
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005821-69.2014.4.03.6112
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARCOS LUIZ ANTONIO
Advogados do(a) APELANTE: FRANCIELI BATISTA ALMEIDA - SP321059-A, ROSINALDO APARECIDO RAMOS - SP170780-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: DANILO TROMBETTA NEVES - SP220628-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005821-69.2014.4.03.6112
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARCOS LUIZ ANTONIO
Advogado do(a) APELANTE: ROSINALDO APARECIDO RAMOS - SP170780-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: DANILO TROMBETTA NEVES - SP220628-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por MARCOS LUIZ ANTONIO, em ação previdenciária proposta por este em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria especial, mediante reconhecimento do trabalho em condições agressivas à saúde, além da conversão do tempo comum em especial.
A r. sentença (ID 104263121 - Págs. 45 a 54) julgou improcedente a demanda. Condenou a parte autora em honorários advocatícios, fixados em R$ 500,00, cuja execução foi suspensa nos temos do art. 12 da Lei n° 1.060/50. Sem custas.
Em razões recursais (ID 104263121 - Págs. 88 a 106), a parte autora defende o reconhecimento da especialidade dos períodos de 01/09/1983 a 30/04/1986, 01/09/1986 a 14/03/1988 e 01/07/1988 a 04/11/1995, trabalhados como "auxiliar de carpinteiro" e "carpinteiro", e o intervalo de 04/09/1996 a 08/01/2014, em razão da exposição a ruído e agentes biológicos, além de requerer a conversão inversa.
A parte autora atravessou petição incidental, requerendo a reafirmação da DER para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição sem incidência do fator previdenciário, nos termos do art. 29-C da Lei 8.213/91, a despeito de não ter formulado o pedido na inicial.
Devidamente processado o recurso, com contrarrazões do INSS, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005821-69.2014.4.03.6112
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARCOS LUIZ ANTONIO
Advogado do(a) APELANTE: ROSINALDO APARECIDO RAMOS - SP170780-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: DANILO TROMBETTA NEVES - SP220628-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Ressalte-se que o pedido que foi analisado pela r. sentença, foi exatamente aquele postulado na inicial (concessão de aposentadoria especial), cabendo frisar a impossibilidade de modificação do objeto da demanda por meio da inovação recursal, atitude vedada no ordenamento jurídico pátrio.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Período Trabalhado | Enquadramento | Limites de Tolerância |
Até 05/03/1997 | 1. Anexo do Decreto nº 53.831/64. 2. Decretos nºs 357/91 e 611/92 | 80 dB |
De 06/03/1997 a 18/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, redação original | 90dB |
A partir de 19/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03 | 85 dB |
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
"(...) a primeira tese o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.
(...)
a segunda tese
fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte:na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador
, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP),no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria
" (STF, ARE 664.335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJe n. 29, de 11.02.2015, public. 12.02.2015)" (grifos nossos).Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Do caso concreto.
Controvertida, na demanda, a especialidade dos intervalos de 01/09/1983 a 30/04/1986, 01/09/1986 a 14/03/1988 e 01/07/1988 a 04/11/1995 e 04/09/1996 a 08/01/2014.
No que diz respeito aos intervalos de 01/09/1983 a 30/04/1986 e 01/07/1988 a 04/11/1995, trabalhados na empresa “Satoro Otani – ME”, na função de carpinteiro, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (ID 104263120 - Pág. 50) informa, genericamente, a sujeição a ruído, sem especificar a intensidade; agentes químicos “dos vapores das tintas utilizadas nas pinturas das carrocerias e das tampas e trabalho permanente com exposição a poeiras (pó de madeira)”; e ergonômicos. Logo, inviável o enquadramento da atividade como especial, eis que não há indicação de agente nocivo previsto na legislação de regência.
Também na profissão de carpinteiro, laborou o autor na empresa “Troncos e Balança Deopel Ltda”, de 01/09/1986 a 14/03/1988, em relação a qual o PPP de ID 104263120 - Pág. 52 indica apenas o risco “de acidentes”, sem mais. Igualmente, impossível o reconhecimento da especialidade neste tocante, por falta de previsão legislativa.
Vale salientar que a profissão de carpinteiro não detém previsão de enquadramento profissional, não encontrando guarida nos róis legais condizentes com a matéria sob análise.
Finalmente, durante o labor na “Associação Prudentina de Educação e Cultura”, de 04/09/1996 a 08/01/2014, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (ID 104263120 - Págs. 54 e 55), com identificação dos responsáveis pelos registros ambientais, aponta a submissão ao ruído de 108,34dB. Superior ao limite de tolerância, portanto.
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputa-se enquadrado como especial o intervalo de 04/09/1996 a 08/01/2014.
