Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6071404-96.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
24/01/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 29/01/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE
PREEXISTENTE À FILIAÇÃO. ARTIGO 42, §2º, DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- Comprovada a incapacidade da parte autora, preexistente ao seu ingresso no Regime Geral da
Previdência Social, é indevido o benefício, conforme disposto no artigo 42, § 2º, da Lei n.
8.213/91.
- Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre a mesma base de cálculo fixada na
sentença, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I,
e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo
estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação da autarquia provida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6071404-96.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDA SEMIELLI TREVISOLI
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO JORGE SPINDOLA FARIAS - SP365438-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6071404-96.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDA SEMIELLI TREVISOLI
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO JORGE SPINDOLA FARIAS - SP365438-N
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal DALDICE SANTANA: cuida-se de apelação interposta em
face da r. sentença que julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder auxílio-
doença à parte autora, de 30/9/2015 a 24/5/2016, discriminados os consectários legais.
Decisão não submetida ao reexame necessário.
Nas razões recursais, a autarquia alega a preexistência da incapacidade à filiação da autora ao
Regime Previdenciário e exora a reforma integral do julgado.
Contrarrazões apresentadas.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6071404-96.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDA SEMIELLI TREVISOLI
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO JORGE SPINDOLA FARIAS - SP365438-N
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal DALDICE SANTANA: conheço do recurso, porquanto
presentes os requisitos de admissibilidade.
Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício por incapacidade.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da CF/1998, com a redação data pela EC n.
20/1998, que tem a seguinte redação:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e
idade avançada; (...)”.
Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, § único, III, da
CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, é devida ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o
trabalho, de forma omniprofissional, e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade
que lhe garanta a subsistência.
O auxílio-doença é devido a quem ficar temporariamente incapacitado, à luz do disposto no artigo
59 da mesma lei, mas a incapacidade se refere "não para quaisquer atividades laborativas, mas
para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social,
Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005,
pág. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o
trabalho.
São exigidos à concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais, quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social.
Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as
condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez ou
auxílio-doença. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86, da Lei n.
8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza,
ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).
O reconhecimento da incapacidade, total ou parcial, depende da realização de perícia médica,
por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil. Porém, o Juiz não está
adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos pessoais,
profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização são pertinentes a esse tema.
Súmula 47 da TNU: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez.
Súmula 53 da TNU: Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social.
Súmula 77 da TNU: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.
No caso, a perícia médica judicial, realizada em 30/3/2017, constatou a incapacidade laborativa
da autora (nascida em 1955, doméstica/do lar), pelo período de 30/9/2015 a24/5/2016, em razão
de neoplasia de estômago.
Em relação à data de início da incapacidade (DII), o perito esclareceu:
“Como o exame de endoscopia foi realizado dentro da rotina de investigação da hepatopatia, é
licito concluir que neste momento não havia incapacidade física (23.03.2015). A simples
declaração do resultado alguns dias depois inicia, dado à gravidade potencial do diagnóstico a
incapacidade, ao ver desde perito. Esta visão, no entanto, pode ser contestada posto que no
momento a autora estava sem sintoma.
No entanto, o início da quimioterapia, dado a gama de efeitos colaterais que produz, marca o
início da incapacidade de forma indiscutível. Desta forma a incapacidade se iniciou em
30.09.2015.
O último ciclo de quimioterapia se iníciou em 24.03.3016 e tem duração de 21 dias. Em função
dos efeitos colaterais, admite-se que a incapacidade persista por dois meses após seu início, ou
seja, a incapacidade cessou em 24.05.2016.”
Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo. Contudo, os demais
elementos de prova colacionados aos autos não autorizam convicção em sentido diverso,
inclusive no tocante ao início da incapacidade.
Cabe destacar, por oportuno, que a doença da autora é neoplasia maligna, conforme comprovado
pela perícia médica judicial, e, portanto, dispensa o cumprimento da carência mínima de doze
contribuições, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei 8.213/1991.
Resta verificar, portanto, a qualidade de segurado da parte quando deflagrada a incapacidade
laboral.
Os dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) da parte autora demonstram
recolhimentos como contribuinte individual de 1/11/2015 a 29/2/2016, ou seja, após a DII
apontada na perícia.
Nesse passo, mostra-se ilegal a concessão do benefício, pois na DII apontada na perícia a parte
autora não estava filiada à Previdência Social.
