Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001506-47.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
05/12/2018
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 13/12/2018
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE DE CONVERTER O
JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA.
I - Embora a renda familiar per capita seja inferior a um salário mínimo mesmo sem levar em
consideração as despesas com a saúde do autor, verifica-se na divergência inaugurada pelo
Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfírio que um dos argumentos para a não
caracterização da hipossuficiência econômica do autor é que a Caixa de Assistência dos
Servidores do Estado do Mato Grosso do Sul assume o reembolso de alguns procedimentos
médicos e de alguns remédios, contudo observo que tal proceder não se verificou em todas as
ocasiões, como se pode ver do indeferimento de pedido de reembolso para exame
eletroencefalograma.
II - Feito retirado de pauta, para o fim de converter o julgamento em diligência, para efeito de que
seja elaborado novo estudo social, contendo demonstrativo detalhado dos gastos que
efetivamente o genitor do autor suporta para que lhe seja proporcionado um tratamento médico
adequado.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO (198) Nº 5001506-47.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDUARDO EMANUEL DA SILVA BALDUINO
REPRESENTANTE: JAQUELINE EUGENIA DA SILVA BALDUINO
Advogado do(a) APELADO: GISELE RIBEIRO FAVERAO - MS9904,
APELAÇÃO (198) Nº 5001506-47.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDUARDO EMANUEL DA SILVA BALDUINO
REPRESENTANTE: JAQUELINE EUGENIA DA SILVA BALDUINO
Advogado do(a) APELADO: GISELE RIBEIRO FAVERAO - MS9904,
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sergio Nascimento (Relator):Trata-se de apelação de
sentença pela qual foi julgado procedente o pedido em ação para condenar o réu a conceder ao
autor o benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição da República, desde o
pedido administrativo. As prestações atrasadas serão pagas com correção monetária e juros de
mora na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal. O réu foi condenado, ainda, ao
pagamento de custas, e de honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor da
condenação até a data da sentença. Concedida a antecipação dos efeitos da tutela para a
implantação do benefício, sem cominação de multa.
A implantação do benefício foi noticiada nos autos.
O réu apela, aduzindo que não restaram preenchidos os requisitos para a concessão do benefício
em comento. Subsidiariamente, pede a fixação do termo inicial do benefício na data da juntada do
laudo pericial, e a redução dos honorários advocatícios.
Após contrarrazões, os autos vieram a esta Corte.
O d. representante do Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso, e
aplicação dos juros conforme índices de atualização da poupança, e correção monetária pelo
IPCA-E.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5001506-47.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDUARDO EMANUEL DA SILVA BALDUINO
REPRESENTANTE: JAQUELINE EUGENIA DA SILVA BALDUINO
Advogado do(a) APELADO: GISELE RIBEIRO FAVERAO - MS9904,
V O T O
Nos termos do art. 1011 do CPC/2015, recebo a apelação do INSS.
Da remessa oficial tida por interposta
Aplica-se ao caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de
reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a
sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
Do mérito
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da
República, que dispõe:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua
família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da
Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou
ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por
sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do
dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela
incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário
mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma
regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida
independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência
constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência,
limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo
186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo,
assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status
normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do
conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do
artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais
pessoas.
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93,
viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de
"pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação
atualizada:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que
tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais,
em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº
12.470, de 2011).
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso
do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive
de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do
indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício
constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a
seguinte redação:
Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a
pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de
microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 1o Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo
e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o
beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a
continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia
médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o
período de revisão previsto no caput do art. 21.
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede
constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e
'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à
concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada,
seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho,
ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, o laudo médico
pericial (06.04.2017), atesta que o autor, nascido em 05.03.2014, é portador de sequela de
paralisia cerebral espástica com retardo mental grave a profundo, hidrocefalia, e síndrome de
West, sendo completamente dependente do cuidado dos pais para sua sobrevivência. Faz-se
mister, aqui, observar o que dispõe o art. 4º, §1º, do Decreto 6.214/2007:
Art. 4o Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
§ 1o Para fins de reconhecimento do direito ao Benefício de Prestação continuada às crianças e
adolescentes menores de dezesseis anos de idade, deve ser avaliada a existência da deficiência
e o seu impacto na limitação do desempenho de atividade e restrição da participação social,
compatível com a idade.
Neste passo, em se tratando de criança, não há que se perquirir quanto à sua capacidade
laborativa, mas deve-se ter em conta as limitações que a deficiência de que é portadora impõem
ao seu desenvolvimento e a atenção especial de que necessita.
Portanto, a parte autora fará jus ao benefício assistencial caso preencha o requisito
socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com potencialidade para
'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com outras
pessoas'.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei
8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite
de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima
transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um
quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à
concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão
que recebeu a seguinte ementa:
CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O
CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A
RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE
REPORTA À LEI PARA FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO
MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ
HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE.
