
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5064286-47.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: ROBERTO DOS SANTOS ALVES CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: MANOEL TELLES DE SOUZA - SP417234-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5064286-47.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO
APELANTE: ROBERTO DOS SANTOS ALVES CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: MANOEL TELLES DE SOUZA - SP417234-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por ROBERTO DOS SANTOS ALVESCORREIA em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a concessão de benefício por incapacidade.
A r. sentença julgou improcedente o pedido, com fundamento na ausência deincapacidade laborativa, condenando a parte autora ao pagamento de honoráriosadvocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, ressalvando-se, contudo, aconcessão da justiça gratuita (ID 275056281).
A parte autora interpôs recurso de apelação (ID 275056285), em que pugnapela reforma da sentença, argumentando, em síntese, que restaram preenchidos osrequisitos para a concessão de benefício por incapacidade.
Sem contrarrazões, subiram os autos a este e. Tribunal.
É o relatório.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ: Com fundamento na ausência de incapacidade, o Ilustre Relator votou, no sentido de manter a improcedência do pedido.
Em que pese os profundos fundamentos trazidos pelo Ilustre Relator, peço licença para apresentar solução diversa.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).
No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em 11/08/2022 constatou que a parte autora, servidor público municipal, idade atual de 51 anos, não está incapacitada no momento para o exercício de sua atividade laboral, como se vê do laudo constante do ID275056273:
"Após avaliação da história clínica, exame psíquico, atestados médicos e leitura do processo, concluo que, a meu ver, sob o ponto de vista médico psiquiátrico, o Periciando Roberto dos Santos Alves Correia se encontra CAPAZ de exercer toda e qualquer atividade laborativa incluindo a habitual. CAPAZ de exercer os atos da vida civil.
No ato pericial, periciado em bom estado geral, e não apresentou e/ou relatou nenhuma sequela física e/ou psíquica decorrente do quadro de Síndrome de Dependência ao Álcool - CID10 F10.2." (pág. 04)
Embora o perito médico tenha atestado que, atualmente, a parte autora não está incapacitada para o trabalho, fato é que se trata pessoa com deficiência, por ter um impedimento de longo prazo de natureza física e mental.
Perfilho do entendimento da Eminente Desembargadora Federal Inês Virgínia (ApCiv nº 5003000-06.2020.4.03.6109, Data do Julgamento 07/12/2022, Data da Publicação 16/12/2022), no sentido de que:
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a ratificação desta Convenção e foi promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Com a Lei nº 13.146/2015, conhecida como Lei da Pessoa com Deficiência (LPD), o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. Consta do art. 2º da LPD:
Art. 2º. Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 1º. A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:
I - os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;
II - os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;
III - a limitação no desempenho de atividades; e
IV - a restrição de participação.
A norma supratranscrita preceitua que a interação do impedimento de longo prazo de natureza física e mental, como o que possui o autor da presente ação, com as barreiras limitadoras não precisam se "somar", bastando a presença de única limitação. Sendo que, no caso concreto, são duas barreiras: a dos fatores psicológicos e pessoais e a da limitação no desempenho das atividades.
Verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, eis que devem ser considerados, também, para a perfeita análise da situação de vulnerabilidade do requerente, fatores sociais e o meio em que a pessoa com deficiência vive, isto é, um conjunto de circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de proteção social.
Nessa ótica, bastante pertinente tratar do assunto a partir da lente dos direitos humanos fundamentais, com apoio na Teoria das Capacidades (capability approach) de Martha Nussbaum, autora que ao lado de Amartya Sen tem contribuído sobremaneira para a reflexão sobre o direito ao desenvolvimento e o desenvolvimento humano, inclusive no âmbito da ONU e na formulação da agenda nesse tema. Maria Helena Renck relaciona e (toma por base) as dez capacidades referidas por Nussbaum – 1. vida; 2. saúde física; 3. integridade física; 4. sentidos, imaginação e pensamento; 5. emoções; 6. razão prática; 7. afiliação; 8. outras espécies; 9. lazer; e 10. controle sobre o próprio ambiente político e material – para destacar que para a Teoria das Capacidades (capability approach) quanto para a Convenção das Pessoas com Deficiência:
"... a deficiência não pode ser vista como um acaso rude a depositar seu peso unicamente nos ombros da pessoa por ele atingido. A sociedade e o Estado têm o dever de agir para promover a inclusão desta pessoa, e de remover as barreiras que impedem a vida condizente com a dignidade. É muito nítido o alinhavo desse fim com os desígnios dos Direitos Humanos, especialmente com os objetivos da Seguridade Social e com o dever de proteção suficiente dos direitos fundamentais.