A pretensão de conversão de tempo comum em especial, denominada "conversão inversa", não merece prosperar. Isso porque o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.310.034/PR, em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva, firmou o entendimento no sentido de que a lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, inclusive quanto ao fator de conversão, independente do regime jurídico à época da prestação do serviço, restando inaplicável a regra que permitia a conversão de atividade comum em especial aos benefícios requeridos após a edição da Lei nº 9.032/95.
Esta 7ª Turma, sobre o tema, assim se pronunciou:
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 1.022, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. HIPÓTESES DE CABIMENTO. CONCESSÃO DE EFEITO INFRINGENTE EM RAZÃO DE O TEMA TER SIDO APRECIADO POR TRIBUNAL SUPERIOR POR MEIO DE RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. NECESSIDADE DE PACIFICAÇÃO DO LITÍGIO E DE SE PRESTIGIAR OS PROVIMENTOS JUDICIAIS CUJA EFICÁCIA É VINCULANTE. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONVERSÃO INVERSA.
(...)
- DA CONVERSÃO INVERSA. O C. Superior Tribunal Justiça, quando do julgamento do REsp 1.310.034/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 19.12.2012, reafirmado em Embargos de Declaração, DJe de 02.02.2015 - representativo da controvérsia), consolidou o entendimento de que a lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, inclusive quanto ao fator de conversão, independente do regime jurídico à época da prestação do serviço, restando inaplicável a regra que permitia a conversão de atividade comum em especial aos benefícios requeridos após a edição da Lei nº 9.032/95.
- Embargos de declaração opostos pela autarquia previdenciária acolhidos."
(ED em AC nº 2011.61.83.010158-4/SP, Rel. Des. Federal Fausto de Sanctis, DE 18/10/2017).
Conforme planilha anexa, considerando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda e em sede administrativa (ID 104263120 - Pág. 80), verifica-se que a parte autora contava com
17 anos, 4 meses e 5 dias
de atividade desempenhada em condições especiais no momento do requerimento administrativo (08/01/2014 – data indicada pelo autor na inicial - ID 104263120 - Pág. 40; DER 23/12/2013 - ID 104263120 - Pág. 82), portanto, tempo insuficiente para fazer jus à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº. 8.213/1991.Na esteira da tese firmada pelo STJ no Tema Repetitivo nº 995, é possível a reafirmação da DER para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, a saber:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. REAFIRMAÇÃO DA DER (DATA DE ENTRADA DO REQUERIMENTO). CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. O comando do artigo 493 do CPC/2015 autoriza a compreensão de que a autoridade judicial deve resolver a lide conforme o estado em que ela se encontra. Consiste em um dever do julgador considerar o fato superveniente que interfira na relação jurídica e que contenha um liame com a causa de pedir.
2. O fato superveniente a ser considerado pelo julgador deve guardar pertinência com a causa de pedir e pedido constantes na petição inicial, não servindo de fundamento para alterar os limites da demanda fixados após a estabilização da relação jurídico-processual.
3. A reafirmação da DER (data de entrada do requerimento administrativo), objeto do presente recurso, é um fenômeno típico do direito previdenciário e também do direito processual civil previdenciário. Ocorre quando se reconhece o benefício por fato superveniente ao requerimento, fixando-se a data de início do benefício para o momento do adimplemento dos requisitos legais do benefício previdenciário.
4. Tese representativa da controvérsia fixada nos seguintes termos: É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
5. No tocante aos honorários de advogado sucumbenciais, descabe sua fixação, quando o INSS reconhecer a procedência do pedido à luz do fato novo.
6. Recurso especial conhecido e provido, para anular o acórdão proferido em embargos de declaração, determinando ao Tribunal a quo um novo julgamento do recurso, admitindo-se a reafirmação da DER.
Julgamento submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos.
(REsp 1727063/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/10/2019, DJe 02/12/2019)
Assim sendo, saliente-se que, ainda que se considere como especial o período posterior ao ajuizamento da demanda, até a data da expedição do PPP de ID 104263121 - Pág. 120, em 19/09/2018, o autor não faria jus ao benefício vindicado (aposentadoria especial), eis que contava com
22 anos e 16 dias
de atividade desempenhada em condições especiais, conforme planilha anexa, portanto, ainda tempo insuficiente para fazer jus à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº. 8.213/1991.Esclareço que se sagrou vitorioso o autor ao ver reconhecida parte da especialidade vindicada. Por outro lado, não foi concedida a aposentadoria especial, restando vencedora nesse ponto a autarquia. Desta feita, dou os honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixo de condenar qualquer delas no reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS delas isento.
