Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5001599-29.2021.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
01/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/12/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 966, V E VIII, DO CPC.
VIOLAÇÃO DASREGRAS QUE DISCIPLINAM A CONCESSÃO DEAPOSENTADORIA
ESPECIAL. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS
NECESSÁRIOS AO BENEFÍCIO. ERRO DE FATO CARACTERIZADO. REAFIRMAÇÃO DA
DER. POSSIBILIDADE. TEMA REPETITIVO Nº 995/STJ.
1. O julgado reconheceu como existente fato inexistente, ao considerar que o segurado havia
preenchido os requisitos necessários à aposentadoria especial, falsa percepção que acarretou
ainda o desrespeito das regras legais que disciplinam a concessão dessa modalidade de
aposentadoria. Erro de fato e violação manifesta de norma jurídica caracterizados.
2. Para a obtenção da aposentadoria integral, exige-se apenas o tempo mínimo de contribuição
(35 anos para homem, e 30 anos para mulher), sem a imposição de idade ou pedágio, nos termos
do Art. 201, § 7º, I, da CF, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/1998.
3. Conforme orientação pacificada no julgamento do Tema Repetitivo nº 995/STJ, "é possível a
reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados
os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o
ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos
dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir".
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. Atendidos os pressupostos legais, impõe-se a concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição a partir do momento em que satisfeitas as condições exigidas.
5. Pedido inicial julgado procedente para rescindir em parte a decisão e julgarparcialmente
procedente o pedido deduzido na ação originária.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIO
Nº
RELATOR:
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5001599-29.2021.4.03.0000
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: JOSE LUIZ CORREA
Advogado do(a) REU: FELIPE FRANCISCO PARRA ALONSO - SP216808-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação rescisória, com pedido detutela de urgência, proposta pelo Instituto Nacional
do Seguro Social - INSS, com fundamento no Art. 966, V e VIII, do Código de Processo Civil,
com vista à desconstituição da sentença proferida nos autos do processo nº1001527-
94.2016.8.26.0620 (apelação cível n° 5834534-36.2019.4.03.999), que julgou parcialmente
procedente o pedido parareconhecer como especiais aatividades desenvolvidas nosperíodos de
01/09/1986 a 18/10/1993, 01/07/1994 a 28/04/1995 e 01/01/2014 a 26/10/2018, condenando a
autarquia previdenciáriaà concessãodo benefício de aposentadoria especialdesde o
requerimento administrativo, formulado em 23/09/2015.
A decisão impugnada foi proferida, em síntese, nos seguintes termos:
"O autor pretende com a presente ação o reconhecimento da natureza especial dos serviços
descritos na inicial. Em consequência, requer a concessão de aposentadoria especial.
Para a obtenção do referido benefício, é de se aplicar o disposto no art. 57, da Lei nº 8.213/91.
Diz o artigo supracitado:
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei,
ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser
a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995).
§ 1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, consistirá numa renda
mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício.(Redação dada pela Lei nº
9.032, de 1995).
§ 2º A data de início do benefício será fixada da mesma forma que a da aposentadoria por
idade, conforme o disposto no art. 49.§
3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante
o Instituto Nacional do Seguro SocialINSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional
nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
durante o período mínimo fixado. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995).
§ 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos
químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade
física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício. (Redação dada pela
Lei nº 9.032, de 1995).
§ 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser
consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva
conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos
pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer
benefício. (Incluído pela Lei nº 9.032, de 1995).
§ 6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da
contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas
alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme aatividade
exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial
após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. (Redação dada pela
Lei nº 9.732, de 11.12.98).
§ 7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide exclusivamente sobre a remuneração
do segurado sujeito às condições especiais referidas no caput. (Incluído pela Lei nº 9.732, de
11.12.98).
§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que
continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes
da relação referida no art. 58 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.98.).
Com efeito, os documentos que acompanham a inicial comprovam que o autor trabalho nas
empresas e permaneceu exposto aos agentes ruídos.