(STF. ADI 1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 27.08.98; D.J. 01.06.2001).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a
jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se
deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas
tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal
interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado
pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG;
Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião
do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão,
após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 -
PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua
promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com
efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas
nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios
para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de
proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. (...)
4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
(...)
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
6. Reclamação constitucional julgada improcedente.
(Rcl 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 07.02.2017, constatou que o núcleo familiar do
autor é composto por ele, genitores, e um irmão de 13 anos, e residem em casa financiada, em
boas condições de habitação, e com móveis e eletrodomésticos em boas condições de uso e
organização. Os gastos são com o tratamento do filho (algumas despesas são custeadas pelo
plano de saúde, com base em liminar que garantiu o reembolso), financiamento da casa (R$
500,00), mercado (R$ 600,00), farmácia (R$ 200,00), acrescido do valor de R$ 250,00 (quando
precisam comprar medicamento Topamax), fraldas (R$ 300,00), leite, espessante e mucilon (R$
170,00), contas de água e luz (R$ 250,00). Possuem um carro Siena 2012, utilizado para levar o
filho às terapias, com gasto de R$ 600,00 a com combustível. O pai é funcionário público no
IAGRO, com renda mensal de R$ 3.009,50, e valor líquido de R$ 1.824,75, em razão de
empréstimos consignados. A mãe está desempregada, dedicando-se aos cuidados com o filho.
Já realizaram campanhas entre familiares e amigos para conseguir pagar o tratamento do filho.
Convém ressaltar que, não obstante o rendimento do genitor, a família, composta por quatro
membros, apresenta renda “per capita” inferior a um salário mínimo, em razão de gastos altos
com o tratamento do autor, encontrando-se o grupo familiar desguarnecido.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a parte autora preenche o
requisito referente à deficiência e comprovou sua hipossuficiência econômica, fazendo jus à
concessão do benefício assistencial.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na forma fixada na sentença, na data do pedido
administrativo (22.12.2014), eis que conforme entendimento jurisprudencial.
Os juros de mora e a correção monetária serão calculados na forma da lei de regência.
Em razão do trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos do artigo
85, § 11, do Novo Código de Processo Civil de 2015, fixo os honorários advocatícios em 15%
sobre o valor das parcelas vencidas até a data da presente decisão, eis que de acordo com o
entendimento da 10ª Turma desta E. Corte.
Por fim, o STJ entendeu que a Lei Estadual nº 3.151/2005, que alterava o art. 7º da Lei Estadual
nº 1.936/1998, não tem o condão de modificar a Lei Estadual nº 3.002/2005, que trata de , e não
isentou as autarquias federais de seu pagamento no Estado de Mato Grosso do Sul (Resp:
186067, Relator: Ministro Haroldo Rodrigues, Desembargador Convocado do TJ/CE, Data de
Publicação: DJe 07/05/2010), razão pela qual fica mantida a condenação da autarquia ao
pagamento das custas.
Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS e à remessa oficial tida por interposta.
As parcelas recebidas em antecipação de tutela serão resolvidas em liquidação.
É o voto.
VOTO RETIFICADOR
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Na sessão de 25.09.2018,
apresentei voto no sentido de negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial tida por
interposta, reconhecendo o direito da parte autora ao benefício assistencial, por entender que,
não obstante o rendimento de seu genitor pudesse ser considerado razoável diante da realidade
brasileira, sem resultar, no entanto, em montante superior a 1 (um) salário mínimo a título de
renda per capita familiar, foram comprovados gastos elevados para o tratamento de seu filho, ora
autor, acometido de graves enfermidades (paralisia cerebral espástica com retardo mental grave
a profundo, hidrocefalia e síndrome de West), a evidenciar a vulnerabilidade econômica do grupo
familiar.
Na oportunidade, o Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfírio pediu vista, sendo que na
sessão de 16.10.2018, apresentou seu voto, assinalando que "...O pai do autor tem um emprego
que lhe gera um salário mensal, suficiente para o pagamento das despesas básicas de
alimentação e manutenção da residência, bem como, acesso a um plano de saúde para o
acompanhamento médico necessário. Ademais, por força de decisão judicial, esse plano de
saúde é responsável pelo pagamento de uma parcela do tratamento experimental realizados.
Consta, ainda, que por meio de ajuda de familiares e amigos o autor é submetido a diversos
tratamentos, consultas e exames de elevado custo. Conclui, por fim, que “...o caso não se
enquadra nas hipóteses de assistência social, mas sim de saúde, portanto não se encontra
abrangido pelo benefício em questão.
