
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011992-59.2019.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: ROSEMEIRE OLIVIA MIRANDA
Advogados do(a) APELANTE: ANDERSON PETERSMANN DA SILVA - SP242151-A, CAMILA BASTOS MOURA DALBON - SP299825-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011992-59.2019.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: ROSEMEIRE OLIVIA MIRANDA
Advogados do(a) APELANTE: ANDERSON PETERSMANN DA SILVA - SP242151-A, CAMILA BASTOS MOURA DALBON - SP299825-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária que objetiva a declaração de inexigibilidade do débito relativo ao recebimento indevido da aposentadoria por invalidez (NB 32/131.512.703-0) no período de 15/11/03 a 05/08/18. Requer a antecipação da tutela.
A r. sentença, proferida em 23/11/2022, afastou a hipótese de decadência e julgou improcedente o pedido e condenou a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, observada a gratuidade.
Inconformada, apela a parte autora, arguindo a ocorrência da decadência, bem como a existência de boa-fé e a impossibilidade de aplicação do Tema 979 do STJ no caso dos autos, pois que o presente feito foi distribuído em 02/09/2019.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011992-59.2019.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: ROSEMEIRE OLIVIA MIRANDA
Advogados do(a) APELANTE: ANDERSON PETERSMANN DA SILVA - SP242151-A, CAMILA BASTOS MOURA DALBON - SP299825-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Rejeito a alegação de decadência. Em que pese a redação da Lei n.º 9.784/99 prever o prazo decadencial de 5 (cinco) anos, antes da expiração do referido prazo adveio a MP n.º 138/2003, convertida na Lei n.º 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei n.º 8213/91, fixando em 10 (dez) anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus beneficiários.
O art. 103-A da Lei nº 8.213/91 assim prescreve:
“Art.103-A.O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.”
No caso dos autos, a cessação da aposentadoria por invalidez decorreu do retorno da segurada ao trabalho e essa especificidade é determinante para o afastamento da decadência.
Não obstante o benefício tenha sido concedido em 15/11/2003, vê-se que o INSS iniciou em 13/08/2018 com o procedimento administrativo de apuração de irregularidade não em relação a concessão, mas em relação a manutenção do benefício retroativamente a 15/11/2013, em razão da constatação da existência de vínculos empregatícios e, portanto, da violação constante do art. 46 da Lei 8.213/91.
Ora, não pode pretender a parte autora que o decurso do prazo de 10 anos a partir da data do início do pagamento do benefício lhe autorize o retorno ao trabalho sem que isso implique na possibilidade de cessação do benefício em razão de suposta decadência.
Assim, mesmo sem aferir, nesse momento, a ocorrência de má-fé, o INSS após a constatação de que a aposentada contava com vínculos empregatícios a partir de 15/10/2013, procedeu em agosto de 2018 a revisão do benefício, o que afasta a hipótese de decadência.
Superadas as questões prejudiciais, passo ao exame do mérito propriamente dito:
Os documentos constantes dos autos demonstram que a parte autora obteve a concessão da aposentadoria por invalidez a partir de 15/11/2003, sendo que na vigência do benefício foram constatados os seguintes vínculos empregatícios, conforme dados do CNIS:
- 15/10/2013 a 31/12/2013 (ANDARE AVANTI SERVICOS EMPRESARIAIS LTDA);
-14/01/2014 a 31/01/2014 (FENIX ASSESSORIA EM COBRANCAS LTDA);
- 03/02/2014 a 07/08/2014 (NUMBER ONE RECUPERADORA DE CREDITO LTDA);
- 18/08/2014 a 06/08/2015 (SYSTEMCRED - SOLUÇÕES EM RECUPERAÇÃO DE ATIVOS LTDA );
- 23/06/2015 a 08/09/2015 (CREDIT CASH ASSESSORIA FINANCEIRA LTDA);
-10/09/2015 a 09/05/2016 (J.A.REZENDE TELESSERVICOS LTDA);
- 20/06/2016 a 31/07/2016 (CREDIT CASH ASSESSORIA FINANCEIRA LTDA);
- 18/08/2016 a 23/01/2017 (LIDERANCA SERVICOS ESPECIALIZADOS EM COBRANCAS LTDA);
- 05/06/2017 a 19/07/17 (A1 SOLUCOES EM RECUPERACAO DE CREDITOS LTDA) .
Em razão da comprovação dos vínculos, a Autarquia instaurou procedimento administrativo regular com fundamento no art. 46 da Lei 8.213/91 (ID 271004578), no qual a parte autora foi regulamente intimada, tanto que apresentou defesa em várias instâncias.
No pertinente à regularidade da apuração administrativa, assevero que os princípios básicos da administração pública estão previstos na Constituição Federal (art. 37) e a eles somam-se outros constantes da Carta Magna, de forma implícita ou explícita, mas sempre de indispensável aplicação.
A Constituição de 1988, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 19/98, estabelece alguns princípios a que se submete a administração pública, tais como os princípios da legalidade, da supremacia do interesse público, da impessoalidade, da presunção de legitimidade, da moralidade administrativa, da publicidade, da motivação. Dentre estes, a observância aos princípios da eficiência, do devido processo legal e da publicidade dos atos é dever que se impõe a todo agente público ao realizar suas atribuições com presteza e rendimento funcional.
