).
Considerando-se quadro apresentado, evolução documentada e o quadro clínico atual, pericianda incapaz para o trabalho. Há laudo do IMESC que descreve início da incapacidade em março de 2009, sendo que a mesma foi ratificada nesta data (DII)
”.Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial,
a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.Saliente-se que as perícias médicas foram efetivadas por profissionais inscritos no órgão competente, os quais responderam aos quesitos elaborados e forneceram diagnósticos com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entenderam pertinentes, e, não sendo infirmados pelo conjunto probatório, referidas provas técnicas merecem confiança e credibilidade.
Reconhecida a incapacidade total e definitiva da demandante para trabalho, por ambos os peritos, de rigor a concessão de aposentadoria por invalidez, nos exatos termos do já mencionado art. 42 da Lei 8.213/91.
Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência (Súmula 576 do STJ).
Tendo em vista a apresentação de pedido administrativo (de reconsideração) em 16.04.2008 (ID 103015102, p. 25), de rigor a fixação da DIB nesta data.
Por oportuno, destaco que a diferença entre a data do início da incapacidade fixada pelos expertos (01.03.2009) e a DER (16.04.2008) é muito pequena, de pouco mais de 10 (dez) meses, não podendo ser tomada em termos matemáticos exatos, exigindo a necessária temperança decorrente dos fatos da vida por parte do julgador (art. 375 do CPC/2015).
Assim, a meu sentir, na data da apresentação do requerimento administrativo, a autora já estava definitivamente incapacitada para o labor, sobretudo, porque é portadora de males degenerativos ortopédicos típicos de pessoas com idade avançada, e que se caracterizam pelo desenvolvimento paulatino ao longo dos anos.
Em outras palavras, se me afigura pouco crível que a saúde da demandante tenha se alterado sensivelmente em menos de um ano. Por outro lado, não se pode considerar que o quadro incapacitante já existia 3 (três) anos antes da DII fixada pelos peritos, isto é, em meados de 2006, como quer em seu apelo.
Passo à análise da questão envolvendo o trabalho da parte autora no período em que reconhecida a incapacidade laborativa, com o desdobramento no pagamento das parcelas em atraso.
Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a ausência da remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não consegue exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade temporária ou definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada, após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária em conceder benefício previdenciário, por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual.
Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado, com a impossibilidade de concessão de benefício judicialmente, em virtude de suposta ausência de incapacidade. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime.
Neste sentido já decidiu esta Corte, conforme arestos a seguir reproduzidos:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORATIVA APÓS A CESSAÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA. DESCONTO DOS VALORES NO PERÍODO DO SUPOSTO TRABALHO. IMPOSSIBILIDADE. LEI 11.960/09. APLICAÇÃO COM RELAÇÃO À CORREÇÃO MONETÁRIA. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O fato da autora ter trabalhado ou voltado a trabalhar, por si só, não significa que tenha recuperado a capacidade laborativa, uma vez que pode tê-lo feito por razão de extrema necessidade e de sobrevivência, ainda mais se tratando de empregada doméstica, não obstante incapacitada para tal. 2. A autora, que deveria ter sido aposentada por invalidez, porém continuou a contribuir após referido período, em função de indevida negativa do benefício pelo INSS, não pode ser penalizada com o desconto dos salários-de-contribuição sobre os quais verteu contribuições, pois, se buscou atividade remunerada, por falta de alternativa, para o próprio sustento, em que pese a incapacidade laborativa, no período em que a autarquia opôs-se ilegalmente ao seu direito, não cabe ao INSS tirar proveito de sua própria conduta. 3. No que tange à correção monetária, devem ser aplicados os índices oficiais de remuneração básica, a partir da vigência da Lei 11.960/09. 4. Agravo parcialmente provido." (AC 0036499-51.2011.4.03.9999, 10ª Turma, Rel. Des. Fed. Baptista Pereira, j. 05/02/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/02/2013)".
"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. MATÉRIA PRELIMINAR. ESPERA PELA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RETORNO À ATIVIDADE LABORATIVA. POSSIBILIDADE DE PERCEPÇÃO CONJUNTA DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE E SALÁRIO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. INOCORRÊNCIA. VALORAÇÃO DE TODAS AS PROVAS ACOSTADOS AOS AUTOS SUBJACENTES. ERRO FATO. INEXISTÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - A matéria preliminar confunde-se com o mérito e com ele será examinada.