Na sequência, pediu vista o Exmo. Desembargador Federal Baptista Pereira, que apresentou voto
acompanhando a divergência, sendo que, na presente sessão, volto a me manifestar,
apresentando voto retificador, nos termos que seguem:
Embora a renda familiar per capita seja inferior a um salário mínimo mesmo sem levar em
consideração as despesas com a saúde do autor, verifica-se na divergência inaugurada pelo
Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfírio que um dos argumentos para a não
caracterização da hipossuficiência econômica do autor é que a Caixa de Assistência dos
Servidores do Estado do Mato Grosso do Sul assume o reembolso de alguns procedimentos
médicos e de alguns remédios, contudo observo que tal proceder não se verificou em todas as
ocasiões, como se pode ver do indeferimento de pedido de reembolso para exame
eletroencefalograma (id 1790304 pág. 35).
Diante do exposto, proponho que o feito seja retirado de pauta, para o fim de converter o
julgamento em diligência, para efeito de que seja elaborado novo estudo social, contendo
demonstrativo detalhado dos gastos que efetivamente o genitor do autor suporta para que lhe
seja proporcionado um tratamento médico adequado.
Após, cumprida a diligência pelo R. Juízo a quo, retornem os autos a esta Turma para a
apreciação do recurso de apelação interposto pelo INSS.
É o voto retificador.
PJE 5001506-47.2018.4.03.9999
VOTO-VISTA
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio: Em Sessão realizada pela Décima Turma desta
E. Corte em 25.09.2018, o Exmo. Desembargador Federal Sérgio Nascimento, relator do
processo, proferiu voto pelo desprovimento da apelação do INSS e da remessa oficial, tida por
interposta, para manter a sentença que julgou procedente o pedido e condenou o INSS a
conceder à parte autora o benefício assistencial, a partir da data do requerimento administrativo,
corrigido monetariamente, fixando honorários advocatícios em 15% sobre o valor da condenação
até a data da sentença e determinando a imediata implantação do benefício.
Solicitei vista dos autos, para melhor examinar a questão trazida à discussão.
Inicialmente, anoto que a sentença foi proferida já na vigência do Código de Processo Civil - Lei
13.105/2015 -, razão pela qual se deve observar o disposto no art. 496, §3º, I. No caso dos autos,
não obstante a sentença ser ilíquida, é certo que o proveito econômico obtido pela parte autora
não superará o valor de 1.000 salários mínimos, tendo em vista que a sentença foi prolatada em
10.05.2016 e o termo inicial da condenação foi fixado na data do requerimento administrativo
(25.09.2012), sendo o valor do benefício de 1 (um) salário mínimo, razão pela qual a remessa
oficial não deve ser conhecida.
Quanto ao mérito, verifico que não houve apelação quanto à incapacidade, razão pela qual deixo
de analisá-la.
No mais, assinale-se que o benefício aqui postulado é de natureza assistencial e deve ser
prestado a quem dele necessitar, independentemente do recolhimento de contribuições.
O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203,
V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente
e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos
recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de
condições de tê-las providas pela família:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei.".
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica
da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
"Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja
renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo."
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo
Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão,
por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de
processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e
sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de
benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento,
declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado
assim ementado:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V,
da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na
ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita
seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido pela lei teve
sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente
miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto
constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo
Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais
contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos
critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não
pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita
estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se
contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de
miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas
leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios
que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O
Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do
processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas,
econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares
econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte
do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade,
do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(RE 567985, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES,
Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 02-10-2013
PUBLIC 03-10-2013).
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo
previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições
sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
"Agravos regimentais em reclamação. Perfil constitucional da reclamação. Ausência dos
requisitos. Recursos não providos. 1. Por atribuição constitucional, presta-se a reclamação para
preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões (art. 102, inciso I,
alínea l, CF/88), bem como para resguardar a correta aplicação de súmula vinculante (art. 103-A,
§ 3º, CF/88). 2. A jurisprudência desta Corte desenvolveu parâmetros para a utilização dessa
figura jurídica, dentre os quais se destaca a aderência estrita do objeto do ato reclamado ao
conteúdo das decisões paradigmáticas do STF. 3. A definição dos critérios a serem observados
para a concessão do benefício assistencial depende de apurado estudo e deve ser verificada de
acordo com as reais condições sociais e econômicas de cada candidato à beneficiário, não sendo
o critério objetivo de renda per capta o único legítimo para se aferir a condição de miserabilidade.
Precedente (Rcl nº 4.374/PE) 4. Agravos regimentais não providos."(Rcl 4154 AgR, Relator(a):
Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 19/09/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-229
DIVULG 20-11-2013 PUBLIC 21-11-2013)
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para
aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per
capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro
abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte
decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido." (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único
parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão, pela Lei 13.146/2015, do
§ 11, no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a existir previsão legal expressa
autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e
do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício
assistencial de prestação continuada.
