
| D.E. Publicado em 13/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS para reformar a r. sentença de 1º grau, julgar improcedente o pedido, revogar a tutela concedida e autorizar a cobrança pelo INSS dos valores recebidos pela autora a título de tutela antecipada, nesses próprios autos, após regular liquidação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005736-59.2009.4.03.6112/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária objetivando a concessão de aposentadoria por idade rural ou a aposentadoria por invalidez.
A r. sentença de fls. 176/184 julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária no pagamento do benefício de aposentadoria por invalidez à parte autora, a partir de 27/10/11 (fl. 112). As parcelas atrasadas serão acrescidas de correção monetária e de juros de mora. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o montante das parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula 111 do STJ).
Em razões recursais de fls. 194/198, o INSS sustenta que a autora não preenche os requisitos necessários à concessão do benefício, ante a falta de qualidade de segurada.
Devidamente processado o recurso, com contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Depois da edição da Lei n. 8.213/91, a situação do rurícola modificou-se, já que passou a integrar um Sistema Único, com os mesmos direitos e obrigações dos trabalhadores urbanos, tornando-se segurado obrigatório da Previdência Social.
Quanto ao desenvolvimento de atividade laboral, exige a Lei n. 8.213/91 início de prova material para comprovar a condição de rurícola, excluindo-se a prova exclusivamente testemunhal para esse fim, entendimento consagrado igualmente pela Súmula 149 do STJ.
Sobre essa questão, é necessário destacar que o rol previsto no artigo 106 da Lei n. 8.213/91 não é taxativo, podendo, portanto, o postulante provar materialmente o exercício de atividade rural por meio de documentos não mencionados no referido dispositivo.
Em princípio, os trabalhadores rurais, na qualidade de empregados, não necessitam comprovar os recolhimentos das contribuições previdenciárias, devendo apenas provar o exercício da atividade laboral no campo pelo prazo da carência estipulado pela lei, tal como exigido para o segurado especial. Assim dispõe o art. 11, VII c/c art. 39, I, da Lei 8.213/91.
No caso, o laudo pericial de fls. 137/141 diagnosticou a parte autora como portadora de "tumor cerebral, catarata senil em ambos os olhos, doença coronariana e hipertensão arterial sistêmica".
Concluiu pela incapacidade total e permanente, mas não soube precisar a data de início da incapacidade.
Consignou, apenas, que a autora apresenta tumor cerebral desde 24/02/1999, doença coronariana diagnosticada em 07/01/09 e catarata nas condições atuais desde 14/07/11.
In casu, como início de prova material de seu labor rural, a parte autora apresentou os seguintes documentos:
- Certidão de nascimento, lavrada em 10/02/62, em que consta a profissão de "lavrador" do seu genitor (fl. 29);
- Certidão de casamento, lavrada em 26/06/65, em que consta a profissão de lavrador do cônjuge e a profissão de prendas domésticas da autora (fl. 31);
- Comprovante de cadastro eletrônico para seleção de beneficiários em assentamentos estaduais emitido pela Fundação Itesp, em que consta a sua habilitação (fls. 35/38);
- Declarações de terceiros, emitidas em 23/01/09, de que a autora trabalhou como boia-fria (fls. 39/42);
- Declaração de terceiro, emitida em 01/03/09, de que a autora esteve cadastrada no movimento "UNITERRA" e que morou no acampamento no período de 2002 a 2008 (fl. 43).
Consigna-se que não pode ser estendida, de forma automática, à parte autora a condição de rurícola atestada nos documentos relativos ao genitor e ao cônjuge.
Isso porque a extensão de efeitos em decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - parece-me viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, nos termos do artigo 11, inciso VII, da Lei n. 8.213/91, não sendo este o caso dos autos em que a parte autora relata que laborou como boia fria a partir do falecimento do cônjuge, ocorrido em 27/10/86 (fl. 04).
Acresça-se que as declarações emitidas por terceiros equivalem a mero depoimento escrito, de modo que não pode ser utilizado como início de prova material, sob pena de afronta ao disposto na Súmula 149 do STJ.
