
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000554-86.2014.4.03.6122
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: AMELIA ARCURY BIANCHI
Advogado do(a) APELANTE: MAURICIO DE LIRIO ESPINACO - SP205914-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: MARCELO JOSE DA SILVA - SP269446-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000554-86.2014.4.03.6122
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: AMELIA ARCURY BIANCHI
Advogado do(a) APELANTE: MAURICIO DE LIRIO ESPINACO - SP205914-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: MARCELO JOSE DA SILVA - SP269446-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por AMÉLIA ARCURY BIANCHI, em ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de “auxílio-doença” ou, se preenchidos os requisitos, “aposentadoria por invalidez”.
A r. sentença prolatada em 15/01/2016 (ID 102951609 – pág. 107/110) julgou improcedente o pedido inicial, sob fundamento de preexistência das doenças à filiação da parte autora ao Regime Previdenciário, condenando-a no pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atribuído à causa (R$ 6.000,00), ressalvados os benefícios da assistência judiciária lhe conferidos (ID 102951609 – pág. 34).
Em razões recursais de apelação (ID 102951609 – pág. 113/115), a parte autora insiste na reforma da sentença, aduzindo, em suma,
no tocante à qualidade de segurado previdenciário
(eis que, já confirmada a incapacidade, em perícia), que o próprio INSS já a teria admitido, na medida em que concedido benefício anteriormente.
Devidamente processado o recurso, com o oferecimento de contrarrazões (ID 102951609 – pág. 117), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000554-86.2014.4.03.6122
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: AMELIA ARCURY BIANCHI
Advogado do(a) APELANTE: MAURICIO DE LIRIO ESPINACO - SP205914-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: MARCELO JOSE DA SILVA - SP269446-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de “aposentadoria por invalidez” será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de “auxílio-doença”, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o “auxílio-doença” é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de “auxílio-doença” e “aposentadoria por invalidez”.
Do caso concreto.
Acostados documentos médicos, inclusive sob determinação do Juízo (ID 102951609 – pág. 17/18, 79/80).
O resultado da perícia judicial realizada em 21/08/2014, posteriormente complementada (ID 102951609 – pág. 46/51, 88/89), constatara que a autora - contando com
88 anos de idade
à época (ID 102951609 – pág. 09), de atividade declaradasempre em afazeres do lar
- seria portadora de Artrose da coluna vertebral CID M 47, Gonartrose primária bilateral CID M 17.0, Coxartrose primária bilateral CID M 16.0, Artrose nas mãos CID M 15.1, assim descritas: artrose generalizada: 1) Nos segmentos torácico e lombar da coluna vertebral; 2) Em ambas as articulações coxofemorais; 3) No joelho esquerdo ocorreu a substituição da articulação por prótese total; 4) No joelho direito; 5) Em ambas as mãos. Além da artrose, apresenta consolidação viciosa de fratura da cabeça do úmero, resultando praticamente na inutilização da função do ombro, uma vez que a pericianda não consegue levar a mão à boca.
Em reposta aos quesitos formulados (ID 102951609 – pág. 34, 40), o perito asseverou a
incapacidade como sendo total e definitiva.
Ainda afirmou, no tocante aos hipotéticos inícios - da doença e da incapacidade:
As alterações degenerativas que caracterizam a artrose surgem na faixa etária de 35 a 45 anos.
A pericianda é idosa. Impossível saber quando as alterações degenerativas supracitadas atingiram o grau que determinou a incapacidade.
A artroplastia total do joelho é intervenção que se indica apenas quando as alterações degenerativas dessa articulação atingem grau que compromete a função desse órgão do Aparelho Locomotor. Portanto, em 1999, ano no qual essa cirurgia foi realizada, a autora estava incapacitada.
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial,
a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
No que concerne à vinculação da autora ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, observa-se dos autos pesquisa ao sistema previdenciário CNIS (ID 102951609 – pág. 74), com contribuições previdenciárias vertidas na condição de “contribuinte individual - facultativo”, referindo-se às competências janeiro/2003 a fevereiro/2004, abril/2004, junho/2009 a novembro/2013, e janeiro, abril e agosto/2014.
Neste cenário, conclui-se que o surgimento das doenças diagnosticadas como causadoras da incapacidade antecede a entrada da autora no Regime Previdenciário Oficial.
Assim, observo que a incapacidade da parte autora é preexistente ao tempo em que ingressara no sistema de seguridade. A esse propósito, inicialmente é necessário frisar que a Seguridade Social brasileira está construída sobre os parâmetros jurídicos da solidariedade, de modo que a seguro social depende do cumprimento de um conjunto de requisitos distribuídos por toda sociedade e também para o Estado, especialmente por trabalhadores, sendo certo que as contribuições necessárias ao custeio desse conjunto de benefícios pecuniários devem ser recolhidas mesmo quando o trabalhador não está acometido de doenças incapacitantes.
Não havendo contribuições por parte dos trabalhadores (contribuintes obrigatórios ou facultativos) sob a lógica solidária que mantém o sistema de seguridade, e se esses trabalhadores só fazem discretas contribuições quando já estão acometidos de doenças incapacitantes, por certo o benefício previdenciário não é devido à luz da Lei nº 8.213/1991 e da própria lógica constitucional da Previdência.