Devido ao elevado valor de cada pessoa ela também é a destinatária da Segurança Social para lhe acudir em tempos de intempéries que lhe fragilizem.(...) Há uma coincidência com estes fins [da teoria das capacidades e da convenção da pessoa com deficiência] no dispositivo de proteção da Assistência Social escolhido pela Constituição Federal de 1988, que a destina a todos que dela necessitarem, bem como na especificação daqueles em pior situação, através do benefício mensal de um salário mínimo." (RENCK, Maria Helena Pinheiro. A limitação temporal do conceito de pessoa com deficiência. Curitiba: Alteridade, 2019, p. 238-239)
Nesse sentido, as avaliações de que trata o § 6º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 e o artigo 70-B do Decreto nº 3.048/99, que sujeitam a concessão dos benefícios assistencial ou previdenciário, respectivamente, às avaliações médica e social, devem considerar as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo do requerente, bem como os fatores ambientais, sociais e pessoais a que está sujeito.
Ainda, a Súmula nº 29 editada pela TNU dos Juizados Especiais Federais assim prevê:
"Para efeitos do art. 20, § 2º, da Lei 8.742, de 1993, a incapacidade para a vida independente não só é aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento."
Neste mesmo sentido, o Enunciado nº 30 da AGU (editado em 30.07.2008):
"A incapacidade para prover a própria subsistência por meio do trabalho é suficiente para a caracterização da incapacidade para a vida independente, conforme estabelecido no art. 203, V, da Constituição Federal, e art. 20, II, da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993."
No caso de que ora se cuida, o perito judicial constatou Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - Síndrome da dependência (CID10 F10.2), havendo uma intrínseca e incontornável contradição com a conclusão de que a parte autora não está incapacitada para o trabalho.
Na verdade, em decorrência da dependência química, a parte autora desenvolveu transtornos mentais e comportamentais, caracterizados por alterações da personalidade e prejuízos cognitivos, que tornam difícil, no momento, a sua interação social e a reinserção no mercado de trabalho, apesar do tratamento a que se submete, pois ainda não tem condições de lidar com aqueles fatores típicos que podem desencadear uma recaída.
Ressalto, ademais, que o alcoolismo é uma doença crônica formalmente reconhecida pelo Código Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial de Saúde - OMS (CID - referência F10.2), classificado como "síndrome de dependência do álcool", de caráter evolutivo e progressivo, com efeitos deletérios na saúde física e mental do indivíduo por ela acometido.
Colho ainda do julgado acima citado que:
A Revista Brasileira de Epidemiologia publicou estudo realizado por profissionais da área de saúde demonstrando o impacto do consumo abusivo de álcool na saúde da população em geral, mais especificamente do Estado de São Paulo:
"O consumo abusivo de álcool é reconhecido como um importante problema de saúde pública em todo o mundo. O abuso/dependência de álcool estão associados a múltiplas consequências adversas para a saúde, como doenças cardíacas e cerebrovasculares, eventos fatais e transtornos psiquiátricos, traumas, violência doméstica, quedas, várias neoplasias, doenças sexualmente transmissíveis, cirrose hepática, dentre outros. No Brasil, estudo conduzido em 1999, no Estado de São Paulo, apontou 6,6% da população entre 12 e 65 anos de idade com dependência de álcool9. Dois anos depois, a mesma população foi pesquisada e foi constatado aumento estatisticamente significativo para 9,4% de dependentes. Uma avaliação das principais causas de morte nos Estados Unidos da América no ano 2000 concluiu que 18,1% do total de óbitos naquele país eram atribuídos ao uso de tabaco, 16,6% a dieta inadequada e inatividade física, e 3,5% ao consumo de álcool. Fatores modificáveis relacionados ao estilo de vida respondem pelas quatro principais causas de morte naquele país. Assim, a mensuração e o monitoramento dos padrões de ingestão alcoólica, com detecção dos segmentos mais vulneráveis, é tarefa essencial para planejamento de estratégias e ações para controle do consumo abusivo, prevenção de doenças crônicas e promoção da saúde."