Após realização da perícia e dos estudos e observações a ela atinentes terem sido realizados
concluímos ter permanecido o requerente na atividade especial, conforme consta no quadro de
fls. 203: 01/09/1986 até 18/10/1993, função de motorista, empresa Olaria e comércio materiais
de construção João de Barro, agentes nocivos atividade de motorista, exposição habitual e
permanente, enquadramento 2.4.4 do Decreto 53.831/64 c.c 2.4.2 do Anexo II do Decreto
83.080/79; 01/07/1994 até 28/04/1995, função de motorista de caminhão, empresa
Transportadora João de Barro, agentes nocivos atividade de motorista, exposição habitual e
permanente, enquadramento 2.4.4 do Decreto 53.831/64 c.c 2.4.2 do Anexo II do Decreto
83.080/79; 01/01/2014 até 26/10/2018 (momento da perícia), função de motorista de pá
carregadeira, empresa Olaria João de Barro, agentes nocivos ruído, nível de exposição 97,1
dB(A), exposição superior a 85dB(A), de forma habitual e permanente, enquadramento 2.4.4 do
Decreto 53.831/64 c.c 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79.
Até 28 de abril de 1995, era admitido o reconhecimento da atividade especial por categoria
profissional, sendo a atividade de motorista contemplada em tal rol. Dessa forma, o requerente
faz jus a aposentadoria especial em razão da categoria profissional.
O requerente estava submetido a condições ambientais de trabalho com ruído acima do limite
da NR 15.
Conclui-se, portanto, que tais períodos, portando, devem ser considerados especiais para fins
de aposentadoria.
Desta forma, vê-se que os perfis profissiográficos previdenciário juntados aos autos são
suficientes a demonstrar a natureza especial dos trabalhos desempenhados, pois háexposição
a ruídos acima do limite determinado pela NR15 e foi devidamente reconhecido a atividade
profissional até 1995, como especial.
O laudo encontra-se devidamente assinado por profissional competente, no entender deste
Magistrado, o laudo restou efetivado de forma completa, e devidamente fundamentada,
porquanto o expert analisou a situação de atividade laboral da parte autora e trouxe conclusão
técnica a respeito da atividade especial, razão pela qual não há que se falar na realização de
outro laudo e nem produção de outras provas.
Tendo-se em vista o período acima, fica assentado que o autor exerceu trabalho sujeito a
condições especiais que prejudicam a saúde ou a integridade física, fazendo o autor jus a
conversão dos referidos períodos especiais em tempo de atividade comum pra o devido
cômputo, com as devidas alterações no fator previdenciário e na RMI.
Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, com resolução de mérito, nos
termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para DECLARAR que no período de
01/09/1986 a 18/10/1993, 01/07/1994 a 28/04/1995 e 01/01/2014 a 26/10/2018 o autor
efetivamente desempenhou atividade em condições especiais, o que deverá ser anotado pra
fins previdenciário, e para CONDENAR o réu INSS a conceder ao autor o benefício de
Aposentadoria Especial em valor correspondente a 100% (cem por cento) do seu salário-de-
beneficio, nos termos do artigo 57, da Lei nº 8.213/1991 desde o requerimento administrativo
23/09/2015 (fls. 28)".
A apelação posteriormente interposta não foi conhecida.
A r. sentença transitou em julgado em 02/07/2020. Esta ação foi ajuizada em 02/02/2021.
Em resumo, a autarquia previdenciáriasustenta que o julgado violou o disposto nos Arts. 201, §
1º, da Constituição Federal (na redação vigente na época da DIB fixada na sentença); Art. 57,
da Lei 8.213/91e64,do Decreto 3.048/99, uma vez que o segurado não reunia tempo suficiente
de exercício de atividades insalubres que viabilizasse aconcessão de aposentadoria especial.
Aduz, ainda, que houveprolaçãode julgamento extra petita, em desconformidade com as regras
dosArts. 141 e 492 do CPC, eis que inexistente pedido de deferimento de aposentadoria
especial nos autos subjacentes.
Argumenta, por fim, que a decisão rescindenda fundamentou-se em erro de fato,por ter
admitidocomo existente fato inexistente, qual seja, que o segurado possuía25 anos de trabalho
sob condições especiais na época fixada para a DIB (23/09/2015).
Pleiteia a rescisão parcial da decisão para que, em novo julgamento da causa, haja a aplicação
do instituto da reafirmação da DER, consoante o decidido no Tema Repetitivo nº 995/STJ, a fim
de conceder-se ao segurado o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,nos
termos do Art. 201, § 7º, I, da Constituição Federal, na redação anterior à da Emenda
Constitucional nº 103/2019, a partir de09/07/2018, data em que foram preenchidos os requisitos
necessários. Requer a concessão da tutela provisória de urgência para a imediata suspensão
da execução em curso.
