
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001304-38.2021.4.03.6128
RELATOR: Gab. 49 - DES. FED. ERIK GRAMSTRUP
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: CICERO MANOEL AVELINO
Advogado do(a) APELADO: MARCIA CRISTINA HERRERA - SP313106-A
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001304-38.2021.4.03.6128
RELATOR: Gab. 49 - DES. FED. ERIK GRAMSTRUP
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: CICERO MANOEL AVELINO
Advogado do(a) APELADO: MARCIA CRISTINA HERRERA - SP313106-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ERIK GRAMSTRUP (RELATOR):
Trata-se de agravo interno interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, nos termos do artigo 1.021 do Código de Processo Civil, em face da decisão monocrática de ID 291581038 que, em ação de natureza previdenciária, negou provimento ao seu apelo, condenando-o ao pagamento dos honorários recursais e, de ofício, determinou a forma de incidência da correção monetária e dos juros de mora.
Em suas razões recursais de ID 292493500, sustenta o INSS, preliminarmente, a impossibilidade de julgamento monocrático. No mérito, em síntese, alega ser indevido o reconhecimento de trabalho especial dos trabalhadores na lavoura canavieira por enquadramento em categoria profissional ou presunção de penosidade, bem assim que a exposição a sílica não atende às exigências normativas para a contagem especial. Postula que, em juízo de retratação, seja reformada a decisão monocrática, ou, em caso negativo, que seja o feito levado a julgamento pelo órgão colegiado.
A parte autora apresentou contrarrazões (ID 293851006), pugnando pelo não provimento do agravo e pela imposição de multa, nos termos do art. 1.021 § 4º do Código de Processo Civil e diante da litigância de má.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001304-38.2021.4.03.6128
RELATOR: Gab. 49 - DES. FED. ERIK GRAMSTRUP
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: CICERO MANOEL AVELINO
Advogado do(a) APELADO: MARCIA CRISTINA HERRERA - SP313106-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ERIK GRAMSTRUP (RELATOR):
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
DO JULGAMENTO MONOCRÁTICO.
Estabelece o artigo 932, incisos II, IV e V, do CPC que:
“Art. 932. Incumbe ao relator:
(...)
II - apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal;
(...)
IV - negar provimento a recurso que for contrário a:
a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;
b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a:
a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;
b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência.”.
Por sua vez, a Súmula n.º 568 do C.STJ dispõe que:
“O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema.”.
Desta feita, sopesando o disposto no art. 932, II, IV e V, do CPC, e aplicando analogicamente a Súmula n.º 568, do C.STJ, entendo cabível o julgamento monocrático no presente caso, já que este atende aos princípios da celeridade processual e da observância aos precedentes judiciais.
Ademais, a interposição do agravo interno (artigo 1.021 do CPC) possibilita a submissão do feito a julgamento pelo órgão colegiado, inclusive com possibilidade de sustentação oral pela parte interessada (art. 7º, § 2º-B da Lei 8.3906/94), pelo que restam resguardados os princípios da colegialidade e da ampla defesa.
Nesse sentido, vem sendo o entendimento desta Corte Regional:
“PREVIDENCIARIO. PROCESSUAL CIVIL. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. CABIMENTO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA DO DIREITO DA AUTARQUIA. OCORRÊNCIA. ERRO MATERIAL. DIREITO AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA RESGUARDADOS. LEGALIDADE NO RECÁLCULO DO BENEFÍCIO ORIGINÁRIO E DA PENSÃO POR MORTE.
I - Plenamente cabível a aplicação do artigo 932 do CPC ao presente caso, porquanto a decisão ora agravada apoiou-se em jurisprudência majoritária proferida por esta Corte. Ressalta-se que não se exige que a jurisprudência dos Tribunais seja unânime ou que exista Súmula a respeito da matéria. Ademais, com o reexame do feito pelo órgão colegiado, que ora se realiza por ocasião do julgamento deste agravo, resta prejudicada a questão referente ao alegado vício da apreciação monocrática.
(...)
VII – Agravo (art. 1.021 do CPC) da autora improvido.” (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001330-92.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO, julgado em 07/02/2024, DJEN DATA: 09/02/2024);
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO (ART. 1.021, DO CPC). INTERPOSIÇÃO CONTRA DECISÃO SINGULAR DO RELATOR. CABIMENTO. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO NO JULGADO. APLICABILIDADE DO TEMA 692/STJ. DESNECESSIDADE DE AGUARDAR O TRÂNSITO EM JULGADO DO ACÓRDÃO PARADIGMA.