(GUIMARÃES, Vanessa Valente et al. Consumo abusivo e dependência de álcool em população adulta no Estado de São Paulo, Brasil. Rev. bras. epidemiol., São Paulo, v. 13, n. 2, p. 314-325, June 2010.)
Assim, conquanto o perito judicial tenha afirmado que não há, no momento, incapacidade para o exercício da atividade laboral, há elementos, nos autos, que conduzem à conclusão de que, embora abstinente no momento, a parte autora não está em condições de retornar ao trabalho imediatamente.
Destaco que o magistrado não está adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõe o artigo 479 do CPC/2015, também podendo ser considerados, como no presente caso, outros elementos de prova constantes dos autos.
Nesse sentido, é o entendimento firmado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
(...) a jurisprudência do STJ alinhou-se no sentido de que, para a concessão da aposentadoria por invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela incapacidade laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado.
(AgInt nos EDcl no AREsp nº 884.666/DF, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 08/11/2016)
Desse modo, constato a existência de deficiência de longo prazo que impede a parte autora de exercer atividade laborativa, pelo menos desde a cessação do benefício de auxílio-doença. Entendo que a parte autora não possui idade avançada, com histórico de tratamento psiquiátrico recente sem internações (ID 275056233, ID 275056234), e vínculos de empregado no seu histórico (ID 275056239), o que sobreleva considerar a possibilidade de recuperação. Fundada nesses pontos relevantes, entendo que a melhor solução é a concessão do benefício temporário até o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual poderá ser reavaliado.
Ademais, restou comprovado, nos autos, que a parte autora é segurada da Previdência Social e cumpriu a carência de 12 (doze) contribuições, exigida pelo artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91, como se vê do documento constante do ID275056239 (extrato CNIS).
Consta, desse documento, que a parte autora recebeu o auxílio-doença no período de 29/08/2020 a 03/11/2020, sendo que, posteriormente, foi concedido no período de 21/09/2021 a 30/112021.
A presente ação foi ajuizada em 26/11/2021.
O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento administrativo ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 01/12/2021, dia seguinte ao da cessação administrativa.
No tocante ao termo final do auxílio-doença, a Lei nº 8.213/91, recomenda, nos casos em que a incapacidade é apenas temporária e há possibilidade de recuperação da capacidade do segurado para a atividade habitual, como nos autos, a fixação, quando da concessão do benefício, de um prazo estimado para a sua duração (artigo 60, § 8º), estabelecendo que, não sendo fixado esse prazo, o INSS poderá cessar o benefício no prazo de 120 dias (§ 9º).
Assim, com base no conjunto probatório dos autos, o auxílio-doença deverá ser pago por 120 (cento e vinte) dias, a contar da efetiva implantação, cumprindo a parte autora, se entender não estar em condições de retornar ao trabalho, requerer a prorrogação do benefício, como lhe faculta a lei.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices e critérios previstos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução.
Vale ressaltar que o referido manual foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data deste julgamento, já que, nos casos em que o benefício previdenciário não é concedido em sentença, mas apenas em sede recursal, a base de cálculos da verba honorária, conforme entendimento dominante esposado pelas Turma da 3ª Seção deste Egrégio Tribunal, compreende as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício.
No que se refere às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, tanto no âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça Estadual de São Paulo (Lei nº 9.289/96, art. 1º, I, e Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/2003).
Tal isenção, decorrente de lei, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
Também não o dispensa do pagamento de honorários periciais ou do seu reembolso, caso o pagamento já tenha sido antecipado pela Justiça Federal, devendo retornar ao erário (Resolução CJF nº 305/2014, art. 32).
Ante o exposto, divergindo do voto do Ilustre Relator, DOU PROVIMENTO ao apelo da parte autora, para condenar o Instituto-réu a conceder-lhe a AUXILIO-DOENÇA, nos termos dos artigos 59 a 61 da Lei nº 8.213/91, a partir de 01/12/2021, dia seguinte ao da cessação administrativa, por 120 (cento e vinte) dias, a contar da efetiva implantação do benefício, determinando, ainda, na forma acima explicitada, a aplicação de juros de mora e correção monetária, bem como o pagamento de encargos de sucumbência.
