Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5004331-61.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
24/08/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 26/08/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. PRÉVIO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA) E STF (REPERCUSSÃO GERAL). INAPLICABILIDADE. DISTINÇÃO. FEITO
JULGADO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. QUALIDADE DE
SEGURADO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. COMPANHEIRA E FILHOS. PROVA MATERIAL E
TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO. DESEMPREGO. BAIXA RENDA. RECURSO ESPECIAL
REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (RESP 1.485.417/MS). TEMA 896. REGIME
ANTERIOR À VIGÊNCIA DA MP 871/2019. TERMO INICIAL. DATA DO RECOLHIMENTO
PRISIONAL (AUTORA ABSOLUTAMENTE INCAPAZ). DATA DO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO (AUTORA MAIOR E CAPAZ). DATA DO NASCIMENTO (AUTOR NASCIDO
APÓS A RECLUSÃO). CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. CUSTAS. MATO
GROSSO DO SUL. PRELIMINAR REJEITADA E, NO MÉRITO, APELAÇÃO DO INSS
PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA, POR FUNDAMENTO DIVERSO.
1 - O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE nº 631.240/MG, resolvido nos
termos do artigo 543-B do CPC/73, assentou o entendimento de que a exigência de prévio
requerimento administrativo a ser formulado perante o INSS antes do ajuizamento de demanda
previdenciária não viola a garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CR/88, art. 5º,
XXXV). Ressalvou-se, contudo, a possibilidade de formulação direta do pedido perante o Poder
Judiciário quando se cuidar de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de
benefício anteriormente concedido, ou ainda, quando notório e reiterado o entendimento do INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
em desfavor da pretensão do segurado.
2 - Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça revisitou sua jurisprudência de modo a
perfilhar o posicionamento adotado pela Suprema Corte, o que se deu quando do julgamento do
RESP nº 1.369.834/SP, resolvido nos termos do artigo 543-C do CPC/73.
3 - Neste feito, busca-se a concessão de benefício previdenciário de auxílio-reclusão, não sendo,
portanto, a hipótese de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente
concedido. Da mesma forma, o pleito não se enquadra nos casos em que notória ou reiterada a
resistência autárquica.
4 -O caso sub examen, contudo, detém a peculiaridade de já ter sido decidido em primeiro grau
de jurisdição. E, se assim o é, há que se fazer a necessária distinção entre a situação posta nesta
demanda e aquela presente no julgamento paradigma, de forma a se verificar a ocorrência de
similitude fática entre elas.
5 - Malgrado tenha a ação sido proposta após o precedente do C. STF, fato é que o INSS
ofereceu contestação abrangendo, tão somente, o mérito, de forma a caracterizar resistência à
pretensão formulada, havendo, ainda, o exaurimento da fase instrutória, com a produção de
provas e manifestação das partes, tudo a ensejar a prolação de sentença de mérito.
6 - Foge à razoabilidade, portanto, reabrir-se a instrução processual na hipótese em que
aperfeiçoados - com a observância do contraditório - todos os atos probatórios, situação que, em
boa medida, desprestigiaria o princípio da duração razoável do processo, alçado, inclusive, a
preceito constitucional. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
7 - Reconhecida a ausência de similitude fática entre o caso ora posto a julgamento e o
precedente firmado pelo STF, razão pela qual se revela desnecessária, aqui, a prévia postulação
administrativa.
8 - O auxílio-reclusão “cumprida a carência prevista no inciso IV do caput do art. 25 desta Lei,
será devido, nas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado de baixa renda
recolhido à prisão em regime fechado que não receber remuneração da empresa nem estiver em
gozo de auxílio-doença, de pensão por morte, de salário-maternidade, de aposentadoria ou de
abono de permanência em serviço” (Art. 80 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº
13.846/2019).
9 - Os critérios para a concessão estão disciplinados nos artigos 116 a 119 do Decreto nº
3.048/99, que aprovou o Regulamento da Previdência Social.
10 - O benefício, até a edição da Lei nº 13.846/2019, independia de carência, destacando-se que,
nos dias presentes, exige-se o implemento de 24 (vinte e quatro) contribuições mensais.
Ademais, para sua concessão, faz-se imperioso o cumprimento dos seguintes requisitos: a)
recolhimento à prisão do segurado; b) manutenção da qualidade de segurado do recluso; c) baixa
renda do segurado; e d) dependência econômica do postulante.
11 - A comprovação da privação de liberdade, que deve, atualmente, ser obrigatoriamente em
regime fechado (admitindo-se, todavia, o regime semiaberto nos casos em que o requerimento do
benefício se der em momento anterior às alterações promovidas pela Lei nº 13.846/2019), dar-se-
á por meio de certidão do efetivo recolhimento à prisão firmada pela autoridade competente, a ser
apresentada trimestralmente.
12 - A manutenção da qualidade de segurado se dá, mesmo sem recolher as contribuições,
àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a
que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e
quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120
(cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua
vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido
de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
13 - Acerca do requisito da baixa renda, decidiu o STF em sede de repercussão geral, que "a
renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do
benefício e não a de seus dependentes" (RE 587365, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j.
25/03/2009, DJE 08/05/2009).
14 - Considera-se baixa renda aquela de valor bruto mensal igual ou inferior ao limite legal,
considerado o último salário de contribuição percebido pelo segurado à época da sua prisão.
15 - Originalmente, o limite legal foi fixado em R$ 360,00, pela EC nº 20/98, sendo, atualmente,
corrigido pelo Ministério da Previdência Social pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do
regime geral de previdência social.
16 - Outro ponto importante gira em torno do segurado que não exerce atividade remunerada
abrangida pela Previdência Social quando do seu encarceramento. Tal questão restou decidida
pelo C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Recurso Especial nº
1.485.417/MS, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia, que fixou a
seguinte tese: "Para a concessão de auxílio-reclusão (art. 80 da Lei 8.213/1991), o critério de
aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do
recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição." (REsp
1.485.417/MS, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 22/11/2017, v.u., DJe 02/02/2018).
