
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006432-97.2023.4.03.6183
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: GLAUCIA DE AZEVEDO RUSSO
Advogado do(a) APELANTE: IVANIR ALVES DIAS PARIZOTTO - SC23705-A
APELADO: .INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006432-97.2023.4.03.6183
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: GLAUCIA DE AZEVEDO RUSSO
Advogado do(a) APELANTE: IVANIR ALVES DIAS PARIZOTTO - SC23705-A
APELADO: .INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, com fundamento na incapacidade laborativa da parte autora, condenando o INSS a restabelecer o benefício de AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA, no período de 15/08/2018 a 10/04/2025, com a aplicação de juros de mora e correção monetária, e condenando as partes, em razão da sucumbência recíproca, ao pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença, que deverão ser proporcionalmente distribuídos, suspensa a execução, em relação à parte autora, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita, antecipando, ainda, os efeitos da tutela para implantação do benefício.
Em suas razões de recurso, alega a parte autora que:
- que, estando incapacitada, ainda que parcialmente, para sua atividade laboral habitual, e por possuir baixa instrução, não há possibilidade de reabilitação profissional, o que justifica a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente;
- que o auxílio por incapacidade temporária só poderá ser cessado pelo INSS se constatada por perícia administrativa a efetiva recuperação da sua capacidade laboral;
- diante das evidências do seu direito à obtenção do benefício, o indeferimento imotivado configurou dano moral, impondo-se a condenação do INSS ao pagamento de indenização.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006432-97.2023.4.03.6183
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: GLAUCIA DE AZEVEDO RUSSO
Advogado do(a) APELANTE: IVANIR ALVES DIAS PARIZOTTO - SC23705-A
APELADO: .INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Em razão de sua regularidade formal, recebo o recurso, nos termos do artigo 1.011 do CPC/2015.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por incapacidade permanente, nova nomenclatura da aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio por incapacidade temporária, antigo auxílio-doença (artigo 59).
E a nomenclatura “auxílio por incapacidade temporária” é um termo guarda-chuva, que abriga não apenas aqueles casos de incapacidade temporária, mas também os de incapacidade definitiva para a atividade habitual, sendo que o primeiro cessa com a recuperação da capacidade laboral do segurado e o último, com a sua reabilitação para outra atividade que lhe garanta a subsistência (artigo 62), podendo, ainda, se o segurado for considerado insusceptível de reabilitação, ser convertido em aposentadoria por incapacidade permanente (parágrafo 1º).
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em 10/10/2023 constatou que a parte autora, professora, idade atual de 52 anos, está incapacitada de forma total e temporária para o exercício de atividade laboral, como se vê do laudo constante do ID293308640:
"Após anamnese psiquiátrica e exame dos autos concluímos que a pericianda não apresenta sintomas e sinais sugestivos de desenvolvimento mental incompleto, retardo mental, demência ou psicose. Trata-se de autora com longo histórico de tratamento psiquiátrico e psicológico com persistência de alterações crônicas do humor, alterações da personalidade. Ela tem inúmeros diagnósticos que vão de episódio depressivo grave com sintomas psicóticos até transtorno dissociativo e transtorno histriônico de personalidade" (pág. 04)
"A autora apresenta atualmente episódio misto com flutuações do humor, crises de ansiedade de forma que o quadro não está estabilizado. Do ponto de vista estritamente funcional o quadro é passível de controle com ajuste da medicação e psicoterapia. Há duas questões a considerar: a primeira se refere ao tempo de afastamento do trabalho, à idade da autora e mesmo que houvesse melhora clínica dificilmente essa senhora se recolocaria no mercado de trabalho; o segundo é que seu quadro nunca foi suficientemente grave com internações ou tentativas efetivas de autoextermínio. A nosso ver, dificilmente a autora obterá controle do quadro pelo ganho secundário da doença. Por outro lado, não há gravidade suficiente para se falar em aposentadoria por invalidez. Assim, vamos considerar conceder dezoito meses de afastamento do trabalho visto que vem sendo tratada como portadora de transtorno afetivo bipolar desde 21/11/2022. Incapacitada de forma total e temporária por dezoito meses quando deverá ser reavaliada. Data de início da incapacidade da autora, pelos documentos acostados aos autos, fixada em 08/05/2018 quando o psiquiatra fala em resposta insatisfatória ao tratamento.
