
| D.E. Publicado em 20/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES e, de ofício, reconhecer a carência superveniente da ação a partir de 05.09.2016 e fixar os consectários legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0019684-66.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por IVA BATISTA DOS SANTOS, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em que se objetiva a concessão do benefício assistencial previsto no artigo 203 da Constituição Federal e artigo 20 da Lei 8.742/1993 (Loas).
Estudo Social às fls. 40/42.
Perícia Judicial às fls. 56/60.
Contestação às fls. 67/79.
O pedido foi julgado procedente, condenando-se o INSS a conceder o benefício assistencial a partir da data da citação, corrigido monetariamente, bem como a arcar com honorários advocatícios, arbitrados em 15% sobre o valor da causa (fls. 97/99).
Sentença não submetida ao reexame necessário.
A parte autora apela e requer que o termo inicial do benefício seja fixado em 11.09.2012, data do requerimento administrativo (fls. 101/104).
O INSS também apela, alegando não estarem preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício (fls. 111/123).
Com as contrarrazões ao recurso do INSS, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da apelação do INSS e pelo provimento da apelação da parte autora (fls. 136/139).
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Assinale-se que o benefício aqui postulado é de natureza assistencial e deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do recolhimento de contribuições.
O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.231/1991.
A renda mensal vitalícia em referência foi extinta pelo art. 40 da Lei 8.742/1993, sendo estabelecido em seu lugar o benefício assistencial de prestação continuada previsto no art. 20 do mesmo diploma legal.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.231/1991:
Em relação ao idoso, cumpre registrar que originariamente o dispositivo em análise estabelecia a idade mínima de 70 (setenta) anos como requisito para a obtenção do benefício, sendo estabelecida, ao mesmo tempo, regra de transição no art. 38 do mesmo estatuto legal, pela qual o critério etário deveria ser reduzido gradativamente, passando a 67 (sessenta e sete) anos contados 24 (vinte e quatro) meses e 65 (sessenta e cinco) anos em 48 (quarenta e oito) meses, respectivamente. Contudo, a Lei 9.720/1998, objeto de conversão da Medida Provisória 1599-50/1998, fixou a idade limite em 67 (sessenta e sete) anos a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento do Estatuto do Idoso, mediante a edição da Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, acabou-se por eleger a idade de 65 (sessenta e cinco) anos como critério etário para a percepção do benefício assistencial, nos seguintes termos:
Finalmente, a Lei 12.435/2011 promoveu a atualização do art. 20 da Lei 8.742/1993, prevendo a idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, e, de outro lado, revogou o art. 38, na redação dada pela Lei 9.720/1998.
Assim, a pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, a partir do início da vigência do Estatuto do Idoso, desde que exposta à situação de hipossuficiência material, pode ser amparada pela Seguridade Social por meio do benefício assistencial de prestação continuada.
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão pela Lei 13.146/2015 do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a constar previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado no caso vertente.
Cumpre observar que, conforme consulta CNIS/PLENUS na data de hoje, verifica-se que a autora teve o benefício assistencial concedido administrativamente com DIB e DIP em 05.09.2016 e, portanto, houve carência superveniente do interesse processual a partir desse momento, razão pela qual se deve verificar se preencheu os requisitos para a concessão do benefício apenas anteriormente a essa data.
Não obstante sua incapacidade ser temporária, podendo melhorar com o tratamento adequado, esclareceu, o perito, que a incapacidade iniciou-se em 11.05.2010, sugerindo nova perícia em 24 meses após sua avaliação, realizada em 06/2016, razão pela qual se verifica que a incapacidade se estende por mais de 2 anos, o que a enquadraria como impedimento de longo prazo.
Assim, é possível concluir que o estado clínico da parte-autora implica a existência de impedimento de longo prazo, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, poderia obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, devendo, assim, ser considerada pessoa com deficiência para os efeitos legais.
No tocante à demonstração da miserabilidade, o Estudo Social produzido indica que o núcleo familiar é integrado pela parte postulante, seu irmão e seu sobrinho, então com 18 anos. À época (09/2015) foi informado que a renda mensal constituía em R$ 1.000,00, proveniente do salário do sobrinho e pelo rendimento do irmão, que trabalhava com moto-taxi, sem, no entanto, saber qual seu rendimento mensal. Consta, ainda, que possuem um veículo e que as despesas básicas mensais eram de R$ 1.210,00.
Deve-se destacar, no entanto, que nos termos do art. 20, §1º, da Lei 8.742/93, na redação dada pela Lei 12.435/2011, "a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto".
Tem-se, portanto, que o irmão e o sobrinho compõem núcleo familiar distinto, razão pela qual seus rendimentos não podem ser considerados na análise da presente situação.
Dessa forma, considerando a ausência de renda e os gastos básicos mensais, tem-se que deve ser reconhecida a presunção de hipossuficiência, nos termos do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/1993.
Quanto ao termo inicial do benefício, não obstante tenha realizado requerimento administrativo em 11.09.2012 (fl. 33), a parte autora apenas insurgiu-se contra o indeferimento, judicialmente, em 30.07.2015, quase 2 (dois) anos após o requerimento, tendo conseguido subsistir durante todo esse período sem o benefício. Ademais, pelo longo transcurso de tempo, não restou comprovado que, à época, estavam preenchidos os requisitos necessários para a concessão do benefício, em especial a miserabilidade, haja vista a possibilidade de mudança das condições e do próprio núcleo familiar.
Assim, a data de início do benefício deve ser fixada na data da citação (21.07.2016, fl. 66), momento em que o INSS tomou ciência da atual pretensão.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES e, de ofício, reconheço a carência superveniente da ação a partir de 05.09.2016 e fixo os consectários legais na forma acima explicitada.
É COMO VOTO.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10077 |
| Nº de Série do Certificado: | 066427B876468A04 |
| Data e Hora: | 12/12/2017 19:27:18 |