17 - Insta consignar que a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça instaurou
procedimento de revisão da tese firmada no tema em questão, decidindo pela sua reafirmação,
ressaltando, contudo, que o regime jurídico objeto da controvérsia é o anterior à inclusão do § 4º
do art. 80 da Lei nº 8.213/1991, pela Lei nº 13.846/2019.
18 - O recolhimento à prisão e os requisitos relativos à qualidade de segurado do recluso e
dependência econômica dos postulantes menores restaram comprovados, conforme certidão de
recolhimento prisional, cópia da CTPS e extrato do CNIS e cópia da certidão de nascimento dos
autores Sayane Moreira Gaspechacka e Luis Samuel Moreira Gaspechaka.
19 - A celeuma cinge-se quanto à qualidade de companheira da coautora Marinalva e ao requisito
da baixa renda.
20 - Nos termos do art. 16, inciso I, da Lei nº 8.213/91, com a redação vigente à época dos fatos,
são dependentes do segurado: “o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não
emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha
deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado
judicialmente;”.
21 - O §3º do art. 16 da Lei de Benefícios dispõe que: "Considera-se companheira ou
companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a
segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal".
22 - Por sua vez, o Decreto nº 3.048/99, no seu art. 16, § 6º, com a redação vigente à época,
considera união estável "aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar,
quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em
comum, enquanto não se separarem.".
23 - Já a Lei nº 9.278/96, que regulamenta o art. 226, § 3º da Constituição Federal, dispõe que:
"É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um
homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família". Saliente-se que
referido conceito consta da atual redação do §6º do art. 16 do RPS e no art. 1.723 do CC.
24 - De acordo com a narrativa delineada na petição inicial, a coautora Marinalva mantinha união
estável com o recluso na data do recolhimento prisional.
25 - Para a comprovação do alegado, foram coligidos aos autos documentos, os quais, à exceção
do contrato particular de convivência celebrado após o recolhimento prisional, constituem início
razoável de prova material e foram devidamente corroborados por idônea e segura prova
coletada em audiência realizada em 15/08/2016, na qual foi ouvida uma testemunha.
26 - Os relatos são convincentes no sentido de que a Sra. Marinalva e o Sr. Luiz Fernando
conviviam como marido e mulher, em união pública e duradoura, com o intuito de formarem
família à época do encarceramento, não havendo nos autos quaisquer outros elementos que
indiquem a inexistência da união estável.
27 - Possível concluir, pela dilação probatória e demais documentos juntados, mormente pela
prova oral, com fundamento nas máximas de experiência, conforme disciplina o artigo 375, do
Código de Processo Civil, que a coautora Marinalva era companheira do segurado recluso.
28 - Diante disso, havendo nos autos elementos de convicção que comprovam a união estável e
duradoura entre a demandante e o recluso, a dependência econômica é presumida, nos termos
do art. 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91, e só cederia mediante a produção de robusta prova em
contrário, o que não se observa no caso.
29 - Realizado estudo social, a autora informou fazer visitas periódicas ao recluso, levando
consigo o coautor Luis Samuel.
30 - No tocante ao requisito da baixa renda, da análise dos autos, verifica-se que o recolhimento
à prisão do segurado se deu em 24/11/2014 e o último vínculo empregatício se iniciou em
05/01/2012, sem data de saída, mas com última remuneração em 09/2014, conforme extrato do
CNIS já mencionado.
31 - Infere-se, do mesmo banco de dados, que o segurado recebeu remunerações superiores a
R$1.000,00 nas competências 03/2012 a 08/2014, de modo que, a despeito de inexistir anotação
do término do vínculo empregatício, tem-se que este ocorreu na competência 09/2014, em razão
do ordenado auferido, na ordem de R$252,26, correspondente, portanto, a eventual resíduo.
32 - Assim, estando desempregado quando da reclusão, tem-se a ausência de renda, se
aplicando o entendimento consagrado pelo C. STJ, no julgamento do Resp nº 1.485.417/MS,
representativo de controvérsia, mantido em sede de revisão da tese repetitiva (Tema 896).
33 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do recolhimento prisional (24/11/2014),
em relação à coautora Sayane Moreira Gaspechacka, uma vez que se trata de dependente
absolutamente incapaz, contra a qual não corre prescrição, nos termos do art. 198, I, do Código
Civil. Quanto à coautora Marinalva Moreira da Silva deve ser fixado na data do requerimento
administrativo (24/02/2015), eis que formulado fora do prazo legal (art. 74, I, da Lei nº 8.213/91,
com a redação dada pela Lei nº 9.528/97). Por fim, para o coautor Luis Samuel Moreira
Gaspechacka o benefício é devido desde a data do seu nascimento (08/09/2015), vez que
nascido quando o segurado já estava recluso.
34 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
35 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
36 - Mantida a condenação da autarquia no pagamento das custas, eis que, em se tratando de
processos tramitados perante a Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, deve ser observado o
disposto na Lei Estadual n.º 3.779, de 11.11.2009, que em seu artigo 24, §1º expõe que a
isenção do recolhimento da taxa judiciária não se aplica ao INSS.
37 - Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação do INSS parcialmente provida. Correção
monetária alterada de ofício.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004331-61.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: MARINALVA MOREIRA DA SILVA, S. M. G., L. S. M. G.
Advogado do(a) APELADO: JANIANE APARECIDA DE CARVALHO - MS18227-A
Advogado do(a) APELADO: JANIANE APARECIDA DE CARVALHO - MS18227-A
Advogado do(a) APELADO: JANIANE APARECIDA DE CARVALHO - MS18227-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004331-61.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: MARINALVA MOREIRA DA SILVA, S. M. G., L. S. M. G.
