Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5375472-33.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
15/05/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 19/05/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. ART. 1.021, CPC. APELAÇÃO
DA AUTORA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMA 1007 DOS RECURSOS
REPETITIVOS. CÔMPUTO DO TEMPODE ATIVIDADE RURAL, REMOTA E DESCONTÍNUA,
ANTERIOR À LEI 8.213/1991.PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. A decisão ora agravada, prolatada em consonância com o permissivo legal, encontra-se
supedaneada em jurisprudência consolidada do Colendo Superior Tribunal de Justiça, inclusive
quanto aos pontos impugnados no presente recurso.
2. A Lei 11.718/2008, ao inserir os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei 8.213/91,autorizou, para fins de
cumprimento da carência exigida para a aposentadoria por idade, o cômputo da atividade
ruralaos trabalhadores que, embora inicialmente tenham exercido atividades rurais, passaram a
desempenhar temporária ou permanentemente atividades urbanas.
3. Com efeito, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso
Especial n. 1.674.221/SP, referente ao Tema 1.007 dos recursos repetitivos, firmou tese nos
seguintes termos:"O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento
da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da
aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das
contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do
labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do
implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo."
4. In casu, a autora completou a idade mínima de 60 (sessenta) anos de idade em 12/03/2013, de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
modo que, nos termos do artigo 142, da Lei nº 8.213/1991, deveria comprovar a carência de 180
(cento e oitenta) meses, ônus do qual, de fato, se desincumbiu. Foi determinada pela r. sentença
a averbação do labor rural da autora nos períodos entre 01/08/1978 e 31/08/1979; 01/04/1980 e
01/07/1980, os quais foram registrados em CTPS, não havendo insurgência recursal pelo INSS.
5. Na espécie, computado o tempo de labor rural registrado na CTPS, cuja averbação foi
determinada pela r. sentença (01/08/1978 a 31/08/1979 e 01/04/1980 a 01/07/1980) em conjunto
com o tempode contribuição constante do CNIS (166 contribuições), o período de carência de 180
(cento e oitenta) meses foi efetivamente cumprido na data em que preenchido o requisito etário.
Destarte, implementados os requisitos legais, a segurada faz jus à percepção de aposentadoria
por idade na modalidade híbrida.
6. As razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do
decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele contida.
7. Agravo interno desprovido.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5375472-33.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA ANGELICA GUIRADO HERMENEGILDO
Advogado do(a) APELANTE: MICHAEL ARADO - SP299691-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5375472-33.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA ANGELICA GUIRADO HERMENEGILDO
Advogado do(a) APELANTE: MICHAEL ARADO - SP299691-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA (RELATORA): - Trata-
se de agravo interno interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com
fulcro no artigo 1.021 do Código de Processo Civil, em face da r. decisão monocrática (ID
97545541), que deu provimento à apelação da parte autora, para julgar parcialmente procedente
a ação, condenando o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por idade híbrida à
segurada, desde a data do requerimento administrativo (13/12/2017).
Sustenta o agravante, preliminarmente, que o presente processo deve ser sobrestado até o
julgamento final do Tema 1007 dos recursos repetitivos. No mérito, afirma que a concessão da
aposentadoria por idade híbrida depende da comprovação do exercício de atividade rural no
período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou do requerimento
administrativo, não sendo admitida aos trabalhadores que comprovadamente deixaram a
atividade campesina há tempos, muito menos computando como carência o tempo de serviço
rural anterior a 1991.Requer a retratação da decisão agravada, para dar provimento ao recurso
de apelação ou, caso não seja este o entendimento, pleiteia a submissão do presente ao
julgamento da E. Turma (ID 107255831).
Contraminuta (ID 123964748).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5375472-33.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA ANGELICA GUIRADO HERMENEGILDO
Advogado do(a) APELANTE: MICHAEL ARADO - SP299691-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
"EMENTA"
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. ART. 1.021, CPC. APELAÇÃO
DA AUTORA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMA 1007 DOS RECURSOS
REPETITIVOS. CÔMPUTO DO TEMPODE ATIVIDADE RURAL, REMOTA E DESCONTÍNUA,
ANTERIOR À LEI 8.213/1991.PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. A decisão ora agravada, prolatada em consonância com o permissivo legal, encontra-se
supedaneada em jurisprudência consolidada do Colendo Superior Tribunal de Justiça, inclusive
quanto aos pontos impugnados no presente recurso.