Dessa forma, feitas tais considerações, conclui-se que somente o cálculo da renda per capita, por
si só, não é suficiente para verificar a existência da hipossuficiência, necessária à concessão do
benefício. Há que se levar em conta todo o conjunto probatório do caso concreto.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício
pleiteado no caso vertente.
No Estudo Social, produzido em 02/2017, consta que a família é composta pela parte postulante,
seus pais e um irmão, à época com 13 anos de idade. Foi informado que o pai era funcionário
público estadual e ganhava, aproximadamente, R$ 2.400,00, mas, vinha recebendo um pouco
mais que R$ 1.800,00 líquido, tendo em vista a existência de um empréstimo para cobrir
despesas com tratamento médico. A família possuía um veículo Siena ano 2012 que ajudava no
transporte do filho para a realização das terapias e, segundo informado, os gastos com
combustível eram altos – em torno de R$ 600,00 a R$ 700,00 mensais.
Consta que o “Plano de Saúde Cassems” assume o reembolso de alguns procedimentos
médicos, por força de liminar judicial, porém, a família arca com outros gastos, como o custeio de
órteses, consultas médicas particulares, gastos com combustível até Dourados (onde realiza
acompanhamento fisioterápico, fonoaudiológico e de terapica ocupacional) e em Campo Grande
(onde realiza tratamento mensal com o método Therasuit).
Há informação “que a família empreende esforços para prover ao filho alcançar melhoria na
qualidade de vida, fortalecimento e que o mesmo possa conseguir se comunicar, mesmo que não
seja através da falar. Que seu último tratamento diferenciado, foi aplicação de Botox nos
membros inferiores, que segundo os pais, surtiu os efeitos desejados e Eduardo tem apresentado
maior firmeza nas pernas”.
Afirmam os pais que “por não terem dinheiro para custeio de certos tratamentos, já realizaram
com o apoio de amigos e familiares, campanhas, promovendo almoços beneficentes e rifas”.
De fato, para comprovar os gastos, consta dos autos extrato do empréstimo consignado que o pai
do autor menciona que é descontado em seu salário. A prestação mensal era de R$ 580,10,
sendo a primeira parcela descontada em 01.04.2016 e a última foi em 01.04.2018.
Constam, ainda, dezenas de recibos e notas fiscais de exames médicos, consultas particulares,
órteses, terapias. Os valores são variados: R$ 200,00, R$ 400,00, R$ 600,00, R$ 800,00, R$
20,00, R$ 65,00, R$ 380,00, R$ 720,00, R$ 540,00, etc.
Há, ainda, solicitações de reembolso à Cassems - Caixa de Assistência dos Servidores do Estado
de Mato Grosso do Sul - no valor de R$ 1.005,00 e de R$ 6.460,00 referentes a consultas
médicas.
Pela análise da documentação dos autos nota-se que os pais do autor não medem esforços para
prover o filho dos melhores tratamentos existentes - aprovados ou experimentais – a fim de
auxiliá-lo em sua recuperação.
Entretanto, em que pese a gravidade da doença do autor e o louvável esforço dos pais, há que se
considerar que o direito ao benefício assistencial de prestação continuada está atrelado à
situação de sensível carência material enfrentada pelo postulante, sob pena de desnaturar o
objetivo almejado pelo constituinte, isto é, dar amparo ao deficiente e ao idoso inseridos em
contextos de manifesta privação de recursos, e banalizar a utilização do instituto,
sobrecarregando, desse modo, o tão combalido orçamento da Seguridade Social.
O benefício em questão é devido àqueles que não tem condições de manutenção de suas
necessidades básicas, nem de tê-las providas por seus familiares ou por terceiros.
O pai do autor tem um emprego que lhe gera um salário mensal, suficiente para o pagamento das
despesas básicas de alimentação e manutenção da residência, bem como, acesso a um plano de
saúde para o acompanhamento médico necessário. Ademais, por força de decisão judicial, esse
plano de saúde é responsável pelo pagamento de uma parcela do tratamento experimental
realizado. Consta, ainda, que por meio de ajuda de familiares e amigos o autor é submetido a
diversos tratamentos, consultas e exames de elevado custo.
Dessa forma, não se pode dizer que o autor está desamparado materialmente, em comparação a
tantos outros casos nos quais o benefício assistencial seria a única renda possível para que uma
família possa se alimentar e pagar despesas básicas como água e luz.
Entendo que o caso não se enquadra nas hipóteses de assistência social, mas sim de saúde,
portanto não se encontra abrangido pelo benefício em questão.
Assim, no caso em apreço, entendo que não restaram satisfeitos todos os requisitos necessários
à concessão do benefício de prestação continuada contemplado no art. 203, V, do texto
constitucional, e art. 20, caput, da Lei 8.742/1993.
