Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0005706-85.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
25/05/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 07/06/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA PARA O TRABALHO. CONFIGURAÇÃO. LAUDO
PERICIAL. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS
CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE
JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO.
VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. SEGURADO
ESPECIAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL SUFICIENTE. SÚMULA 149, STJ. PROVA TESTEMUNHAL.
RECONHECIMENTO. QUALIDADE DE SEGURADO DEMONSTRADA. CUMPRIMENTO DA
CARÊNCIA LEGAL. AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO. DIB. DATA DA APRESENTAÇÃO DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. SÚMULA 576, STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS
DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111, STJ. APELAÇÃO DA AUTORA
PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. TUTELA ESPECÍFICA
CONCEDIDA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
8 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame efetuado em 14 de fevereiro de 2017, quando a demandante possuía 53 (cinquenta e três)
anos, consignou o seguinte: “A pericianda apresenta quadro de alterações vasculares desde
janeiro de 2002 (sic), quando surgiu uma ferida na perna esquerda e por isso parou de trabalhar.
Desde 2005 está em tratamento de diabetes e há 1 ano em uso de insulina. Atestado médico de
junho de 2015 com diagnóstico de insuficiência venosa crônica em membro inferior esquerdo com
dermatofibrose, dermatite ocre e varizes e episódios de úlcera varicosa. Medicamentos em uso:
Glibenclamida, AAS, Metformina e Insulina (...) Ao exame físico apresenta lesão ulcerada em
atividade em membro inferior com fibrose cutânea e sinais de processo infeccioso secundário
com secreção (Vide foto). Doppler venoso do membro inferior esquerdo de outubro de 2015 com
incompetência de safena magna e de perfurantes incompetentes com úlcera varicosa cicatrizada.
Necessita de tratamento médico com vascular com perspectiva de cicatrização da lesão e
melhora do quadro clínico (...) Considerando os achados do exame clínico, bem como os
elementos apresentados, a patologia vascular diagnosticada no estágio em que se encontra gera
incapacidade total e temporária para o trabalho”.
9 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que
dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento
motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à
controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em
sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou
quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão,
salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser
o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a
exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
10 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o
qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico
da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises
que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmada pelo conjunto probatório, referida prova técnica
merece confiança e credibilidade.
11 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova
exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
12 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que
se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da
7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser
contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido
produzidos de forma espontânea, no passado.
13 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de
que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele
retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que
tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
14 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
15 - A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
16 - Realizada audiência de instrução e julgamento, em 26 de abril de 2017, foram colhidos os
depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pela requerente, que demonstraram tanto o labor
campesino exercido por ela, em regime de economia familiar, durante toda sua vida, como
confirmaram ter a mesma interrompido, ou ao menos reduzido drasticamente, o trabalho em
decorrência dos males de que é portadora.
17 - Impende salientar que o sítio de propriedade da sua família possui uma área total, em
hectares, de aproximadamente 7,7. Tendo em vista que o módulo fiscal do Município de
Itapetininga/SP, localidade da gleba, é de 22 ha, conforme consulta ao site do INCRA, se mostra
inquestionável que o imóvel é inferior a 4 (quatro) módulos fiscais para os fins do disposto no art.
11, VII, “a)”, da Lei 8.213/91.
18 - Cumpridos os requisitos carência e qualidade de segurado, quando do surgimento da
incapacidade total e temporária, acertada a concessão do benefício de auxílio-doença (art. 59 da
Lei 8.213/91).
