Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2194743 / SP
0033301-30.2016.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REQUISITO ETÁRIO PREENCHIDO. BENEFÍCIO DE VALOR
MÍNIMO PAGO AO IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº
10.741/03. APLICAÇÃO POR ANALOGIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ
(REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE
NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ISOLADA. ANÁLISE DA MISERABILIDADE
EM CONJUNTO COM DEMAIS FATORES. AFASTADA SITUAÇÃO DE RISCO. VÁRIOS
INTEGRANTES DO NÚCLEO FAMILIAR QUE POSSUÍAM RENDIMENTOS.
ACOMPANHAMENTO MÉDICO JUNTO À REDE PÚBLICA DE SAÚDE. FILHOS QUE
PODERIAM PRESTAR AJUDA. DEVER DE AUXÍLIO É, EM PRIMEIRO LUGAR, DA FAMÍLIA.
PROPRIEDADE DE VEÍCULO AUTOMOTOR. IMÓVEL PRÓPRIO. CONDIÇÕES DE
HABITABILIDADE SATISFATÓRIAS. CASA SITUADA EM BAIRRO DOTADO DE
INFRAESTRUTURA ADEQUADA. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA NÃO DEMONSTRADA.
MÍNIMO EXISTENCIAL GARANTIDO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA.
SENTENÇA MANTIDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
1 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o
pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem
não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
2 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a
concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que
comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
3 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a
redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
4 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de
miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a
manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do
Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia.
5 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para
comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no
julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle
concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
6 - Pleiteia a autora a concessão do benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é
idosa e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua
família.
7 - O requisito etário fora devidamente preenchido, considerando o implemento da idade
mínima de 65 (sessenta e cinco) anos em 19/02/2012 (fl. 14), anteriormente à propositura da
presente demanda (06/11/2012 - fl. 02).
8 - Entretanto, não restou demonstrada a hipossuficiência econômica. Por primeiro, nessa
seara, destaca-se que, informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais -
CNIS, cujo extrato encontra-se acostado à fl. 151, dão conta que a requerente percebe
benefício previdenciário de pensão por morte, desde 10/05/2015 (NB: 173.216.181-7). Assim, a
partir de então, é certo que não faz mais jus ao deferimento do benefício assistencial, nos
exatos termos do art. 20, §4º, da Lei 8.742/93, o qual veda a cumulação deste com qualquer
outro no âmbito da seguridade social, exceto os da assistência médica e da pensão especial de
natureza indenizatória. Todavia, também não faz jus ao beneplácito em período anterior a
15/05/2015.
9 - O estudo social, realizado em 30 de agosto de 2014, (fls. 68/80), informou que o núcleo
familiar era formado pela autora, seu marido, 2 (duas) filhas, 4 (quatro) netos, esposa de um
dos netos e 3 (três) bisnetos. Segundo o relatado, a família residia em imóvel próprio, tendo "a
requerente dividido alguns cômodos da casa para uma filha e a neta morar, e no mesmo quintal
tem mais duas casas aonde residem mais uma filha e dois netos e um neto casado com três
filhos". A parte onde a autora residia era composta por "dois quartos, uma sala, uma cozinha,
um banheiro, uma dispensa e a lavanderia. O imóvel é de alvenaria, forro de madeira e piso de
cerâmica. Os eletrodomésticos são novos, sendo eles: fogão, geladeira, liquidificador, um
armário, uma máquina de costura, uma televisão (antiga) a máquina de lavar roupa que ela
utiliza é da filha com quem divide alguns cômodos da casa. Os móveis são simples, sendo eles:
sofá, rack, dois guarda-roupa, uma cama de casal, uma de solteiro e uma mesa de madeira
com quatro cadeiras". O bairro em que se encontra o imóvel é servido por rede de água e
esgoto.