Independentemente do trânsito em julgado, requisite-se à Gerência Executiva do INSS, com base no artigo 497 do CPC/2015, que, no prazo de 45 dias, sob pena de multa-diária no valor de R$ 100,00, cumpra a obrigação de fazer em favor do segurado ROBERTO DOS SANTOS ALVES CORREIA, consistente na imediata implantação do benefício de AUXÍLIO-DOENÇA, com data de início (DIB) em 01/12/2021 (dia seguinte ao da cessação administrativa), e renda mensal a ser calculada de acordo com a legislação vigente.
COMUNIQUE-SE.
É COMO VOTO.
/gabiv/asato
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5064286-47.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED.ANTONIO MORIMOTO
APELANTE: ROBERTO DOS SANTOS ALVES CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: MANOEL TELLES DE SOUZA - SP417234-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR):
Inicialmente, tempestivo o recurso e presentes os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da insurgência propriamente dita, considerando a matéria objeto de devolução.
Dos benefícios por incapacidade para o trabalho
A Constituição Federal, em sua redação original do artigo 201, inciso I, referia que os planos de previdência atenderiam a cobertura de eventos de invalidez e doença, dentre outros.
Contudo, após a Emenda Constitucional (EC) nº 103, de 13/11/2019, a Carta Magna passou a utilizar de novel terminologia para designar os eventos sob proteção previdenciária, indicando a cobertura das contingências de incapacidade permanente ou temporária, anteriormente designadas como invalidez ou doença, nos termos da nova redação do artigo 201, inciso I, in verbis:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019).
Ressalto que, em razão do princípio tempus regit actum, a concessão dos benefícios por incapacidade deverá observar os requisitos previstos na legislação vigente ao tempo do infortúnio.
Da aposentadoria por incapacidade permanente (invalidez)
A aposentadoria por incapacidade permanente, antes aposentadoria por invalidez, segue os artigos 42 a 47 da Lei nº.8.213, de 24/07/1991, Lei de Benefícios da Previdência Social, bem assim os artigos 43 a 50 do Decreto nº 3.048, de 06/05/1999, o regulamento da Previdência Social, com as suas alterações posteriores, sempre observadas as alterações da EC nº 103/2019.
O preceito para a concessão do aludido benefício está inserto no caput do artigo 42, da LBPS, in verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Assim, o benefício de aposentação é destinado aos segurados da Previdência Social, cuja incapacidade para o trabalho é considerada permanente e insusceptível de recuperação da capacidade laboral ou, ainda, de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Outrossim, apesar de a aposentadoria por incapacidade definitiva seja desprovida de caráter perene, o benefício tornar-se-á definitivo, quando, uma vez não constatada a possibilidade de reabilitação profissional, o segurado for dispensado de realizar perícias médicas periódicas. Essa circunstância ocorre quando o segurado: i) completa 55 (cinquenta e cinco) anos de idade e tenham decorridos 15 (quinze) anos de gozo da aposentadoria por incapacidade e/ou auxílio por incapacidade provisória; ou ii) implementa os60 (sessenta) anos de idade, conforme preceitua o artigo 101, I e II, da LBPS, com as alterações da Lei n. 13.457, de 26/06/2017.
Do auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença)
O auxílio por incapacidade temporária, nova denominação do auxílio-doença, está disposto nos artigos 59 a 63 da Lei nº8.213/91, bem como a sua regulamentação dos artigos 71 a 80 do Decreto nº 3.048/99.
A preceito básico para a concessão consta do caput do artigo 59 da LBPS, in verbis:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Depreende-se que o benefício se destina aos segurados da Previdência Social que estejam em situação de temporária incapacidade para o trabalho ou atividade habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, decorrente de doença, acidente de qualquer natureza ou por prescrição médica, constatada a possibilidade de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Todavia, em decorrência de sua natureza impermanência, o auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença), poderá ser, posteriormente, (i) transformado em aposentadoria por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez), na hipótese de sobrevir incapacidade total e permanente; (ii) convertido em auxílio-acidente, se ficar demonstrada sequela permanente que enseje a redução da sua capacidade laboral; ou (iii) cessado, em decorrência de reaquisição da capacidade laboral com retorno ao trabalho, ou em razão de reabilitação profissional.
