
| D.E. Publicado em 10/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, acolher em parte os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014340-85.2009.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de embargos de declaração opostos pela parte autora contra acórdão de minha relatoria (fls. 154/156vº).
Sustenta a parte autora, em síntese, que o v. acórdão contém vícios, alegando que "não há que se falar em decadência da Administração Pública em rever o ato de concessão do benefício pago à parte embargada, muito menos que não poderia realizar a revisão do benefício, assim, é de rigor que haja expressa manifestação quanto à revisão realizada em 03/2006, antes do fim do prazo decadencial e que a Administração Pública tem o poder-dever de revisar seus atos, mesmo essa revisão tenha decorrido de uma ação judicial" (fl. 161).
Vista à parte contrária (fl. 162).
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de embargos de declaração opostos pela parte autora contra acórdão de fls. 154/156vº, proferido em 12/12/2017.
Conheço dos embargos de declaração, haja vista que tempestivos.
Nos termos do art. 535 do Código de Processo Civil de 1973, atualmente disciplinado no art. 1.022 do NCPC, os embargos de declaração são cabíveis quando o provimento jurisdicional padece de omissão, contradição ou obscuridade, bem como para sanar a ocorrência de erro material.
O INSS não está tolhido de corrigir ato concessório de benefício editado com flagrante vício que constitua burla a legislação previdenciária, mas deverá assegurar ampla defesa e contraditório antes de suspender ou cancelar o benefício. Todavia, diante do princípio da segurança jurídica, o poder de autotutela do Estado encontra-se limitado por prazos decadenciais previstos na legislação previdenciária.
A previsão do prazo decadencial de todo e qualquer direito ou ação para a revisão do ato de concessão de benefício, adveio com a 9ª reedição da MP nº 1.523, de 27/06/1997, convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/97, que veio a fixar em seu artigo 103, o prazo decadencial de 10 (dez) anos, verbis:
"Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo."
Posteriormente, a Lei nº 9.784, de 29/01/99, em seu artigo 54 disciplinou o prazo decadencial quinquenal para anulação dos atos administrativos.
"Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato."
Com o advento da MP nº 138, de 19/11/2003, foi introduzido no regramento previdenciário - Lei n. 8.213/91 - o artigo 103-A, que trata da hipótese de revisão dos atos administrativos, convolando-se tal MP na Lei nº 10.839/04, cujo teor transcrevo:
"Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé."
Com efeito, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.114.938/AL, orientou-se no sentido de que é de dez anos o prazo decadencial para o INSS proceder à revisão do ato concessório, no que toca aos benefícios concedidos anteriormente ao advento da Lei nº 9.784 /99, a contar da vigência desta lei (01/02/1999), verbis:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA A DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS CONCEDIDOS EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 9.787/99. PRAZO DECADENCIAL DE 5 ANOS, A CONTAR DA DATA DA VIGÊNCIA DA LEI 9.784/99. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ART. 103-A DA LEI 8.213/91, ACRESCENTADO PELA MP 19.11.2003, CONVERTIDA NA LEI 10.839/2004. AUMENTO DO PRAZO DECADENCIAL PARA 10 ANOS. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, NO ENTANTO.
1. A colenda Corte Especial do STJ firmou o entendimento de que os atos administrativos praticados antes da Lei 9.784/99 podem ser revistos pela Administração a qualquer tempo, por inexistir norma legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. Somente após a Lei 9.784/99 incide o prazo decadencial de 5 anos nela previsto, tendo como termo inicial a data de sua vigência (01.02.99).Ressalva do ponto de vista do Relator.
2. Antes de decorridos 5 anos da Lei 9.784 /99, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS) e fixou em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus beneficiários.
3. Tendo o benefício do autor sido concedido em 30.7.1997 e o procedimento de revisão administrativa sido iniciado em janeiro de 2006, não se consumou o prazo decadencial de 10 anos para a Autarquia Previdenciária rever o seu ato.
4. Recurso Especial do INSS provido para afastar a incidência da decadência declarada e determinar o retorno dos autos ao TRF da 5a. Região, para análise da alegada inobservância do contraditório e da ampla defesa do procedimento que culminou com a suspensão do benefício previdenciário do autor." (STJ - REsp 1.114.938/AL, Terceira Seção, Rel. Min. NAPOLEAÕ NUNES MAIA FILHO, j. 14/04/2010, v.u., DJE: 02/08/2010)
Nesse sentido, jurisprudência desta Décima Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. DECADÊNCIA PARA A ADMINISTRAÇÃO. ART. 103-A, DA LEI N. 8.213/91. NÃO OCORRÊNCIA.
1. O INSS tem o prazo decadencial de 10 anos para rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus beneficiários. Aplicação do Art. 103-A, da Lei 8.213/91.
2. Concedida a aposentadoria por idade em 09.10.2003, não decaiu a autarquia do direito de rever o ato administrativo de concessão do benefício, que gerou vantagem ao segurado.
