
| D.E. Publicado em 29/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações da parte autora e do INSS e, de ofício, estabelecer que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 19/06/2018 19:50:04 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001285-67.2009.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pela parte autora e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada pela primeira, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença, de fls. 71/77, julgou improcedente o pedido deduzido na inicial, ante a não comprovação da qualidade de segurada e da incapacidade para o labor.
Em sequência, a autora interpôs apelo, de fls. 80/90, ao qual foi dado provimento para anular a sentença, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem a fim de que fosse produzida prova testemunhal, bem como para que se realizasse nova perícia médica (fls. 123/126).
Atendidas tais providências (fls. 137/150 e 167/170), foi prolatada nova sentença, às fls. 172/173-verso, que, por sua vez, julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de benefício de auxílio-doença, desde 05/09/2012. Fixou correção monetária e juros de mora, nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/09. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas em atraso, contabilizadas até a data da sua prolação.
Nova apelação da autora, às fls. 175/178, requerendo a concessão de aposentadoria por invalidez, eis que alega estar demonstrada, nos autos, a sua incapacidade permanente para o labor. Pleiteia, outrossim, a majoração dos honorários advocatícios.
O INSS também interpôs recurso de apelação, de fls. 180/187, no qual pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a parte autora não preenche os requisitos para a concessão dos benefícios ora vindicados.
Contrarrazões da parte autora, às fls. 190/191-verso.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 6 (seis) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Lei 13.457, de 2017).
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o primeiro profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em exame pericial realizado em 30 de junho de 2008 (fls. 51/55), consignou:
"Em ENGM realizada em 20/03/08 foi diagnosticada síndrome do túnel do carpo a direita que foi tratada cirurgicamente em Maio deste ano. Ante o exposto a paciente deverá ficar afastada de suas atividades laborativas até 10/08/2008 para recuperação de cirurgia" (sic).
Tendo em vista o exíguo prazo de impedimento estabelecido supra, quando da anulação da primeira sentença, foi determinada a realização de nova perícia, para apurar as reais condições físicas da autora naquele momento, o que se deu em 05 de setembro de 2012 (fls. 137/150).
O novo especialista relatou:
"O dados colhidos no decorrer da história clínica e exame físico assim como exames complementares em anexo nos leva a diagnosticar HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA, CARDIOPATIA VALVAR, SÍNDROME DO TÚNEL DO CARPO DIREITO. AS DOENÇAS HIPERTENSÃO ARTERIAL SITÊMICA E CARDIOCAPATIA VALVAR, ESTÃO CONTROLADAS NO MOMENTO, JÁ A SÍNDROME DO TÚNEL DO CARPO NECESSITA DE TRATAMENTO
(...)
Concluo que o(a) autor (a) é portador de HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA, CARDIOPATIA VALVAR E SÍNDROME DO T´NEL DO CARPO DIREITO, estando, dessa forma TOTAL E TEMPORARIAMENTE INCAPAZ PARA O TRABALHO DESDE 05/09/2012, DATA DA REALIZAÇÃO DA PERÍCIA MÉDICA" (sic).
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Saliente-se que as perícias médicas foram efetivadas por profissionais inscritos no órgão competente, os quais responderam aos quesitos elaborados e forneceram diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entenderam pertinentes, e, não sendo infirmados pelo conjunto probatório, referidas provas técnica merece confiança e credibilidade.
Dessa forma, reconhecida a incapacidade total e temporária da requerente, acertada a concessão apenas de auxílio-doença, nos termos do art. 59 da Lei 8.213/91.
Destaco, de outro lado, que, quando do surgimento da incapacidade, levando-se em conta o primeiro laudo pericial, era a autora segurada da Previdência Social e havia cumprido a carência legal.
Adoto a DII (março de 2008) fixada pelo primeiro experto, pois se me afigura de difícil crença, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece no dia dia (art. 335 do CPC/1973 e 375 do CPC/2015), tenha a parte autora sofrido com patologia ortopédica em 2008 ("síndrome do túnel do carpo"), se recuperado posteriormente e, em 2012, voltado novamente ao estado de incapacidade.
A meu ver, tendo em vista que se trata de doença de caráter degenerativo, isto é, caracterizada pelo desenvolvimento paulatino ao longo dos anos, a autora permaneceu incapacitada para o labor desde 2008 até pelo menos 2012. Com efeito, os elementos constantes dos autos indicam que não houve melhora do quadro incapacitante nesse interregno.
O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal.
Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Para fazer prova da qualidade de segurada, na condição de rurícola, colacionou aos autos a sua Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, de fls. 11/21, na qual constam os seguintes vínculos rurais: de 08/06/1987 a 23/06/1987 e de 24/04/1990 a 21/07/1990, junto à DESTILARIA ALTA MOGIANA; de 13/02/2001 a 25/04/2001, junto a JOSE OSWALDO RIBEIRO MENDONÇA E OUTROS; de 10/05/2001 a 21/05/2001, junto a GABRIEL AFONSO MEI ALVES OLIVEIRA; e, por fim, de 01/02/2005 a 23/02/2005, junto a OTÁVIO JUNQUEIRA MOTTA LUIZ E OUTRO.
Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, as quais ora faço anexar aos autos, corroboram os períodos de trabalho rural acima listados, sendo que no Cadastro consta apenas, diferentemente da CTPS, que a autora percebeu remuneração junto a GABRIEL AFONSO MEI ALVES OLIVEIRA até agosto de 2001 e não até maio.
Realizada audiência de instrução e julgamento, em 15 de janeiro de 2013 (fls. 167/170), foram colhidos os depoimentos de testemunhas arroladas pela demandante.
EUNICE APARECIDA COUTINHO afirmou que "conhece a autora há muito tempo e trabalhou com ela na roça, cortando cana, a partir de 2005, até 2008. Nesse período, ela trabalhou o ano todo. Em 2005 teve registro em carteira e depois 'foi avulso'. Em 2008, ela ficou doente, operou o braço e não mais trabalhou. Não sabe se o problema melhorou. Tiverem muito pouco conato desde então, já que ela mudou-se para uma fazenda perto de Guaíra, onde o marido dela trabalha, mas ela não. Não sabe se a autora já recuperou-se para o trabalho" (sic) (fl. 168).
ENIVALDO DO NASCIMENTO disse que "conhece a autora há uns quinze anos. Ela sempre trabalhou na roça. É empreiteiro de mão de obra rural e leva trabalhadores para a usina Guaíra. A autora prestou-lhe serviços até 2005, parte do tempo sem e posteriormente com registro. Na usina ela trabalhou registrada. Estima que a autora tenha trabalhado na roça até 2008. Ela casou-se naquele ano e mudou-se, razão pela qual não tiveram mais contato. Quando trabalhava, a autora sempre reclamava de dores no braço. Era comum ela parar antes do horário. Não sabe se a autora procurou tratamento para o problema" (sic) (fl. 169).
ROBERTO DIAS asseverou que "conhece a autora há uns vinte anos. Ela sempre trabalhou na roça. Já levou-a ao trabalho rural, na qualidade de empreiteiro de mão de obra. Em 2005, ela trabalhou na fazenda São João, para a usina Alta Mogiana. Depois de 2005, a autora continuou a trabalhar na roça para outros empreiteiros, já que sempre a via nos pontos de trabalhadores rurais. A autora sempre reclamada de dores no corpo. Não sabe se isso evoluiu para alguma incapacidade. Não sabe se ela tem trabalhado recentemente. Não se recorda de quando a viu trabalhando pela última vez" (sic) (fl. 170).
Note-se que os depoimentos ampliam a eficácia probatória dos documentos indicativos de labor rural, de modo que é possível concluir que a autora desempenhou atividade campesina até março de 2008, data do início da incapacidade (DII).
Cumpre destacar, ainda, que os testemunhos trazem extensa quantidade de detalhes sobre onde a demandante trabalhava na condição de rurícola, em quais culturas, com quem mantinha vínculo de trabalho, período de início e fim da atividade rural, dentre outras informações.
Assim, comprovado o surgimento da incapacidade total e temporária para o trabalho, quando a autora era segurada da Previdência Social, de rigor a concessão de auxílio-doença.
No que se refere à necessidade de reabilitação, ressalta-se que esta só tem vez quando o segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação habitual, mas não para a realização de outro trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação profissional.
Uma vez concedido e dada a sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-doença realmente pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia.
Bem por isso, descabe cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a realização de procedimento reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o restabelecimento da capacidade laboral para o trabalho habitual, uma vez que esse dever decorre de imposição de Lei.
Eventual alegação de persistência de quadro incapacitante ou até de seu agravamento, para fins de concessão de nova benesse, por se tratar de situação fática diversa, deve ser objeto de novo pedido administrativo ou judicial, sob pena de eternização desta lide.
Relativamente aos honorários advocatícios, inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente, o que resta atendido com o percentual de 10% (dez por cento) sobre as prestações devidas até a data da prolação da sentença de 1º grau (Súmula 111, STJ), devendo a r. sentença ser mantida também no particular.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Ante o exposto, nego provimento às apelações da parte autora e do INSS e, de ofício, estabeleço que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 19/06/2018 19:50:01 |