Requisitos à concessão do benefício por incapacidade:
A qualidade de segurado consiste no primeiro requisito, conforme dispõe o artigo 11 da Lei nº 8.213/91, cuja manutenção tem por supedâneo precípuo o pagamento de contribuições ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS). Assim,considerando o caráter contributivo da Previdência Social, a qualidade de segurado estará mantida aos segurados mediantecontribuição.
Todavia, a referida lei, nas hipóteses do artigo 15, estabelece exceção legal expressa, mediante a utilização do denominado período de graça, consistente no interregno assegurado àquele que, mesmo sem recolher contribuições, continua ostentando a condição de segurado, a saber:
Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
É de se observar, ainda, que o §1º do supracitado artigo prorroga por 24 meses tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 meses.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no §4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº 4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição, acarretando, consequentemente, a caducidade do direito pretendido.
Ocorre que, a condição de segurado é garantida àquele que se encontra no gozo de benefício previdenciário, exceto auxílio-acidente.
Na hipótese de acidente de trabalho, o benefício é devido aos segurados empregados, inclusive o doméstico, o trabalhador avulso e o segurado especial.
O segundo requisito exigido para concessão do benefício por incapacidade é a carência, impõe, como regra geral, a comprovação do recolhimento de 12 (doze) contribuições mensais, nos termos do artigo 25 da Lei nº 8.213/91.
O período de carência consiste no “número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências”, na forma do caput do artigo 24 da Lei nº 8.213/91.
Todavia, independe de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa, e de doença profissional ou do trabalho, assim como ao segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido das doenças elencadas na forma dos artigos 26, inciso II, c/c 151, da LBPS.
O terceiro requisito consiste na incapacidade para o trabalho, a qual, para a concessão de aposentação, deve ser permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e, para fins de auxílio incapacidade temporária (auxílio-doença), deve persistir por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Nessa senda, a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao RGPS não configura óbice à concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade decorrer de progressão ou agravamento da moléstia, ex vi do artigo 42, § 2º, da LBPS.
A existência de incapacidade, total ou parcial, é reconhecida mediante realização de perícia médica, por perito nomeado pelo juízo, consoante o Código de Processo Civil. No entanto, o magistrado não está adstrito unicamente às conclusões periciais, podendo valer-se de outros elementos constantes dos autos para formar a sua convicção, tais como questões pessoais, sociais e profissionais.
Na hipótese de exsurgir das provas periciais elementos suficientes ao reconhecimento da incapacidade somente parcial para o trabalho, o magistrado deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença.
Acrescente-se que em hipóteses específicas, quando demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra pessoa, é possível o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) ao valor da aposentadoria por invalidez, nos termos artigo 45 da Lei nº8.213/91.
Saliento, ainda, que o benefício de auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença), é um minus em relação à aposentadoria por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez), a qual sendo concedida não gera cumulação, mas sim cessação daquele.
Do caso concreto
No que tange à incapacidade, a profissional psiquiatra indicada pelo juízo a quo, com base em exame realizado em 11 de agosto de 2022 (ID 275056273), consignou o seguinte:
VI – Síntese: Após avaliação da história clínica, exame psíquico, atestados médicos e leitura do processo, concluo que, a meu ver, sob o ponto de vista médico psiquiátrico, o Periciando Roberto dos Santos Alves Correia se encontra CAPAZ de exercer toda e qualquer atividade laborativa incluindo a habitual. CAPAZ de exercer os atos da vida civil. (grifou-se)
Além disso, em resposta aos quesitos formulados pelo juízo, a r. expert afirmou (ID 275056273):
VII – Respostas aos quesitos formulados:
A) Quesitos formulados pelo Exmo. Sr. Dr. Juiz:
1) Há incapacidade para o trabalho? R: Não. Após avaliação da história clínica, exame psíquico, atestados médicos e leitura do processo, concluo que, a meu ver, sob o ponto de vista médico psiquiátrico, o Periciando Roberto dos Santos Alves Correia se encontra CAPAZ de exercer toda e qualquer atividade laborativa incluindo a habitual. CAPAZ de exercer os atos da vida civil.