2. A Lei 11.718/2008, ao inserir os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei 8.213/91,autorizou, para fins de
cumprimento da carência exigida para a aposentadoria por idade, o cômputo da atividade
ruralaos trabalhadores que, embora inicialmente tenham exercido atividades rurais, passaram a
desempenhar temporária ou permanentemente atividades urbanas.
3. Com efeito, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso
Especial n. 1.674.221/SP, referente ao Tema 1.007 dos recursos repetitivos, firmou tese nos
seguintes termos:"O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento
da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da
aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das
contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do
labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do
implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo."
4. In casu, a autora completou a idade mínima de 60 (sessenta) anos de idade em 12/03/2013, de
modo que, nos termos do artigo 142, da Lei nº 8.213/1991, deveria comprovar a carência de 180
(cento e oitenta) meses, ônus do qual, de fato, se desincumbiu. Foi determinada pela r. sentença
a averbação do labor rural da autora nos períodos entre 01/08/1978 e 31/08/1979; 01/04/1980 e
01/07/1980, os quais foram registrados em CTPS, não havendo insurgência recursal pelo INSS.
5. Na espécie, computado o tempo de labor rural registrado na CTPS, cuja averbação foi
determinada pela r. sentença (01/08/1978 a 31/08/1979 e 01/04/1980 a 01/07/1980) em conjunto
com o tempode contribuição constante do CNIS (166 contribuições), o período de carência de 180
(cento e oitenta) meses foi efetivamente cumprido na data em que preenchido o requisito etário.
Destarte, implementados os requisitos legais, a segurada faz jus à percepção de aposentadoria
por idade na modalidade híbrida.
6. As razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do
decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele contida.
7. Agravo interno desprovido.
A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA (RELATORA):- Não é
de ser provido o agravo.
A decisão ora agravada, prolatada em consonância com o permissivo legal, encontra-se
supedaneada em jurisprudência consolidada do Colendo Superior Tribunal de Justiça, inclusive
quanto aos pontos impugnados no presente recurso, nos seguintes termos:
“Trata-se de apelação interposta por MARIA ANGÉLICA GUIRADO HERMENEGILDO contra r.
sentença proferida em ação previdenciária ajuizada em face do INSS – Instituto Nacional do
Seguro Social, objetivando a concessão de aposentadoria por idade híbrida.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo o trabalho rural exercido
nos períodos de 01/08/1978 a 31/08/1979 e 01/04/1980 a 01/07/1980, os quais foram anotados
em CTPS, determinando a averbação do referido tempo de serviço. Porém, deixou de reconhecer
o tempo de trabalho rural nos períodos entre 01/09/1979 e 30/03/1980; 02/07/1980 e 07/06/1987;
29/09/1987 e 18/101987; 12/01/1988 e 30/10/1991, na medida em que, embora as testemunhas
tenham apontado o referido tempo de trabalho rural pela autora, não houve prova documental
contemporânea aos referidos períodos. Rejeitou o pedido de concessão da aposentadoria por
idade híbrida, sob o fundamento de que a autora não teria preenchido a carência de 180
contribuições, tendo em vista a impossibilidade de se considerar o tempo de trabalho rural
anterior a 1991 para cômputo do período carencial. Haja vista a sucumbência recíproca,
determinou que as custas e despesas processual fossem rateadas entre as partes, arcando cada
qual delas com os honorários em favor do patrono da parte contrária, fixado em 10% sobre o
valor da condenação. Sentença não sujeita à remessa necessária, nos termos do artigo 496, §3º,
inciso I, do CPC (ID 41494540).
A autora opôs embargos de declaração (ID 41494543), os quais não foram conhecidos, em razão
da inexistência de omissão, obscuridade e contradição na sentença (ID 41494544).