Advogado do(a) APELADO: JANIANE APARECIDA DE CARVALHO - MS18227-A
Advogado do(a) APELADO: JANIANE APARECIDA DE CARVALHO - MS18227-A
Advogado do(a) APELADO: JANIANE APARECIDA DE CARVALHO - MS18227-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS,
em ação ajuizada por Marinalva Moreira da Silva, Luís Samuel Moreira Gaspechacka e Sayane
Moreira Gaspechacka, os dois últimos representados pela primeira, objetivando a concessão do
benefício previdenciário de auxílio-reclusão.
Concedida a tutela antecipada (ID 3444506 - Pág. 74/78).
A r. sentença (ID 3444507 - Pág. 79/83), mantida em sede de embargos de declaração (ID
3444507 - Pág. 95), julgou procedente o pedido inicial, condenando o INSS a conceder o
benefício de auxílio-reclusão, desde a data do recolhimento prisional (24/11/2014) até a data da
soltura do instituidor, bem como no pagamento de custas e honorários advocatícios, arbitrados
em 10% sobre o valor da soma das prestações vencidas até a data da prolação da sentença,
nos termos do art. 85, § 3º, I, do CPC, e da Súmula 111 do STJ.
Em razões recursais (ID 3444507 - Pág. 99/118 e ID 3444508 - Pág. 01/12), requer,
preliminarmente, a extinção do feito sem julgamento do mérito, em razão da ausência de prévio
requerimento administrativo em nome dos filhos da autora (falta de interesse processual). No
mérito, postula a reforma do decisum, ao fundamento de que não restou comprovada a
qualidade de dependente como companheira e de que o último salário de contribuição do
recluso era superior ao limite legal. Subsidiariamente, requer a fixação do termo inicial do
benefício na data do requerimento administrativo (24/02/2015), a isenção do pagamento de
custas e insurge-se quanto aos critérios de correção monetária e juros de mora, os quais, no
seu entender, devem observar o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada
pela Lei nº 11.960/2009. Prequestiona a matéria.
Intimada, a parte autora apresentou contrarrazões (ID 3444508 - Pág. 15/21).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Parecer do Ministério Público Federal opinando pelo provimento do recurso autárquico (ID
135761350/).
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004331-61.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: MARINALVA MOREIRA DA SILVA, S. M. G., L. S. M. G.
Advogado do(a) APELADO: JANIANE APARECIDA DE CARVALHO - MS18227-A
Advogado do(a) APELADO: JANIANE APARECIDA DE CARVALHO - MS18227-A
Advogado do(a) APELADO: JANIANE APARECIDA DE CARVALHO - MS18227-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Discute-se, inicialmente, acerca da necessidade de prévia postulação administrativa à obtenção
de benefício previdenciário.
O tema, como se sabe, suscita discussões de longa data.
O extinto Tribunal Federal de Recursos, após reiteradas decisões sobre a necessidade de
requerimento administrativo antes de se socorrer ao Poder Judiciário, editou a Súmula nº 213,
com o seguinte teor:
"O exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura de ação de natureza
previdenciária."
Trilhando a mesma senda, esta Corte trouxe à lume a Súmula nº 09, in verbis:
"Em matéria previdenciária, torna-se desnecessário o prévio exaurimento da via administrativa,
como condição de ajuizamento da ação."
A melhor compreensão para a expressão exaurimento reside no esgotamento de recursos por
parte do segurado junto à Administração, o que significa que, ao postular a concessão ou
revisão de seu benefício, o requerente não precisa se utilizar de todos os meios existentes na
seara administrativa antes de recorrer ao Poder Judiciário. Porém, na ausência, sequer, de
pedido administrativo, não resta aperfeiçoada a lide, vale dizer, inexiste pretensão resistida que
justifique a tutela jurisdicional e, por consequência, o interesse de agir.
É bem verdade que, nos casos de requerimento de benefício previdenciário, as máximas de
experiência têm demonstrado que o Instituto Securitário, por vezes, ao se negar a protocolizar
os pedidos, sob o fundamento de ausência de direito ou de insuficiência de documentos, fere o
direito de petição aos órgãos públicos (art. 5º, XXXIV, "a", CF e art. 105 da Lei 8.213/91). Mas,
não é menos verdade que, via de regra, os pedidos são rapidamente analisados, cumprindo o
INSS com o seu dever institucional.
Por isso, penso que seria correto determinar a comprovação do prévio requerimento na via
administrativa, pois incumbe ao INSS analisar, prima facie, os pleitos de natureza
previdenciária, e não ao Poder Judiciário, o qual deve agir quando a pretensão do segurado for
resistida ou na ausência de decisão por parte da Autarquia, legitimando o interessado ao
exercício da actio.
Aceitar que o Juiz, investido na função estatal de dirimir conflitos, substitua o INSS em seu
múnus administrativo, significa permitir seja violado o princípio constitucional da separação dos
poderes, insculpido no art. 2º da Lex Major, pois, embora os mesmos sejam harmônicos, são,
igualmente, independentes, devendo cada qual zelar por sua função típica que o ordenamento
constitucional lhes outorgou.
Tanto isso é verdade, que o próprio legislador, quando da edição da Lei nº 8.213/91, concedeu
à autoridade administrativa, em seu art. 41, § 6º, o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para
efetuar o pagamento da primeira renda mensal do benefício, após a apresentação da
documentação necessária por parte do segurado. Na ausência de apreciação por parte da
Autarquia ou se o pleito for indeferido, aí sim, surgirá o interesse de agir, condição necessária à
propositura de ação judicial.
Entender de maneira diversa equivale, a um só tempo, em contribuir para a morosidade do
Poder Judiciário, devido ao acúmulo de um sem-número de ações e prejudicar a vida do
segurado que, tendo direito ao benefício, aguardará por anos a fio o deslinde final de sua
causa, onerando, inclusive, os cofres do INSS com o pagamento de prestações atrasadas e
respectivas verbas acessórias decorrentes de condenação judicial.
O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE nº 631.240/MG, resolvido nos
termos do artigo 543-B do CPC/73, assentou o entendimento de que a exigência de prévio
requerimento administrativo a ser formulado perante o INSS antes do ajuizamento de demanda
previdenciária não viola a garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CR/88, art.