2) A incapacidade é total ou parcial? R: Prejudicado. Não observada incapacidade laboral. Vide item VI da perícia.
3) A incapacidade é permanente ou não? R: Prejudicado.
B) Quesitos formulados pelo Autor:
2) Determinadas doenças possuem cura? R: Controle através da abstinência alcoólica.
3) Determinadas doenças incapacitam o autor para o trabalho? R: Não. Vide item VI da perícia.
C) Quesitos formulados pelo INSS:
a) Queixa que o (a) periciado (a) apresenta no ato da perícia. R: Periciado relata início de uso de bebida alcoólica “desde criança”, com aumento gradativo da quantidade e da periodicidade com a instalação de sinais e/ou sintomas físicos e/ ou psíquicos da Síndrome de Abstinência Alcoólica aos 30 anos de idade (sic).
b) Doença, lesão ou deficiência diagnosticada por ocasião da perícia (com CID). R: Após avaliar cuidadosamente a história clínica, exame psíquico, relatórios médicos e leitura do processo, relato que, a meu ver, sob o ponto de vista médico psiquiátrico, o Periciando Roberto dos Santos Alves Correia apresenta quadro compatível com, segundo a 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças de Síndrome de Dependência ao Álcool-CID10-F10.2 (grifou-se)
Assim, muito embora o apelante, com 50 anos, seja portador de patologia, conforme as conclusões da expert do juízo a quo, ele não possui incapacidade para o labor habitual.
Apesar do juiz não estar adstrito às conclusões ou informações de tais documentos, não há como aplicar o preceito contido no artigo 479 do Código de Processo Civil, à míngua de informações que conduzam à convicção da incapacidade laboral da postulante.
Trago à colação precedentes deste E. Tribunal corroborando o entendimento aqui esposado:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO NÃOCONCEDIDO. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA IMPROVIDA.
1. O ponto controvertido na presente demanda restringe-se a capacidade laborativa da parte autora em razão de acometimento de enfermidades médicas. Logo, exige-se prova técnica para sua constatação. Conforme se observa, após a realização da perícia médica judicial o Magistrado, destinatário das provas processuais, se deu por satisfeito para a resolução da lide.
2. A concessão da aposentadoria por invalidez reclama que o requerente seja segurado da Previdência Social, tenha cumprido o período de carência de 12 (doze) contribuições, e esteja incapacitado, total e definitivamente, para o trabalho (art. 201, I, da CF e arts. 18, I, a;25, I, e 42 da Lei nº 8.213/91). Idênticos requisitos são exigidos à outorga de auxílio-doença, cuja diferença centra-se na duração da incapacidade (arts. 25, I, e 59 da Lei nº 8.213/91).
3. No que se refere ao requisito da incapacidade, o laudo pericial de fls. 96/100, realizado em 24/06/2016, quando a autora contava com31 anos, atestou que ela "é portadora de quadro fóbico ansioso (CID 10: F40.0) cuja patologia encontra-se controlada com o tratamento instituído e que no momento pericianda é plenamente capaz para gerir a si própria e aos seis bens e para o desemprenho de funções laborais."
4. Observo, ainda, que o laudo foi devidamente elaborado por perito médico indicado pelo juízo, não havendo qualquer nulidade no documento capaz de invalidá-lo nem tampouco necessidade de realização de nova perícia. Com efeito, a mera discordância do autor em relação à conclusão do perito não tem o condão de afastá-la.
5. Desse modo, uma vez não comprovada a incapacidade laborativa, é de rigor a manutenção da sentença de improcedência da ação.
6. Matéria preliminar rejeitada. Apelação não provida.
(AC nº 0004331-83.2017.4.03.9999/SP, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, DE 15/08/2017)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. PRELIMINAR. INCAPACIDADE. INEXISTÊNCIA.SUCUMBÊNCIA.
I - A preliminar de cerceamento de defesa se confunde com o mérito e com ele será analisada.