Ante o exposto, com a devida vênia, divirjo do E. Desembargador Federal Relator, para dar
provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido, cassando a tutela antecipada
concedida anteriormente.
Observo que, apesar do julgamento do recurso representativo de controvérsia REsp nº
1.401.560/MT, entendo que, enquanto mantido o posicionamento firmado pelo e. STF no ARE
734242 AgR, este deve continuar a ser aplicado nestes casos, afastando-se a necessidade de
devolução de valores recebidos de boa fé, em razão de sua natureza alimentar.
Honorários advocatícios pela parte autora, fixados em 10% sobre o valor da causa, observada a
condição de beneficiário da assistência judiciária gratuita, se o caso (Lei 1.060/50 e Lei
13.105/15).
É como voto.
VOTO VISTA
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, em face da
sentença que julgou procedente o pedido de benefício de prestação continuada, previsto no Art.
203, da CF/88 e regulado pelo Art. 20, da Lei nº 8.742/93, a pessoa deficiente.
Na sessão realizada no dia 25/09/2018, o Eminente Relator, Desembargador Federal Sérgio
Nascimento, apresentou seu voto no sentido de negar provimento à remessa oficial, tida por
submetida, e à apelação.
A seu turno, o Ilustre Desembargador Federal Nelson Porfirio apresentou voto divergente, dando
provimento à apelação, sob o fundamento de que o caso não se enquadra nas hipóteses de
assistência social, mas sim de saúde, porquanto não restou demonstrada a situação de carência
material a ensejar a concessão do benefício assistencial.
Para melhor refletir sobre o tema, pedi vista dos autos, e, nesta oportunidade, expresso o meu
posicionamento quanto à matéria controvertida.
Com a devida vênia, acompanho o voto dissidente.
De acordo com o Art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, a assistência social será prestada
a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, tendo por
objetivos a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência
e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
Sua regulamentação deu-se pela Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), que,
no Art. 20, caput e § 3º, estabeleceu que o benefício é devido à pessoa deficiente e ao idoso
maior de sessenta e cinco anos cuja renda familiar per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do
salário mínimo. In verbis:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou
companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros,
os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família
cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
No julgamento da ADI 1.232-1/DF, em 27.08.1998, o Tribunal Pleno do Egrégio Supremo Tribunal
Federal, por maioria (três votos a dois), entendeu que o § 3º do Art. 20 da Lei 8.742/93
estabelece critério objetivo para a concessão do benefício assistencial, vencidos, parcialmente, os
ministros Ilmar Galvão e Néri da Silveira, que, embora igualmente reconhecessem sua
constitucionalidade, conferiam-lhe interpretação extensiva, por concluir que o dispositivo apenas
instituiu hipótese em que a condição de miserabilidade da família é presumida (presunção iuris et
iure), sem, no entanto, afastar a possibilidade de utilização de outros meios para sua
comprovação.
Ao apreciar o REsp 1.112.557/MG, em 28.10.2009, sob o regime do Art. 543-C do CPC, a
Terceira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou posição na linha do voto
minoritário do E. STF, por compreender que "a limitação do valor da renda per capita familiar não
deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para
prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento
objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade
quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo", consoante a ementa que
ora colaciono:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)".
Nesse sentido pacificou-se a jurisprudência daquela Corte. Confiram-se: AgRg no Ag
1394664/SP, Relatora Ministra Laurita Vaz, 5ª Turma, DJe 03/05/2012; AgRg no Ag 1394595/SP,
Relator Ministro Og Fernandes, 6ª Turma, DJe 09/05/2012; AgRg no Ag 1425746/SP, Relator
Ministro Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 19/12/2011; AgRg no Ag 1394683/SP, Relator
Ministro Gilson Dipp, 5ª Turma, DJe 01/12/2011; AgRg no REsp 1247868/RS, Relator Ministro
Jorge Mussi, 5ª Turma, DJe 13/10/2011; AgRg no REsp 1265039/RS, Relatora Ministra Maria
Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe 28/09/2011; AgRg no REsp 1229103/PR, Relator
Ministro Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ/RJ), 5ª Turma, DJe
03/05/2011; AgRg no Ag 1164852/RS, Relator Ministro Honildo Amaral de Mello Castro
(Desembargador convocado do TJ/AP), 5ª Turma, DJe 16/11/2010.
Assim, é de se observar que não obstante vários julgados tenham se baseado no entendimento
firmado na ADI 1.232/DF, aquele precedente cedeu espaço à interpretação inaugurada pelo
Ministro Ilmar Galvão, no sentido de que é possível a aferição da condição de hipossuficiência
econômica do idoso ou do portador de deficiência por outros meios que não apenas a
comprovação da renda familiar mensal per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
Mesmo no E. STF, que havia firmado entendimento diverso, a posição findou por ser revista
recentemente, em 18.04.2013, nos julgamentos do RE 567985/MT, pelo sistema da repercussão
geral, e da Reclamação (RCL) 4374, ocasião em que a Suprema Corte declarou incidenter tantum
a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, do Art. 20, da Lei nº
8.742/1993.