Como dito, embora a doença da autora dispense o cumprimento da carência de doze
contribuições, a teor do artigo 26, inciso II, da Lei 8.213/1991, não dispensa a prévia filiação ao
RGPS para a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
Afigura-se ilegal a concessão de benefício nestas circunstâncias, pois, a prova dos autos
demonstra claramente a presença de incapacidade para o trabalho preexistente à própria filiação.
Não é possível conceder benefício previdenciário a quem só contribui quando lhe é conveniente,
deixando de exercer o dever de solidariedade social no custeio no decorrer de sua vida.
In casu, não há dúvidas de que se aplica à presente demanda o disposto no artigo 42, § 2º,
primeira parte, da Lei nº 8.213/91, pois se trata de incapacidade preexistente.
Nesse diapasão:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 42, §
2º, DA LEI Nº 8.213/1991. DOENÇA PREEXISTENTE À FILIAÇÃO AO REGIME GERAL DE
PREVIDÊNCIA SOCIAL. REEXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. 1.
Demonstrado nos autos, que a incapacidade laboral é anterior à filiação ao Regime Geral de
Previdência Social, não faz jus o segurado à aposentadoria por invalidez, conforme o artigo 42, §
2º da Lei 8.213/1991. 2. Rever o entendimento do Tribunal de origem quanto a existência da
incapacidade laborativa do autor, antes mesmo de sua filiação junto ao Regime Geral de
Previdência Social - RGPS, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, providência
sabidamente incompatível com a via estreita do recurso especial. (Súmula nº 7/STJ). 3. Agravo
regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg no Ag 1329970 / SP AGRAVO REGIMENTAL
NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2010/0132461-4 Relator(a) Ministro MARCO AURÉLIO
BELLIZZE (1150) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA Data do Julgamento 17/04/2012 Data da
Publicação/Fonte DJe 31/05/2012)
"PREVIDENCIÁRIO - AGRAVO LEGAL - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - AUXÍLIO
DOENÇA - PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADA - OCORRÊNCIA - DOENÇA PRÉ-
EXISTENTE I. Para concessão de aposentadoria por invalidez é necessário comprovar a
condição de segurado, o cumprimento da carência, salvo quando dispensada, e a incapacidade
total e permanente para o trabalho. O auxílio-doença tem os mesmos requisitos, ressalvando-se a
incapacidade, que deve ser total e temporária. II. Considerando que as patologias diagnosticadas
são de caráter crônico e degenerativo, restou evidenciado que, ao ingressar ao Regime Geral da
Previdência Social, na qualidade de contribuinte facultativo, no período de 01/07/2003 a 06/2004,
a autora já estava incapacitada. III. Considerando a data da incapacidade fixada nos autos
(meados de 08/2008), e a última contribuição vertida pela autora (09/06/2004 - 06/2004), teria
sido consumada a perda da qualidade de segurada, conforme disposto no art. 15, II, e §4°, da Lei
8.213/91, uma vez que também não houve o recolhimento das quatro contribuições necessárias,
após tal perda, nos termos do art. 24, par. único, da LBPS. IV. Agravo legal improvido.” (AC -
APELAÇÃO CÍVEL - 1056095 Processo: 0039855-64.2005.4.03.9999 UF: SP Órgão Julgador:
NONA TURMA Data do Julgamento: 03/10/2011 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:17/10/2011 Relator:
DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS)
A solidariedade legal tem via dupla: todos devem contribuir para a previdência social, quando
exercem atividade de filiação obrigatória, para que todos os necessitados filiados obtenham a
proteção previdenciária.
O seguro social depende de recolhimento de contribuições e não pode conceder prestações
previdenciários sem prévio custeio.
A Previdência Social é essencialmente contributiva (artigo 201, caput, da Constituição Federal) e
só pode conceder benefícios mediante o atendimento dos requisitos legais, sob pena de
transmudar-se em Assistência Social, ao arrepio da legislação.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre a mesma base de cálculo fixada na
sentença, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I,
e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo
estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Ante o exposto, dou provimento à apelação, para considerar indevido o benefício.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE
PREEXISTENTE À FILIAÇÃO. ARTIGO 42, §2º, DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- Comprovada a incapacidade da parte autora, preexistente ao seu ingresso no Regime Geral da
Previdência Social, é indevido o benefício, conforme disposto no artigo 42, § 2º, da Lei n.
8.213/91.
- Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre a mesma base de cálculo fixada na
sentença, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I,
e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo
estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação da autarquia provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