Em razões recursais, a apelante sustenta, em síntese, que faz jus à aposentadoria por idade
híbrida, porquanto somado o período de atividade rural e o número de contribuições vertidas ao
RGPS como empregadae segurado individual resta preenchido os requisitos de carência e de
idade para concessão do benefício. Alega que o tempo de serviço rural sem registro em CTPS
restou comprovado nos autos, mediante início de prova documental corroborado pela oitiva de
testemunhas, inexistindo óbice ao cômputo do tempo de serviço rural anterior a 1991 para efeito
de carência. Requer o provimento do recurso, buscando o reconhecimento do trabalho rural sem
anotação na CTPS, nos seguintes períodos: 01/09/1979 a 30/03/1980; 02/07/1980 a 07/06/1987;
29/09/1987 a 18/10/1987; 12/01/1988 a 30/10/1991 para, ao final, reformar a r. sentença e
conceder a aposentadoria por idade híbrida, desde a data do requerimento administrativo (ID
41494547).
Com contrarrazões (ID 41494551), os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
Decido.
Cabível na espécie o art. 932,do Código de Processo Civil, em atenção aos princípios
constitucionais da celeridade e razoável duração do processo, haja vista entendimento dominante
sobre o tema em questão (Súmula 568/STJ, aplicada por analogia).
Preenchidos os pressupostos genéricos, conheço da apelação e passo ao seu exame.
Cinge-se a controvérsia quanto à concessão de aposentadoria por idade na modalidade híbrida,
mediante o cômputo do período de trabalho rural remoto, exercido anteriormente a 1991.
No presente caso, a autora ingressou com requerimento administrativo protocolizado aos
13/12/2017, objetivando a concessão de aposentadoria por idade na modalidade híbrida (NB
180.024.317-8).
O pedido restou indeferido pela Autarquia Previdenciária, porquanto reconhecido apenas o
período de 166 meses de contribuição, número inferior à carência exigida para o benefício
requerido (180 contribuições) (ID 41494526, pág. 26/33).
Com efeito, a aposentadoria por idade na modalidade híbrida está prevista no artigo 48, §§3º e
4º, da Lei nº 8.213/91, nos seguintes termos:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
(...)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no §
2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei
nº 11.718, de 2008).
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)".
A Lei 11.718/2008, ao inserir os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei 8.213/91,autorizou, para fins de
cumprimento da carência exigida para a aposentadoria por idadeo cômputo da atividade rural,
aos trabalhadores que, embora inicialmente tenham exercido atividades rurais, passaram a
desempenhar temporária ou permanentemente atividades urbanas.
Destarte, para o segurado rurícola, os períodos de contribuição referentes a atividades urbanas
podem ser somados ao tempo de serviço rural para cômputo da carência, fazendo jus ao
benefício aocompletarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos,
se mulher.
In casu, a autora completou a idade mínima de 60 (sessenta) anos de idade em 12/03/2013, de
modo que, nos termos do artigo 142, da Lei nº 8.213/1991, deveria comprovar a carência de 180
(cento e oitenta) meses.
Conforme já mencionado, a autarquia reconheceu o tempo de contribuição de 166 (cento e
sessenta e seis) meses, com base nas informações constantes do CNIS, em que aponta os
seguintes vínculos da autora: como segurada obrigatória (empregada) nos períodos de
08/06/1987 a 28/09/1987, 19/10/1987 a 11/01/1988 (ambos na função de trabalhadora rural) e
01/11/1991 a 08/07/2002 (em clube recreativo – serviços gerais) e de 01/05/2008 a 31/12/2009,
01/03/2010 a 31/05/2010, 01/07/2010 a 31/05/2011, 01/07/2011 a 31/01/2012 e 01/03/2012 a
31/05/2013, como contribuinte individual.