Concedida aantecipação da tutela para determinar o cancelamento da aposentadoria especial
deferida e a imediata concessão de aposentadoria por tempo de contribuição ao segurado, com
DIB a partir de 09/07/2018; bem como para ordenar a suspensão da execução dos valores em
atraso, sem prejuízo do prosseguimento quanto à parte incontroversa, até a solução definitiva
da presente demanda.
Juntada de petição do réu em que manifesta expressa concordância coma liminar proferida.
Deferida a gratuidade da justiça.
Em seu parecer, o Ministério Público Federalopina peloconhecimento da ação rescisória, nos
termos do Art. 966, VIII, do CPC, para que o julgado seja parcialmente rescindido e, em juízo
rescisório, seja declarado o direito do autor à aposentadoria por tempo de contribuição com
data de início em 09/07/2018.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5001599-29.2021.4.03.0000
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: JOSE LUIZ CORREA
Advogado do(a) REU: FELIPE FRANCISCO PARRA ALONSO - SP216808-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A questão posta a desate diz respeito à ocorrência de violação manifesta de norma jurídica e
erro de fato no julgado.
Argumenta a autarquia previdenciária que a sentença rescindenda está inquinada dos citados
víciospor ter concedido aposentadoria especial a segurado que não havia preenchido os
requisitos necessários.
Para que se configure a hipótese prevista no Art. 966, V, do CPC, impõe-se que a violação à
norma seja frontal e direta.
Sobre o tema, lecionaHumberto Theodoro Júnior, ainda que sobre o conceito de "violação a
literal disposição de lei", expresso no Código Processual Civil revogado, que:
"O conceito de violação "literal de disposição de lei" vem sendo motivo de largas controvérsias
desde o Código anterior. Não obstante, o novo estatuto deliberou conservar a mesma
expressão.
O melhor entendimento, a nosso modo de ver, é o de Amaral dos Santos, para quem sentença
proferida contra literal disposição de lei não é apenas a que ofende a letra escrita de um
diploma legal; "é aquela que ofende flagrantemente a lei, tanto quando a decisão é repulsiva à
lei (error in judicando), como quando é proferida com absoluto menosprezo ao modo e forma
estabelecidos em lei para a sua prolação (error in procedendo).
Não se cogita de justiça ou injustiça no modo de interpretar a lei. Nem se pode pretender
rescindir a sentença sob invocação de melhor interpretação da norma jurídica aplicada pelo
órgão julgador".
(THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual. Vol. I. 50 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2009, pp. 701-702).
A respeito do estatuto processual em vigor, acrescenta:
"Violação manifesta, referida pelo art. 966, V, do atual Código exprime bem a que se apresenta
frontal e evidente à norma, e não a que decorre apenas de sua interpretação diante da
incidência, sobre determinado quadro fático. Reconhece-se que toda norma tem um núcleo
mínimo ou específico de compreensão, mesmo quando esteja formulada em termos vagos ou
imprecisos. É esse núcleo que não pode ser ignorado ou ultrapassado pelo intérprete e
aplicador da norma. Ir contra seu conteúdo implica, segundo Sérgio Bermudes, proferir
sentença “inequivocamente contrária à norma”, justificando-se a rescisória por sua manifesta
violação".
(THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. III. 53 ed. rev. e atual. Rio
de Janeiro: Forense, p. 826).
Ao substituir o termo "violação a literal disposição de lei" por "violação manifesta de norma
jurídica", o novo Código pacificou a controvérsia doutrinária e jurisprudencial em torno do
cabimento dessa hipótese de rescindibilidade não só para os casos em que há ofensa a texto
de dispositivo de Lei, em sua literalidade, como também quando se viola princípios e regras
integrantes do ordenamento jurídico. Por sua vez, a Lei nº 13.256/16, ao introduzir os §§ 5º e
6º, do Art. 966, do CPC, passou a prever sua aplicação contra decisão baseada em enunciado
de súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos repetitivos que não tenha considerado
a existência de distinção entre a questão discutida no processo e o padrão decisório que lhe
deu fundamento.
A seu turno, oerro de fato, na acepção dada pelo o Art. 966, VIII, do Código de Processo Civil,
implicaassumircomo existente fato inexistente, ou como inexistente fato efetivamente ocorrido,
sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre
o qual o juiz deveria ter se pronunciado.
Conforme o ensinamento doutrinário, é indispensável que o erro possa ser verificável do
simples exame dos autos, admitindo-se a rescisória somente se a existência ou inexistência do
fato não tiver sido expressamente apreciada pela decisão (GONÇALVES, Marcus Vinicius
Rios.Direito processual civil esquematizado- 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2016, pp 563-564).
