Processo
AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO / SP
5004889-57.2018.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
24/06/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 02/07/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO.
EVENTUAL IRREGULARIDADE. DÉBITO. DESCONTO. INSS. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ
NÃO AFASTADA. TEMA 979 STJ. SUSPENSÃO DE EXIGIBILIDADE. CABIMENTO. TUTELA
ANTECIPADA INDEFERIDA. ARTIGO 300 DO CPC. REQUISITOS PRESENTES. DECISÃO
AGRAVADA REFORMADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.
1. Recurso conhecido, nos termos do artigo 1.015, I, do CPC.
2. É entendimento consolidado da Egrégia 10ª. Turma desta Corte, que é defeso à Autarquia
exigir a devolução dos valores já pagos, pois, o C. STF decidiu que são irrepetíveis, quando
percebidas de boa-fé, as prestações previdenciárias, em função da sua natureza alimentar.
3. O recebimento de boa-fé de valores a título de benefício previdenciário, pelo segurado ou
beneficiário, não são passíveis de devolução posto que se destinam à sua própria sobrevivência,
circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
4. A Primeira Seção do E. STJ, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 979),
salvaguardou a boa-fé do segurado.
5. Não demonstrada a ausência de boa-fé da segurada/agravante, não prosperam as alegações
da Autarquia quanto à cobrança do alegado débito a título de benefício assistencial.
6. Agravo de instrumento provido.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº5004889-57.2018.4.03.0000
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
AGRAVANTE: IZAURA TEODORO NASCIMENTO, TAMYLY NASCIMENTO DA SILVA
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº5004889-57.2018.4.03.0000
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
AGRAVANTE: IZAURA TEODORO NASCIMENTO, TAMYLY NASCIMENTO DA SILVA
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de agravo de
instrumento, com pedido de tutela antecipada recursal, interposto em face de r. decisão que,
nos autos do PJE 5002774-75.2017.4.03.6183, ação anulatória de débito, objetivando a
suspensão/anulação dos débitos cobrados pelo INSS, a título de benefício assistencial,
indeferiu a tutela antecipada.
Sustentam as agravantes, em síntese, que a Autarquia não está autorizada a proceder aos
descontos em verbas que ostentem nítido caráter alimentar, sobretudo quando a invasão
ultrapassar os limites daquilo que compõe o mínimo existencial. Aduz que a irrepetibilidade dos
alimentos, embora não constitua regra escrita do Direito brasileiro, está consagrada pelo
entendimento dos Tribunais pátrios, assim como pelo entendimento doutrinário, de forma que
sua revogação não pode ser afirmada a partir de texto legal inespecífico, nem pode ser
relativizada na via administrativa. Requer a concessão da tutela antecipada recursal e, ao final,
provimento do recurso com a reforma da r. decisão agravada.
Intimado, o Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso com a reforma da
decisão agravada.
Determinado o sobrestamento do recurso até a apreciação da questão pelo E. STJ – Tema 979.
Embargos de declaração, opostos pelas agravantes, acolhidos com efeitos integrativos, e
deferida a tutela antecipada recursal, para suspender a exigibilidade de eventuais débitos
cobrados pelo INSS, referentes ao benefício assistencial NB 87/106.872.091-0, até a
apreciação da questão pelo E. Superior Tribunal de Justiça (tema 979).
Intimadas as partes, não houve manifestação.
Ciente o Ministério Público Federal - ID 3452413.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº5004889-57.2018.4.03.0000
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
AGRAVANTE: IZAURA TEODORO NASCIMENTO, TAMYLY NASCIMENTO DA SILVA
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Conheço do recurso, nos
termos do artigo 1.015, I, do CPC.
O R. Juízo a quo indeferiu a tutela antecipada, nos seguintes termos:
“Vistos.
Postula a parte autora auferir em tutela antecipada a suspensão imediata da exigibilidade do
crédito cobrado pelo INSS, ante a boa-fé da mesma.
Recebo a petição ID 2790507 como aditamento à inicial.
Defiro os benefícios da justiça gratuita para todos os atos processuais.
A respaldar o provimento jurisdicional antecipatório mister a existência conjugada dos
pressupostos – efetivo ou, no mínimo, elevado grau de plausibilidade do direito, a
demonstração de prova convincente, e a ocorrência de grave lesão, no mais das vezes,
irreversível, apta a justificar a tutela com urgência.
Se questionável for o direito e/ou cogitada eventual ocorrência de lesão, ou, até mesmo suposto
dano que já vem sendo perpetrado - é certo, segundo ponto de vista da parte interessada –
mas, permissível a correção através de mera recomposição patrimonial, são hipóteses a não
autorizar o deferimento da tutela desde o início, já quando da propositura da ação.
Na hipótese dos autos, pelos fundamentos acima deduzidos e, dada a situação fática, não
verificada a existência conjunta dos requisitos necessários a tanto. Melhor se faz o implemento
do contraditório e a eventual realização de outras provas, cuja pertinência será posteriormente
verificada, restando consignado que tal pleito irá ser analisado somente quando do julgamento
definitivo, em cognição exauriente.
Diante do exposto, INDEFIRO o pedido de antecipação de tutela.
(...)”.
É contra esta decisão que aagravantese insurge.
Razão lheassiste.
Da análise dos autos, a agravante era titular do benefício de amparo social a deficiente NB
87/106.872.091-0, com termo inicial em 13/06/1997. O INSS expediu ofício informando a
presença de irregularidades no recebimento do benefício, considerando que a renda per capita
teria excedido o limite exigido pela lei de até ¼ do salário-mínimo, em razão da renda da
genitora/curadora decorrente de auxílio-doença, DIB 02/07/2014 e vínculos empregatícios
desde 2002. Sustenta a Autarquia, recebimento indevido do benefício assistencial, pela
agravante, ensejando o débito de R$ 52.451,50.
