
| D.E. Publicado em 27/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006055-49.2012.4.03.6103/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Senhor Desembargador Federal SOUZA RIBEIRO (Relator):
Trata-se de ação ordinária, interposta por JURANDIR CARDOSO DE SIQUEIRA, servidor público federal aposentado, objetivando o reconhecimento e a averbação de tempo laborado em condições especiais, no Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), com a consequente concessão de benefício de aposentadoria especial de servidor público federal ou, subsidiariamente, a revisão do benefício de aposentadoria proporcional do autor para aposentadoria integral, mediante a conversão do tempo especial em comum.
A r. sentença reconheceu a prescrição, quanto ao fundo de direito, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/32, e julgou extinto o processo, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso II, do Código de Processo Civil de 2015.
Apelação do autor, pela reforma do decisum. Em suas razões recursais, sustenta a imprescritibilidade do fundo de direito, por versar a demanda sobre matéria previdenciária, alegando que as prestações previdenciárias, de caráter alimentar, são indisponíveis, bem como de trato sucessivo, estando sujeitas à prescrição total, apenas, aquelas parcelas não reclamadas no interstício de cinco anos. Ademais, argumenta ter direito à aposentadoria especial (pedido principal), por somar mais de vinte e cinco anos de tempo de serviço, exposto a agentes agressivos à sua saúde, aplicando-se, ante a ausência de Lei Complementar específica, a Lei nº 8.213/91, conforme decisões dos Mandados de Injunção nºs 721 e 918. Aduz, ainda, que o prazo prescricional não pode ser contado a partir da concessão do benefício que ocorreu em 1995, mas a partir da data da decisão proferida no MI 918, qual seja, em 26/11/2008, ou deveria ser contado a partir da negativa de seu pedido administrativo de revisão da aposentadoria. Por fim, requer a aplicação da Súmula 85 do STJ.
Com as contrarrazões apresentadas pela União, os autos subiram a esta E. Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Senhor Desembargador Federal SOUZA RIBEIRO (Relator):
Pretende o autor, técnico aposentado do Comando da Aeronáutica, nestes autos, a averbação de tempo de serviço especial, no período de labor no Centro Técnico Aeroespacial - CTA, de 01/10/1968 até 11/12/1990, sob regime celetista, e no lapso de 12/12/90 a 12/04/95, sob o regime do RJU, e consequente concessão de aposentadoria especial. Subsidiariamente, requer a conversão em comum de referidos intervalos de labor especial e a revisão do ato de concessão do benefício de aposentadoria.
Inicialmente, anoto que, no presente caso, não se há falar em prescrição do fundo de direito.
Explico.
A situação posta nos autos é singular, uma vez que, quando da concessão do benefício ao autor, em 12/04/1995 (fls. 28), já era previsto na Constituição Federal (art. 40, §4º, III) o direito à aposentadoria especial ou cômputo de tempo de serviço especial, para servidor público, todavia, a efetiva obtenção de tal benesse, à época da aposentação do requerente, dependia da edição de norma de lei regulamentadora, sem a qual sua reivindicação não poderia ser exercida.
Imperioso salientar que, segundo o princípio do actio nata, a prescrição inicia-se com o nascimento da pretensão ou ação, ou seja, o curso do prazo prescricional tem início com a real lesão ou ameaça do direito tutelado, momento em que nasce a pretensão a ser deduzida em Juízo.
Dessa forma, entendo que a efetiva possibilidade de concessão de aposentadoria especial a servidor público apenas surgiu a partir do momento em que suprida essa lacuna legislativa pelo STF, por meio do julgamento do MI 721/DF, publicado em 30/11/2007, segundo o qual, restou determinado que, até que fosse editada a norma legal regulamentadora, exigida no dispositivo constitucional, aplicável a mesma legislação que orienta o regime geral de previdência (Lei nº 8.213/91).
Confira-se:
Nesse contexto, relativamente aos servidores aposentados anteriormente à publicação do julgado de C. STF, o termo inicial do prazo prescricional para a postulação do direito de concessão de aposentadoria especial de servidor somente deve ter início a partir do citado marco (30/11/2007), ao passo que, no que tange a aposentadorias concedidas posteriormente à referida data, a prescrição deve correr da data de concessão desse benefício.
Logo, no caso em epígrafe, não ocorreu a prescrição do fundo de direito, uma vez que o termo inicial prescricional começou a correr a partir de 30/11/2007, e a presente ação foi ajuizada em 06/08/2012.