19 - No que se refere à necessidade de reabilitação, destaca-se que esta só tem vez quando o
segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação
habitual, mas não para o trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a constatação,
haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação profissional, nos
exatos termos do caput do art. 62 da Lei 8.213/91. Nessa senda, uma vez concedido e dada sua
natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-doença pode ser cessado, prorrogado,
ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo
necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da
realização de perícias periódicas por parte da autarquia, conforme previsão expressa contida no
art. 101 da Lei nº 8.213/91, observando-se, ainda, a sistemática da cobertura previdenciária
estimada (“COPES”), prevista no §9º do art. 62 do mesmo diploma legislativo. Descabe, ainda,
cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a realização de procedimento
reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o restabelecimento da capacidade laboral
para o trabalho habitual, uma vez que esse dever decorre de imposição de Lei. Por fim, eventual
alegação de agravamento do quadro de saúde e concessão de nova benesse, por se tratar de
situação fática diversa, deve ser objeto de novo pedido administrativo ou judicial, sob pena de
eternização desta lide.
20 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se
dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência
(Súmula 576 do STJ). Haja vista a apresentação de requerimento administrativo em 12.04.2016,
de rigor a fixação da DIB em tal data.
21 - Não fixada uma DCB prévia para a benesse, posto que não se visualiza uma data de
recuperação certa para a autora. O mal incapacitante (“úlcera varicosa”), nas palavras do expert,
se caracteriza justamente por “lesões (que) evoluem com períodos de melhora seguido de
períodos de recidiva”.
22 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
23 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
24 - Honorários advocatícios arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação,
consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma
vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
25 - Apelação da parte autora provida. Sentença reformada. Ação julgada procedente. Tutela
específica concedida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005706-85.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: LOURDES CARNEIRO DE CAMARGO SONEGO
Advogado do(a) APELANTE: KARINA CANDELARIA SIGRIST DE SIQUEIRA - MS8265
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005706-85.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: LOURDES CARNEIRO DE CAMARGO SONEGO
Advogado do(a) APELANTE: KARINA CANDELARIA SIGRIST DE SIQUEIRA - MS8265
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por LOURDES CARNEIRO DE CAMARGO SONEGO, em ação
ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a
concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
A r. sentença julgou improcedente o pedido. Condenada a parte autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários
advocatícios, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a
situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da
assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº
1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC (ID 101979005, p. 122-124).
Em razões recursais, a demandante pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que
preenche os requisitos para a concessão dos benefícios ora vindicados (ID 101979005, p. 127-
131).
O INSS apresentou contrarrazões (ID 101979005, p. 135-140).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005706-85.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: LOURDES CARNEIRO DE CAMARGO SONEGO
Advogado do(a) APELANTE: KARINA CANDELARIA SIGRIST DE SIQUEIRA - MS8265
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença,
for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame efetuado em 14 de fevereiro de 2017 (ID 101979005, p. 87-90), quando a demandante
possuía 53 (cinquenta e três) anos, consignou o seguinte:
“A pericianda apresenta quadro de alterações vasculares desde janeiro de 2002 (sic), quando
surgiu uma ferida na perna esquerda e por isso parou de trabalhar. Desde 2005 está em
tratamento de diabetes e há 1 ano em uso de insulina. Atestado médico de junho de 2015 com
diagnóstico de insuficiência venosa crônica em membro inferior esquerdo com dermatofibrose,
dermatite ocre e varizes e episódios de úlcera varicosa. Medicamentos em uso: Glibenclamida,
AAS, Metformina e Insulina
(...)
Ao exame físico apresenta lesão ulcerada em atividade em membro inferior com fibrose
cutânea e sinais de processo infeccioso secundário com secreção (Vide foto). Doppler venoso
do membro inferior esquerdo de outubro de 2015 com incompetência de safena magna e de
perfurantes incompetentes com úlcera varicosa cicatrizada. Necessita de tratamento médico
com vascular com perspectiva de cicatrização da lesão e melhora do quadro clínico
(...)
Considerando os achados do exame clínico, bem como os elementos apresentados, a patologia
vascular diagnosticada no estágio em que se encontra gera incapacidade total e temporária
para o trabalho”.
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre
convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou
científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos
robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto.
Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas
partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se
vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração
do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000,
Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo
Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o
qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de
histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando
demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
Passo a analisar, agora, os requisitos carência e qualidade de segurado.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal.
Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor para todos os anos do período que se
pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o
raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS
NÃO DEMONSTRADOS. 1. (...). 3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o
período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em
que foi constituído o documento(...)" (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº
0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1
DATA:07/12/2015 - grifos nossos).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO
DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...)
2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência
estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua
eficácia probatória. (...)" (AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver
comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil,
assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural
exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos
como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal
idônea. Por analogia, se aplica também tal entendimento ao tempo de pesca artesanal.
Nessa senda, quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia
familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos
seguintes termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(omissis)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado
urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda
que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro
outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do
caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal
meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal
meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este
equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente,
trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§1º - Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos
membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento
socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e
colaboração, sem a utilização de empregados permanentes" (grifos nossos).
Para fazer prova da qualidade de segurado especial, na condição de produtora agropecuária,
colacionou aos autos os seguintes documentos:
a) certidão de seu casamento, ocorrido em 04.12.1982, na qual seu esposo, CELSO SONEGO,
está qualificado como “agricultor” (ID 101979005, p. 20);
b) escritura de venda e compra de direitos possessórios sobre gleba rural, firmada em
03.08.1999, na qual ele está indicado como cessionário comprador (ID 101979005, p. 25-26);
c) declaração emitida pelo Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Itapetininga/SP, de 2016, no sentido de que a demandante exerce a lide campesina (ID
101979005, p. 27-28);
d) recibos de entrega de declaração do ITR, em nome da requerente, relativa aos exercícios de
2014 e 2015 (ID 101979005, p. 30-31);
e) certificado de cadastro do imóvel rural, de propriedade de sua família (“Sítio São Pedro”),
emitido pelo INCRA, relativo aos exercícios de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014 (ID 101979005,
p. 32);
f) e, por fim, notas fiscais de compra e venda de produtos/insumos agropecuários, em seu
nome, de 01.10.2015, 23.10.2014, 02.03.2009, 19.02.2009 e 06.06.2007 (ID 101979005, p. 33-
34 e 36-38).
Realizada audiência de instrução e julgamento, em 26 de abril de 2017 (ID 101979005, p. 120-
121), foram colhidos os depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pela requerente.
JOSÉ RICARDO afirmou que conhece a demandante desde quando esta era criança e que ela
sempre trabalhou na campo. Disse que antes do casamento ajudava seu genitor na lavoura e
depois o seu marido. Atestou que hoje cuida mais dos afazeres domésticos, pois não consegue
mais exercer a atividade rural, por conta dos seus problemas de saúde, os quais são
relativamente antigos (relato condizente com os achados no exame pericial, de que as suas
úlceras possuem períodos de melhora e piora).
JOSÉ CARLOS BRIZOLA atestou que conhece a autora desde 1973 e que sempre
desempenhou a lide campesina, plantando milho, feijão, arroz. Hoje ela é proprietária de um
imóvel, no Bairro dos Claros, em Itapetininga/SP (“Sítio São Pedro”). Disse que ela trabalha,
hoje, bem menos do que antigamente, por conta das patologias. O cultivo se restringe a itens
para a sua subsistência e de sua família.
Note-se que os depoimentos ampliam a eficácia probatória dos documentos indicativos do labor
rural, exercido em regime de economia familiar, de modo que é possível concluir que a autora
desempenhou tal atividade durante toda sua vida, como confirmaram ter a mesma interrompido,
ou ao menos reduzido drasticamente, o trabalho em decorrência dos males de que é portadora.
Impende salientar que o sítio de propriedade da sua família possui uma área total, em hectares,
de aproximadamente 7,7 (ID 101979005, p. 30-31). Tendo em vista que o módulo fiscal do
Município de Itapetininga/SP, localidade da gleba, é de 22 ha, conforme consulta ao site do
INCRA, se mostra inquestionável que o imóvel é inferior a 4 (quatro) módulos fiscais para os
fins do disposto no art. 11, VII, “a)”, da Lei 8.213/91.
Cumpridos, a meu julgar, os requisitos carência e qualidade de segurado, quando do
surgimento da incapacidade total e temporária, acertada a concessão do benefício de auxílio-
doença (art. 59 da Lei 8.213/91).