5º, XXXV). Ressalvou-se, contudo, a possibilidade de formulação direta do pedido perante o
Poder Judiciário quando se cuidar de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção
de benefício anteriormente concedido, ou ainda, quando notório e reiterado o entendimento do
INSS em desfavor da pretensão do segurado.
O precedente restou assim ementado, verbis:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art.
5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso
haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se
caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS,
ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de
prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o
entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do
segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício
anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação
mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se
depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -,
uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito
da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo
Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em
curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que
tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado
o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de
anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha
apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à
pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas,
observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30
dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será
intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia
deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for
acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões
imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o
interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial
deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para
todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido
para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que
alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob
pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em
90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data
de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado
será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir."
(STF, RE nº 631.240/MG, Pleno, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, j. 03.09.2014, DJe
10.11.2014). (grifos nossos)
Considerado o entendimento do STF acima explicitado, o Superior Tribunal de Justiça revisitou
sua jurisprudência de modo a perfilhar o posicionamento adotado pela Suprema Corte, o que se
deu quando do julgamento do RESP nº 1.369.834/SP, resolvido nos termos do artigo 543-C do
CPC/73.
O precedente paradigmático em questão porta a seguinte ementa:
"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE. CONFIRMAÇÃO
DA JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR AO QUE DECIDIDO PELO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DO RE 631.240/MG, JULGADO SOB A
SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, sob rito do
artigo 543-B do CPC, decidiu que a concessão de benefícios previdenciários depende de
requerimento administrativo, evidenciando situações de ressalva e fórmula de transição a ser
aplicada nas ações já ajuizadas até a conclusão do aludido julgamento (03/9/2014).
2. Recurso especial do INSS parcialmente provido a fim de que o Juízo de origem aplique as
regras de modulação estipuladas no RE 631.240/MG. Julgamento submetido ao rito do artigo
543-C do CPC."
(STJ, RESP nº 1.369.834/SP, 1ª Seção, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 24.09.2014, DJe
02.12.2014). (grifos nossos)
Neste feito, busca-se a concessão de benefício previdenciário de auxílio-reclusão, não sendo,
portanto, a hipótese de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente
concedido. Da mesma forma, o pleito não se enquadra nos casos em que notória ou reiterada a
resistência autárquica.
O caso sub examen, contudo, detém a peculiaridade de já ter sido decidido em primeiro grau de
jurisdição. E, se assim o é, há que se fazer a necessária distinção entre a situação posta nesta
demanda e aquela presente no julgamento paradigma, de forma a se verificar a ocorrência de
similitude fática entre elas.
De fato, malgrado tenha a ação sido proposta após o precedente do C. STF, fato é que o INSS
ofereceu contestação abrangendo, tão somente, o mérito, de forma a caracterizar resistência à
pretensão formulada, havendo, ainda, o exaurimento da fase instrutória, com a produção de
provas e manifestação das partes, tudo a ensejar a prolação de sentença de mérito.
Foge à razoabilidade, portanto, reabrir-se a instrução processual na hipótese em que
aperfeiçoados - com a observância do contraditório - todos os atos probatórios, situação que,
em boa medida, desprestigiaria o princípio da duração razoável do processo, alçado, inclusive,
a preceito constitucional.
Em casos análogos, o Superior Tribunal de Justiça assim decidiu:
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
NECESSIDADE DE PRÉVIA POSTULAÇÃO DO BENEFÍCIO NA VIA ADMINISTRATIVA.
ALEGAÇÃO DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR. JULGAMENTO DAS QUESTÕES DE
MÉRITO NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. DIREITO AO BENEFÍCIO RECONHECIDO
JUDICIALMENTE. TEORIA DAS DISTINÇÕES.
1. Hipótese na qual busca o INSS, via recurso especial, seja o processo extinto, sem
julgamento do mérito, por ofensa aos artigos 3º e 267 do CPC porque a parte não fez o prévio
requerimento do benefício na via administrativa.
2. No caso dos autos, o Juízo de primeiro grau julgou procedente o pedido e concedeu o
benefício, o que se distingue do que decidido no RE n. 631.240/MG. Nesse sentido, confiram-
se: AgRg no AREsp 377.316/MG, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe
24/03/2015; AgRg no AREsp 254.264/PR, Rel. Ministra Marga Tessler (Juíza Federal
convocada do TRF 4ª Região), Primeira Turma, DJe 18/05/2015.
3. Hipótese distinta da apreciada pelo STF no RE 631.240/MG, razão pela qual inaplicável o
determinado pela Suprema Corte ao processo em análise.
(AgRg no AREsp nº 370.852/PR, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Turma, DJe 15/06/2015).
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PRÉVIO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DO RE 631.240/MG. TEORIA DAS DISTINÇÕES
(DISTINGUISHING).
I - Decisão agravada que afastou a aplicação do RE 631.240/MG no caso em que houve
julgamento com resolução de mérito na instância ordinária e determinada a implantação do
benefício previdenciário.
II - Aplicação da teoria das distinções (distinguishing) face à ausência de similitude fática,
porquanto o precedente do Supremo Tribunal Federal foi firmado em ação na qual não houve
julgamento com resolução de mérito.
III - A anulação do acórdão e da sentença, com a reabertura da discussão de mérito, não se
apresenta razoável, na medida em que o INSS teve a oportunidade de analisar e manifestar-se
tecnicamente sobre o caso, à luz das provas produzidas, e quedou-se inerte, limitando-se a
defender a ausência de interesse de agir.
IV - Agravo Regimental improvido".
(AgRg no AREsp nº 377.316/MG, Rel. Ministra Regina Helena Costa, 1ª Turma, DJe
24/03/2015).
Dessa forma, reconheço a ausência de similitude fática entre o caso ora posto a julgamento e o
precedente firmado pelo STF, razão pela qual se revela desnecessária, aqui, a prévia
postulação administrativa.
Avanço no meritum causae.
