Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1898642 / SP
0031524-15.2013.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO. SENTENÇA
CONDICIONAL. NULIDADE. CONDIÇÕES DE JULGAMENTO IMEDIATO PELO TRIBUNAL.
ATIVIDADE ESPECIAL. CARACTERIZAÇÃO PARCIAL. BENEFÍCIO INDEVIDO.
AVERBAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. REMESSA NECESSÁRIA, TIDA POR
INTERPOSTA, PROVIDA. SENTENÇA ANULADA. AÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.
APELAÇÃO DO INSS PREJUDICADA.
1 - Na exordial, descreve o autor seu ciclo laborativo composto por atividades de natureza
especial, nos intervalos de 25/03/1982 a 14/10/1991 (Secretaria Agricultura), 02/01/1992 a
18/02/1993 (Associação Feminina), 13/04/1993 a 24/06/1997 (Irmandade Santa Casa),
01/04/1998 a 07/12/1998 (Cesario Galli Neto), 01/09/1999 a 08/02/2001 (Antônio Gabriel),
09/02/2001 a 09/06/2001 (Julice Maria Prestes), 02/09/2001 a 31/08/2002 (Irmandade Santa
Casa), 02/05/2003 a 16/03/2004 (Instituto Educacional), 17/03/2004 a 28/09/2009 (Unimed) e
29/09/2009 a 30/03/2011 (Unimed), assim pugnando a concessão de "aposentadoria especial"
(postulada em 28/09/2009, sob NB 150.474.526-1, com data de indeferimento correspondente a
05/10/2009).
2 - Merece relevo a periodização cuja especialidade já se encontra reconhecida na via
administrativa: de 13/04/1993 a 28/04/1995 e 29/04/1995 a 05/03/1997 - remanescendo a
discussão, neste ponto, quanto ao lapso de 06/03/1997 até 24/06/1997.
3 - O INSS foi condenado a averbar tempo de serviço especial e implantar aposentadoria em
nome da parte autora. E não havendo como se apurar, nesta fase processual, com exatidão, o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
valor condenatório, considera-se a sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos
termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
4 - O d. Juiz a quo condicionou a providência concessória à presença de requisitos a serem
averiguados pelo próprio INSS. Está-se diante de sentença condicional, eis que, deveras, não
foi analisado o pedido formulado na inicial, restando violado o princípio da congruência,
insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
5 - O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação
autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições
para tanto. Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os
elementos necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram
assegurados - com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação
processual aplicável, passa-se ao exame do mérito da demanda.
6 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
7 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
8 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, com
redação dada pela Lei nº 9.032/95.
9 - Até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a)
com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
10 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
11 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
12 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
13 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
14 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
15 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
16 - A apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento
da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia
tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima
do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos
anos anteriores, referido nível era superior.
17 - Os autos contêm documentos, dentre os quais importam as cópias de CTPS - cujas
anotações de emprego são passíveis de conferência junto ao banco de dados CNIS e às
tabelas confeccionadas pelo INSS.
18 - Inocuidade da prova oral produzida, isso porque somente pode ser ilustrada eventual
especialidade laborativa por intermédio de prova documental.
19 - Exsurge documentação específica, cujo exame percuciente comprova o labor excepcional
do postulante, de 02/05/2003 a 16/03/2004, na condição de auxiliar de enfermagem, sob
agentes biológicos parasitas infecciosos, de acordo com o PPP, possibilitando o acolhimento
como labor de natureza especial, consoante itens 1.3.2 e 2.1.3 do Decreto nº 53.831/64; 1.3.4 e
2.1.3 do Decreto nº 83.080/79; 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97; e 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
20 - Com relação ao intervalo de 25/03/1982 a 14/10/1991 - no qual o autor exercera atividades
junto à Delegacia Agrícola de Itararé (órgão subordinado à Secretaria de Agricultura e
Abastecimento, Município de Itapeva/SP), na condição de auxiliar agropecuário - não pode ser
reconhecido como especial, porquanto sob regime jurídico estatutário, contribuindo para
Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, conforme certidão de tempo de contribuição -
CTC e documentos correlatos, de forma que a responsabilidade pelo reconhecimento da
especialidade das atividades e a respectiva conversão pertencem ao órgão emissor da certidão,
sendo o INSS parte ilegítima para figurar no pólo passivo no que pertine ao referido período.
21 - No tocante aos interregnos de 01/04/1998 a 07/12/1998, 01/09/1999 a 08/02/2001,
09/02/2001 a 09/06/2001 e 29/09/2009 a 30/03/2011, não há documentos nos autos capazes de
comprovar a sujeição do autor a agentes insalubres, ao longo das tarefas desenvolvidas,
cumprindo ressaltar a inviabilidade, neste caso, de reconhecimento da especialidade por força
de enquadramento profissional.
22 - Concernente ao lapso de 17/03/2004 a 28/09/2009, muito embora tenha sido acostado
Perfil Profissiográfico - PPP assinalando a função do autor como auxiliar de enfermagem, não
foram trazidos elementos indicadores da exposição insalubre, apenas descrita a tarefa como
sendo contato com pacientes. Logo, desautorizado o conhecimento da excepcionalidade
laboral.
23 - No que refere aos interstícios de 06/03/1997 a 24/06/1997 (atendente de enfermagem), e
02/09/2001 a 31/08/2002 (auxiliar de enfermagem), em que pese a remissão documental a
agentes biológicos vírus, bactérias e fungos, a ausência de indicação do responsável pelas
medições (acerca dos elementos agressivos) retira toda a força probante dos documentos.
24 - No que respeita ao período de 02/01/1992 a 18/02/1993, o PPP alude ao manuseio de
fertilizantes, assim genericamente indicado, sem menção a (qualquer) substância
correspondente, o que inviabiliza, pois, o reconhecimento da excepcionalidade.
25 - Computando-se todos os intervalos laborativos de índole unicamente especial (incluído o
intervalo ora reconhecido), constata-se que, na data do pleito administrativo, em 28/09/2009,
totalizava 04 anos, 09 meses e 08 dias de tempo de serviço exclusivamente especial,
notadamente aquém do número de anos necessário à consecução da "aposentadoria especial",
restando, pois, improcedente a demanda, neste ponto específico.
26 - Pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia
previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo especial correspondente a 02/05/2003 a
16/03/2004.
27 - Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários
advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a
gratuidade da justiça conferida ao autor e por ser o INSS delas isento.
28 - Remessa necessária, tida por interposta, provida. Sentença condicional anulada. Julgada
parcialmente procedente a ação. Apelação do INSS prejudicada.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa
necessária, tida por interposta, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de sentença
condicional e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgar
parcialmente procedente a ação, reconhecendo labor especial no intervalo de 02/05/2003 a
16/03/2004, determinando à respectiva averbação, com a conversão, de especial para comum,
estabelecendo a sucumbência recíproca entre as partes autora e ré, restando prejudicado o
exame da apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Referência Legislativa
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-490***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-21 ART-460***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-492 ART-1013 PAR-3 INC-2***** LOPS-60 LEI
ORGÂNICA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-3807 ANO-1960 ART-31LEG-FED LEI-5890 ANO-1973 ART-9LEG-FED DEC-
53831 ANO-1964 ITE-1.3.2 ITE-2.1.3***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-1.3.4 ITE-2.1.3***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-2172
ANO-1997 ITE-3.0.1LEG-FED LEI-9528 ANO-1997***** RPS-99 REGULAMENTO DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ITE-3.0.1