Outrossim, o erro "não pode ser aquele que resultou da escolha ou opção do juiz diante de uma
controvérsia", mas "o que passou desapercebido" (VICENTE, Greco Filho.Direito processual
civil brasileiro - v. 2: atos processuais a recursos e processos nos tribunais. 18 ed. rev. e ampl.
São Paulo: Saraiva, 2007, pp. 448-449). Por fim, é necessário que haja um nexo de causalidade
entre o erro e a conclusão a que chegou o magistrado (DIDIER JUNIOR, Fredie; CUNHA,
Leonardo Carneiro da.Curso de direito processual civil - v. 3: meios de impugnação às decisões
judiciais e processo nos tribunais. 10. ed. Salvador: JusPODIVM, 2012, pp. 447-448). Noutros
termos:
"Para que seja admitida a ação rescisória com fundamento no dispositivo legal ora analisado, é
necessário o preenchimento de quatro requisitos:
(a) o erro de fato deve ser fundamento essencial da sentença, ou seja, não fosse o erro de fato,
a decisão teria sido em outro sentido;
(b) a apuração do equívoco factual deve ser realizada com as provas produzidas no processo
originário, de forma que a produção de prova na própria ação rescisória nesse caso é proibida;
(c) o fato não pode representar ponto controvertido (questão) no processo originário, ou porque
as partes não alegaram e caberia ao juiz conhecê-los de ofício, ou porque houve confissão de
uma parte ou ainda porque a outra parte se absteve de impugnar a alegação de fato;
(d) a inexistência de pronunciamento judicial a respeito do fato, entendendo-se que a má
apreciação de prova não gera ação rescisória".
(NEVES, Daniel Amorim Assunção. Manual de direito processual civil - v. único. 8. ed. Salvador:
JusPODIVM, 2012, pp. 1380-1381).
No caso sob análise, resta incontroverso que o segurado não havia reunido tempo suficiente de
desempenho de atividades sob condições insalubres para a obtenção do benefício de
aposentadoria especial. Desse modo, pelo simples exame dos autos, verifica-se que o julgado
consideroucomo existente fato inexistente.
Impõe-seacrescentar que essa falsa napercepção sobre a realidade doselementos do processo
acarretou também indubitável ofensaàs disposiçõeslegais que disciplinam a concessão dessa
modalidade de aposentadoria, razão por que caracterizadasas hipóteses deerro de fato e
violação manifesta de norma jurídica, o que autoriza da desconstituição da decisão.
Em novo julgamento da causa, observo que osegurado propôs ação ordinária em 20/06/2016,
em que objetivava o reconhecimento da especialidade do trabalho exercido nos períodos de
01/09/1986 a18/10/1993,01/07/1994 a01/02/1997,19/11/2003 a04/08/2008,02/03/2009
a06/06/2015 e de01/06/2012 a30/06/2015, cumulado com pedido de concessão de
aposentadoria integral por tempo de contribuiçãodesde o requerimento administrativo,
formulado em 23/09/2015.
Para a obtenção da aposentadoria integral exige-se o tempo mínimo de contribuição (35 anos
para homem, e 30 anos para mulher) e será concedida levando-se em conta somente o tempo
de serviço, sem exigência de idade ou pedágio, nos termos do Art. 201, § 7º, I, da CF.
Por sua vez, a Emenda Constitucional 20/98 assegura, em seu Art. 3º, a concessão de
aposentadoria proporcional aos que tenham cumprido os requisitos até a data de sua
publicação, em 16/12/98. Neste caso, o direito adquirido à aposentadoria proporcional, faz-se
necessário apenas o requisito temporal, ou seja, 30 (trinta) anos de trabalho no caso do homem
e 25 (vinte e cinco) no caso da mulher, requisitos que devem ser preenchidos até a data da
publicação da referida emenda, independentemente de qualquer outra exigência.
Em relação aos segurados que se encontravam filiados ao RGPS à época da publicação da EC
20/98, mas não contavam com tempo suficiente para requerer a aposentadoria - proporcional
ou integral - ficam sujeitos as normas de transição para o cômputo de tempo de serviço. Assim,
as regras de transição só encontram aplicação se o segurado não preencher os requisitos
necessários antes da publicação da emenda. O período posterior à Emenda Constitucional
20/98 poderá ser somado ao período anterior, com o intuito de se obter aposentadoria
proporcional, se forem observados os requisitos da idade mínima (48 anos para mulher e 53
anos para homem) e período adicional (pedágio), conforme o Art. 9º, da EC 20/98.