A respeito do auxílio-reclusão, a cobertura do evento está assegurada no art. 201, IV, da
Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, no art. 80, que o auxílio-reclusão “cumprida a carência prevista no
inciso IV do caput do art. 25 desta Lei, será devido, nas condições da pensão por morte, aos
dependentes do segurado de baixa renda recolhido à prisão em regime fechado que não
receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de pensão por
morte, de salário-maternidade, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço”
(redação dada pela Lei nº 13.846/2019).
Trata-se, portanto, de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado recluso
constantes no art. 16 da LBPS.
Os critérios para a concessão estão disciplinados nos artigos 116 a 119 do Decreto nº 3.048/99,
que aprovou o Regulamento da Previdência Social.
O benefício, até a edição da Lei nº 13.846/2019, independia de carência, destacando-se que,
nos dias presentes, exige-se o implemento de 24 (vinte e quatro) contribuições mensais.
Ademais, para sua concessão, faz-se imperioso o cumprimento dos seguintes requisitos: a)
recolhimento à prisão do segurado; b) manutenção da qualidade de segurado do recluso; c)
baixa renda do segurado; e d) dependência econômica do postulante.
A comprovação da privação de liberdade, que deve, atualmente, ser obrigatoriamente em
regime fechado (admitindo-se, todavia, o regime semiaberto nos casos em que o requerimento
do benefício se der em momento anterior às alterações promovidas pela Lei nº 13.846/2019),
dar-se-á por meio de certidão do efetivo recolhimento à prisão firmada pela autoridade
competente, a ser apresentada trimestralmente.
A manutenção da qualidade de segurado se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele
que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a
doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos
do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Acerca do requisito da baixa renda, muito se discutiu se este se referia aos dependentes ou ao
próprio segurado preso, tendo o Supremo Tribunal Federal apreciado a matéria em âmbito de
repercussão geral, cujo julgado restou assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-
RECLUSÃO. ART. 201, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO
DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO-RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS
SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998.
SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO PROVIDO.
I - Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é que a deve
ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes.
II - Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que
restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio-reclusão, a qual adotou o critério da
seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários.
III - Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da
inconstitucionalidade.
IV - Recurso extraordinário conhecido e provido.
(RE 587365, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 25/03/2009, DJE 08/05/2009).
Desta forma, considera-se baixa renda aquela de valor bruto mensal igual ou inferior ao limite
legal, considerado o último salário de contribuição percebido pelo segurado à época da sua
prisão.
Originalmente, o limite legal foi fixado em R$ 360,00, pela EC nº 20/98, sendo, atualmente,
corrigido pelo Ministério da Previdência Social pelos mesmos índices aplicados aos benefícios
do Regime Geral de Previdência Social.
Outro ponto importante gira em torno do segurado que não exerce atividade remunerada
abrangida pela Previdência Social quando do seu encarceramento.
Tal questão restou decidida pelo C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do
Recurso Especial nº 1.485.417/MS, sob a sistemática dos recursos representativos de
controvérsia (Tema 896), que fixou a seguinte tese:
"Para a concessão de auxílio-reclusão (art. 80 da Lei 8.213/1991), o critério de aferição de
renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do recolhimento
à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição." (REsp 1.485.417/MS,
Rel. Min. Herman Benjamin, j. 22/11/2017, v.u., DJe 02/02/2018).
Registro, por oportuno, que o acórdão do Recurso Especial em questão fora objeto da
interposição de Recurso Extraordinário, tendo sido modificado pelo STF no ARE nº
1.122.222/SP, sob o fundamento de que a tese é contrária à jurisprudência daquela Casa,
ocasião em que passei a admitir, então, o último salário de contribuição vertido pelo recluso.
No entanto, sobreveio decisão da Corte Suprema, assentando que a controvérsia envolvendo
os critérios legais de aferição de renda do segurado, para fins de percepção do benefício de
auxílio-reclusão, envolve matéria de índole infraconstitucional, afastada, portanto, a existência
de repercussão geral a reclamar posicionamento daquela Corte (ARE nº 1.163.485/SP).
Dessa forma, resta preservada a decisão proferida no Tema nº 896.
Insta consignar, por oportuno, que a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça
instaurou procedimento de revisão da tese firmada no tema em questão, decidindo pela sua
reafirmação, ressaltando, contudo, que o regime jurídico objeto da controvérsia é o anterior à
inclusão do § 4º do art. 80 da Lei nº 8.213/1991, pela Lei nº 13.846/2019.
Isso porque, sobredito parágrafo instituiu novo critério de aferição da renda mensal bruta para
fins de enquadramento do segurado como de baixa renda, qual seja, a média dos salários de
contribuição apurados no período de 12 (doze) meses anteriores ao mês do recolhimento à
prisão.
Com isso, após processo de revisão, a tese repetitiva relativa ao Tema 896/STJ restou assim
definida:
“Para a concessão de auxílio-reclusão (art. 80 da Lei 8.213/1991) no regime anterior à vigência
da MP 871/2019, o critério de aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral
remunerada no momento do recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário
de contribuição.” (REsp 1842985/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 24/02/2021, DJe 01/07/2021)-
Do caso concreto.
O recolhimento à prisão e os requisitos relativos à qualidade de segurado do recluso e
dependência econômica dos postulantes menores restaram comprovados, conforme certidão de
recolhimento prisional (ID 3444506 - Pág. 14 e 142), cópia da CTPS e extrato do CNIS (ID
3444506 - Pág. 29/39 e 50/51) e cópia da certidão de nascimento dos autores Sayane Moreira
Gaspechacka e Luis Samuel Moreira Gaspechaka (ID3444506 - Pág. 22 e 72).
A celeuma cinge-se quanto à qualidade de companheira da coautora Marinalva e ao requisito
da baixa renda.
Nos termos do art. 16, inciso I, da Lei nº 8.213/91, com a redação vigente à época dos fatos,
são dependentes do segurado: “o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não
emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha
deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim
declarado judicialmente;”.