II - Há que prevalecer o entendimento já adotado na 10ª Turma, no sentido de que comprovada a incapacidade laborativa e não tendo sido concedida tutela para implantação do benefício, não se justifica a exclusão do período em que o segurado, mesmo tendo direito ao benefício, teve que trabalhar para garantir a sua subsistência, já que não é razoável que se exija que o segurado tenha recursos para se manter até que o seu feito seja julgado.
III - Malgrado o ora réu tenha exercido atividade remunerada desde o termo inicial do benefício de auxílio-doença fixado pela r. decisão rescindenda (05.02.2006) até agosto de 2011, conforme extrato do CNIS acostado aos autos, cabe ponderar que este havia sido contemplado com benefício de auxílio-doença nos períodos de 25.06.2004 a 04.07.2005, de 16.10.2005 a 30.11.2005 e de 25.01.2006 a 05.02.2006, havendo, ainda, documentos médicos apontando a ocorrência da mesma enfermidade constatada pela perícia oficial (epicondilite lateral do cotovelo direito) desde agosto de 2004. Assim sendo, é razoável inferir que o ora réu teve que buscar o mercado de trabalho mesmo sem plenas condições físicas para tal.
IV - A r. decisão rescindenda apreciou o conjunto probatório em sua inteireza, segundo o princípio da livre convicção motivada, tendo concluído pela existência de incapacidade parcial e temporária do réu para o trabalho, a ensejar a concessão do benefício de auxílio-doença.
V - Não se admitiu um fato inexistente ou se considerou inexistente um fato efetivamente ocorrido, pois foram consideradas as provas acostadas aos autos originários, com pronunciamento judicial sobre o tema, mesmo porque não constava das peças que compuseram os aludidos autos o extrato de CNIS indicando a manutenção de atividade laborativa após a cessação do benefício de auxílio-doença concedido na esfera administrativa.
VI - Honorários advocatícios arbitrados em R$ 700,00 (setecentos reais) a serem suportados pelo INSS.
VII - Preliminar rejeitada. Ação rescisória cujo pedido se julga improcedente."
(AR nº 0019784-55.2011.4.03.0000, Rel. Des. Federal Sérgio Nascimento, 3ª Seção, e-DJF3 18/11/2013)”.
A confirmar tal entendimento, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva, fixou a “Tese nº 1.013”, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.786.590/SP, ocorrido em 24.06.2020, com o seguinte teor:
“No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente."
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Relativamente aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente, o que resta atendido com o percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações devidas até a data da prolação da sentença de 1º grau (Súmula 111, STJ), devendo o
decisum
ser mantido no particular.Ante o exposto,
nego provimento
à apelação do INSS edou parcial provimento
à apelação da parte autora e à remessa necessária para fixar a DIB da aposentadoria por invalidez na data da apresentação de requerimento administrativo, que se deu em 16.04.2008, bem como para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual.É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE TOTAL E DEFINITIVA PARA O TRABALHO. LAUDOS MÉDICOS. INTERPRETAÇÃO
A CONTRARIO SENSU
. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM OS PARECERES DOS EXPERTOS. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA. DIB. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. SÚMULA 576, STJ. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA INCAPACIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DESCONTO. DESCABIMENTO. TEMA REPETITIVO Nº 1.013/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111, STJ. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS. DIB MODIFICADA. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
8 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado na ação cautelar de antecipação de prova (autos nº 0012505-77.2008.8.26.0152), com fundamento em exame realizado em 15 de junho de 2011 (ID 103015102, p. 133-137), quando a demandante possuía 59 (cinquenta e nove) anos, consignou: "Após análise do histórico, exames físico e complementares, e documentos anexados aos autos, verifica-se que a autora é portadora de hipertensão arterial sistêmica, incontinência urinária, lombalgia crônica, osteoatrite de joelho esquerdo e depressão. Do ponto de vista da hipertensão, incontinência urinária e depressão, essas são doenças passíveis de controle ambulatorial sem necessidade de afastamento do trabalho. Do ponto de vista da lombalgia crônica e osteoartrite de joelho, essas condições determinam uma incapacidade parcial e permanente, uma vez que são doenças crônicas sem possibilidade de cura ou reversão. Incapacitam parcialmente para atividades de características braçais e que determinem sobrecarga do joelho e coluna. Não foram caracterizadas a tuberculose e problema pulmonar relatados pela autora, por falta de documentos que sustentem tal acometimento, e não foram encontrados alterações sugestivas no exame físico. Considerando a idade da autora, as características de suas doenças, grau de escolaridade e o tipo de ocupação que sempre exerceu (braçal - doméstica), sugere-se aposentadoria por invalidez. Início da incapacidade de difícil precisão por relatos vagos e imprecisos, e prontuários sem dados referentes a capacidade laborativa. Pode-se considerar o início da incapacidade no ano de 2005, quando do prontuário anexado aparecem as queixas ortopédicas limitantes”. Em sede de esclarecimentos complementares, todavia, fixou a DII em meados de março 2009, já que a autora continuou a laborar, após a cessação do auxílio-doença em 2006, até aquele momento (ID 103015102, p. 177-179).