A inobservância destes princípios remete ao exercício do controle dos atos da Administração, seja pela aplicação do princípio da autotutela com a revisão dos seus próprios atos, revogando-os quando inconvenientes ou anulando-os quando ilegais, seja pela via judicial.
O Ministério da Previdência Social e o INSS mantêm um programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e falhas existentes, previsto no art. 11 da Lei n° 10.666/03 e regulamentado pelo artigo 179, §1° do Decreto n° 3.048/99 e, notadamente, em relação aos benefícios por incapacidade há previsão expressa de revisão periódica dos mesmos.
Neste contexto, não se vislumbra qualquer violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa na tramitação do procedimento administrativo que concluiu pela recuperação da capacidade laboral diante do retorno voluntário ao trabalho remunerado, mediante vínculo empregatício, bem como pelo indevido recebimento simultâneo de remuneração e aposentadoria a partir de 15/11/2013.
Ademais, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.381.734/RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, submetido ao rito dos recursos repetitivos, pacificou a questão no Tema 979/STJ, firmando o seguinte entendimento: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido".
Não obstante a Corte Superior tenha modulado os efeitos da decisão, no sentido de que o entendimento firmado no Tema 979 somente será aplicável aos processos distribuídos, em primeira instância, a partir de 23/04/2021, a hipótese dos autos não se refere ao recebimento indevido de valores por erro do INSS ou interpretação equivocada da lei.
In casu, a percepção indevida da aposentadoria por invalidez decorreu da constatação da recuperação da capacidade laboral em razão da anotação de vínculos empregatícios, não podendo a autora alegar desconhecimento da lei ou mesmo boa-fé na percepção do benefício. De rigor a devolução dos valores.
Portanto, deve ser mantida integralmente a r. sentença, inclusive quanto aos honorários advocatícios, fixados nos exatos termos adotados poresta Turma Julgadora.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. DECADÊNCIA AFASTADA. PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. REGULARIDADE DA APURAÇÃO ADMINISTRATIVA. CONSTATAÇÃO DA ANOTAÇÃO DE VÍNCULOS EMPREGATÍCIOS. RECUPERAÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. TEMA 979/STJ. INAPLICABILIDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES PAGOS. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. Em que pese a redação da Lei n.º 9.784/99 prever o prazo decadencial de 5 (cinco) anos, antes da expiração do referido prazo adveio a MP n.º 138/2003, convertida na Lei n.º 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei n.º 8213/91, fixando em 10 (dez) anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus beneficiários.
2. Decadência afastada, considerando que o procedimento administrativo de apuração de irregularidade não em relação a concessão, mas em relação a manutenção do benefício retroativamente a 15/11/2013, em razão da constatação da existência de vínculos empregatícios e, portanto, da violação constante do art. 46 da Lei 8.213/91.
3. Não pode pretender a parte autora que o decurso do prazo de 10 anos a partir da data do início do pagamento do benefício lhe autorize o retorno ao trabalho sem que isso implique na possibilidade de cessação do benefício em razão de suposta decadência.
4. O INSS após a constatação de que a aposentada contava com vínculos empregatícios a partir de 15/10/2013, procedeu em agosto de 2018 a revisão do benefício, o que afasta a hipótese de decadência.
5. 4. A Constituição de 1988, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 19/98, estabelece alguns princípios a que se submete a administração pública, tais como os princípios da legalidade, da supremacia do interesse público, da impessoalidade, da presunção de legitimidade, da moralidade administrativa, da publicidade, da motivação. Dentre estes, a observância aos princípios da eficiência, do devido processo legal e da publicidade dos atos é dever que se impõe a todo agente público ao realizar suas atribuições com presteza e rendimento funcional.
6. A inobservância destes princípios remete ao exercício do controle dos atos da Administração, seja pela aplicação do princípio da autotutela com a revisão dos seus próprios atos, revogando-os quando inconvenientes ou anulando-os quando ilegais, seja pela via judicial.
7. Neste contexto, não se vislumbra qualquer violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa na tramitação do procedimento administrativo que concluiu pela recuperação da capacidade laboral diante do retorno voluntário ao trabalho remunerado, mediante vínculo empregatício, bem como pelo indevido recebimento simultâneo de remuneração e aposentadoria a partir de 15/11/2013.
8. O presente não se refere a hipótese de recebimento indevido de valores por erro do INSS ou interpretação equivocada da lei. A percepção indevida da aposentadoria por invalidez decorreu da constatação da recuperação da capacidade laboral em razão da anotação de vínculos empregatícios, não podendo a autora alegar desconhecimento da lei ou mesmo boa-fé na percepção do benefício. De rigor a devolução dos valores.
9. Deve ser mantida integralmente a r. sentença, inclusive quanto aos honorários advocatícios, fixados nos exatos termos adotados por esta Turma Julgadora.
10. Sucumbência recursal.
11. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