Por fim, a habilitação como beneficiária em assentamento estadual gera apenas uma expectativa de desenvolvimento do labor rural, em regime de economia familiar, a partir de 04/03/09, o que não restou demonstrado no depoimento da autora e das testemunhas. Veja-se:
Autora: "nasceu no meio campesino, em um sítio da Bahia, lembrando-se de que trabalhou na lavoura até ficar viúva. Confirmou que está correta a informação que seu filho forneceu ao perito de que ela deixou de trabalhar há vinte e cinco anos (resposta ao quesito nº 6 - f. 39). Declarou que permaneceu no acampamento por sete anos e que faz quatro anos que saiu de lá. Na época que seu marido faleceu, ela ainda era boia fria, tendo trabalhado para alguns proprietários da região, tais como Amélio França e Bento Redivo, mas que faz 32 anos que ela reside na zona urbana de Presidente Prudente" (fl. 180).
Testemunha "Cleusa da Silva Germiniano": "conhece a autora há 32 anos da época da Fazenda Aliança. Sabe que o marido da Requerente, já falecido, também trabalhava na lavoura, e que depois de seu falecimento, a Demandante continuou nas atividades campesinas, deixando este labor há 04 anos. A depoente confirmou que tanto ela quanto a Autora saíram da lide rural há mais de 20 anos, e, posteriormente, tornaram-se acampadas em um Acampamento localizado no município de Presidente Epitácio, onde permaneceram por 06 anos, mas que há 04 anos também deixaram este local. Antes de trabalharem neste local, entretanto, elas moravam na Vila e laboram como boias frias em lavouras de algodão, não se recordando os nomes dos proprietários rurais para quem prestavam serviços" (fl. 180).
Testemunha "Elza Ferreira Melo": "conhece a Autora desde 1962, quando ambas trabalhavam juntas no Sítio São Francisco, de propriedade de Amélio França, localizado no município de Presidente Bernardes. Nesta época, a Requerente era solteira e laborava em companhia de seus genitores. Depois que ela se casou, mudou-se para o Sítio do Redivo. Soube que a Autora estava no Movimento dos Sem Terras e que estava doente, e que há quatro anos lá trabalhava" (fl. 180).
Testemunha "Placília Rosa de Moura": "conhece a Autora do estado da Bahia, quando ambas tinham 15 anos e residiam no Sítio São Francisco. Depois que a Demandante se casou, elas perderam o contato, tendo a depoente permanecido no Sítio no município de Emilianópolis. Não soube informar, contudo, as atividades que a Requerente exercia após a sua mudança para o município de Presidente Prudente, nem tampouco quanto tempo aqui reside ou quem é seu falecido marido" (fl. 180 v).
No caso, a própria autora relata que não trabalha há vinte e cinco anos (desde 1987), pelo que não há como considera-la como segurada especial ao tempo do início da incapacidade (posterior a 1999).
Ademais, os relatos das testemunhas são confusos e contradizem a afirmação da autora, não se prestando a comprovar o desenvolvimento do labor rural em regime de economia familiar.
Destarte, não reconhecida a qualidade de segurada da autora, requisito indispensável à concessão de aposentadoria por invalidez ou do auxílio-doença, de rigor o indeferimento do pedido.
Observo que a sentença concedeu a tutela antecipada, assim, a situação dos autos adequa-se àquela apreciada no recurso representativo de controvérsia REsp autuada sob o nº 1.401.560/MT.
O precedente restou assim ementado, verbis:
Revogo os efeitos da tutela antecipada concedida (fl. 183 v) e aplico, portanto, o entendimento consagrado pelo C. STJ no mencionado recurso repetitivo representativo de controvérsia e reconheço a repetibilidade dos valores recebidos pela autora por força de tutela de urgência concedida, a ser vindicada nestes próprios autos, após regular liquidação.
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS para reformar a r. sentença de 1º grau, julgar improcedente o pedido, revogar a tutela concedida e autorizar a cobrança pelo INSS dos valores recebidos pela autora a título de tutela antecipada, nesses próprios autos, após regular liquidação.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
É como voto.
Desembargador Federal
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