Além disso, a r. sentença determinou a averbação do tempo de trabalho rural exercido nos
períodos entre 01/08/1978 e 31/08/1979; 01/04/1980 e 01/07/1980, os quais foram registrados em
CTPS; negou, contudo, o reconhecimento do período de labor rurícola entre 01/09/1979 e
30/03/1980; 02/07/1980 e 07/06/1987; 29/09/1987 e 18/10/1987; 12/01/1988 e 30/10/1991, sob o
fundamento de que, embora as testemunhas tenham apontado o referido tempo de trabalho rural
pela autora, não houve prova documental contemporânea aos referidos períodos.
Acerca da matéria discutida nos autos, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no
julgamento do Recurso Especial n. 1.674.221/SP, referente ao Tema 1.007 dos recursos
repetitivos, firmou tese nos seguintes termos:"O tempo de serviço rural, ainda que remoto e
descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência
necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o
recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a
predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no
momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo."
Confira-se a ementa do referido julgado:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO DOS
RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX E DOS
ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. APOSENTADORIA HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o. DA LEI
8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES RURAIS E
URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL. EXERCÍCIO DE
ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI 8.213/1991 A DESPEITO
DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO PARA
FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO LABOR CAMPESINO POR
OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER MINISTERIAL.
RECURSO ESPECIAL DA SEGURADA PROVIDO.
1. A análise da lide judicial que envolve a proteção do Trabalhador Rural exige do julgador
sensibilidade, e é necessário lançar um olhar especial a esses trabalhadores para compreender a
especial condição a que estão submetidos nas lides campesinas.
2. Como leciona a Professora DANIELA MARQUES DE MORAES, é preciso analisar quem é o
outro e em que este outro é importante para os preceitos de direito e de justiça. Não obstante o
outro possivelmente ser aqueles que foi deixado em segundo plano, identificá-lo pressupõe um
cuidado maior. Não se pode limitar a apontar que seja o outro. É preciso tratar de tema correlatos
ao outro, com alteridade, responsabilidade e, então, além de distinguir o outro, incluí-lo (mas não
apenas de modo formal) ao rol dos sujeitos de direito e dos destinatários da justiça (A Importância
do Olhar do Outro para a Democratização do Acesso à Justiça, Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2015, p. 35).
3. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3o. e 4o. no art. 48 da lei 8.213/1991, abrigou,
como já referido, aqueles Trabalhadores Rurais que passaram a exercer temporária ou
permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da inovação legislativa o mesmo
Segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo previdenciário: ao atingir idade
avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque exerceu trabalho urbano e não tinha
como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o curto período laboral não preencher o
período de carência (REsp. 1. 407.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 28.11.2014).
4. A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência dos
benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles Trabalhadores
que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela penúria, para o meio
urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram implementar os requisitos para a
concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em situação de extrema vulnerabilidade
social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor rural,
ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de aposentadoria
rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural com outros
períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de comprovação da
carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que cumprido o
requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
6. Analisando o tema, esta Corte é uníssona ao reconhecer a possibilidade de soma de lapsos de
atividade rural, ainda que anteriores à edição da Lei 8.213/1991, sem necessidade de
recolhimento de contribuições ou comprovação de que houve exercício de atividade rural no
período contemporâneo ao requerimento administrativo ou implemento da idade, para fins de
concessão de aposentadoria híbrida, desde que a soma do tempo de serviço urbano ou rural
alcance a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
7. A teste defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o
exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento
etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não só
contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o objetivo da
legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado
não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991
praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores é
o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para o atividade urbana com o
avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição
preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal
deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o
legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os
juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela sai
desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10.Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que
remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da
carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido
efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja
qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho
exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. Recurso Especial da Segurada provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, a fim
de que prossiga no julgamento do feito analisando a possibilidade de concessão de
aposentadoria híbrida.
(REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 14/08/2019, DJe 04/09/2019)
Assim, em se tratando de aposentadoria híbrida, não existe exigência de que o segurado exerça
atividade rural no momento imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou ao
implemento do requisito etário, bem como não hávedação quanto ao cômputo do tempo de labor
campesino, anterior à vigência da Lei nº 8.213/91, para fins de carência.