Por conseguinte, conclui-se que se deve falar apenas na prescrição das parcelas vencidas há mais de cinco anos, nos termos preconizados na Súmula 85/STJ: "nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação."
Assim, mesmo com a ressalva das parcelas relativas aos cinco anos anteriores à propositura da ação, a prescrição, no presente caso, não se afigura como óbice para análise do pedido deduzido pelo autor.
Impõe-se, portanto, a reforma da sentença de 1º grau, afastando-se extinção do processo, baseada na prescrição do fundo de direito, à vista dos argumentos acima expendidos.
Assim, passo à análise do mérito.
Quanto ao direito à aposentadoria especial a servidor público, de rigor algumas considerações.
A Constituição de 1988 assegura, em seu artigo 201, §9º, desde sua redação original, "o direito à contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios definidos em lei".
Por sua vez, o art. 40, §4º, da Constituição Federal, com a redação alterada pela Emenda Constitucional nº 20/1998, veda a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos servidores sujeitos ao regime próprio de previdência, ressalvados os casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar.
Note-se que a Lei Maior não garante a conversão do tempo de serviço especial, para o servidor público, mas apenas a contagem recíproca, considerando o tempo de efetiva contribuição, sendo que a aplicação do multiplicador, decorrente de norma concernente ao Regime Geral de Previdência Social, não se aplica ao regime estatutário, que possui regramento próprio.
Ademais, consoante anteriormente asseverado, houve sucessivos Mandados de Injunção impetrados por entidades de classe representantes dos servidores públicos, que visavam suprir a lacuna originada do comando constitucional instituído pelo artigo 40, parágrafo 4°, inciso III. Dessa forma, em nove de abril de 2014, o Supremo Tribunal Federal aprovou a súmula vinculante 33, cujo enunciado possui a seguinte redação:
No esteio da jurisprudência pacífica da Suprema Corte, a Súmula Vinculante veio consagrar o direito ao cômputo especial do tempo exercido em condições prejudiciais à saúde do servidor público. Este cômputo especial foi assegurado para viabilizar o direito à aposentadoria especial, ou seja, para a concessão de benefício previdenciário com tempo de contribuição reduzido, previsto no "caput" do artigo 57 da Lei 8.213/91, cujo tempo integral (15, 20 ou 25 anos, conforme o caso) é exercido em condições especiais.
Relevante destacar o voto do eminente Ministro Teori Zavascky, no bojo do Agravo Regimental no Mandado de Injunção 1596:
Nesse sentido:
Por conseguinte, as regras do Regime Geral de Previdência Social, as quais a nova súmula faz menção, são aquelas instituídas pela Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre o plano de benefícios da Previdência Social e, em seu artigo 57, trata da aposentadoria especial nos seguintes termos:
Note-se que o dispositivo supracitado não é auto aplicável, necessitando de regulamentação para alcançar efetividade, sendo que a regulamentação em questão foi instituída pelos Decretos nºs 53.831/64, 83.080/79, bem como pelo Decreto nº 3.048/99, este último que aprova o Regulamento da Previdência Social, já sob a vigência da Lei nº 8.213/91.
Ressalte-se que o segurado tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial nos moldes da legislação da época da prestação do serviço (RESP 425660/SC de Relatoria do Ministro Felix Fischer, publicado no DJ em 28.04.1995).
Nesse passo, até o advento da Lei nº 9.032/95 admitia-se duas formas de se considerar o tempo de serviço como especial: a) enquadramento por categoria profissional: conforme a atividade desempenhada pelo segurado prevista em regulamento; b) enquadramento por agente nocivo: independentemente da atividade ou profissão exercida, o caráter especial do trabalho decorria da exposição ininterrupta e permanente a agentes insalubres arrolados na legislação de regência.
Assim sendo, até 28 de abril de 1995, para que a atividade do servidor fosse considerada especial, bastava o mero enquadramento em uma das profissões ou que determinado agente nocivo estivesse previsto nos anexos dos Decretos que regulamentam a matéria.
No entanto, após a referida data, o servidor terá de demonstrar a efetiva submissão aos agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, o que, por sua vez, deverá ser feito por meio do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, preenchido pelo órgão público ou por preposto autorizado, ou, ainda, LTCAT - Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Assim, para fazer jus ao pleiteado benefício deve ser efetivamente comprovada a constante, habitual e permanente sujeição do servidor a agentes agressivos, físicos, químicos ou biológicos, à saúde, com base em perícia técnica que demonstre sujeição permanente das atividades desempenhadas pelo mesmo a esses agentes agressivos.