10 - A renda do núcleo familiar decorria, à luz dos esclarecimentos da assistente prestados em
31 de maio de 2015 (fls. 110/111-verso), dos proventos de aposentadoria do esposo da autora,
MANOEL GABRIEL DA SILVA, no importe de um salário mínimo, da remuneração da filha da
autora, CARMEM ROSA DA SILVA, na quantia de R$880,00, do neto VINICIUS BRITO DE
SOUZA, no valor de R$1.100,00, da neta CAMILA BRITO DE SOUZA, no valor de R$400,00, e
do neto SIDNEI APARECIDO BORGES FILHO, no valor de R$1.100,00.
11 - Portanto, os rendimentos totais do núcleo familiar, pouco tempo antes do falecimento do
marido da requerente, cingiam a R$4.204,00, sendo a renda per capita familiar pouco inferior a
½ do salário mínimo vigente.
12 - A família recebia uma cesta básica da Prefeitura Municipal a cada 2 (dois) meses. Por
outro lado, a autora fazia acompanhamento médico junto ao Posto de Saúde de Nova
Granada/SP e seu esposo realizava tratamento junto ao Instituto do Câncer em São José do
Rio Preto/SP.
13 - Um dos netos da autora, SIDNEI APARECIDO BORGES FILHO, possuía um veículo
automotor (Monza ano 1990).
14 - A assistente relata que os familiares, embora morassem no mesmo terreno da autora, não
a auxiliavam. Nessa senda, lembre-se que o benefício assistencial de prestação continuada
existe para auxiliar a sobrevivência das pessoas portadoras de incapacidade, por idade
avançada, ou outras restrições físicas ou psíquicas para o trabalho e que não possuam
parentes próximos em condições de lhes prover o sustento. O dever, portanto, é, em primeiro
lugar, da família.
15 - Repisa-se que as condições de habitabilidade eram satisfatórias, o imóvel, além de próprio,
estava situado em bairro com infraestrutura adequada, com rede de água e esgoto. Com efeito,
à luz das fotografias acostadas às fls. 73/80, infere-se que, no geral, a residência estava bem
conservada.
16 - Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifica-se que a
demandante não se enquadrava na concepção legal de hipossuficiência econômica, antes da
percepção da pensão por morte, não fazendo, portanto, jus a quaisquer atrasados de benefício
assistencial.
17 - O benefício assistencial da prestação continuada é auxílio que deve ser prestado pelo
Estado, portanto, por toda a sociedade, in extremis, ou seja, nas específicas situações que
preencham os requisitos legais estritos, bem como se e quando a situação de quem o pleiteia
efetivamente o recomende, no que se refere ao pouco deixado pelo legislador para a livre
interpretação do Poder Judiciário.
18 - Ainda que o magistrado sensibilize-se com a situação apresentada pela parte autora e
compadeça-se com a horripilante realidade a que são submetidos os trabalhadores em geral,
não pode determinar à Seguridade a obrigação de pagamento de benefício, que independe de
contribuição, ou seja, cujo custeio sairá da receita do órgão pagador - contribuições
previdenciárias e sociais - e cujos requisitos mínimos não foram preenchidos, sob pena de criar
perigoso precedente que poderia causar de vez a falência do já cambaleado Instituto
Securitário.
19 - O benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à complementação da
renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador exerça a ingrata tarefa de distinguir
faticamente entre as situações de pobreza e de miserabilidade, eis que tem por finalidade
precípua prover a subsistência daquele que o requer.
20 - Apelação da parte autora desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação da parte autora, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
***** EIDO-2003 ESTATUTO DO IDOSO
LEG-FED LEI-10741 ANO-2003 ART-34 PAR-ÚNICO***** LOAS-93 LEI ORGÂNICA DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8742 ANO-1993 ART-20 PAR-3 PAR-4***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL
DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-203 ITE-5LEG-FED LEI-13146 ANO-2015
Veja
STF ADI 1.232/DF;
STF RCL 4.374/PE.