No tocante à comprovação da atividade rurícola, termos da Súmula nº 149 do Colendo Superior
Tribunal de Justiça, não basta a prova exclusivamente testemunhal, com o fim de obtenção de
benefício previdenciário, sendo necessária a existência de um início razoável de prova material,
que não significa prova exauriente, mas apenas seu começo.
Como mencionado, pretende a apelante o reconhecimento do labor rural nos períodos entre
01/09/1979 a 30/03/1980; 02/07/1980 a 07/06/1987; 29/09/1987 a 18/10/1987; 12/01/1988 a
30/10/1991, lapsos que correspondem exatamente aos intervalos em que não há registro de
contrato de trabalho na CTPS, seja rural ou urbano.
In casu,não se revela razoável início de prova material para fins de reconhecimento do labor rural
não registrado na CTPS, tendo em vista que o único documento encartado aos autos, para fins de
comprovação do referido períodoconsiste na CTPS do cônjuge da autora em que consta diversos
registros como trabalhador rural, lavrador, motorista, pedreiro, administrador rural, guarda
municipal, em lapsos alternados, compreendendo o período acima requerido.
Os registros firmados em nome do cônjuge da autora relacionados à atividade rural (lavrador,
trabalhador rural, administrador rural) não se prestam a comprovar o suposto exercício do
trabalhorurícola pela autora nos períodos pretendidos, uma vez que em se tratando de trabalho
exercido em virtude de vínculo empregatício, a princípio, não há que se falar em extensão da
condição de rurícola ao cônjuge, posto que não se trata de labor exercido em regime de
economia familiar, mas sim em decorrência de contrato de trabalho (cf. TRF 3ª Região, 8ª Turma,
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5248522-76.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal DAVID
DINIZ DANTAS, julgado em 25/09/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 30/09/2019).
Ademais, embora as testemunhas tenham confirmado que a autora exerceu labor rural em longo
período de tempo, em diversas propriedades rurais, os depoimentos foram genéricos, não sendo
possível concluir que nos intervalos entre os contratos rurais registrados na CTPS houve, de fato,
exercício de trabalho rural.
Na espécie, inobstante a impossibilidade dereconhecimento do labor rural nos períodos de entre
01/09/1979 a 30/03/1980; 02/07/1980 a 07/06/1987; 29/09/1987 a 18/10/1987; 12/01/1988 a
30/10/1991, constata-se que a autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade híbrida, em
razão do preenchimento dos requisitos legais.
Isto porque, computado o tempo de labor rural registrado na CTPS, cuja averbação foi
determinada pela r. sentença (01/08/1978 a 31/08/1979 e 01/04/1980 a 01/07/1980) em conjunto
com o tempode contribuição constante do CNIS (166 contribuições), o período de carência de 180
(cento e oitenta) meses foi efetivamente cumprido na data em que preenchido o requisito etário.
Assim, conjugando-se a data em que foi implementado o requisito etário, o tempo de serviço
comprovado nos autos e o art. 142 da Lei nº 8.213/91, tem-se que, por ocasião do requerimento
administrativo, havia sido cumprida a carência exigida.
Destarte, implementados os requisitos legais, a segurada faz jus à percepção de aposentadoria
por idade na modalidade híbrida, a partir da data do requerimento administrativo (13/12/2017),
momento em que já preenchia os requisitos para a concessão do benefício.
As prestações vencidas no período deverão ser adimplidas em parcela única, observando-se para
correção monetária e juros de mora, o que decidiu o Egrégio Supremo Tribunal Federal no
julgamento Recurso Extraordinário nº 870.947 (Repercussão Geral - Tema 810), assim como os
termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor
por ocasião da execução do julgado.
Consoante orientação firmada pela C. Oitava Turma desta Corte,nas ações de natureza
previdenciária, a verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação, até a
presente decisão (Súmula nº 111 do STJ), tendo em vista que a r. sentença julgou improcedente
o pedido.
Indevidas custas e despesas processuais, ante a isenção de que goza a autarquia (art. 4º, inciso
I, da Lei nº 9.289/96) e da justiça gratuita deferida.