Ante o exposto,
dou parcial provimento à apelação da parte autora,
para reconhecer a especialidade do período de 04/09/1996 a 08/01/2014, assim como reconhecer a sucumbência recíproca, mantida, no mais, a r. sentença prolatada em primeiro grau de jurisdição.Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso excepcional ou a certificação do trânsito em julgado.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. RUÍDO. RECONHECIMENTO PARCIAL. TEMPO INSUFICIENTE. REAFIRMAÇÃO DA DER. POSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO À PROVA DOS AUTOS. BENEFÍCIO ESPECIAL NÃO DEFERIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Ressalte-se que o pedido que foi analisado pela r. sentença, foi exatamente aquele postulado na inicial (concessão de aposentadoria especial), cabendo frisar a impossibilidade de modificação do objeto da demanda por meio da inovação recursal, atitude vedada no ordenamento jurídico pátrio.
2 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
3 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
4 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
5 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91.
6 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
7 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
8 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
9 - A ausência de informação, no Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, acerca da habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, em nada prejudica o segurado, na medida em que tal campo específico não integra o formulário.
10 - Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior. Precedentes.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - Controvertida, na demanda, a especialidade dos intervalos de 01/09/1983 a 30/04/1986, 01/09/1986 a 14/03/1988 e 01/07/1988 a 04/11/1995 e 04/09/1996 a 08/01/2014.
14 - No que diz respeito aos intervalos de 01/09/1983 a 30/04/1986 e 01/07/1988 a 04/11/1995, trabalhados na empresa “Satoro Otani – ME”, na função de carpinteiro, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (ID 104263120 - Pág. 50) informa, genericamente, a sujeição a ruído, sem especificar a intensidade; agentes químicos “dos vapores das tintas utilizadas nas pinturas das carrocerias e das tampas e trabalho permanente com exposição a poeiras (pó de madeira)”; e ergonômicos. Logo, inviável o enquadramento da atividade como especial, eis que não há indicação de agente nocivo previsto na legislação de regência.
15 - Também na profissão de carpinteiro, laborou o autor na empresa “Troncos e Balança Deopel Ltda”, de 01/09/1986 a 14/03/1988, em relação a qual o PPP de ID 104263120 - Pág. 52 indica apenas o risco “de acidentes”, sem mais. Igualmente, impossível o reconhecimento da especialidade neste tocante, por falta de previsão legislativa.
16 - Vale salientar que a profissão de carpinteiro não detém previsão de enquadramento profissional, não encontrando guarida nos róis legais condizentes com a matéria sob análise.
17 - Finalmente, durante o labor na “Associação Prudentina de Educação e Cultura”, de 04/09/1996 a 08/01/2014, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (ID 104263120 - Págs. 54 e 55), com identificação dos responsáveis pelos registros ambientais, aponta a submissão ao ruído de 108,34dB. Superior ao limite de tolerância, portanto.
18 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputa-se enquadrado como especial o intervalo de 04/09/1996 a 08/01/2014.
19 - A pretensão de conversão de tempo comum em especial, denominada "conversão inversa", não merece prosperar. Isso porque o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.310.034/PR, em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva, firmou o entendimento no sentido de que a lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, inclusive quanto ao fator de conversão, independente do regime jurídico à época da prestação do serviço, restando inaplicável a regra que permitia a conversão de atividade comum em especial aos benefícios requeridos após a edição da Lei nº 9.032/95.
20 - Conforme planilha anexa, considerando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda e em sede administrativa (ID 104263120 - Pág. 80), verifica-se que a parte autora contava com
17 anos, 4 meses e 5 dias
de atividade desempenhada em condições especiais no momento do requerimento administrativo (08/01/2014 – data indicada pelo autor na inicial - ID 104263120 - Pág. 40; DER 23/12/2013 - ID 104263120 - Pág. 82), portanto, tempo insuficiente para fazer jus à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº. 8.213/1991.21 - Na esteira da tese firmada pelo STJ no Tema Repetitivo nº 995, é possível a reafirmação da DER para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias.
22 - Assim sendo, saliente-se que, ainda que se considere como especial o período posterior ao ajuizamento da demanda, até a data da expedição do PPP de ID 104263121 - Pág. 120, em 19/09/2018, o autor não faria jus ao benefício vindicado (aposentadoria especial), eis que contava com
22 anos e 16 dias
de atividade desempenhada em condições especiais, conforme planilha anexa, portanto, ainda tempo insuficiente para fazer jus à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº. 8.213/1991.23 – Sagrou-se vitorioso o autor ao ver reconhecida parte da especialidade vindicada. Por outro lado, não foi concedida a aposentadoria especial, restando vencedora nesse ponto a autarquia. Desta feita, dá-se os honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixa-se de condenar qualquer delas no reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS delas isento.
24 - Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade do período de 04/09/1996 a 08/01/2014, assim como reconhecer a sucumbência recíproca, mantida, no mais, a r. sentença prolatada em primeiro grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
