
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0010871-50.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DENIS RAMOS VICENTE
Advogado do(a) APELADO: CARLOS EDUARDO BORGES - SP240332-S
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0010871-50.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DENIS RAMOS VICENTE
Advogado do(a) APELADO: CARLOS EDUARDO BORGES - SP240332-S
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por DÊNIS RAMOS VICENTE, objetivando o restabelecimento de “auxílio-doença” (concedido entre 29/11/2012 e 31/05/2013, sob NB 554.461.858-1) (ID 107573380 – pág. 60), com a posterior conversão em “aposentadoria por invalidez”.
A r. sentença prolatada em 23/09/2016 (ID 107573381 – pág. 77/81) julgou procedente a ação, condenando o INSS no pagamento de “auxílio-doença” desde 31/05/2013 (data da cessação administrativa do benefício) e até a reabilitação profissional do segurado, a ser realizada pelo INSS, com incidência de juros de mora e correção monetária sobre o total em atraso. Condenação da autarquia também em honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor apurado até a sentença, respeitada a Súmula 111 do C. STJ. Isenção das custas processuais, por força de lei.
Em razões recursais de apelação (ID 107573381 – pág. 85/97), o INSS pugna pela decretação de improcedência da ação, isso porque verificada a preexistência das doenças da parte autora em relação ao seu retorno ao sistema previdenciário (após 15 anos afastado do RGPS). Aduz, outrossim, que a natureza da inaptidão afirmada no bojo do laudo (inaptidão parcial, impedindo a prática profissional apenas com esforços pesados), permitiria a realização de tarefas leves. Noutra hipótese, espera pelas:
a)
decretação da sucumbência recíproca, eis que sucumbente o autor de parte do petitório;b)
estipulação dos índices referentes aos juros de mora e correção monetária conforme Lei nº 11.960/09;c)
fixação do termo inicial do benefício na data da juntada do laudo judicial; ed)
determinação dos descontos referentes a parcelas do benefício concomitantes a períodos de trabalho remunerado.
Devidamente processado o recurso, com o oferecimento de contrarrazões recursais pela parte autora (nas quais sustenta, preliminarmente, ser protelatório o recurso da autarquia; ID 107573381 – pág. 101/108), vieram os autos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0010871-50.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DENIS RAMOS VICENTE
Advogado do(a) APELADO: CARLOS EDUARDO BORGES - SP240332-S
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Da arguição preliminar
No que diz respeito à hipótese aventada em sede de contrarrazões pelo autor, diante da apelação ofertada pelo INSS, o então vigente Código de Processo Civil de 2015 disciplina hipóteses de ocorrência, a saber: deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; alterar a verdade dos fatos; usar do processo para conseguir objetivo ilegal; se opuser resistência injustificada ao andamento do processo; proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; provocar incidente manifestamente infundado; e se interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório (art. 80).
Excetuadas as circunstâncias acima previstas, o exercício regular do direito de ação, por si só, não se presta a caracterizar a litigância de má-fé.
In casu
, vejo que a autarquia previdenciária não incidiu em comportamento que se subsome a quaisquer das hipóteses de cabimento da condenação referida - máxime considerando a controversa questão nos autos, acerca do reconhecimento da incapacidade laborativa, necessário à concessão da benesse guerreada.
Da questão de fundo
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de “aposentadoria por invalidez” será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de “auxílio-doença”, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o “auxílio-doença” é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei nº 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador, ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de “auxílio-doença” e “aposentadoria por invalidez”.
Do caso concreto.
Trazidos aos autos, pelo autor, documentos médicos (ID 107573380 – pág. 19/26; ID 107573381 – pág. 08, 117/118).
E do laudo de perícia realizada em 13/05/2014 (ID 107573381 – pág. 24/32, 56/64, 70), infere-se que a parte autora - contando com
53 anos
à ocasião (ID 107573380 – pág. 16) e deprofissão derradeira (declarada no âmbito da perícia): preparar lanches (em lanchonete)
- padeceria de insuficiência cardíaca, nas válvulas mitral, aórtica e tricúspide. Foi operado do coração em 03/13, com substituição da valva aórtica. No exame de 07/08/13, restaram insuficiência discreta das válvulas mitral e tricúspide.
Em resposta a quesitos formulados (ID 107573380 – pág. 11, 37, 40/43), asseverou o jusperito tratar-se de
incapacidade parcial e definitiva, estando a parte autora incapaz para a realização de serviços pesados, podendo executar serviços leves.