1. O denominado agravo interno (artigo Art. 1.021 do CPC/15) tem o propósito de impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada e, em caso de não retratação, possa ter assegurado o direito de ampla defesa, com submissão das suas impugnações ao órgão colegiado, o qual, cumprindo o princípio da colegialidade, fará o controle da extensão dos poderes do relator e, bem assim, a legalidade da decisão monocrática proferida, não se prestando, afora essas circunstâncias, à rediscussão, em si, de matéria já decidida, mediante reiterações de manifestações anteriores ou à mingua de impugnação específica e fundamentada da totalidade ou da parte da decisão agravada, objeto de impugnação.
2. Na hipótese, a decisão agravada não padece de qualquer ilegalidade ou abuso de poder, estando seus fundamentos em consonância com a jurisprudência pertinente à matéria devolvida a este E. Tribunal.
3. Agravo interno desprovido.” (TRF 3ª Região, 9ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5022555-66.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, julgado em 14/09/2023, DJEN DATA: 20/09/2023);
“AGRAVO. PREVIDENCIÁRIO. DECISÃO SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADA. REPETIÇÃO DEARGUMENTOS.
1. O julgamento monocrático tem por objeto liberar as pautas de julgamento dos tribunais de recursos cuja matéria já tenha entendimento firmado na jurisprudência majoritária das Cortes nacionais.
2. Não há que se falar em ofensa ao duplo grau de jurisdição se a questão já foi reiteradamente discutida nos Tribunais.
3. A agravante reitera em suas razões recursais os mesmos argumentos trazidos na inicial, já debatidos e resolvidos pela decisão recorrida.
4. Agravo não provido.” (TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5041512-96.2018.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal MARCELO VIEIRA DE CAMPOS, julgado em 30/01/2023, DJEN DATA: 03/02/2023)
Passo, portanto, à análise da matéria impugnada por meio do agravo interno apresentado.
DA ATIVIDADE ESPECIAL
Em síntese, a insurgência da agravante se refere ao reconhecimento do trabalho em condições especiais, nos períodos de 25/07/1991 a 20/02/1995, em que o segurado laborou na lavoura canavieira, e de 01/01/2001 a 18/11/2003, no qual esteve exposto a sílica, uma vez que nos demais interstícios, houve o reconhecimento da especialidade por sujeição a ruído, agente não impugnado pela autarquia.
Sem razão, contudo.
Conforme já ressaltado na decisão monocrática, o reconhecimento da especialidade dos interstícios em questão se deu em virtude do conjunto probatório carreado aos autos, em especial a prova documental apresentada.
Com efeito, para comprovar a especialidade do período de 25/07/1991 a 20/02/1995, laborado junto à “Usina Barão de Suassuna S/A”, na função de trabalhador rural, o segurado apresentou o PPP de ID 201424344 - Pág. 39/40. Segundo referido PPP, o autor trabalhava no campo “cortando cana, semente, roçando mato, abrindo valetas, sucando, semeando adubo e calcário, cambitando, aplicando herbicidas”, razão pela qual esteve exposto a defensivos agrícolas (herbicidas - Roundap, Gramoxone, Paraquat, Gesapax, Cupinicida, Larvicidas), calcário e adubos.
Segundo entendimento pacificado pela 7ª Turma desta E. Corte, é possível o reconhecimento do labor desempenhado pelo segurado no plantio e corte da cana de açúcar, em razão do enquadramento nos itens 1.2.11 do Anexo III do Decreto n.º 53.831/64, 1.2.10 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79, 1.0.17 do Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 e 1.0.17 do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, uma vez que tais atividades expõe o trabalhador à produtos químicos nocivos, dentre eles, os hidrocarbonetos presentes na fuligem resultante da queima da palha da cana, além de inseticidas, pesticidas e defensivos agrícolas.
Vale ressaltar, ainda, que o trabalho desempenhado nas lavouras de cana de açúcar envolve desgaste físico excessivo, com horas de exposição ao sol, além do contato direto com os malefícios da fuligem, exigindo-se, ainda, alta produtividade, em lamentáveis condições antiergonômicas de trabalho, razão pela qual possível o seu reconhecimento como especial.