A par do tempo de serviço, deve o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos
do Art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a
tabela de seu Art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das
condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de
contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado Art. 25, II.
A sentença rescindenda considerou como especiais os interregnos de 01/09/1986 a 18/10/1993,
01/07/1994 a 28/04/1995 e 01/01/2014 a 26/10/2018, e condenou o INSSa conceder ao então
autor o benefício de aposentadoria especial, nos termos do Art. 57, da Lei nº 8.213/91, desde o
requerimento administrativo, em 23/09/2015.
O INSS reconhece a parcial procedência do pedido origináriopara o fim de se reconhecer o
direito do segurado à averbação dos períodos de01/09/1986 a 18/10/1993, 01/07/1994 a
28/04/1995 e 01/01/2014 a 26/10/2018 como tempo de trabalho especial. Não obstante,
assinala que o próprio demandado pleiteou, nos autos subjacentes,a concessão do benefício
mediante o cômputo de atividades exercidas após o ajuizamento da ação matriz, a partir de
09/07/2018, quando totalizaria trinta e cinco anos de contribuição.
Ademais, requer a aplicação do decidido no julgamento do Tema Repetitivo nº 995 (REsp
1424792/BA), em 22/10/2019, pelo c. Superior Tribunal de Justiça, quando ficou pacificada a
orientação segundo a qual "é possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do
Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do
benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da
prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015,
observada a causa de pedir".
Por seu turno, o réu reconhece a procedênciado pedido e, assim,ambas as partes concordam
que o segurado não havia implementado as condições necessárias para a concessão de
aposentadoria especial na DER (23/09/2015), mas que, no entanto, preencheraos requisitos
para a aposentadoria integral por tempo de contribuição a partir de 09/07/2018, como cômputo
de períodos de atividade posteriores ao ajuizamento dofeito subjacente.
Destarte, atendidos os pressupostos legais, é de se rescindir parcialmente o julgado e, em novo
julgamento da causa, determinar a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição
comtermo inicial fixado em 09/07/2018, data em que satisfeitas as condições exigidas,
observada a desnecessidade de devolução dos valores recebidos, por se tratar de verba
alimentar, recebida de boa-fé pelo segurado, por força de decisão judicial.
Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 1.200,00, nos termos
dos Arts. 90 e 85, § 8º, do CPC, ressalva a suspensão da exigibilidade, por se tratar de
beneficiário da gratuidade da justiça.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para rescindir parcialmente a decisãoe, em
novo julgamento da causa, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido deduzido nos
autos da ação originária.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 966, V E VIII, DO CPC.
VIOLAÇÃO DASREGRAS QUE DISCIPLINAM A CONCESSÃO DEAPOSENTADORIA
ESPECIAL. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS
NECESSÁRIOS AO BENEFÍCIO. ERRO DE FATO CARACTERIZADO. REAFIRMAÇÃO DA
DER. POSSIBILIDADE. TEMA REPETITIVO Nº 995/STJ.
1. O julgado reconheceu como existente fato inexistente, ao considerar que o segurado havia
preenchido os requisitos necessários à aposentadoria especial, falsa percepção que acarretou
ainda o desrespeito das regras legais que disciplinam a concessão dessa modalidade de
aposentadoria. Erro de fato e violação manifesta de norma jurídica caracterizados.
2. Para a obtenção da aposentadoria integral, exige-se apenas o tempo mínimo de contribuição
(35 anos para homem, e 30 anos para mulher), sem a imposição de idade ou pedágio, nos
termos do Art. 201, § 7º, I, da CF, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/1998.
3. Conforme orientação pacificada no julgamento do Tema Repetitivo nº 995/STJ, "é possível a
reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que
implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no
interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias
ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir".
4. Atendidos os pressupostos legais, impõe-se a concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição a partir do momento em que satisfeitas as condições exigidas.
5. Pedido inicial julgado procedente para rescindir em parte a decisão e julgarparcialmente
procedente o pedido deduzido na ação originária. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
unanimidade, decidiu julgar procedente o pedido para rescindir parcialmente a decisão e, em
novo julgamento da causa, julgar parcialmente procedente o pedido deduzido nos autos da
ação originária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