Nestes termos:
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V,
da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na
ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que “considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita
seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”. O requisito financeiro estabelecido pela lei teve
sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente
miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto
constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo
Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais
contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos
critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não
pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita
estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se
contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de
miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas
leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios
que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O
Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do
processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas,
econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares
econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte
do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade,
do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento.”
(RE 567985, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES,
Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 02-10-2013
PUBLIC 03-10-2013)
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V,
da Constituição da República, estabeleceu critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo fosse concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovassem não
possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º
da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal
na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que “considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita
seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”. O requisito financeiro estabelecido pela lei teve
sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente
miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto
constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo
Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Reclamação como
instrumento de (re)interpretação da decisão proferida em controle de constitucionalidade abstrato.
Preliminarmente, arguido o prejuízo da reclamação, em virtude do prévio julgamento dos recursos
extraordinários 580.963 e 567.985, o Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamação. O
STF, no exercício da competência geral de fiscalizar a compatibilidade formal e material de
qualquer ato normativo com a Constituição, pode declarar a inconstitucionalidade,
incidentalmente, de normas tidas como fundamento da decisão ou do ato que é impugnado na
reclamação. Isso decorre da própria competência atribuída ao STF para exercer o denominado
controle difuso da constitucionalidade das leis e dos atos normativos. A oportunidade de
reapreciação das decisões tomadas em sede de controle abstrato de normas tende a surgir com
mais naturalidade e de forma mais recorrente no âmbito das reclamações. É no juízo
hermenêutico típico da reclamação – no “balançar de olhos” entre objeto e parâmetro da
reclamação – que surgirá com maior nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no
controle de constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a determinada decisão do STF,
o Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua própria decisão. E,
inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisão-parâmetro da reclamação, se
entender que, em virtude de evolução hermenêutica, tal decisão não se coaduna mais com a
interpretação atual da Constituição. 4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos
preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei
permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e único
estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes
idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais
elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que
criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder
Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de
renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões
monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do
critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de
notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 5. Declaração de inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6. Reclamação
constitucional julgada improcedente.”
(Rcl 4374, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-173 DIVULG 03-09-2013 PUBLIC 04-09-2013)
Naquela mesma ocasião, julgou-se ainda o RE 580.963/PR, também submetido ao regime da
repercussão geral, em que o Pretório Excelso declarou igualmente inconstitucional o parágrafo
único do Art. 34 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso).
A ementa restou assim redigida:
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V,
da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na
ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que: “considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita
seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”. O requisito financeiro estabelecido pela Lei teve
sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente
miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto
constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo
Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais
contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e processo de inconstitucionalização dos
critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não
pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita
estabelecido pela LOAS. Como a Lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de
contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de avaliar o real estado de
miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas
leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais,
tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o
Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei
9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que
instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O
Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência
do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas,
econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares
econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte
do Estado brasileiro). 4. A inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único,
da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o benefício
assistencial já concedido a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo
da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Não exclusão dos benefícios assistenciais
recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por
idosos. Inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em
relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos
idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial
inconstitucional. 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do
art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. 6. Recurso extraordinário a que se nega
provimento.”
(RE 580963, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013,
PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-225 DIVULG 13-11-2013
PUBLIC 14-11-2013)
Bem explicado, trata-se, em ambos os casos, de inconstitucionalidade parcial por omissão.
No que se refere ao § 3º do Art. 20 da Lei 8.742/93, considerou-se, segundo o voto do Relator,
Ministro Gilmar Mendes, que o dispositivo "era insuficiente para cumprir integralmente o comando
constitucional do art. 203, V, Constituição da República", por não contemplar outras hipóteses
caracterizadoras da absoluta incapacidade de manutenção do idoso ou o deficiente físico.
Já com relação ao Art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/03, a omissão implica em violação ao
princípio da isonomia, que, conquanto afaste do cálculo da renda per capita familiar o benefício
assistencial já concedido a outro membro da família, contempla apenas o idoso, excluindo do
mesmo tratamento o deficiente, assim como o idoso que conviva com familiar titular de benefício
previdenciário de valor mínimo.