No que se refere à necessidade de reabilitação, destaca-se que esta só tem vez quando o
segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação
habitual, mas não para o trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a
constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação
profissional, nos exatos termos do caput do art. 62 da Lei 8.213/91.
Nessa senda, uma vez concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício
de auxílio-doença pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de
reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das
condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por
parte da autarquia, conforme previsão expressa contida no art. 101 da Lei nº 8.213/91,
observando-se, ainda, a sistemática da cobertura previdenciária estimada (“COPES”), prevista
no §9º do art. 62 do mesmo diploma legislativo.
Descabe, ainda, cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a realização de
procedimento reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o restabelecimento da
capacidade laboral para o trabalho habitual, uma vez que esse dever decorre de imposição de
Lei.
Por fim, eventual alegação de agravamento do quadro de saúde e concessão de nova benesse,
por se tratar de situação fática diversa, deve ser objeto de novo pedido administrativo ou
judicial, sob pena de eternização desta lide.
Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá
na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência
(Súmula 576 do STJ).
Haja vista a apresentação de requerimento administrativo em 12.04.2016 (ID 101979005, p.
23), de rigor a fixação da DIB em tal data.
Deixo de fixar uma DCB prévia para a benesse, posto que não visualizo uma data de
recuperação certa para a autora. O mal incapacitante (“úlcera varicosa”), nas palavras do
expert, se caracteriza justamente por “lesões (que) evoluem com períodos de melhora seguido
de períodos de recidiva”.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir
as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo
com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas
as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que,
sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
Por derradeiro, a hipótese da ação comporta a outorga de tutela específica nos moldes do art.
497 do Código de Processo Civil. Dessa forma, em atenção a expresso requerimento da parte
autora, visando assegurar o resultado concreto buscado na demanda e a eficiência da
prestação jurisdicional, independentemente do trânsito em julgado, determino seja enviado e-
mail ao INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, instruído com os documentos da parte
autora, a fim de serem adotadas as providências cabíveis ao cumprimento desta decisão, para
a implantação do benefício no prazo máximo de 20 (vinte) dias.
Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora, julgando procedente o pedido para
condenar o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de auxílio-doença, desde a data
da apresentação do requerimento administrativo, que se deu em 12.04.2016, sendo que sobre
os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a
expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, além de condená-lo no
pagamento de honorários advocatícios na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das
parcelas vencidas até a data da prolação da sentença de 1º grau de jurisdição, deferindo-se,
ainda, a antecipação dos efeitos da tutela.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA PARA O TRABALHO. CONFIGURAÇÃO. LAUDO
PERICIAL. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS
CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE
JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO.
VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO.
SEGURADO ESPECIAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR.
INÍCIO DE PROVA MATERIAL SUFICIENTE. SÚMULA 149, STJ. PROVA TESTEMUNHAL.
RECONHECIMENTO. QUALIDADE DE SEGURADO DEMONSTRADA. CUMPRIMENTO DA
CARÊNCIA LEGAL. AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO. DIB. DATA DA APRESENTAÇÃO DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. SÚMULA 576, STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS
DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111, STJ. APELAÇÃO DA AUTORA
PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. TUTELA
ESPECÍFICA CONCEDIDA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º
estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12
(doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
8 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame efetuado em 14 de fevereiro de 2017, quando a demandante possuía 53 (cinquenta e
três) anos, consignou o seguinte: “A pericianda apresenta quadro de alterações vasculares
desde janeiro de 2002 (sic), quando surgiu uma ferida na perna esquerda e por isso parou de
trabalhar. Desde 2005 está em tratamento de diabetes e há 1 ano em uso de insulina. Atestado
médico de junho de 2015 com diagnóstico de insuficiência venosa crônica em membro inferior
esquerdo com dermatofibrose, dermatite ocre e varizes e episódios de úlcera varicosa.