3. Apelação desprovida." (APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013514-27.2010.4.03.6183/SP, Rel. Baptista Pereira, DJe 27/10/2016)
No caso dos autos, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição n.º 057.176.985-3/42 foi concedido administrativamente em 22/04/1993 e a revisão judicial do benefício ocorreu 03/2006, não havendo que se falar em ocorrência de decadência, tendo em vista que não decorreu 10 (dez) anos entre a vigência da Lei nº 9.784/99 (01/02/1999) e o início do procedimento de apuração das irregularidades.
Por outro lado, no âmbito da ação revisional que tinha por objetivo o recálculo da renda mensal inicial com cômputo de períodos de exercício de atividade especial, o acórdão de fls. 145/152 deu provimento à apelação da parte autora para julgar procedente o pedido formulado e determinar a revisão do benefício.
Apesar de o objeto da ação subjacente ser o reconhecimento de determinados períodos como atividade especial e posterior recálculo do benefício, o INSS calculou o benefício apurando os 36 últimos salários-de-contribuição, de maneira divergente do apurado anteriormente à determinação da revisão, quando se computara os 33 últimos salários-de-contribuição (fl. 132).
Com efeito, não é possível que a autarquia, em ação revisional ajuizada pelo beneficiário, altere os critérios de cálculo de ofício, ainda mais quando de forma desvencilhada do título exequendo, que apenas deu provimento à apelação da parte autora para julgar procedente o pedido formulado e determinou a revisão do benefício para recalcular a renda mensal inicial com cômputo de períodos de exercício de atividade especial.
Nota-se, portanto, que houve divergência dos salários-de-contribuição computados no período de 04/09 a 09/89 apurados no ato da concessão e no cálculo apresentado pela autarquia previdenciária no âmbito dos embargos à execução.
Assim sendo, aproveitou-se a autarquia previdenciária da ação revisional que tinha por objetivo incluir períodos reconhecidos como especial para corrigir o período básico de cálculo erroneamente implementado no ato de concessão do benefício, bem como utilizar salários-de-contribuição diversos dos utilizados anteriormente.
Para a prática de atos administrativos decorrentes do exercício da autotutela, quando acarretarem prejuízos ao beneficiário, devem ser precedidos de regular processo administrativo, possibilitando o exercício da ampla defesa e contraditório (artigo 5º, LIV e LV, da Constituição Federal), o que não há prova nos autos que tenha ocorrido.
Nesse sentido, jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
"EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ADMINISTRATIVO. EXERCÍCIO DO PODER DE AUTOTUTELA ESTATAL. REVISÃO DE CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO E DE QUINQUÊNIOS DE SERVIDORA PÚBLICA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
1. Ao Estado é facultada a revogação de atos que repute ilegalmente praticados; porém, se de tais atos já decorreram efeitos concretos, seu desfazimento deve ser precedido de regular processo administrativo.
2. Ordem de revisão de contagem de tempo de serviço, de cancelamento de quinquênios e de devolução de valores tidos por indevidamente recebidos apenas pode ser imposta ao servidor depois de submetida a questão ao devido processo administrativo, em que se mostra de obrigatória observância o respeito ao princípio do contraditório e da ampla defesa. 3. Recurso extraordinário a que se nega provimento." (RE 594296, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 21/09/2011, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-030 DIVULG 10-02-2012 PUBLIC 13-02-2012)
No mesmo sentido, jurisprudência desta E. Corte:
"É dever da Previdência Social efetuar a cassação, suspensão ou revisão do valor de benefício previdenciário, desde que precedida de regular processo administrativo para a apuração de eventuais irregularidades, assegurada a ampla defesa ao beneficiário, sem o que haverá violação do preceito constitucional do contraditório, configurando abuso de poder. Essa prerrogativa consiste no exercício do poder-dever de autotutela da Administração sobre seus próprios atos. O art. 69, da Lei nº 8.212/91, estabelece em seu § 1º que havendo indício de irregularidade na concessão ou na manutenção de benefício, a Previdência Social notificará o beneficiário para apresentar defesa, provas ou documentos de que dispuser, no prazo de trinta dias. Constatada a suspeita de fraude a viciar o ato concessório de um benefício, há que se realizar um prévio procedimento, no qual a parte interessada possa se defender e comprovar que satisfaz os requisitos necessários à concessão e manutenção do mencionado benefício, conforme confirma jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça." (AC 00082246119924036183, JUIZ CONVOCADO NILSON LOPES, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/12/2013 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Desta sorte, a execução deverá prosseguir pelos valores apurados pela contadoria judicial, conforme cálculos de fls. 113/117 dos autos, no valor de R$ 51.758,32, atualizado até 05/2008.
Diante do exposto, ACOLHO PARCIALMENTE OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, para, sem efeitos infringentes, afastar a ocorrência de decadência, mantendo o provimento à apelação da parte embargada, na forma da fundamentação adotada.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal Relatora
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 31/07/2018 18:31:19 |