Com base nos elementos e fatos expostos e analisados, conclui-se: Caracterizada situação de incapacidade laborativa temporária (dezoito meses), sob a ótica psiquiátrica." (pág. 05)
O laudo em questão foi realizado por profissional habilitado, equidistante das partes, capacitado, especializado em perícia médica, e de confiança do r. Juízo, cuja conclusão encontra-se lançada de forma objetiva e fundamentada, não havendo que se falar em realização de nova perícia judicial. Outrossim, levou em consideração, para formação de seu convencimento, a documentação médica colacionada aos autos, bem como atendeu às necessidades do caso concreto, possibilitando concluir que o perito realizou minucioso exame clínico, respondendo aos quesitos formulados.
Embora o perito judicial tenha concluído pela incapacidade temporária da parte autora, depreende-se, dos autos, que os transtornos mentais que a afligem tiveram início no ano de 2008 e, desde então, lhe foram concedidos vários benefícios de auxílio por incapacidade temporária (NB 532.195.822-6, de 17/09/2008 a 02/10/2008; NB 534.521.802-8, de 02/03/2009 a 31/07/2011; NB 547.358.768-9, de 04/08/2011 a 13/03/2013; e NB 601.423.429-6, de 16/04/2013 a 14/08/2018) (vide ID293308639 - dossiê médico - e ID293308640 - dossiê previdenciário).
Ora, considerando a idade atual da parte autora e que os males incapacitantes a afligem há longa data, não tendo, desde então, obtido a cura para os seus males nem a recuperação da sua capacidade laborativa, não obstante o tratamento a que vem se submetendo, é de se concluir que ela não mais reúne condições para o trabalho.
Destaco que o magistrado não está adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõe o artigo 479 do CPC/2015, também podendo ser considerados, como no presente caso, outros elementos de prova constantes dos autos.
Desse modo, considerando que a parte autora, conforme o conjunto probatório dos autos, não tem condições de trabalhar, sendo improvável a recuperação da sua capacidade laboral e não tendo ela condições de se reabilitar para o exercício de outra atividade que lhe garanta o sustento, é possível a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente, até porque preenchidos os demais requisitos legais.
Nesse sentido, é o entendimento firmado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
... a jurisprudência do STJ alinhou-se no sentido de que, para a concessão da aposentadoria por invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela incapacidade laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado.
(AgInt nos EDcl no AREsp nº 884.666/DF, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 08/11/2016)
Quanto ao preenchimento dos demais requisitos (condição de segurado e cumprimento da carência), a matéria não foi questionada pelo INSS, em suas razões de apelo, devendo subsistir, nesse ponto, o que foi estabelecido pela sentença.
Não é o caso de se fixar um termo final do benefício, vez que o benefício concedido foi o de aposentadoria por incapacidade permanente, não se aplicando, à hipótese dos autos, o disposto no artigo 60, parágrafos 8º e 9º, da Lei nº 8.213/91.
Relativamente ao pedido de indenização por danos morais, deve ser apreciado à luz da teoria da responsabilidade civil do Estado, ficando caracterizado o dever de indenizar quando presentes o dano indenizável - o qual se caracteriza pela violação a um bem imaterial - e o nexo de causalidade entre o dano e a atividade estatal.
Não há nos autos qualquer indício de que a parte autora tenha sofrido violação a qualquer um dos bens jurídicos anteriormente mencionados, o que por si só enseja a improcedência do pedido indenizatório.
O fato de a Administração ter cessado benefícios e indeferido pedidos, por si só, não autoriza o deferimento da indenização buscada, seja porque não ficou demonstrada qualquer má-fé da Administração, seja porque a ausência de incapacidade, nesses casos, foi constatada por perícia médica administrativa, tendo o INSS atuado em conformidade com a lei.
Como bem asseverou o MM. Juízo de origem:
"... constato que não há qualquer indício de dano moral sofrido pela parte autora, a ser indenizado pelo INSS.
A parte autora não produziu em momento algum da presente demanda, uma prova indiciária sequer de ter sofrido tal espécie de dano em razão da conduta do INSS.
Sobre a conduta do INSS, ademais, vale mencionar que o indeferimento do pedido de concessão de benefício nada tem de abusivo, encontrando-se a autarquia no regular exercício de sua competência administrativa.
Em relação ao pedido de danos material não há indicação por parte da demandante acerca dos danos materiais sofridos, tratando-se de alegação genérica, sem supedâneo em provas contundentes que venham a demonstrar o prejuízo sofrido pela parte autora.
Assim, à mingua de provas que indiquem o dano material sofrido pela parte autora, é de rigor a improcedência do pedido quanto a esta questão." (ID293308654)
Vê-se, assim, que a decisão apelada andou bem ao julgar improcedente o pedido de indenização por danos morais, estando em sintonia com a jurisprudência desta C. Turma sobre o tema:
No concernente aos alegados danos moral e material (contratação de advogado), observo que não restou comprovada lesão que caracterize dano moral ou material, bem como tendo a autarquia dado ao fato uma das interpretações possíveis, não se extraindo do contexto conduta irresponsável ou inconsequente, diante do direito controvertido apresentado, não é devida indenização por dano moral ou material. - 2. Não configurado quaisquer danos, de rigor a manutenção da sentença.
(AC nº 0010138-97.2015.4.03.6105, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, DE 15/08/2017)
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei.
Assim, provido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente, descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao apelo da parte autora, para conceder-lhe, em substituição ao auxílio por incapacidade temporária deferido pela sentença, a APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE, nos termos dos artigos 42 e 44 da Lei nº 8.213/91, a partir de 15/08/2018, dia seguinte ao da cessação administrativa do último auxílio por incapacidade temporária. Mantenho, quanto ao mais, a sentença apelada.
Independentemente do trânsito em julgado, requisite-se à Gerência Executiva do INSS, com base no artigo 497 do CPC/2015, que, no prazo de 45 dias, sob pena de multa-diária no valor de R$ 100,00, cumpra a obrigação de fazer em favor da segurada GLÁUCIA DE AZEVEDO RUSSO, consistente na implantação do benefício de APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE (em substituição ao auxílio por incapacidade temporária, concedido na sentença), com data de início (DIB) em 15/08/2018 (dia seguinte ao da cessação administrativa do último auxílio por incapacidade temporária), e renda mensal a ser calculada de acordo com a legislação vigente.
COMUNIQUE-SE.
É COMO VOTO.
/gabiv/asato
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. INCAPACIDADE DEFINITIVA PARA A ATIVIDADE LABORAL. DEMAIS REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO FINAL DO BENEFÍCIO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. HONORÁRIOS RECURSAIS. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA, EM PARTE.
1. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por incapacidade permanente, nova nomenclatura da aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio por incapacidade temporária, antigo auxílio-doença (artigo 59). Assim, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
2. Embora o perito judicial tenha concluído pela incapacidade temporária da parte autora, depreende-se, dos autos, que os transtornos mentais que a afligem tiveram início no ano de 2008 e, desde então, lhe foram concedidos vários benefícios de auxílio por incapacidade temporária. Assim, considerando que os males incapacitantes a afligem há longa data, não tendo, desde então, obtido a cura para os seus males nem a recuperação da sua capacidade laborativa, não obstante o tratamento a que vem se submetendo, é de se concluir que ela não mais reúne condições para a atividade laboral.
3. O magistrado não está adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõe o artigo 479 do CPC/2015, também podendo ser considerados, como no presente caso, outros elementos de prova constantes dos autos.
4. Considerando que a parte autora, conforme o conjunto probatório dos autos, não tem condições de trabalhar, sendo improvável a recuperação da sua capacidade laboral, é possível a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente, até porque preenchidos os demais requisitos legais.
5. Não é o caso de se fixar um termo final do benefício, vez que o benefício concedido foi o de aposentadoria por incapacidade permanente, não se aplicando, à hipótese dos autos, o disposto no artigo 60, parágrafos 8º e 9º, da Lei nº 8.213/91.
6. Não há nos autos qualquer indício de que a parte autora tenha sofrido violação a qualquer um dos bens jurídicos anteriormente mencionados, o que por si só enseja a improcedência do pedido indenizatório. E o fato de a Administração ter cessado benefícios e indeferido pedidos, por si só, não autoriza o deferimento da indenização buscada, seja porque não ficou demonstrada qualquer má-fé da Administração, seja porque a ausência de incapacidade, nesses casos, foi constatada por perícia médica administrativa, tendo o INSS atuado em conformidade com a lei.
7. Provido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente, descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais.
8. Apelo parcialmente provido. Sentença reformada, em parte.
