
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007069-78.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: DANILO TROMBETTA NEVES - SP220628-N
APELADO: ANTONIO HARUO ALVES NODA
Advogado do(a) APELADO: WELLINGTON LUCIANO SOARES GALVAO - SP148785-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007069-78.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: DANILO TROMBETTA NEVES - SP220628-N
APELADO: ANTONIO HARUO ALVES NODA
Advogado do(a) APELADO: WELLINGTON LUCIANO SOARES GALVAO - SP148785-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, em ação previdenciária ajuizada por ANTONIO HARUO ALVES NODA, objetivando reconhecimento de labor rural, com a expedição da respectiva certidão de tempo de serviço.
A r. sentença (ID 100532501 - págs. 77/81) julgou procedente o pedido, para reconhecer o labor rural de 02/01/1983 a 23/07/1991, determinando a sua averbação. Condenou o INSS no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados no montante de R$ 700,00.
Em razões recursais (ID 100532501 - págs. 86/101), o INSS alega a ausência do início de prova material, vedada a prova exclusivamente testemunhal. Sustenta a impossibilidade de concomitância do trabalho rural com os períodos registrados na CTPS de 20.06.1988 a 30.09.1988 e 17.05.1989 a 02.10.1989, motivo pelo qual requer a exclusão de tais períodos. Afirma que os interregnos de atividade rural anteriores a 1991 não podem ser considerados para fins de carência. Aduz a necessidade de indenização do período trabalhado para que sejam computados como tempo de contribuição.
Intimada a parte autora, apresentou contrarrazões (ID 100532501 - págs. 108/114).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de reconhecimento de labor rural, para fins de obtenção da respectiva certidão de tempo de serviço.
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 31/07/2015, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
"Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).
§1º Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.
§2º Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.
§3º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente."
No caso, a r. sentença reconheceu, em favor da parte autora, tempo de serviço rural. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS. 1. (...). 3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento.(...)" (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº 0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/12/2015 - grifos nossos).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória. (...)" (AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP
, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(omissis)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS PARA SANAR OMISSÃO SEM EFEITO MODIFICATIVO.
(...)
2. No presente caso, impõe-se sanar omissão para asseverar que a jurisprudência do STJ possui entendimento no sentido de que é dispensável o recolhimento de contribuições previdenciárias, para fins de reconhecimento de tempo de serviço rural, quanto ao labor exercido antes da Lei 8.213/1991
.(...)" (EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 05/11/2015)."AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 485, V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 55, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. OCORRÊNCIA. SEGURADA VINCULADA AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL-RGPS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. APOSENTADORIA. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. ANTES DA VIGÊNCIA DA REFERIDA LEI. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A autora sempre esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social.
2. Não é exigível o recolhimento das contribuições previdenciárias, relativas ao tempo de serviço prestado como trabalhador rural, antes da vigência da Lei n 8.213/91, para fins de aposentadoria urbana pelo Regime Geral de Previdência Social. Precedentes da Terceira Seção.
Ação rescisória procedente" (AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015, DJe 04/12/2015 - grifos nossos).
"APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR A PROVA DOCUMENTAL.
1. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de vigência da Lei n.º 8.213/1991, é de ser computado e averbado, independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, mas não se presta para efeito de carência.(...)
" (AC nº 0029462-51.2003.4.03.9999, 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/12/2015).Do caso concreto
.As provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo do autor, são:
a) dispensa da prática de educação física da escola EEPSG de "Caiabu", formulada perante a Delegacia de Ensino de Regente Feijó-SP, com data de pedido de 09/05/85 e em 09/05/1986, em razão do requerente exercer a função de trabalhador rural e de trabalhar em regime de economia familiar (ID 100532501 - pág. 15/17);
b) certidão de casamento, contraído em 22/10/1988, na qual está atestado que à época era lavrador (ID 100532501 - pág. 20).
A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal (ID 100532501 – págs. 74/75 – depoimento audiovisual).
A testemunha Sr. Aparecido Galindo disse que conheceu o autor quando ele tinha dez anos, pois era seu vizinho, em Santa Teresa. Informou que o requerente trabalhava na lavoura com o pai dele, plantando algodão, amendoim e milho, o que se deu "até os anos 90, 91". Respondeu que, depois disso, o autor "mexeu com um pouco de leite", foi para o Japão, voltou e entrou pra Usina e trabalha lá até hoje.
O Sr. Luiz Claro da Silva disse que conhece o requerente desde criança, pois eram vizinhos de sítio. Mencionou que o autor trabalhava na lavoura, plantando milho, algodão, mamona, até 90/93. Relatou que o pai do autor tocava a lavoura e moravam na casa dele o pai e os irmãos. Ratificou que depois o “autor saiu”, foi para o Japão e hoje está na Usina.
A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino no período de 02/01/1983 a 19/06/1988, 01/10/1988 a 16/05/1989 e 03/10/1989 a 23/07/1991.
Afastado o labor rural de 20.06.1988 a 30.09.1988 e de 17.05.1989 a 02.10.1989, eis que comprovado pelo CNIS apresentado que o autor trabalhou como empregado na empresa “Usina Alto Alegre S/A – açúcar e álcool” (ID 100532501- pág. 63), vínculos, portanto, urbanos e incontroversos.
Ante o exposto,
dou parcial provimento à remessa necessária
, tida por interposta,bem como à apelação do INSS
, para afastar o labor rural de 20.06.1988 a 30.09.1988 e de 17.05.1989 a 02.10.1989, mantida, no mais, a r. sentença prolatada em 1º grau de jurisdição.Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso excepcional ou a certificação do trânsito em julgado.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO. EXCLUSÃO DE LABOR RURAL CONCOMITANTE A VÍNCULOS URBANOS REGISTRADOS EM CTPS. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 – A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 31/07/2015, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973. No caso, a r. sentença reconheceu, em favor da parte autora, tempo de serviço rural. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
2 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
3 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
4 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
5 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
6 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais.
7 - A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal.
8 - A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino no período de 02/01/1983 a 19/06/1988, 01/10/1988 a 16/05/1989 e 03/10/1989 a 23/07/1991.
9 - Afastado o labor rural de 20.06.1988 a 30.09.1988 e de 17.05.1989 a 02.10.1989, eis que comprovado pelo CNIS apresentado que o autor trabalhou como empregado na empresa “Usina Alto Alegre S/A – açúcar e álcool” (ID 100532501- pág. 63), vínculos, portanto, urbanos e incontroversos.
10 - Remessa necessária e apelação do INSS parcialmente providas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, bem como à apelação do INSS, para afastar o labor rural de 20.06.1988 a 30.09.1988 e de 17.05.1989 a 02.10.1989, mantida, no mais, a r. sentença prolatada em 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