O §3º do art. 16 da Lei de Benefícios dispõe que: "Considera-se companheira ou companheiro a
pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de
acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal".
Por sua vez, o Decreto nº 3.048/99, no seu art. 16, § 6º, com a redação vigente à época,
considera união estável "aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar,
quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em
comum, enquanto não se separarem.".
Já a Lei nº 9.278/96, que regulamenta o art. 226, § 3º da Constituição Federal, dispõe que: "É
reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem
e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família". Saliente-se que referido
conceito consta da atual redação do §6º do art. 16 do RPS e no art. 1.723 do CC.
De acordo com a narrativa delineada na petição inicial, a coautora Marinalva mantinha união
estável com o recluso na data do recolhimento prisional.
Para a comprovação do alegado, foram coligidos aos autos os seguintes documentos:
a) Contrato particular de convivência, celebrado em 23/02/2015, entre o Sr. Luis Fernando
Ferreira Gaspechaka e a coautora Marinalva, no qual declaram que “vivem em união estável
desde 01 de janeiro de 2010” (ID 3444506 - Pág. 15/16);
b) Termo de adesão ao plano de saúde médico hospitalar em nome do Sr. Luis Fernando, sem
data, mas com assinaturas e relativo a plano empresarial – empresa “Energetíca Santa Helena
Ltda.”, com admissão em 05/01/2012, no qual aquele foi qualificado como casado e constam
como dependentes Marinalva (cônjuge) (ID 3444506 - Pág. 18);
c) Certidão de nascimento de Sayane Moreira Gaspechacka e Luis Samuel Moreira
Gaspechaka, filhos da autora e do recluso, nascidos, respectivamente, em 05/05/2011 e
08/09/2015 (ID 3444506 - Pág. 22 e 72);
d) Comprovantes de endereço em comum sito à Av. Rio Brilhante, 1029 (ID 3444506 - Pág.
42/43).
À exceção do contrato particular de convivência celebrado após o recolhimento prisional,
registro que constitui início razoável de prova material os documentos acima apontados que
foram devidamente corroborados por idônea e segura prova coletada em audiência realizada
em 15/08/2016, na qual foi ouvida uma testemunha.
A Sra. Sueli Luzia Molinari asseverou que a coautora Marinalva é casada com o Sr. Luiz
Fernando há 05 (cinco) anos, desde quando os conhece, tendo ambos dois filhos. O Fernando
está preso. Não sabe se ele teve filhos de outro relacionamento. Afirmou que ambos andavam
na rua, no mercado, no Posto de Saúde como casados.
Os relatos são convincentes no sentido de que a Sra. Marinalva e o Sr. Luiz Fernando
conviviam como marido e mulher, em união pública e duradoura, com o intuito de formarem
família à época do encarceramento, não havendo nos autos quaisquer outros elementos que
indiquem a inexistência da união estável.
Portanto, é possível concluir, pela dilação probatória e demais documentos juntados, mormente
pela prova oral, com fundamento nas máximas de experiência, conforme disciplina o artigo 375,
do Código de Processo Civil, que a coautora Marinalva era companheira do segurado recluso.
Diante disso, havendo nos autos elementos de convicção que comprovam a união estável e
duradoura entre a demandante e o recluso, a dependência econômica é presumida, nos termos
do art. 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91, e só cederia mediante a produção de robusta prova em
contrário, o que não se observa no caso.
Ressalto que, realizado estudo social, a autora informou fazer visitas periódicas ao recluso,
levando consigo o coautor Luis Samuel (ID 3444507 - Pág. 53/59).
No tocante ao requisito da baixa renda, da análise dos autos, verifica-se que o recolhimento à
prisão do segurado se deu em 24/11/2014 e o último vínculo empregatício se iniciou em
05/01/2012, sem data de saída, mas com última remuneração em 09/2014, conforme extrato do
CNIS já mencionado.
Infere-se, do mesmo banco de dados, que o segurado recebeu remunerações superiores a
R$1.000,00 nas competências 03/2012 a 08/2014, de modo que, a despeito de inexistir
anotação do término do vínculo empregatício, tem-se que este ocorreu na competência
09/2014, em razão do ordenado auferido, na ordem de R$252,26, correspondente, portanto, a
eventual resíduo.
Assim, estando desempregado quando da reclusão, tem-se a ausência de renda, se aplicando
o entendimento consagrado pelo C. STJ, no julgamento do Resp nº 1.485.417/MS,
representativo de controvérsia, mantido em sede de revisão da tese repetitiva (Tema 896).
Desta feita, vislumbra-se, portanto, que todos os requisitos necessários à concessão do
benefício previdenciário pleiteado foram cumpridos.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do recolhimento prisional (24/11/2014),
em relação à coautora Sayane Moreira Gaspechacka, uma vez que se trata de dependente
absolutamente incapaz, contra a qual não corre prescrição, nos termos do art. 198, I, do Código
Civil.
Quanto à coautora Marinalva Moreira da Silva deve ser fixado na data do requerimento
administrativo (24/02/2015 - ID 3444506 - Pág. 105), eis que formulado fora do prazo legal (art.
74, I, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97).
Por fim, para o coautor Luis Samuel Moreira Gaspechacka o benefício é devido desde a data do
seu nascimento (08/09/2015), vez que nascido quando o segurado já estava recluso.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir
as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Mantida a condenação da autarquia no pagamento das custas, eis que, em se tratando de
processos tramitados perante a Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, deve ser observado o
disposto na Lei Estadual n.º 3.779, de 11.11.2009, que em seu artigo 24, §1º expõe que a
isenção do recolhimento da taxa judiciária não se aplica ao INSS.
Ante o exposto, rejeito a preliminar de falta de interesse de agir e, no mérito, dou parcial
provimento à apelação do INSS, para fixar o termo inicial do benefício na data do requerimento
administrativo (24/02/2015), em relação à coautora Marinalva Moreira da Silva, e, em relação ao
coautor Luis Samuel Moreira Gaspechacka, na data do seu nascimento (08/09/2015), e para
estabelecer que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão
fixados de acordo com Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça
Federal, e, de ofício, determino que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser
calculada de acordo com o mesmo Manual até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de
quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, mantendo, no mais, a r. sentença
de 1º grau de jurisdição, por fundamento diverso.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. PRÉVIO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA) E STF (REPERCUSSÃO GERAL). INAPLICABILIDADE. DISTINÇÃO.