9 - Nomeado outro profissional médico, já nos autos da ação principal, este, por sua vez, com base em exame realizado em 30 de maio de 2014 (ID 103015843, 112-119, 137-138 e 161-162), quando a requerente já tinha 62 (sessenta e dois) anos, relatou: “Pericianda total e permanentemente incapaz para a atividade laborativa. Não é possível precisar o início das doenças pelas suas características, sendo que quadro atual se iniciou entre 2005/2006 pelo relato/registros (DID). Considerando-se quadro apresentado, evolução documentada e o quadro clínico atual, pericianda incapaz para o trabalho. Há laudo do IMESC que descreve início da incapacidade em março de 2009, sendo que a mesma foi ratificada nesta data (DII)”.
10 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial,
a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.11 - Saliente-se que as perícias médicas foram efetivadas por profissionais inscritos no órgão competente, os quais responderam aos quesitos elaborados e forneceram diagnósticos com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entenderam pertinentes, e, não sendo infirmados pelo conjunto probatório, referidas provas técnicas merecem confiança e credibilidade.
12 - Reconhecida a incapacidade total e definitiva da demandante para trabalho, por ambos os peritos, de rigor a concessão de aposentadoria por invalidez, nos exatos termos do já mencionado art. 42 da Lei 8.213/91.
13 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência (Súmula 576 do STJ). Tendo em vista a apresentação de pedido administrativo (de reconsideração) em 16.04.2008 (ID 103015102, p. 25), de rigor a fixação da DIB nesta data.
14 - A diferença entre a data do início da incapacidade fixada pelos expertos (01.03.2009) e a DER (16.04.2008) é muito pequena, de pouco mais de 10 (dez) meses, não podendo ser tomada em termos matemáticos exatos, exigindo a necessária temperança decorrente dos fatos da vida por parte do julgador (art. 375 do CPC/2015).
15 - Assim, na data da apresentação do requerimento administrativo, a autora já estava definitivamente incapacitada para o labor, sobretudo, porque é portadora de males degenerativos ortopédicos típicos de pessoas com idade avançada, e que se caracterizam pelo desenvolvimento paulatino ao longo dos anos.
16 - Em outras palavras, se afigura pouco crível que a saúde da demandante tenha se alterado sensivelmente em menos de um ano. Por outro lado, não se pode considerar que o quadro incapacitante já existia 3 (três) anos antes da DII fixada pelos peritos, isto é, em meados de 2006, como quer em seu apelo.
17 - Descabe o abatimento, sobre as parcelas devidas, do período em que o segurado manteve vínculo empregatício ou verteu recolhimentos na condição de contribuinte individual. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual.
18 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime.
19 - A confirmar tal entendimento, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (REsp nº 1.786.590/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 24/06/2020, DJe 01/07/2020), fixou a “Tese nº 1.013” com o seguinte teor: “No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente.".
20 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.21 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
22 - Relativamente aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente, o que resta atendido com o percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações devidas até a data da prolação da sentença de 1º grau (Súmula 111, STJ), devendo o
decisum
ser mantido no particular.23 - Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora e remessa necessária parcialmente providas. DIB modificada. Alteração dos critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora. Sentença reformada em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à apelação da parte autora e à remessa necessária para fixar a DIB da aposentadoria por invalidez na data da apresentação de requerimento administrativo, que se deu em 16.04.2008, bem como para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