Não há dúvidas de que, quando a parte autora filiara-se ao RGPS, como contribuinte individual, já estaria incapacitada para o trabalho.
Por fim, quanto às alegações da autora, de que a autarquia previdenciária teria reconhecido, em âmbito administrativo, sua condição de segurada, à época do surgimento da inaptidão e, em consequência, deferido benefícios por incapacidade (a saber, “auxílios-doença” sob NB’s 005.026.058-5 e 005.029.639-6) (ID 102951609 – pág. 74), cumpre transcrever trechos da escorreita fundamentação da r. sentença, neste ponto:
“Assim, tomando em consideração o conjunto probatório, tenho que a incapacidade já era manifesta ao tempo do ingresso da autora, como facultativa, no Regime Geral de Previdência Social. O primeiro indicativo é a idade da postulante, pois nascida em 08.10.1925, tinha 77 anos ao tempo da filiação, em janeiro de 2003. O segundo, e não menos importante, refere-se à qualidade de segurada, ou seja, facultativa. O terceiro, é o estágio das lesões: antigas e crônicas.
Melhor dizendo: a autora passou distante de qualquer sistema previdenciário durante grande parte do período produtivo de sua vida, filiando-se facultativamente com mais de 70 anos de idade, quando o acesso à prestação somente se vislumbrava por incapacidade (nem aposentadoria por idade nem por contribuição logrará fácil acesso, considerando o período de contribuição mínimo) e portadora dos males que ensejaram a inaptidão - parcial - para o trabalho, pois, como esclarecido pelo examinador do Juízo, acometeram à autora desde longínqua data, não podendo, assim, ter importância e significado médico posterior ao ingresso.
(...)
Ainda, considerando o que se expôs, equivocada mostrou-se a concessão administrativa de benefícios de auxílio -doença (de 23.09.2005 a 15.04.2006 e de 31.05.2006 a 15.10.2006 - fl. 06), fundados nos diagnósticos hipertensão essencial (primária) e paniculite nas regiões do pescoço e do dorso (CID 110 e M54.0 - fls. 90/91), porquanto, como acima exposto, a incapacidade é anterior (e muito) ao início do recolhimento das contribuições à Previdência Social
(grifei)
Ante o exposto,
nego provimento
à apelação da parte autora
, mantendo hígida a r. sentença.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PREEXISTÊNCIA DA INCAPACIDADE. INÍCIO DO IMPEDIMENTO EM ÉPOCA ANTERIOR À FILIAÇÃO NO RGPS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
8 - O resultado da perícia judicial realizada em 21/08/2014, posteriormente complementada, constatara que a autora - contando com
88 anos de idade
à época, de atividade declaradasempre em afazeres do lar
- seria portadora de Artrose da coluna vertebral CID M 47, Gonartrose primária bilateral CID M 17.0, Coxartrose primária bilateral CID M 16.0, Artrose nas mãos CID M 15.1, assim descritas: artrose generalizada: 1) Nos segmentos torácico e lombar da coluna vertebral; 2) Em ambas as articulações coxofemorais; 3) No joelho esquerdo ocorreu a substituição da articulação por prótese total; 4) No joelho direito; 5) Em ambas as mãos. Além da artrose, apresenta consolidação viciosa de fratura da cabeça do úmero, resultando praticamente na inutilização da função do ombro, uma vez que a pericianda não consegue levar a mão à boca.9 - Em reposta aos quesitos formulados, o perito asseverou a
incapacidade como sendo total e definitiva.
Afirmou, no tocante aos hipotéticos inícios - da doença e da incapacidade: As alterações degenerativas que caracterizam a artrose surgem na faixa etária de 35 a 45 anos. A pericianda é idosa. Impossível saber quando as alterações degenerativas supracitadas atingiram o grau que determinou a incapacidade. A artroplastia total do joelho é intervenção que se indica apenas quando as alterações degenerativas dessa articulação atingem grau que compromete a função desse órgão do Aparelho Locomotor. Portanto, em 1999, ano no qual essa cirurgia foi realizada, a autora estava incapacitada.10 - No que concerne à vinculação da autora ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, observa-se dos autos pesquisa ao sistema previdenciário CNIS, com contribuições previdenciárias vertidas na condição de “contribuinte individual - facultativo”, referindo-se às competências janeiro/2003 a fevereiro/2004, abril/2004, junho/2009 a novembro/2013, e janeiro, abril e agosto/2014.
11 - O surgimento das doenças diagnosticadas como causadoras da incapacidade antecede a entrada da autora no Regime Previdenciário Oficial.
12 - A incapacidade da parte autora é preexistente ao tempo em que ingressara no sistema de seguridade. A esse propósito, inicialmente é necessário frisar que a Seguridade Social brasileira está construída sobre os parâmetros jurídicos da solidariedade, de modo que a seguro social depende do cumprimento de um conjunto de requisitos distribuídos por toda sociedade e também para o Estado, especialmente por trabalhadores, sendo certo que as contribuições necessárias ao custeio desse conjunto de benefícios pecuniários devem ser recolhidas mesmo quando o trabalhador não está acometido de doenças incapacitantes.
13 - Quando a parte autora filiara-se ao RGPS, como contribuinte individual, já estaria incapacitada para o trabalho.
14 - Apelação da parte autora desprovida. Sentença mantida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, mantendo hígida a r. sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
