Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1973664 / SP
0004234-13.2012.4.03.6102
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO
DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. PRODUÇÃO PROBATÓRIA.
DOCUMENTAÇÃO SUFICIENTE NOS AUTOS. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO.
PRELIMINAR DE MATÉRIA IDÊNTICA. MÉDICO. EXPOSIÇÃO A AGENTE BIOLÓGICO.
CONJUNTO PROBATÓRIO. RECONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE NEUTRALIZAÇÃO DA
AGRESSIVIDADE PELO USO DE EPI EFICAZ. TEMPO SUFICIENTE. BENEFÍCIO ESPECIAL
CONCEDIDO. MANTIDA DATA DA DIB. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA.
1 - Agravo retido. Sem sentido a nulidade da sentença em razão do alegado cerceamento de
defesa por ausência de produção probatória, eis que a prova documental juntada aos autos
mostra-se suficiente para o julgamento da causa, sendo, portanto, desnecessária a realização
da perícia requerida, bem como a produção de prova oral. Assim, negado provimento ao
recurso.
2 - Em sede de preliminar, foi alegada a mesma matéria veiculada por meio de agravo retido, já
decidida acima.
3 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
4 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
7 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
8 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
9 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - Durante as atividades realizadas pelo autor como médico no Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, de 06/03/1997 a 18/12/2009, o Perfil Profissiográfico
Previdenciário de fls. 124/126, com indicação dos responsáveis pelos registros ambientais e
pela monitoração biológica, demonstra que o autor estava exposto a risco biológico no
desempenho de sua profissão, dentre outras atividades, ao realizar "exame físico do doente,
pré e pós operatório, curativos, retirada de pontos e outros; orientar e explicar o exame
urológico; realizar cirurgias urológicas, transplantes renais; orientar e auxiliar os estudantes na
realização dos atos cirúrgicos; dar assistência ao ambulatório de urologia, atender aos
pacientes; fazer exames de toque retal, diagnosticar e praticar terapias", portanto, cabendo o
seu enquadramento nos itens 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99.
14 - Ressalta-se que os requisitos de "habitualidade" e "permanência" devem ser interpretados
com granus salis. Exigir-se do trabalhador a exposição ininterrupta aos agentes agressivos, por
toda a sua jornada de trabalho, ficaria restrita somente àqueles que tivessem sua saúde
esmigalhada. Habitualidade pressupõe frequência, que, por sua vez, é atingida com o exercício
cotidiano de determinado trabalho ou função. Portanto, o conceito de moderado ou, até mesmo,
alternado não são auto-excludentes da ideia de habitualidade. A questão da permanência deve
ser encarada da mesma forma. A ideia é de que a exposição seja duradoura, capaz de
prejudicar a saúde do trabalhador. Mas não se exige seja ininterrupta, pois, a seguir esse
raciocínio, somente faria jus à aposentadoria especial o trabalhador doente. Por esta razão, é
que a situação de intermitência não afasta a especialidade do labor, desde que a exposição se
dê rotineiramente, de maneira duradoura.
15 - Importante esclarecer que, nos casos em que resta comprovada a exposição do
profissional de saúde à nocividade do agente biológico, a natureza de suas atividades já revela,
por si só, que mesmo nos casos de utilização de equipamentos de proteção individual, tido por
eficazes, não é possível afastar a insalubridade a que fica sujeito. Precedentes.
16 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrado como especial o período de
06/03/1997 a 18/12/2009.
17 - Conforme cálculos aritméticos simples, de fácil intelecção, portanto, somando-se a
atividade especial reconhecida nesta demanda (06/03/1997 a 18/12/2009) ao período
incontroverso já admitido (04/08/1982 a 05/03/1997), verifica-se que a parte autora contava com
mais de 25 anos de atividade desempenhada em condições especiais, por ocasião da data da
entrada do requerimento administrativo (29/06/2010), fazendo jus, portanto, à concessão de
aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº 8.213/1991.
18 - O requisito carência restou também completado.
19 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da concessão do benefício originário
(DIB - 29/06/2010 - fl. 42), uma vez que se trata de revisão de coeficiente de cálculo e da renda
mensal inicial, em razão do reconhecimento de período laborado em atividade especial.
20 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da
elaboração da conta, com aplicação do IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C.
STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE) e com efeitos
prospectivos.
21 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
22 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
23 - Agravo retido desprovido. Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação da parte autora
provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao
agravo retido de fls. 171/174, rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação do
autor, para admitir a especialidade de 06/03/1997 a 18/12/2009, e condenar o INSS na
implantação da aposentadoria especial, mantida a data de início do benefício em 29/06/2010,
sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de
mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando-o,
ainda, no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados no montante de 10% sobre o valor
das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, mantida, no mais, a r. sentença
proferida em 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