Assevero que o Juiz não está adstrito ao laudo pericial,
a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Por sua vez, constam cópias de CTPS (ID 107573380 – pág. 27/30 e 72, até ID 107573381 – pág. 04), guias de recolhimentos previdenciários (ID 107573380 – pág. 31/34) e laudas extraídas do sistema informatizado CNIS/Plenus (ID 107573380 – pág. 35, 55/61, 67/71; e ID 107573381 – pág. 05), comprovando o ciclo laborativo-contributivo da parte autora composto por contratos de emprego entre anos de 1979 e 1986, e no ano de 1994, além de recolhimentos previdenciários vertidos na qualidade de contribuinte individual, desde setembro até dezembro/2012.
Pois bem.
Ao se considerar que o perito judicial asseverara, no bojo do laudo, o princípio da incapacidade como
sendo há 03 anos (correspondendo ao ano de 2011),
a conclusão a que se chega é a de que a parte autora recomeçara a verter contribuições já detendo as patologias incapacitantes, ora examinadas.
Extrai-se, deste contexto, que ao se refiliar, a parte autora já era portadora de males incapacitantes, estando configurada, portanto, a preexistência das doenças.
Destarte, verificada a preexistência, de rigor o indeferimento dos pedidos.
Ante o exposto,
rejeito a alegação preliminar e, no mérito, dou provimento
à apelação do INSS
, para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial.
Inverto o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por cinco anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita (ID 107573380 – pág. 36), a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RECURSO DO INSS PROTELATÓRIO. PRELIMINAR REJEITADA. LAUDO MÉDICO. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. INÍCIO DO IMPEDIMENTO EM ÉPOCA PREGRESSA AO REINGRESSO NO RGPS. PREEXISTÊNCIA DOS MALES. AUXÍLIO-DOENÇA INDEVIDO. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - O exercício regular do direito de ação, por si só, não se presta a caracterizar a litigância de má-fé. A autarquia previdenciária não incidiu em comportamento que se subsome a quaisquer das hipóteses de cabimento da condenação referida - máxime considerando a controversa questão nos autos, acerca do reconhecimento da incapacidade laborativa, necessário à concessão da benesse guerreada.
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de “aposentadoria por invalidez” será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de “auxílio-doença”, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O “auxílio-doença” é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de “auxílio-doença” e “aposentadoria por invalidez”.
9 - Trazidos aos autos, pelo autor, documentos médicos. E do laudo de perícia realizada em 13/05/2014, infere-se que a parte autora - contando com
53 anos
à ocasião e deprofissão derradeira (declarada no âmbito da perícia): preparar lanches (em lanchonete)
- padeceria de insuficiência cardíaca, nas válvulas mitral, aórtica e tricúspide. Foi operado do coração em 03/13, com substituição da valva aórtica. No exame de 07/08/13, restaram insuficiência discreta das válvulas mitral e tricúspide.10 - Em resposta a quesitos formulados, asseverou o jusperito tratar-se de
incapacidade parcial e definitiva, estando a parte autora incapaz para a realização de serviços pesados, podendo executar serviços leves.
11 - O Juiz não está adstrito ao laudo pericial,
a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes.12 - Constam cópias de CTPS, guias de recolhimentos previdenciários e laudas extraídas do sistema informatizado CNIS/Plenus, comprovando o ciclo laborativo-contributivo da parte autora composto por contratos de emprego entre anos de 1979 e 1986, e no ano de 1994, além de recolhimentos previdenciários vertidos na qualidade de contribuinte individual, desde setembro até dezembro/2012.
13 - Ao se considerar que o perito judicial asseverara, no bojo do laudo, o princípio da incapacidade como
sendo há 03 anos (correspondendo ao ano de 2011),
a conclusão a que se chega é a de que a parte autora recomeçara a verter contribuições já detendo as patologias incapacitantes, ora examinadas.14 - Ao se refiliar, a parte autora já era portadora de males incapacitantes, estando configurada, portanto, a preexistência das doenças.
15 - De rigor o indeferimento dos pedidos.
16 - Condenada a autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais se arbitra em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
17 - Preliminar rejeitada. No mérito, apelação do INSS provida. Sentença reformada. Ação julgada improcedente. Inversão das verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a alegação preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação do INSS, para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