Nesse quadro, com base na orientação recém firmada pela Corte Suprema, forçoso concluir que
se deve dar interpretação extensiva ao § 3º, do Art. 20, da Lei nº 8.742/93, a fim de abranger
outras situações em que comprovada a condição de miserabilidade do postulante ao benefício
assistencial. Ademais, em respeito ao princípio da isonomia, deve-se também estender a
interpretação do parágrafo único do Art. 34 do Estatuto do Idoso, para excluir do cálculo da renda
per capita familiar o benefício de valor mínimo recebido por outro membro da família,
independentemente se de natureza assistencial ou previdenciária, aplicando-se a mesma
disposição ao deficiente.
No mesmo sentido, é a jurisprudência uniformizada pela Primeira Seção do e. Superior Tribunal
de Justiça, no julgamento do recurso representativo de controvérsia, sob o Tema nº 640, in
verbis:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO
VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor
de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício
de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso
(Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de
Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.”
(REsp 1355052/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Data da Publicação/Fonte
DJe 05/11/2015).
Tecidas essas considerações, resta analisar se a parte autora implementa os requisitos legais
para a concessão do benefício pleiteado.
Cabe relembrar que o benefício assistencial requer o preenchimento de dois pressupostos para a
sua concessão, de um lado, sob o aspecto subjetivo, a deficiência e de outro lado, sob o aspecto
objetivo, a hipossuficiência.
No que concerne à matéria divergente, o requisito da hipossuficiência econômica, o relatório
social firmado em 07/02/2017, dá conta que o autor na Eduardo Emanoel da Silva Balduino,
nascido aos 05/03/2014, portador de necessidades especiais, tendo como principais diagnósticos
hidrocefalia, paralisia cerebral e Síndrome de West, residia com sua mãe Jaqueline Eugênia da
Silva Balduino, 31 anos, desempregada, o genitor Adriano Balduino de Lima, 37 anos, funcionário
público estadual, ocupante do cargo/função de agente fiscal agropecuário, e com o irmão Lucas,
13 anos de idade, estudante.
A família residia em casa própria, financiada, em boas condições de habitabilidade, adquirida
quando possuía condições financeiras estáveis antes do nascimento de Eduardo.
Além desse bem, a família era proprietária de um veículo Siena, ano 2012, que era utilizado para
o transporte do filho em consultas e tratamento médico.
A renda familiar era proveniente dos vencimentos do genitor, no valor bruto de R$3.009,50,
conforme holerite apresentado, todavia, após os descontos de praxe e do empréstimo consignado
contraído para pagamento das despesas médicas com o autor, no valor de R$580,10, restava o
valor de R$1.824,75 para o pagamento das despesas do grupo familiar.
Foram informadas despesas com financiamento do imóvel (R$500,00), alimentação (R$600,00),
leite e outros alimentos destinados ao autor (R$170,00), energia elétrica e água (R$250,00),
medicamentos (R$200,00), fraldas descartáveis para uso do autor (R$300,00), e combustível
para o veículo utilizado no transporte do autor às sessões de terapia (R$600,00 a R$700,00).
A genitora relatou que antes do nascimento do autor a família levava uma vida financeira
tranquila, pois o casal trabalhava e seu marido exercia funções no IAGRO, em um cargo que
realizava viagens sistemáticas e recebia diárias, que melhoravam as condições financeiras,
porém, com a chegada do filho e a necessidade de permanecerem perto para ajudar nos
cuidados da criança, o marido não viaja mais, acarretando uma diminuição da renda.
Esclareceu, ainda, que os gastos com tratamento do filho eram muito elevados, pois apesar de ter
garantido através de liminar que o plano de saúde assumisse o reembolso de alguns
procedimentos, havia outros com o custeio de órteses dos membros inferiores e de mão,
pagamento de consultas médicas com neuropediatra e com combustível para levá-lo para
Dourados, onde realiza acompanhamento fisioterápico, fonoaudiológico e de terapia ocupacional,
e em Campo Grande, onde realiza tratamento mensal com método Therasuit.
Consta que o autor fazia uso de vários medicamentos, Topiramato, Sabril e Depakene, os dois
primeiros fornecidos pela Secretaria de Saúde do Estado, mas que eram devolvidos quando se
tratava de genéricos, pois a médica não aceitava o seu uso, por entender que não garantia a
mesma eficácia, esclarecendo que o medicamento Topomax era adquirido ao custo de R$250,00.
Relatou a Assistente Social que os gastos mensais da família com o tratamento do autor eram
muito elevados, mesmo tendo garantido através de liminar que o plano de saúde assumisse o
reembolso de alguns procedimentos, pois existiam outros gastos com órteses dos membros
inferiores e da mão, pagamento de consultas médicas com neuropediatra e combustível para o
transporte até Dourados, onde o autor realiza acompanhamento fisioterápico, fonoaudiológico e
terapia ocupacional, e em Campo Grande, onde faz tratamento mensal com método Therasuit.
Concluiu a experta que o autor fazia jus ao benefício, tendo em vista que os gastos com a sua
manutenção e tratamento eram elevados e que a renda auferida por seu genitor não era
suficiente para mantê-lo de forma digna (Num. 1790304 – págs. 99/102).