No caso concreto, cabe ao demandante comprovar por prova pericial adequada que preenche os requisitos necessários à concessão da benesse.
In casu, verifico, por meio da Declaração, do Formulário e do Laudo Técnico, todos emitidos pelo Instituto de Aeronáutica e Espaço - IAE (fls. 29/33 e 37), que o autor laborou como técnico, desempenhando suas atividades no setor IAE/AMR (antigo Laboratório Fotográfico), onde executava a revelação de toda a documentação fotográfica da Divisão, preparava soluções químicas aplicadas como reveladores e reforçadores, manuseando diversos produtos químicos, tais como: Revelador e Reforçador X-OMAT EX II (da Kodak), bromato de sódio, formol, hidroquinona, sulfito de sódio, hiposulfito de sódio, metol, ácido acético, ácido bórico e bórax, entre outros, de forma habitual e permanente.
Sendo assim, devem ser considerados como tempo de serviço em atividade especial os períodos de 01.10.1968 até 11.12.1990 e 12.12.1990 até 12.04.1995, porquanto restou comprovado que o autor laborou em condições especiais, uma vez que os citados documentos atestam que o postulante esteve exposto a agentes químicos tipificados como vapores inorgânicos e vapores tóxicos orgânicos, enquadradas nos códigos 1.2.9 e 1.2.11 do quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64, de modo habitual e permanente, durante todo o período em que atuou no IAE.
Assim, reconhecido como especial o período laborado no IAE, o autor conta com 26 (vinte e seis) anos, 06 (seis) meses e 12 (doze) dias de serviço em atividade nociva à sua saúde, o que autoriza a concessão da aposentadoria especial integral, nos termos do artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
Positivados os requisitos legais, cumpre reconhecer o direito do autor à aposentadoria especial, a partir da citação efetiva da União Federal, em 02.10.2013 (fl. 70), uma vez que não houve requerimento administrativo desse benefício específico. Cumpre anotar que o único pedido realizado administrativamente foi no sentido de reconhecimento de tempo laborado como especial e consequente conversão em tempo comum, e não de concessão de aposentadoria especial (fls. 57).
Nesse sentido:
Por fim, anoto que eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos.
No que diz respeito aos honorários sucumbenciais, entendo que devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, pois razoável e compatível com a complexidade da causa, nos termos do art. 85, §2º do NCPC.
Com relação aos juros de mora, anoto que, consoante a entrada em vigor da Lei nº 11.960/09, ocorrida em 30.06.2009, a atualização monetária do débito judicial e a incidência de juros de mora devem obedecer aos critérios estabelecidos no novo regramento legal, dispondo que "nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança", já que cuida a espécie de norma de natureza processual tendo, destarte, incidência imediata ao processo.
Isso porque, segundo entendimento do C. STF, adotado no julgamento do RE 559.445/PR, as normas que disciplinam os juros moratórios possuem natureza processual (instrumental) e devem ser aplicadas aos processos em curso seguindo a mesma sistemática da correção monetária, que impõe a incidência dos percentuais previstos na lei específica vigente à época do período a ser corrigido. Nesse sentido:
Assim, aplicam-se juros de mora no percentual de 1% ao mês, nos termos do art. 3.º Decreto n.º 2.322/87, no período anterior à 24/08/2001, data de publicação da Medida Provisória n.º 2.180-35, que acresceu o art. 1.º-F à Lei n.º 9.494/97; percentual de 0,5% ao mês, a partir da MP n.º 2.180-35/2001 até o advento da Lei n.º 11.960, de 30/06/2009, que deu nova redação ao art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97; e percentual estabelecido para caderneta de poupança, a partir da Lei n.º 11.960/2009, a partir de quando a atualização do débito deve ser feita pelos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.
Relativamente à correção monetária, a mesma deve incidir nos termos da legislação vigente à época da liquidação do julgado, observando-se, oportunamente, no que tange aos critérios de atualização, o julgamento do C. STF no RE 870.947/SE.
Ante o exposto, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação, para afastar a prescrição do fundo de direito e julgar parcialmente procedente o pedido, a fim de condenar a União a conceder a aposentadoria especial ao autor, nos termos da fundamentação. Verba honorária, correção monetária e juros de mora, consoante acima explicitado.
É o voto.
SOUZA RIBEIRO
Desembargador Federal
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