II - A peça técnica apresentada pelo Sr. Perito, profissional de confiança do Juiz e eqüidistante das partes, foi conclusiva no sentido da inexistência de incapacidade da parte autora.
III - Não preenchendo o demandante os requisitos necessários à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença, a improcedência do pedido é de rigor.
IV- Não há condenação do autor aos ônus da sucumbência, por ser beneficiário da assistência judiciária gratuita.
V - Preliminar rejeitada e apelação do autor improvida no mérito.
(AC nº 0004677-07.2015.4.03.6183/SP, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, DE 29/09/2017)
Quanto à documentação colacionada pela parte autora, anoto que não tem a mesma o condão de afastar a conclusão da perícia.
Não havendo comprovação da incapacidade para a atividade laboral habitual, fica prejudicada a análise dos demais requisitos.
Desse modo, ausente um dos seus requisitos legais, vez que não demonstrada a incapacidade laboral habitual, não é de se conceder o benefício postulado.
Honorários Advocatícios
Em razão da sucumbência recursal, instituídos no artigo 85, §11, do CPC/2015, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei.
Assim, desprovido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 2% (dois por cento), observada a suspensão prevista no artigo 98, §§2º e 3º, do CPC.
Conclusão
Ante o exposto, nego provimento à apelação, observada a verba honorária acima disposta.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA PARA A ATIVIDADE HABITUAL. DEMAIS REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. ENCARGOS DE SUCUMBÊNCIA. APELO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA.
1. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (art. 25, I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por invalidez (art. 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (art. 59). Para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
2. O perito judicial constatou Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - Síndrome da dependência (CID10 F10.2), havendo uma intrínseca e incontornável contradição com a conclusão de que a parte autora não está incapacitada para o trabalho. Em decorrência da dependência química, a parte autora desenvolveu transtornos mentais e comportamentais, caracterizados por alterações da personalidade e prejuízos cognitivos, que tornam difícil, no momento, a sua interação social e a reinserção no mercado de trabalho, apesar do tratamento a que se submete, pois ainda não tem condições de lidar com aqueles fatores típicos que podem desencadear uma recaída. Assim sendo, conquanto o perito judicial tenha afirmado que não há, no momento, incapacidade para o exercício da atividade laboral, há elementos, nos autos, que conduzem à conclusão de que, embora abstinente no momento, a parte autora não está em condições de retornar ao trabalho imediatamente.
3. O magistrado não está adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem o artigo 436 do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, podendo também considerar, como no caso, outros elementos de prova constantes dos autos.
4. Constatada a existência de deficiência de longo prazo que impede a parte autora de exercer atividade laborativa, pelo menos desde a cessação do benefício de auxílio-doença. Ademais, a parte autora não possui idade avançada, com histórico de tratamento psiquiátrico recente sem internações, e vínculos de empregado no seu histórico, o que sobreleva considerar a possibilidade de recuperação. Fundada nesses pontos relevantes, a melhor solução é a concessão do benefício temporário.
5. Comprovado, nos autos, que a parte autora é segurada da Previdência Social e cumpriu a carência de 12 (doze) contribuições, exigida pelo artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91.
6. O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento administrativo ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
7. No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 01/12/2021, dia seguinte ao da cessação administrativa.
8. Com base no conjunto probatório dos autos, o auxílio-doença deverá ser pago por 120 (cento e vinte) dias, a contar da efetiva implantação, cumprindo a parte autora, se entender não estar em condições de retornar ao trabalho, requerer a prorrogação do benefício, como lhe faculta a lei.
9. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices e critérios previstos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução.
10. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data deste julgamento, já que, nos casos em que o benefício previdenciário não é concedido em sentença, mas apenas em sede recursal, a base de cálculos da verba honorária, conforme entendimento dominante esposado pelas Turma da 3ª Seção deste Egrégio Tribunal, compreende as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício.
11. A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais, tanto no âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça do Estado de São Paulo (Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/2003), mas (i) não do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora, (ii) nem do pagamento de honorários periciais ou do seu reembolso, caso o pagamento já tenha sido antecipado pela Justiça Federal, devendo retornar ao erário (Resolução CJF nº 305/2014, art. 32).
12. Apelo provido. Sentença reformada.