Com efeito, o C. Supremo Tribunal Federal decidiu no sentido de ser desnecessária a
restituição dos valores recebidos de boa-fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do
princípio da irrepetibilidade dos alimentos, conforme julgados abaixo transcritos:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO
COM AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR. RECEBIMENTO
DE BOA - FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA
REVOGADA. DEVOLUÇÃO. (g.n.)
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário
recebido de boa - fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à
repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar . Precedentes.
2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente
recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº
8.213/1991. Precedentes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, ARE 734242 AgR, Relator Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em
04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015);
AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TCU QUE
DETERMINOU A IMEDIATA INTERRUPÇÃO DO PAGAMENTO DA URP DE FEVEREIRO DE
1989 (26,05%). EXCLUSÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA RECONHECIDA POR DECISÃO
JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE
BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA
LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido do descabimento da restituição
de valores percebidos indevidamente em circunstâncias, tais como a dos autos, em que o
servidor público está de boa-fé. (Precedentes: MS 26.085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal
Pleno, DJe 13/6/2008; AI 490.551-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 3/9/2010).
2. A boa-fé na percepção de valores indevidos bem como a natureza alimentar dos mesmos
afastam o dever de sua restituição.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, MS 25921 AgR, Relator Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 01/12/2015,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-060 DIVULG 01-04-2016 PUBLIC 04-04-2016)".
O Pleno do STF, ao julgar o RE 638.115, novamente decidiu pela irrepetibilidade dos valores
recebidos de boa-fé até a data do julgamento, conforme a ata de julgamento de 23.03.2015,
abaixo transcrita:
“Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, apreciando o tema 395 da repercussão
geral, conheceu do recurso extraordinário, vencidos os Ministros Rosa Weber, Luiz Fux,
Cármen Lúcia e Celso de Mello. Em seguida, o Tribunal, por maioria, deu provimento ao
recurso extraordinário, vencidos os Ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello. O
Tribunal, por maioria, modulou os efeitos da decisão para desobrigar a devolução dos valores
recebidos de boa - fé pelos servidores até esta data, nos termos do voto do relator, cessada a
ultra-atividade das incorporações concedidas indevidamente, vencido o Ministro Marco Aurélio,
que não modulava os efeitos da decisão. Impedido o Ministro Roberto Barroso . Presidiu o
julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 19.03.2015.
(RE 638115, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 19/03/2015, processo
eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-151 divulg 31-07-2015 public 03-08-2015)".
Neste passo, é entendimento consolidado da Egrégia 10ª. Turma desta Corte, que é defeso à
Autarquia exigir a devolução dos valores já pagos, pois, conforme acima exposto, o C. STF
decidiu que são irrepetíveis, quando percebidas de boa-fé, as prestações previdenciárias, em
função da sua natureza alimentar.
É dizer, o recebimento de boa-fé de valores a título de benefício previdenciário, pelo segurado
ou beneficiário, não são passíveis de devolução posto que se destinam à sua própria
sobrevivência, circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
Acresce relevar, ainda, que a Primeira Seção do E. STJ, em julgamento sob o rito dos recursos
repetitivos (Tema 979), salvaguardou a boa-fé do segurado, conforme tese fixada:
“Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por
cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o
segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com
demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.”
O colegiado acompanhou o voto do relator, Ministro Benedito Gonçalves, para quem, na análise
dos casos de erro material ou operacional, deve-se averiguar a presença da boa-fé do
segurado, concernente à sua aptidão para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade
do pagamento.
Houve modulação dos efeitos da decisão, que será aplicada aos processos distribuídos na
primeira instância a partir da publicação do acórdão (23/4/2021).
Neste passo, não demonstrada a ausência de boa-fé da segurada/agravante, não prosperam as
alegações da Autarquia quanto à cobrança do alegado débito a título de benefício assistencial.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO, para suspender a
exigibilidade de eventuais débitos cobrados pelo INSS, referentes ao benefício assistencial NB
87/106.872.091-0, na forma da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO.
EVENTUAL IRREGULARIDADE. DÉBITO. DESCONTO. INSS. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ
NÃO AFASTADA. TEMA 979 STJ. SUSPENSÃO DE EXIGIBILIDADE. CABIMENTO. TUTELA
ANTECIPADA INDEFERIDA. ARTIGO 300 DO CPC. REQUISITOS PRESENTES. DECISÃO
AGRAVADA REFORMADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.
1. Recurso conhecido, nos termos do artigo 1.015, I, do CPC.
2. É entendimento consolidado da Egrégia 10ª. Turma desta Corte, que é defeso à Autarquia
exigir a devolução dos valores já pagos, pois, o C. STF decidiu que são irrepetíveis, quando
percebidas de boa-fé, as prestações previdenciárias, em função da sua natureza alimentar.
3. O recebimento de boa-fé de valores a título de benefício previdenciário, pelo segurado ou
beneficiário, não são passíveis de devolução posto que se destinam à sua própria
sobrevivência, circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
4. A Primeira Seção do E. STJ, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 979),
salvaguardou a boa-fé do segurado.
5. Não demonstrada a ausência de boa-fé da segurada/agravante, não prosperam as alegações
da Autarquia quanto à cobrança do alegado débito a título de benefício assistencial.
6. Agravo de instrumento provido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