FEITO JULGADO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA.
QUALIDADE DE SEGURADO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. COMPANHEIRA E FILHOS.
PROVA MATERIAL E TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO. DESEMPREGO. BAIXA RENDA.
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (RESP 1.485.417/MS).
TEMA 896. REGIME ANTERIOR À VIGÊNCIA DA MP 871/2019. TERMO INICIAL. DATA DO
RECOLHIMENTO PRISIONAL (AUTORA ABSOLUTAMENTE INCAPAZ). DATA DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO (AUTORA MAIOR E CAPAZ). DATA DO NASCIMENTO
(AUTOR NASCIDO APÓS A RECLUSÃO). CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
CUSTAS. MATO GROSSO DO SUL. PRELIMINAR REJEITADA E, NO MÉRITO, APELAÇÃO
DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA, POR FUNDAMENTO
DIVERSO.
1 - O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE nº 631.240/MG, resolvido
nos termos do artigo 543-B do CPC/73, assentou o entendimento de que a exigência de prévio
requerimento administrativo a ser formulado perante o INSS antes do ajuizamento de demanda
previdenciária não viola a garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CR/88, art.
5º, XXXV). Ressalvou-se, contudo, a possibilidade de formulação direta do pedido perante o
Poder Judiciário quando se cuidar de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção
de benefício anteriormente concedido, ou ainda, quando notório e reiterado o entendimento do
INSS em desfavor da pretensão do segurado.
2 - Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça revisitou sua jurisprudência de modo a
perfilhar o posicionamento adotado pela Suprema Corte, o que se deu quando do julgamento do
RESP nº 1.369.834/SP, resolvido nos termos do artigo 543-C do CPC/73.
3 - Neste feito, busca-se a concessão de benefício previdenciário de auxílio-reclusão, não
sendo, portanto, a hipótese de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício
anteriormente concedido. Da mesma forma, o pleito não se enquadra nos casos em que notória
ou reiterada a resistência autárquica.
4 -O caso sub examen, contudo, detém a peculiaridade de já ter sido decidido em primeiro grau
de jurisdição. E, se assim o é, há que se fazer a necessária distinção entre a situação posta
nesta demanda e aquela presente no julgamento paradigma, de forma a se verificar a
ocorrência de similitude fática entre elas.
5 - Malgrado tenha a ação sido proposta após o precedente do C. STF, fato é que o INSS
ofereceu contestação abrangendo, tão somente, o mérito, de forma a caracterizar resistência à
pretensão formulada, havendo, ainda, o exaurimento da fase instrutória, com a produção de
provas e manifestação das partes, tudo a ensejar a prolação de sentença de mérito.
6 - Foge à razoabilidade, portanto, reabrir-se a instrução processual na hipótese em que
aperfeiçoados - com a observância do contraditório - todos os atos probatórios, situação que,
em boa medida, desprestigiaria o princípio da duração razoável do processo, alçado, inclusive,
a preceito constitucional. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
7 - Reconhecida a ausência de similitude fática entre o caso ora posto a julgamento e o
precedente firmado pelo STF, razão pela qual se revela desnecessária, aqui, a prévia
postulação administrativa.
8 - O auxílio-reclusão “cumprida a carência prevista no inciso IV do caput do art. 25 desta Lei,
será devido, nas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado de baixa renda
recolhido à prisão em regime fechado que não receber remuneração da empresa nem estiver
em gozo de auxílio-doença, de pensão por morte, de salário-maternidade, de aposentadoria ou
de abono de permanência em serviço” (Art. 80 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei
nº 13.846/2019).
9 - Os critérios para a concessão estão disciplinados nos artigos 116 a 119 do Decreto nº
3.048/99, que aprovou o Regulamento da Previdência Social.
10 - O benefício, até a edição da Lei nº 13.846/2019, independia de carência, destacando-se
que, nos dias presentes, exige-se o implemento de 24 (vinte e quatro) contribuições mensais.
Ademais, para sua concessão, faz-se imperioso o cumprimento dos seguintes requisitos: a)
recolhimento à prisão do segurado; b) manutenção da qualidade de segurado do recluso; c)
baixa renda do segurado; e d) dependência econômica do postulante.
11 - A comprovação da privação de liberdade, que deve, atualmente, ser obrigatoriamente em
regime fechado (admitindo-se, todavia, o regime semiaberto nos casos em que o requerimento
do benefício se der em momento anterior às alterações promovidas pela Lei nº 13.846/2019),
dar-se-á por meio de certidão do efetivo recolhimento à prisão firmada pela autoridade
competente, a ser apresentada trimestralmente.
12 - A manutenção da qualidade de segurado se dá, mesmo sem recolher as contribuições,
àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável,
a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e
quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120
(cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua
vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
13 - Acerca do requisito da baixa renda, decidiu o STF em sede de repercussão geral, que "a
renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do
benefício e não a de seus dependentes" (RE 587365, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j.
25/03/2009, DJE 08/05/2009).
14 - Considera-se baixa renda aquela de valor bruto mensal igual ou inferior ao limite legal,
considerado o último salário de contribuição percebido pelo segurado à época da sua prisão.
15 - Originalmente, o limite legal foi fixado em R$ 360,00, pela EC nº 20/98, sendo, atualmente,
corrigido pelo Ministério da Previdência Social pelos mesmos índices aplicados aos benefícios
do regime geral de previdência social.