O demonstrativo de pagamento anexado ao estudo social dá conta que no mês de julho de 2016,
os vencimentos do genitor importava em R$3.009,50, e após os descontos de praxe, inclusive do
empréstimo consignado (R$580,00), restavam R$1.824,75. Cabe salientar que o salário mínimo
vigente na ocasião estava fixado em R$880,00.
De acordo com o extrato bancário que instruiu a inicial, o empréstimo contraído em 07/01/2016,
para pagamento em 25 parcelas de R$580,00, findou em 01/04/2018 (Num. 1790303 – pág. 23),
de modo que a partir de então essa despesas foi suprimida do orçamento doméstico.
Como cediço, o critério da renda per capita do núcleo familiar não é o único a ser utilizado para se
comprovar a condição de miserabilidade do idoso ou do deficiente que pleiteia o benefício.
No entanto, analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que não está caracterizada a
situação de vulnerabilidade ou risco social a ensejar a concessão do benefício assistencial, ainda
que se considere que a família da autora viva em condições econômicas modestas.
Impende destacar que a família é proprietária de um veículo e gasta em torno de R$700,00 com
combustível, não se olvidando as despesas havidas com impostos e para a manutenção desse
bem, situação incompatível com a alegada condição de miserabilidade.
Há que se ponderar que malgrado a gravidade da doença e os gastos havidos com o tratamento
do autor, consta dos autos que foi ajuizada a ação ordinária de obrigação de fazer em face do
plano de saúde Caixa de Assistência dos Servidores do Estado do Mato Grosso do Sul –
CASSEMS, sob o nº 08004146620168120010, em apenso, tendo sido juntado o parecer expedido
pela ANS e expedido o alvará de levantamento dos valores depositados naqueles autos e
posteriormente depositados os demais valores relativos ao tratamento (Num. 1790304 – pág.
124).
Como posto pelo I. Desembargador Federal Nelson Porfírio, “O pai do autor tem um emprego que
lhe gera um salário mensal, suficiente para o pagamento das despesas básicas de alimentação e
manutenção da residência, bem como, acesso a um plano de saúde para o acompanhamento
médico necessário. Ademais, por força de decisão judicial, esse plano de saúde é responsável
pelo pagamento de uma parcela do tratamento experimental realizado. Consta, ainda, que por
meio de ajuda de familiares e amigos o autor é submetido a diversos tratamentos, consultas e
exames de elevado custo.”, evidenciando que o autor está amparado materialmente, se
comparado a outros casos em que o benefício assistencial consistiria na única renda da família
para suprir suas necessidades básicas.
Destarte, não comprovado o requisito da hipossuficiência econômica, ao menos nesse momento,
a autoria não faz jus ao benefício assistencial de prestação continuada do Art. 20, da Lei nº
8.742/93.
Cabe relembrar que o escopo da assistência social é prover as necessidades básicas das
pessoas, sem as quais não sobreviveriam e que o benefício não se destina à complementação de
renda.
Consigno que, com a eventual alteração das condições descritas, a parte autora poderá formular
novamente seu pedido.
Ante o exposto, com a devida vênia, divirjo do Senhor Relator e acompanho o voto divergente,
para dar provimento à apelação e revogar a tutela concedida.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE DE CONVERTER O
JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA.
I - Embora a renda familiar per capita seja inferior a um salário mínimo mesmo sem levar em
consideração as despesas com a saúde do autor, verifica-se na divergência inaugurada pelo
Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfírio que um dos argumentos para a não
caracterização da hipossuficiência econômica do autor é que a Caixa de Assistência dos
Servidores do Estado do Mato Grosso do Sul assume o reembolso de alguns procedimentos
médicos e de alguns remédios, contudo observo que tal proceder não se verificou em todas as
ocasiões, como se pode ver do indeferimento de pedido de reembolso para exame
eletroencefalograma.
II - Feito retirado de pauta, para o fim de converter o julgamento em diligência, para efeito de que
seja elaborado novo estudo social, contendo demonstrativo detalhado dos gastos que
efetivamente o genitor do autor suporta para que lhe seja proporcionado um tratamento médico
adequado. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, após o voto vista do Des.
Fed. Baptista Pereira, que acompanhava o voto divergente do Des. Fed. Nelson Porfirio no
sentido de dar provimento à apelação para julgar improcedente o pedido, e após o voto retificador
do Senhor Relator, a Turma, por unanimidade, decidiu RETIRAR DE PAUTA O PROCESSO,
convertendo o feito em diligência para efeito de que seja elaborado novo estudo social, contendo
demonstrativos detalhados dos gastos que efetivamente o genitor do autor suporta para que seja
mantido um tratamento médico adequado, ficando suspenso o julgamento, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA