Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5058573-67.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
13/05/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 19/05/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL
AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PAGO AO IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO
ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03. APLICAÇÃO POR ANALOGIA. PRECEDENTES
JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO
DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA
DE NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ISOLADA. ANÁLISE DA MISERABILIDADE
EM CONJUNTO COM DEMAIS FATORES. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO
CONFIGURADO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA DEMONSTRADA. CASAL DE IDOSOS.
RENDA VARIÁVEL DE MEIO SALÁRIO MÍNIMO. LIMITE DO PARÂMETRO JURISPRUDENCIAL
DA MISERABILIDADE. AUSÊNCIA DE AUXÍLIO GOVERNAMENTAL E DE TERCEIROS.
MÍNIMO EXISTENCIAL NÃO GARANTIDO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DEVIDO. DIB. DATA
DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE RECURSO. MANUTENÇÃO DA
SENTENÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS
DESPROVIDA. CONSECTÁRIOS LEGAIS ALTERADOS DE OFÍCIO.
1 – O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o
pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem
não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a
concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
3 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a
redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
4 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de
miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a
manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do
Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia.
5 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para
comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento
da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de
constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
6 – Todavia, a mera aplicação do referido dispositivo não enseja, automaticamente, a concessão
do benefício, uma vez que o requisito da miserabilidade não pode ser analisado tão somente
levando-se em conta o valor per capita, sob pena de nos depararmos com decisões
completamente apartadas da realidade. Destarte, a ausência, ou presença, desta condição
econômica deve ser aferida por meio da análise de todo o conjunto probatório.
7 - Pleiteia a parte autora a concessão de benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é
incapaz e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua
família.
8 - O profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base exame realizado em 08 de junho
de 2018 (ID 6963925 – p. 1/5), quando a requerente tinha 62 (sessenta e dois) anos de idade, a
diagnosticou como portadora de “Neurocisticercose, Osteoartrose, Escoliose, Diabetes,
Hipertensão Arterial e Insuficiência Aórtica”.
9 - Consignou o expert que “Atualmente os sinais e sintomas das patologias de que é portadora a
incapacita para todas as atividades laborais”. Ponderou: “a incapacidade laboral poderá ser
temporária. Está realizando tratamento médico adequado. Nova perícia médica deverá ser
realizada em dezembro de 2018 (180 dias) para constatar a existência da incapacidade (ou
capacidade) laboral.” Fixou a data da incapacidade laboral a partir de outubro de 2017.
10 - O juiz não está adstrito integralmente ao laudo pericial, nos termos do que dispõe o art. 436
do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado. Por ser o juiz
o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame.
Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
11 - Ainda que o laudo pericial tenha apontado pela eventual e hipotética possibilidade de ser
considerada como temporária a incapacidade da autora, sequer houve detalhamento específico a
esse respeito pelo perito com qualquer justificativa concreta para tal prognóstico, tampouco
definida data para tanto, sendo simplesmente marcada nova perícia para a reavaliação da
requerente em 180 (cento e oitenta dias).
12 - Por outro lado, a gravidade da saúde da autora foi reconhecida pela conclusão de que não
poderia exercer qualquer atividade, cabendo atentar que o seu quadro clínico está fundado em
histórico progressivo, fartamente documentado, por meio de uma diversidade de exames e
respectivos resultados inclusive relatados na perícia, dentre os quais: a) “Tomografia
computadorizada de crânio realizada em 24 de novembro de 2016 (fls. 77 dos autos) relata:
múltiplas e diminutas calcificações esparsas no parênquima encefálico, sem alterações
associadas, compatíveis com granulomas calcificados (neurocisticercose); b) “Radiografia dos
quadris realizada em 13 de novembro de 2013 (fls. 78 dos autos) relata: osteofitos e esclerose em
articulações sacras ilíacas. Radiografia da coluna lombo sacra realizada em 13 de novembro de
2013 (fls. 78 dos autos) relata: osteofitos e discopatia L5/S1. Radiografia da coluna lombo sacra
realizada em 11 de abril de 2016 (fls. 16 dos autos) relata osteofitos e espondiloartrose lombar.
Radiografia dos quadris realizada em 4 de outubro de 2017 (fls. 79 dos autos anexo) relata:
osteofitos e esclerose em articulações sacras ilíacas. Radiografia da coluna lombo sacra
realizada em 4 de outubro de 2017 (fls. 79 dos autos e anexo) relata: osteofitos e discopatia
L5/S1. Radiografia da bacia realizada em 16 de maio de 2018 (anexo) relata: osteofitos e artrose
coxo femoral inicial. Radiografia da coluna lombo sacra realizada em 16 de maio de 2018 (anexo)
relata: osteofitos e discopatia L5/S1. Atestados médicos emitidos em 25 de maio de 2016 (fls. 24
dos autos), em 4 de outubro de 2017 (fls. 81 dos autos e anexo) e em 16 de maio de 2018
(anexo) relatam a patologia.”c) “Radiografia da coluna lombo sacra realizada em 13 de novembro
de 2013 (fls. 78 dos autos), em 4 de outubro de 2017 (fls. 79 dos autos e anexo) e em 16 de maio
de 2018 (anexo) relatam: escoliose.”
13 - Tais elementos coligidos aos autos evidenciam que desde os anos de 2013 e início de 2016
a saúde da autora já estava nitidamente debilitada, o que está em perfeita sintonia com as
próprias declarações da postulante – de que está impossibilitada de exercer atividade
remunerada há aproximadamente 2 (dois) anos.
14 - Ademais, ainda que se cogite eventual retorno às suas atividade como mencionado pelo
perito, inegável que a situação da requerente - com histórico de desempenho da profissão de
faxineira e diarista, as quais reúnem uma série de atividades, muitas delas que essencialmente
exigem esforço físico -, com baixo grau de instrução, mais de sessenta anos e apresentando
comprometimentos físicos de longa data, não só evidencia a presença de fatores capazes de
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas, como aponta para uma dificultosa possibilidade de recolocação profissional a esta
altura, restando configurado, também por este prisma, o impedimento de longo prazo.
15 - A parte autora também demonstrou ser hipossuficiente para os fins de concessão do
benefício ora em análise.
16 - O estudo social, elaborado com base em visita realizada na casa da demandante em 06 de
outubro de 2017 (ID 6963903, p. 1/11), informou que o núcleo familiar é formado por esta e seu
esposo.
17 - Residem em residência popular, alugada, construída em alvenaria, com forro e piso ladrilho.
A morada é composta por três quartos, uma cozinha, uma sala, um banheiro, uma copa e duas
varandas.
18 - A renda da família, segundo o informado à assistente, decorria dos rendimentos do marido,
JAIR STEVANI, na profissão de caminhoneiro, no valor variável “que gira em torno” de R$
1.000,00.
19 - As despesas relatadas, envolvendo gastos com aluguel, energia elétrica, água, alimentação,
telefone, celular, roupas e calçados, medicamentos, cingiam a aproximadamente R$ 1.249,00.
20 - Mediante a visita domiciliar, foi detalhada a carência vivenciada pela dificuldade financeira,
com interferência direta na aquisição de: “roupas e calçados/ roupas de cama, banho e mesa;
tratamento dentário não disponibilizado pela Rede Pública de Saúde; produtos de higiene
pessoal/ corte de cabelo; um par de óculos, o que vem fazendo uso se encontra em péssimo
estado; cama e colchão (em péssimo estado de conservação); móveis, eletrodomésticos e
eletroeletrônicos (compra e substituição); melhoria das condições de alimentação que segundo
informou a Autora, são precárias. E ainda de acordo com os problemas de saúde que enfrenta,
necessitando ser à base de legumes, frutas e verduras; pagamento de aluguel em atraso”.
21 - Portanto, a renda per capita familiar, por se tratar de rendimento variável, estaria em torno do
limite do parâmetro jurisprudencial de miserabilidade, de ½ (metade) de um salário mínimo, sendo
insuficiente para fazer frente às despesas do casal.
22 - Apurou-se que não estavam inscritos em programas sociais de transferência de renda
municipal, estadual e federal.
23 - Foi informado que a requerente tem 3 (três) filhos. E, nesse ponto, não se nega que é dever
dos filhos prestar ajuda a seus genitores. Com efeito, o benefício assistencial de prestação
continuada existe para auxiliar a sobrevivência das pessoas portadoras de incapacidade, por
idade avançada, ou outras restrições físicas ou psíquicas para o trabalho e que não possuam
parentes próximos em condições de lhes prover o sustento. O dever, portanto, é, em primeiro
lugar, da família.
24 - Os filhos, residentes em outras localidades, possuem famílias e despesas próprias. Foi
declarado que inclusive estes haviam “se cotizado e pagaram consulta com médico ortopedista e
exames de imagem”. No entanto, não há elementos suficientes para afirmar que poderiam
contribuir com préstimos superiores aos já fornecidos.
25 - Alie-se, como elemento de convicção, a corroborar a vulnerabilidade social da família, o fato
de que os seus 2 (dois) integrantes são atualmente pessoas idosas, sendo que o fator etário, por
si só, figura como circunstância adicional que acaba por exasperar as despesas próprias ao longo
do tempo. Além disso, ambos já apresentam problemas de saúde. Ela, dado o impedimento de
longo prazo, não pode exercer atividade remunerada. Ele, por sua vez, tem problemas de coluna
e diabetes.
26 - Por fim, vale acrescentar as impressões da assistente social, ao encerrar a visita na casa da
postulante: “A renda família encontra-se centrada na atividade eventual que seu esposo exerce
como motorista de caminhão, auferindo uma renda que não é fixa e insuficiente para prover as
despesas fixas do lar e garantir as necessidades do casal. A situação familiar se agrava uma vez
que o esposo da Autora também enfrenta problemas de saúde. Conforme foi demonstrado no
decorrer deste Estudo Socioeconômico, a Autora enfrenta dificuldades financeiras, e não vem
sendo atendida na totalidade de suas necessidades pessoais, principalmente em relação ao
aspecto alimentação e aquisição de medicamentos que necessitam ser adquiridos em farmácias
particulares, o que a expõe a situação de risco e vulnerabilidade social.”
27 - Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifica-se que o
núcleo familiar se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, fazendo,
portanto, a parte autora, jus ao beneplácito assistencial.
28 - Acerca do termo inicial do benefício, firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na
data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência. (AgRg
no REsp 1532015/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em
04/08/2015, DJe 14/08/2015)." Assim, tendo em vista a apresentação de requerimento
administrativo pela parte autora em 26/05/2017 (ID 6963891, p. 1), de rigor seria a fixação da DIB
em tal data, no entanto, deve ser mantida em 25/05/2017, nos termos da r. sentença, tendo em
vista a falta de recurso nesse ponto.
29 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
30 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
31 - Saliente-se que, não obstante tratar-se de benefício assistencial, deve ser observado o tópico
do Manual atinente aos benefícios previdenciários, a teor do disposto no parágrafo único do art.
37 da Lei nº 8.742/93.
32 - Apelação do INSS desprovida. Consectários legais alterados de ofício.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5058573-67.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
Advogado do(a) APELANTE: ANDREA TERLIZZI SILVEIRA - SP194936-N
APELADO: MARIA HELENA ALVES STEVANI
Advogado do(a) APELADO: JOSE FERNANDO ANDRAUS DOMINGUES - SP156538-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5058573-67.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
Advogado do(a) APELANTE: ANDREA TERLIZZI SILVEIRA - SP194936-N
APELADO: MARIA HELENA ALVES STEVANI
Advogado do(a) APELADO: JOSE FERNANDO ANDRAUS DOMINGUES - SP156538-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS,
em ação ajuizada por MARIA HELENA ALVES STEVANI, objetivando a concessão do benefício
assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento
dos atrasados do beneplácito assistencial, desde a data do requerimento administrativo
(25/05/2017), acrescidas as diferenças apuradas de correção monetária e juros de mora.
Condenou-o, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das
parcelas vencidas até a data da sentença (ID 6963936, p. 1/8).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a
demandante não preencheu os requisitos para a concessão do benefício ora vindicado (ID
6963940, p. 1/2).
A parte autora apresentou contrarrazões (ID 6963943 – p. 1/3).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Parecer do Ministério Público Federal (ID 136410858, p. 1/3), no sentido do desprovimento do
recurso.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5058573-67.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
Advogado do(a) APELANTE: ANDREA TERLIZZI SILVEIRA - SP194936-N
APELADO: MARIA HELENA ALVES STEVANI
Advogado do(a) APELADO: JOSE FERNANDO ANDRAUS DOMINGUES - SP156538-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
A República Federativa do Brasil, conforme disposto no art. 1º, III, da Constituição Federal, tem
como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana que, segundo José Afonso da
Silva, consiste em:
"um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o
direito à vida. 'Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos
fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa
humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido
normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-
se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a
nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para construir teoria do núcleo da personalidade
individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre
que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem
social visará a realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa
e seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados
formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa
humana.'"
(Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 106-107).
Para tornar efetivo este fundamento, diversos dispositivos foram contemplados na elaboração
da Carta Magna, dentre eles, o art. 7º, IV, que dispõe sobre as necessidades vitais básicas
como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e
previdência social e o art. 203, que instituiu o benefício do amparo social, com a seguinte
redação:
"A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição
à seguridade social, e tem por objetivos:
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei."
Entretanto, o supracitado inciso, por ser uma norma constitucional de eficácia limitada,
dependia da edição de uma norma posterior para produzir os seus efeitos, qual seja, a Lei nº
8.742, de 7 de dezembro de 1993, regulamentada pelo Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de
1995 e, posteriormente, pelo Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007.
O art. 20 da Lei Assistencial, com redação fornecida pela Lei nº 12.435/2011, e o art. 1º de seu
decreto regulamentar estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, quais sejam:
ser o requerente deficiente ou idoso, com 70 anos ou mais e que comprove não possuir meios
de prover a própria manutenção e nem tê-la provida por sua família. A idade mínima de 70 anos
foi reduzida para 67 anos, a partir de 1º de janeiro de 1998, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 anos, através do art. 34 da Lei nº 10.741 de 01 de outubro de 2003,
mantida, inclusive, por ocasião da edição da Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011.
Os mesmos dispositivos legais disciplinaram o que consideram como pessoa com deficiência,
família e ausência de condições de se manter ou de tê-la provida pela sua família.
Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a
redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
O impedimento de longo prazo, a seu turno, é aquele que produz seus efeitos pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos (§10).
A incapacidade exigida, por sua vez, não há que ser entendida como aquela que impeça a
execução de todos os atos da vida diária, para os quais se faria necessário o auxílio
permanente de terceiros, mas a impossibilidade de prover o seu sustento por meio do exercício
de trabalho ou ocupação remunerada.
Neste sentido, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, em julgado da lavra do
Ministro Relator Gilson Dipp (5ª Turma, REsp nº 360.202, 04.06.2002, DJU 01.07.2002, p. 377),
oportunidade em que se consignou: "O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida
laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da
ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção
do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação
continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de
locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador".
No que se refere à hipossuficiência econômica, a Medida Provisória nº 1.473-34, de 11.08.97,
transformada na Lei nº 9.720, em 30.11.98, alterou o conceito de família para considerar o
conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo
teto. Com a superveniência da Lei nº 12.435/11, definiu-se, expressamente para os fins do art.
20, caput, da Lei Assistencial, ser a família composta pelo requerente, cônjuge ou companheiro,
os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e
enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, §1º).
Já no que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para
comprovar a condição de miserabilidade, anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no
julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle
concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
O v. acórdão, cuja ementa ora transcrevo, transitou em julgado em 19.09.2013:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203,
V, da Constituição da República, estabeleceu critérios para que o benefício mensal de um
salário mínimo fosse concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovassem
não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art.
20, § 3º da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo
Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se
incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja
renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro
estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria
que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do
benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de
Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do
art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Reclamação como instrumento de (re)interpretação da decisão
proferida em controle de constitucionalidade abstrato. Preliminarmente, arguido o prejuízo da
reclamação, em virtude do prévio julgamento dos recursos extraordinários 580.963 e 567.985, o
Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamação. O STF, no exercício da competência
geral de fiscalizar a compatibilidade formal e material de qualquer ato normativo com a
Constituição, pode declarar a inconstitucionalidade, incidentalmente, de normas tidas como
fundamento da decisão ou do ato que é impugnado na reclamação. Isso decorre da própria
competência atribuída ao STF para exercer o denominado controle difuso da
constitucionalidade das leis e dos atos normativos. A oportunidade de reapreciação das
decisões tomadas em sede de controle abstrato de normas tende a surgir com mais
naturalidade e de forma mais recorrente no âmbito das reclamações. É no juízo hermenêutico
típico da reclamação - no "balançar de olhos" entre objeto e parâmetro da reclamação - que
surgirá com maior nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no controle de
constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a determinada decisão do STF, o
Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua própria decisão. E,
inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisão-parâmetro da reclamação,
se entender que, em virtude de evolução hermenêutica, tal decisão não se coaduna mais com a
interpretação atual da Constituição. 4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos
preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei
8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia
quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com
entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios
mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004,
que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder
Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de
renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões
monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do
critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente
de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas
modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de
outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 5. Declaração de
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6.
Reclamação constitucional julgada improcedente. (Rcl 4374, GILMAR MENDES, STF)"
Entretanto, interpretando tal decisão, chega-se à conclusão de que a Lei Assistencial, ao fixar a
renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo
vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso
por outros meios de prova.
Tal entendimento descortina a possibilidade do exame do requisito atinente à hipossuficiência
econômica pelos já referidos "outros meios de prova".
A questão, inclusive, levou o Colendo Superior Tribunal de Justiça a sacramentar a discussão
por meio da apreciação da matéria em âmbito de recurso representativo de controvérsia
repetitiva assim ementado:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO
SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98,
dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas
portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja
família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
(...)
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de
se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade,
ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário mínimo. 6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre
convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de
provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida
como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode
admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o
seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido."
(REsp nº 1.112.557/MG, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, DJ
20/11/2009). (grifos nossos)
No que pertine à exclusão, da renda do núcleo familiar, do valor do benefício assistencial
percebido pelo idoso, conforme disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03,
referido tema revelou-se polêmico, por levantar a discussão acerca do discrímen em se
considerar somente o benefício assistencial para a exclusão referida, e não o benefício
previdenciário de qualquer natureza, desde que de igual importe; sustentava-se, então, que a
ratio legis do artigo em questão dizia respeito à irrelevância do valor para o cálculo referenciado
e, bem por isso, não havia justificativa plausível para a discriminação.
Estabelecido o dissenso inclusive perante o Superior Tribunal de Justiça, o mesmo se resolveu
no sentido, enfim, de se excluir do cálculo da renda familiar todo e qualquer benefício de valor
mínimo recebido por pessoa maior de 65 anos, em expressa aplicação analógica do contido no
art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.
Refiro-me, inicialmente, à Petição nº 7203/PE (Incidente de Uniformização de Jurisprudência),
apreciada pela 3ª Seção do STJ em 10 de agosto de 2011 (Rel. Ministra Maria Thereza de
Assis Moura) e, mais recentemente, ao Recurso Especial nº 1.355.052/SP, processado
segundo o rito do art. 543-C do CPC/73 e que porta a seguinte ementa:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO,
NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no
valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do
benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do
Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código
de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(REsp nº 1.355.052/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, j. 25/02/2015, DJe
05/11/2015). (grifos nossos)
Todavia, a mera aplicação do referido dispositivo não enseja, automaticamente, a concessão do
benefício, uma vez que o requisito da miserabilidade não pode ser analisado tão somente
levando-se em conta o valor per capita, sob pena de nos depararmos com decisões
completamente apartadas da realidade. Destarte, a ausência, ou presença, desta condição
econômica deve ser aferida por meio da análise de todo o conjunto probatório.
Do caso concreto.
Pleiteia a parte autora a concessão de benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é
incapaz e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua
família.
O profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base exame realizado em 08 de junho de
2018 (ID 6963925 – p. 1/5), quando a requerente tinha 62 (sessenta e dois) anos de idade, a
diagnosticou como portadora de “Neurocisticercose, Osteoartrose, Escoliose, Diabetes,
Hipertensão Arterial e Insuficiência Aórtica”.
Consignou o expert que “Atualmente os sinais e sintomas das patologias de que é portadora a
incapacita para todas as atividades laborais”. Ponderou: “a incapacidade laboral poderá ser
temporária. Está realizando tratamento médico adequado. Nova perícia médica deverá ser
realizada em dezembro de 2018 (180 dias) para constatar a existência da incapacidade (ou
capacidade) laboral.” Fixou a data da incapacidade laboral a partir de outubro de 2017.
Assevero que o juiz não está adstrito integralmente ao laudo pericial, nos termos do que dispõe
o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado.
Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório
trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe
Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE.
12/11/2010.
Ainda que o laudo pericial tenha apontado pela eventual e hipotética possibilidade de ser
considerada como temporária a incapacidade da autora, sequer houve detalhamento específico
a esse respeito pelo perito com qualquer justificativa concreta para tal prognóstico, tampouco
definida data para tanto, sendo simplesmente marcada nova perícia para a reavaliação da
requerente em 180 (cento e oitenta dias).
Por outro lado, a gravidade da saúde da autora foi reconhecida pela conclusão de que não
poderia exercer qualquer atividade, cabendo atentar que o seu quadro clínico está fundado em
histórico progressivo, fartamente documentado, por meio de uma diversidade de exames e
respectivos resultados inclusive relatados na perícia, dentre os quais:
a) “Tomografia computadorizada de crânio realizada em 24 de novembro de 2016 (fls. 77 dos
autos) relata: múltiplas e diminutas calcificações esparsas no parênquima encefálico, sem
alterações associadas, compatíveis com granulomas calcificados (neurocisticercose);
b) “Radiografia dos quadris realizada em 13 de novembro de 2013 (fls. 78 dos autos) relata:
osteofitos e esclerose em articulações sacras ilíacas. Radiografia da coluna lombo sacra
realizada em 13 de novembro de 2013 (fls. 78 dos autos) relata: osteofitos e discopatia L5/S1.
Radiografia da coluna lombo sacra realizada em 11 de abril de 2016 (fls. 16 dos autos) relata
osteofitos e espondiloartrose lombar. Radiografia dos quadris realizada em 4 de outubro de
2017 (fls. 79 dos autos anexo) relata: osteofitos e esclerose em articulações sacras ilíacas.
Radiografia da coluna lombo sacra realizada em 4 de outubro de 2017 (fls. 79 dos autos e
anexo) relata: osteofitos e discopatia L5/S1. Radiografia da bacia realizada em 16 de maio de
2018 (anexo) relata: osteofitos e artrose coxo femoral inicial. Radiografia da coluna lombo sacra
realizada em 16 de maio de 2018 (anexo) relata: osteofitos e discopatia L5/S1. Atestados
médicos emitidos em 25 de maio de 2016 (fls. 24 dos autos), em 4 de outubro de 2017 (fls. 81
dos autos e anexo) e em 16 de maio de 2018 (anexo) relatam a patologia.”
c) “Radiografia da coluna lombo sacra realizada em 13 de novembro de 2013 (fls. 78 dos
autos), em 4 de outubro de 2017 (fls. 79 dos autos e anexo) e em 16 de maio de 2018 (anexo)
relatam: escoliose.”
Tais elementos coligidos aos autos evidenciam que desde os anos de 2013 e início de 2016 a
saúde da autora já estava nitidamente debilitada, o que está em perfeita sintonia com as
próprias declarações da postulante – de que está impossibilitada de exercer atividade
remunerada há aproximadamente 2 (dois) anos.
Ademais, ainda que se cogite eventual retorno às suas atividade como mencionado pelo perito,
inegável que a situação da requerente - com histórico de desempenho da profissão de faxineira
e diarista, as quais reúnem uma série de atividades, muitas delas que essencialmente exigem
esforço físico -, com baixo grau de instrução, mais de sessenta anos e apresentando
comprometimentos físicos de longa data, não só evidencia a presença de fatores capazes de
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas, como aponta para uma dificultosa possibilidade de recolocação profissional a
esta altura, restando configurado, também por este prisma, o impedimento de longo prazo.
A parte autora também demonstrou ser hipossuficiente para os fins de concessão do benefício
ora em análise.
O estudo social, elaborado com base em visita realizada na casa da demandante em 06 de
outubro de 2017 (ID 6963903, p. 1/11), informou que o núcleo familiar é formado por esta e seu
esposo.
Residem em residência popular, alugada, construída em alvenaria, com forro e piso ladrilho. A
morada é composta por três quartos, uma cozinha, uma sala, um banheiro, uma copa e duas
varandas.
A renda da família, segundo o informado à assistente, decorria dos rendimentos do marido,
JAIR STEVANI, na profissão de caminhoneiro, no valor variável “que gira em torno” de R$
1.000,00.
As despesas relatadas, envolvendo gastos com aluguel, energia elétrica, água, alimentação,
telefone, celular, roupas e calçados, medicamentos, cingiam a aproximadamente R$ 1.249,00.
Mediante a visita domiciliar, foi detalhada a carência vivenciada pela dificuldade financeira, com
interferência direta na aquisição de: “roupas e calçados/ roupas de cama, banho e mesa; ·
tratamento dentário não disponibilizado pela Rede Pública de Saúde; · produtos de higiene
pessoal/ corte de cabelo; · um par de óculos, o que vem fazendo uso se encontra em péssimo
estado; · cama e colchão (em péssimo estado de conservação); · móveis, eletrodomésticos e
eletroeletrônicos (compra e substituição); · melhoria das condições de alimentação que segundo
informou a Autora, são precárias. E ainda de acordo com os problemas de saúde que enfrenta,
necessitando ser à base de legumes, frutas e verduras; · pagamento de aluguel em atraso”.
Portanto, a renda per capita familiar, por se tratar de rendimento variável, estaria em torno do
limite do parâmetro jurisprudencial de miserabilidade, de ½ (metade) de um salário mínimo,
sendo insuficiente para fazer frente às despesas do casal.
Apurou-se que não estavam inscritos em programas sociais de transferência de renda
municipal, estadual e federal.
Foi informado que a requerente tem 3 (três) filhos. E, nesse ponto, não se nega que é dever dos
filhos prestar ajuda a seus genitores. Com efeito, o benefício assistencial de prestação
continuada existe para auxiliar a sobrevivência das pessoas portadoras de incapacidade, por
idade avançada, ou outras restrições físicas ou psíquicas para o trabalho e que não possuam
parentes próximos em condições de lhes prover o sustento. O dever, portanto, é, em primeiro
lugar, da família.
Os filhos, residentes em outras localidades, possuem famílias e despesas próprias. Foi
declarado que inclusive estes haviam “se cotizado e pagaram consulta com médico ortopedista
e exames de imagem”. No entanto, não há elementos suficientes para afirmar que poderiam
contribuir com préstimos superiores aos já fornecidos.
Alie-se, como elemento de convicção, a corroborar a vulnerabilidade social da família, o fato de
que os seus 2 (dois) integrantes são atualmente pessoas idosas, sendo que o fator etário, por si
só, figura como circunstância adicional que acaba por exasperar as despesas próprias ao longo
do tempo. Além disso, ambos já apresentam problemas de saúde. Ela, dado o impedimento de
longo prazo, não pode exercer atividade remunerada. Ele, por sua vez, tem problemas de
coluna e diabetes.
Por fim, vale acrescentar as impressões da assistente social, ao encerrar a visita na casa da
postulante: “A renda família encontra-se centrada na atividade eventual que seu esposo exerce
como motorista de caminhão, auferindo uma renda que não é fixa e insuficiente para prover as
despesas fixas do lar e garantir as necessidades do casal. A situação familiar se agrava uma
vez que o esposo da Autora também enfrenta problemas de saúde. Conforme foi demonstrado
no decorrer deste Estudo Socioeconômico, a Autora enfrenta dificuldades financeiras, e não
vem sendo atendida na totalidade de suas necessidades pessoais, principalmente em relação
ao aspecto alimentação e aquisição de medicamentos que necessitam ser adquiridos em
farmácias particulares, o que a expõe a situação de risco e vulnerabilidade social.”
Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifico que o núcleo
familiar se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, fazendo, portanto, a
parte autora, jus ao beneplácito assistencial.
Acerca do termo inicial do benefício, firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na
data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência.
Nessa esteira, confira-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. TERMO
INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
1. Afasta-se a incidência da Súmula 7/STJ, porquanto o deslinde da controvérsia requer apenas
a análise de matéria exclusivamente de direito.
2. Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, o termo inicial para a concessão do benefício
assistencial de prestação continuada é a data do requerimento administrativo e, na sua
ausência, a partir da citação.
Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1532015/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado
em 04/08/2015, DJe 14/08/2015)."
Assim, tendo em vista a apresentação de requerimento administrativo pela parte autora em
26/05/2017 (ID 6963891, p. 1), de rigor seria a fixação da DIB em tal data, no entanto, deve ser
mantida em 25/05/2017, nos termos da r. sentença, tendo em vista a falta de recurso nesse
ponto.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir
as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Saliento que, não obstante tratar-se de benefício assistencial, deve ser observado o tópico do
Manual atinente aos benefícios previdenciários, a teor do disposto no parágrafo único do art. 37
da Lei nº 8.742/93.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e, de ofício, estabeleço que a correção
monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09,
a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora,
incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual,
mantida, no mais, a r. sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PAGO AO IDOSO. EXCLUSÃO.
ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03. APLICAÇÃO POR ANALOGIA.
PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA).
STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº
8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ISOLADA.
ANÁLISE DA MISERABILIDADE EM CONJUNTO COM DEMAIS FATORES. IMPEDIMENTO
DE LONGO PRAZO CONFIGURADO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA DEMONSTRADA.
CASAL DE IDOSOS. RENDA VARIÁVEL DE MEIO SALÁRIO MÍNIMO. LIMITE DO
PARÂMETRO JURISPRUDENCIAL DA MISERABILIDADE. AUSÊNCIA DE AUXÍLIO
GOVERNAMENTAL E DE TERCEIROS. MÍNIMO EXISTENCIAL NÃO GARANTIDO.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DEVIDO. DIB. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
AUSÊNCIA DE RECURSO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA.
JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. CONSECTÁRIOS LEGAIS
ALTERADOS DE OFÍCIO.
1 – O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o
pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem
não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a
concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que
comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
3 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a
redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
4 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de
miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a
manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do
Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia.
5 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para
comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no
julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle
concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
6 – Todavia, a mera aplicação do referido dispositivo não enseja, automaticamente, a
concessão do benefício, uma vez que o requisito da miserabilidade não pode ser analisado tão
somente levando-se em conta o valor per capita, sob pena de nos depararmos com decisões
completamente apartadas da realidade. Destarte, a ausência, ou presença, desta condição
econômica deve ser aferida por meio da análise de todo o conjunto probatório.
7 - Pleiteia a parte autora a concessão de benefício assistencial, uma vez que, segundo alega,
é incapaz e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua
família.
8 - O profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base exame realizado em 08 de junho
de 2018 (ID 6963925 – p. 1/5), quando a requerente tinha 62 (sessenta e dois) anos de idade, a
diagnosticou como portadora de “Neurocisticercose, Osteoartrose, Escoliose, Diabetes,
Hipertensão Arterial e Insuficiência Aórtica”.
9 - Consignou o expert que “Atualmente os sinais e sintomas das patologias de que é portadora
a incapacita para todas as atividades laborais”. Ponderou: “a incapacidade laboral poderá ser
temporária. Está realizando tratamento médico adequado. Nova perícia médica deverá ser
realizada em dezembro de 2018 (180 dias) para constatar a existência da incapacidade (ou
capacidade) laboral.” Fixou a data da incapacidade laboral a partir de outubro de 2017.
10 - O juiz não está adstrito integralmente ao laudo pericial, nos termos do que dispõe o art. 436
do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado. Por ser o
juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a
exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
11 - Ainda que o laudo pericial tenha apontado pela eventual e hipotética possibilidade de ser
considerada como temporária a incapacidade da autora, sequer houve detalhamento específico
a esse respeito pelo perito com qualquer justificativa concreta para tal prognóstico, tampouco
definida data para tanto, sendo simplesmente marcada nova perícia para a reavaliação da
requerente em 180 (cento e oitenta dias).
12 - Por outro lado, a gravidade da saúde da autora foi reconhecida pela conclusão de que não
poderia exercer qualquer atividade, cabendo atentar que o seu quadro clínico está fundado em
histórico progressivo, fartamente documentado, por meio de uma diversidade de exames e
respectivos resultados inclusive relatados na perícia, dentre os quais: a) “Tomografia
computadorizada de crânio realizada em 24 de novembro de 2016 (fls. 77 dos autos) relata:
múltiplas e diminutas calcificações esparsas no parênquima encefálico, sem alterações
associadas, compatíveis com granulomas calcificados (neurocisticercose); b) “Radiografia dos
quadris realizada em 13 de novembro de 2013 (fls. 78 dos autos) relata: osteofitos e esclerose
em articulações sacras ilíacas. Radiografia da coluna lombo sacra realizada em 13 de
novembro de 2013 (fls. 78 dos autos) relata: osteofitos e discopatia L5/S1. Radiografia da
coluna lombo sacra realizada em 11 de abril de 2016 (fls. 16 dos autos) relata osteofitos e
espondiloartrose lombar. Radiografia dos quadris realizada em 4 de outubro de 2017 (fls. 79
dos autos anexo) relata: osteofitos e esclerose em articulações sacras ilíacas. Radiografia da
coluna lombo sacra realizada em 4 de outubro de 2017 (fls. 79 dos autos e anexo) relata:
osteofitos e discopatia L5/S1. Radiografia da bacia realizada em 16 de maio de 2018 (anexo)
relata: osteofitos e artrose coxo femoral inicial. Radiografia da coluna lombo sacra realizada em
16 de maio de 2018 (anexo) relata: osteofitos e discopatia L5/S1. Atestados médicos emitidos
em 25 de maio de 2016 (fls. 24 dos autos), em 4 de outubro de 2017 (fls. 81 dos autos e anexo)
e em 16 de maio de 2018 (anexo) relatam a patologia.”c) “Radiografia da coluna lombo sacra
realizada em 13 de novembro de 2013 (fls. 78 dos autos), em 4 de outubro de 2017 (fls. 79 dos
autos e anexo) e em 16 de maio de 2018 (anexo) relatam: escoliose.”
13 - Tais elementos coligidos aos autos evidenciam que desde os anos de 2013 e início de
2016 a saúde da autora já estava nitidamente debilitada, o que está em perfeita sintonia com as
próprias declarações da postulante – de que está impossibilitada de exercer atividade
remunerada há aproximadamente 2 (dois) anos.
14 - Ademais, ainda que se cogite eventual retorno às suas atividade como mencionado pelo
perito, inegável que a situação da requerente - com histórico de desempenho da profissão de
faxineira e diarista, as quais reúnem uma série de atividades, muitas delas que essencialmente
exigem esforço físico -, com baixo grau de instrução, mais de sessenta anos e apresentando
comprometimentos físicos de longa data, não só evidencia a presença de fatores capazes de
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas, como aponta para uma dificultosa possibilidade de recolocação profissional a
esta altura, restando configurado, também por este prisma, o impedimento de longo prazo.
15 - A parte autora também demonstrou ser hipossuficiente para os fins de concessão do
benefício ora em análise.
16 - O estudo social, elaborado com base em visita realizada na casa da demandante em 06 de
outubro de 2017 (ID 6963903, p. 1/11), informou que o núcleo familiar é formado por esta e seu
esposo.
17 - Residem em residência popular, alugada, construída em alvenaria, com forro e piso
ladrilho. A morada é composta por três quartos, uma cozinha, uma sala, um banheiro, uma copa
e duas varandas.
18 - A renda da família, segundo o informado à assistente, decorria dos rendimentos do marido,
JAIR STEVANI, na profissão de caminhoneiro, no valor variável “que gira em torno” de R$
1.000,00.
19 - As despesas relatadas, envolvendo gastos com aluguel, energia elétrica, água,
alimentação, telefone, celular, roupas e calçados, medicamentos, cingiam a aproximadamente
R$ 1.249,00.
20 - Mediante a visita domiciliar, foi detalhada a carência vivenciada pela dificuldade financeira,
com interferência direta na aquisição de: “roupas e calçados/ roupas de cama, banho e mesa;
tratamento dentário não disponibilizado pela Rede Pública de Saúde; produtos de higiene
pessoal/ corte de cabelo; um par de óculos, o que vem fazendo uso se encontra em péssimo
estado; cama e colchão (em péssimo estado de conservação); móveis, eletrodomésticos e
eletroeletrônicos (compra e substituição); melhoria das condições de alimentação que segundo
informou a Autora, são precárias. E ainda de acordo com os problemas de saúde que enfrenta,
necessitando ser à base de legumes, frutas e verduras; pagamento de aluguel em atraso”.
21 - Portanto, a renda per capita familiar, por se tratar de rendimento variável, estaria em torno
do limite do parâmetro jurisprudencial de miserabilidade, de ½ (metade) de um salário mínimo,
sendo insuficiente para fazer frente às despesas do casal.
22 - Apurou-se que não estavam inscritos em programas sociais de transferência de renda
municipal, estadual e federal.
23 - Foi informado que a requerente tem 3 (três) filhos. E, nesse ponto, não se nega que é
dever dos filhos prestar ajuda a seus genitores. Com efeito, o benefício assistencial de
prestação continuada existe para auxiliar a sobrevivência das pessoas portadoras de
incapacidade, por idade avançada, ou outras restrições físicas ou psíquicas para o trabalho e
que não possuam parentes próximos em condições de lhes prover o sustento. O dever,
portanto, é, em primeiro lugar, da família.
24 - Os filhos, residentes em outras localidades, possuem famílias e despesas próprias. Foi
declarado que inclusive estes haviam “se cotizado e pagaram consulta com médico ortopedista
e exames de imagem”. No entanto, não há elementos suficientes para afirmar que poderiam
contribuir com préstimos superiores aos já fornecidos.
25 - Alie-se, como elemento de convicção, a corroborar a vulnerabilidade social da família, o
fato de que os seus 2 (dois) integrantes são atualmente pessoas idosas, sendo que o fator
etário, por si só, figura como circunstância adicional que acaba por exasperar as despesas
próprias ao longo do tempo. Além disso, ambos já apresentam problemas de saúde. Ela, dado o
impedimento de longo prazo, não pode exercer atividade remunerada. Ele, por sua vez, tem
problemas de coluna e diabetes.
26 - Por fim, vale acrescentar as impressões da assistente social, ao encerrar a visita na casa
da postulante: “A renda família encontra-se centrada na atividade eventual que seu esposo
exerce como motorista de caminhão, auferindo uma renda que não é fixa e insuficiente para
prover as despesas fixas do lar e garantir as necessidades do casal. A situação familiar se
agrava uma vez que o esposo da Autora também enfrenta problemas de saúde. Conforme foi
demonstrado no decorrer deste Estudo Socioeconômico, a Autora enfrenta dificuldades
financeiras, e não vem sendo atendida na totalidade de suas necessidades pessoais,
principalmente em relação ao aspecto alimentação e aquisição de medicamentos que
necessitam ser adquiridos em farmácias particulares, o que a expõe a situação de risco e
vulnerabilidade social.”
27 - Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifica-se que o
núcleo familiar se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, fazendo,
portanto, a parte autora, jus ao beneplácito assistencial.
28 - Acerca do termo inicial do benefício, firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá
na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência.
(AgRg no REsp 1532015/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado
em 04/08/2015, DJe 14/08/2015)." Assim, tendo em vista a apresentação de requerimento
administrativo pela parte autora em 26/05/2017 (ID 6963891, p. 1), de rigor seria a fixação da
DIB em tal data, no entanto, deve ser mantida em 25/05/2017, nos termos da r. sentença, tendo
em vista a falta de recurso nesse ponto.
29 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
30 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
31 - Saliente-se que, não obstante tratar-se de benefício assistencial, deve ser observado o
tópico do Manual atinente aos benefícios previdenciários, a teor do disposto no parágrafo único
do art. 37 da Lei nº 8.742/93.
32 - Apelação do INSS desprovida. Consectários legais alterados de ofício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e, de ofício, estabelecer que a
correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros
de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o
mesmo Manual, mantida, no mais, a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