16 - Outro ponto importante gira em torno do segurado que não exerce atividade remunerada
abrangida pela Previdência Social quando do seu encarceramento. Tal questão restou decidida
pelo C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Recurso Especial nº
1.485.417/MS, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia, que fixou a
seguinte tese: "Para a concessão de auxílio-reclusão (art. 80 da Lei 8.213/1991), o critério de
aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do
recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição." (REsp
1.485.417/MS, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 22/11/2017, v.u., DJe 02/02/2018).
17 - Insta consignar que a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça instaurou
procedimento de revisão da tese firmada no tema em questão, decidindo pela sua reafirmação,
ressaltando, contudo, que o regime jurídico objeto da controvérsia é o anterior à inclusão do §
4º do art. 80 da Lei nº 8.213/1991, pela Lei nº 13.846/2019.
18 - O recolhimento à prisão e os requisitos relativos à qualidade de segurado do recluso e
dependência econômica dos postulantes menores restaram comprovados, conforme certidão de
recolhimento prisional, cópia da CTPS e extrato do CNIS e cópia da certidão de nascimento dos
autores Sayane Moreira Gaspechacka e Luis Samuel Moreira Gaspechaka.
19 - A celeuma cinge-se quanto à qualidade de companheira da coautora Marinalva e ao
requisito da baixa renda.
20 - Nos termos do art. 16, inciso I, da Lei nº 8.213/91, com a redação vigente à época dos
fatos, são dependentes do segurado: “o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não
emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha
deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim
declarado judicialmente;”.
21 - O §3º do art. 16 da Lei de Benefícios dispõe que: "Considera-se companheira ou
companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a
segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal".
22 - Por sua vez, o Decreto nº 3.048/99, no seu art. 16, § 6º, com a redação vigente à época,
considera união estável "aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar,
quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em
comum, enquanto não se separarem.".
23 - Já a Lei nº 9.278/96, que regulamenta o art. 226, § 3º da Constituição Federal, dispõe que:
"É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um
homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família". Saliente-se que
referido conceito consta da atual redação do §6º do art. 16 do RPS e no art. 1.723 do CC.
24 - De acordo com a narrativa delineada na petição inicial, a coautora Marinalva mantinha
união estável com o recluso na data do recolhimento prisional.
25 - Para a comprovação do alegado, foram coligidos aos autos documentos, os quais, à
exceção do contrato particular de convivência celebrado após o recolhimento prisional,
constituem início razoável de prova material e foram devidamente corroborados por idônea e
segura prova coletada em audiência realizada em 15/08/2016, na qual foi ouvida uma
testemunha.
26 - Os relatos são convincentes no sentido de que a Sra. Marinalva e o Sr. Luiz Fernando
conviviam como marido e mulher, em união pública e duradoura, com o intuito de formarem
família à época do encarceramento, não havendo nos autos quaisquer outros elementos que
indiquem a inexistência da união estável.
27 - Possível concluir, pela dilação probatória e demais documentos juntados, mormente pela
prova oral, com fundamento nas máximas de experiência, conforme disciplina o artigo 375, do
Código de Processo Civil, que a coautora Marinalva era companheira do segurado recluso.
28 - Diante disso, havendo nos autos elementos de convicção que comprovam a união estável
e duradoura entre a demandante e o recluso, a dependência econômica é presumida, nos
termos do art. 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91, e só cederia mediante a produção de robusta prova
em contrário, o que não se observa no caso.
29 - Realizado estudo social, a autora informou fazer visitas periódicas ao recluso, levando
consigo o coautor Luis Samuel.
30 - No tocante ao requisito da baixa renda, da análise dos autos, verifica-se que o
recolhimento à prisão do segurado se deu em 24/11/2014 e o último vínculo empregatício se
iniciou em 05/01/2012, sem data de saída, mas com última remuneração em 09/2014, conforme
extrato do CNIS já mencionado.
31 - Infere-se, do mesmo banco de dados, que o segurado recebeu remunerações superiores a
R$1.000,00 nas competências 03/2012 a 08/2014, de modo que, a despeito de inexistir
anotação do término do vínculo empregatício, tem-se que este ocorreu na competência
09/2014, em razão do ordenado auferido, na ordem de R$252,26, correspondente, portanto, a
eventual resíduo.
32 - Assim, estando desempregado quando da reclusão, tem-se a ausência de renda, se
aplicando o entendimento consagrado pelo C. STJ, no julgamento do Resp nº 1.485.417/MS,
representativo de controvérsia, mantido em sede de revisão da tese repetitiva (Tema 896).
33 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do recolhimento prisional
(24/11/2014), em relação à coautora Sayane Moreira Gaspechacka, uma vez que se trata de
dependente absolutamente incapaz, contra a qual não corre prescrição, nos termos do art. 198,
I, do Código Civil. Quanto à coautora Marinalva Moreira da Silva deve ser fixado na data do
requerimento administrativo (24/02/2015), eis que formulado fora do prazo legal (art. 74, I, da
Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97). Por fim, para o coautor Luis Samuel
Moreira Gaspechacka o benefício é devido desde a data do seu nascimento (08/09/2015), vez
que nascido quando o segurado já estava recluso.
34 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
35 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
36 - Mantida a condenação da autarquia no pagamento das custas, eis que, em se tratando de
processos tramitados perante a Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, deve ser observado o
disposto na Lei Estadual n.º 3.779, de 11.11.2009, que em seu artigo 24, §1º expõe que a
isenção do recolhimento da taxa judiciária não se aplica ao INSS.
37 - Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação do INSS parcialmente provida. Correção
monetária alterada de ofício. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar de falta de interesse de agir e, no mérito, dar parcial
provimento à apelação do INSS, para fixar o termo inicial do benefício na data do requerimento
administrativo (24/02/2015), em relação à coautora Marinalva Moreira da Silva, e, em relação ao
coautor Luis Samuel Moreira Gaspechacka, na data do seu nascimento (08/09/2015), e para
estabelecer que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão
fixados de acordo com Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça
Federal, e, de ofício, determinar que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser
calculada de acordo com o mesmo Manual até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de
quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, mantendo, no mais, a r. sentença
de 1º grau de jurisdição, por fundamento diverso, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