Ante o exposto, nos termos do artigo art. 932, do Código de Processo Civil,dou provimentoà
apelação, para julgar parcialmente procedente a ação, condenando o INSS a conceder à parte
autora o benefício de aposentadoria por idade híbrida, desde a data do requerimento
administrativo,nos termos acima consignados
Em se tratando de benefício de caráter alimentar, defiro, excepcionalmente, independentemente
do trânsito em julgado, a tutela de urgência de natureza satisfativa para determinar a implantação
do benefício ora concedido, no prazo de 30 (trinta) dias a partir desta decisão, ficando para a fase
de liquidação a apuração e execução das prestações vencidas.
Determino, com fundamento no art. 497 do Código de Processo Civil, a expedição de ofício ao
INSS,por meio eletrônico, instruído com documentos da seguradaMARIA ANGÉLICA GUIRADO
HERMENEGILDO, para que cumpra a obrigação de fazer consistente na imediata concessão de
aposentadoria por idade, com data de início em13/12/2017.”
Consoante exposto no julgamento monocrático, aPrimeira Seção do C. Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do Recurso Especial n. 1.674.221/SP, referente ao Tema 1.007 dos
recursos repetitivos, firmou tese nos seguintes termos:"O tempo de serviço rural, ainda que
remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da
carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido
efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja
qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho
exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo”.
Neste ponto, como se observa, as razões do agravo interno vão de encontro ao entendimento
firmado pelo C. Superior Tribunal de Justiça em precedente de observância obrigatória, nos
termos do artigo 927, inciso III, do CPC.
Deste modo, as razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o
desacerto do decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria
nele contida.
Assim, não vislumbro qualquer vício a justificar a reforma da decisão ora agravada.
Pelo exposto, nego provimento ao agravo interno.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. ART. 1.021, CPC. APELAÇÃO
DA AUTORA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMA 1007 DOS RECURSOS
REPETITIVOS. CÔMPUTO DO TEMPODE ATIVIDADE RURAL, REMOTA E DESCONTÍNUA,
ANTERIOR À LEI 8.213/1991.PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. A decisão ora agravada, prolatada em consonância com o permissivo legal, encontra-se
supedaneada em jurisprudência consolidada do Colendo Superior Tribunal de Justiça, inclusive
quanto aos pontos impugnados no presente recurso.
2. A Lei 11.718/2008, ao inserir os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei 8.213/91,autorizou, para fins de
cumprimento da carência exigida para a aposentadoria por idade, o cômputo da atividade
ruralaos trabalhadores que, embora inicialmente tenham exercido atividades rurais, passaram a
desempenhar temporária ou permanentemente atividades urbanas.
3. Com efeito, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso
Especial n. 1.674.221/SP, referente ao Tema 1.007 dos recursos repetitivos, firmou tese nos
seguintes termos:"O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento
da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da
aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das
contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do
labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do
implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo."
4. In casu, a autora completou a idade mínima de 60 (sessenta) anos de idade em 12/03/2013, de
modo que, nos termos do artigo 142, da Lei nº 8.213/1991, deveria comprovar a carência de 180
(cento e oitenta) meses, ônus do qual, de fato, se desincumbiu. Foi determinada pela r. sentença
a averbação do labor rural da autora nos períodos entre 01/08/1978 e 31/08/1979; 01/04/1980 e
01/07/1980, os quais foram registrados em CTPS, não havendo insurgência recursal pelo INSS.
5. Na espécie, computado o tempo de labor rural registrado na CTPS, cuja averbação foi
determinada pela r. sentença (01/08/1978 a 31/08/1979 e 01/04/1980 a 01/07/1980) em conjunto
com o tempode contribuição constante do CNIS (166 contribuições), o período de carência de 180
(cento e oitenta) meses foi efetivamente cumprido na data em que preenchido o requisito etário.
Destarte, implementados os requisitos legais, a segurada faz jus à percepção de aposentadoria
por idade na modalidade híbrida.
6. As razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do
decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele contida.
7. Agravo interno desprovido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao agravo interno, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