Medicamentos em uso: Glibenclamida, AAS, Metformina e Insulina (...) Ao exame físico
apresenta lesão ulcerada em atividade em membro inferior com fibrose cutânea e sinais de
processo infeccioso secundário com secreção (Vide foto). Doppler venoso do membro inferior
esquerdo de outubro de 2015 com incompetência de safena magna e de perfurantes
incompetentes com úlcera varicosa cicatrizada. Necessita de tratamento médico com vascular
com perspectiva de cicatrização da lesão e melhora do quadro clínico (...) Considerando os
achados do exame clínico, bem como os elementos apresentados, a patologia vascular
diagnosticada no estágio em que se encontra gera incapacidade total e temporária para o
trabalho”.
9 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que
dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento
motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à
controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em
sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames
ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal
aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso
concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto
probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis
Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima,
DJE. 12/11/2010.
10 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente,
o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de
histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando
demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmada pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
11 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
12 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
13 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
14 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
15 - A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
16 - Realizada audiência de instrução e julgamento, em 26 de abril de 2017, foram colhidos os
depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pela requerente, que demonstraram tanto o
labor campesino exercido por ela, em regime de economia familiar, durante toda sua vida, como
confirmaram ter a mesma interrompido, ou ao menos reduzido drasticamente, o trabalho em
decorrência dos males de que é portadora.
17 - Impende salientar que o sítio de propriedade da sua família possui uma área total, em
hectares, de aproximadamente 7,7. Tendo em vista que o módulo fiscal do Município de
Itapetininga/SP, localidade da gleba, é de 22 ha, conforme consulta ao site do INCRA, se
mostra inquestionável que o imóvel é inferior a 4 (quatro) módulos fiscais para os fins do
disposto no art. 11, VII, “a)”, da Lei 8.213/91.
18 - Cumpridos os requisitos carência e qualidade de segurado, quando do surgimento da
incapacidade total e temporária, acertada a concessão do benefício de auxílio-doença (art. 59
da Lei 8.213/91).
19 - No que se refere à necessidade de reabilitação, destaca-se que esta só tem vez quando o
segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação
habitual, mas não para o trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a
constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação
profissional, nos exatos termos do caput do art. 62 da Lei 8.213/91. Nessa senda, uma vez
concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-doença pode
ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria
por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o
que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia, conforme
previsão expressa contida no art. 101 da Lei nº 8.213/91, observando-se, ainda, a sistemática
da cobertura previdenciária estimada (“COPES”), prevista no §9º do art. 62 do mesmo diploma
legislativo. Descabe, ainda, cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a
realização de procedimento reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o
restabelecimento da capacidade laboral para o trabalho habitual, uma vez que esse dever
decorre de imposição de Lei. Por fim, eventual alegação de agravamento do quadro de saúde e
concessão de nova benesse, por se tratar de situação fática diversa, deve ser objeto de novo
pedido administrativo ou judicial, sob pena de eternização desta lide.
20 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este
se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua
inexistência (Súmula 576 do STJ). Haja vista a apresentação de requerimento administrativo em
12.04.2016, de rigor a fixação da DIB em tal data.
21 - Não fixada uma DCB prévia para a benesse, posto que não se visualiza uma data de
recuperação certa para a autora. O mal incapacitante (“úlcera varicosa”), nas palavras do
expert, se caracteriza justamente por “lesões (que) evoluem com períodos de melhora seguido
de períodos de recidiva”.
22 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
23 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
24 - Honorários advocatícios arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação,
consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma
vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
25 - Apelação da parte autora provida. Sentença reformada. Ação julgada procedente. Tutela
específica concedida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora, julgando procedente o pedido
para condenar o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de auxílio-doença, desde a
data da apresentação do requerimento administrativo, que se deu em 12.04.2016, sendo que
sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09,
a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a
expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, além de condená-lo no
pagamento de honorários advocatícios na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das
parcelas vencidas até a data da prolação da sentença de 1º grau de jurisdição, deferindo-se,
ainda, a antecipação dos efeitos da tutela, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