Neste sentido, cito os precedentes desta 7ª Turma:
“APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO ESPECIAL PARCIALMENTE RECONHECIDO. RUÍDO. TRABALHADOR DA LAVOURA CANAVIEIRA. PERÍCIA TÉCNICA JUDICIAL. TEMA 1124/STJ. BENEFÍCIO CONCEDIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS. HONORÁRIOS. DEFERIDO TUTELA ANTECIPADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
- Conforme entendimento adotado pela 7ª Turma desta E. Corte, a atividade realizada pelo trabalhador rural no corte e cultivo de cana-de-açúcar pode ser enquadrada como especial com base nos códigos 1.2.11 do Anexo III do Decreto nº 53.831/64, 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, 1.0.17 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e 1.0.17, Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, já que suas funções envolvem a exposição excessiva a produtos químicos nocivos, incluindo hidrocarbonetos presentes na fuligem da palha da cana queimada, além de inseticidas, pesticidas e defensivos agrícolas, entre outros riscos à saúde do trabalhador.
(...)
- Recurso do INSS parcialmente provido.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5177606-80.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 10/08/2023, DJEN DATA: 17/08/2023)
“PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. RUÍDO. USO DE EPI. LAVOURA CANAVIEIRA. AGENTES QUÍMICOS. CALOR. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
(...)
6. É possível o reconhecimento da especialidade do trabalho desempenhado na lavoura de cana de açúcar, verificada a condição insalubre do labor na cultura canavieira. Códigos 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64, 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79 e 1.0.17, Anexo IV do Decreto nº 3.048/99.
(...)
15. Apelação da parte autora provida. Apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS não provida.”.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 6219915-36.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal MARCELO VIEIRA DE CAMPOS, julgado em 16/10/2023, DJEN DATA: 20/10/2023)
Por outro lado, no tocante ao interregno de 01/01/2001 a 18/11/2003, foi apresentado o PPP de ID 201424344 - Pág. 43/47, devidamente preenchido e assinado, indicando que o autor ativou-se no setor de esmaltação da empresa “Roca Sanitários Brasil Ltda.”. Segundo referido PPP, apesar de estar exposto a níveis de ruído inferiores aos limites de tolerância previstos à época, o segurado ficava sujeito a “Poeira de Sílica Respirável”, de maneira habitual e permanente.
Conforme fundamentado na decisão agravada, o referido agente nocivo tem seu enquadramento no item 1.0.18 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997 e do Decreto nº 3.048/1999, inclusive por se tratar de substância relacionada no Grupo I da LINACH (Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos/Agentes confirmados como carcinogênicos para humanos - prevista na PORTARIA INTERMINISTERIAL MTE/MS/MPS Nº 9, DE 07 DE OUTUBRO DE 2014 - DOU 08/10/2014), o que, por si só, é suficiente para a demonstração do prejuízo à saúde do trabalhador.
Ademais, restou expressamente consignado que, ainda que haja informação sobre a utilização de EPI eficaz, não há nos autos prova da real neutralização do agente agressivo ou da mera atenuação de seus efeitos. Portanto, não há que se falar em descaracterização da insalubridade, consoante entendimento pacificado pelo E. STF, quando do julgamento do ARE n.º 664335, em sede de repercussão geral, que firmou as seguintes teses (Tema n.º 555):
“I- O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial;
II – Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria”.
Vê-se, portanto, que caso o segurado apresente PPP que indique sua exposição a agente nocivo e, inexistindo prova de que o EPI fornecido era efetivamente capaz de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, de rigor o reconhecimento do labor como especial.
Assim, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado.
Impende consignar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Neste sentido é a jurisprudência desta E. Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. DESNECESSIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.ATIVIDADE ESPECIAL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO EXERCÍCIO LABORAL. RUÍDO.AGENTES QUÍMICOS. ANÁLISE QUALITATIVA (HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS). AUSÊNCIA DE EPI EFICAZ. ESPECIALIDADE RECONHECIDA. BENEFÍCIO DEVIDO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. FIXAÇÃO NOS TERMOS DA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA.
(...)
- A discussão sobre o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) como fator de descaracterização do tempo especial encontra-se balizada pelo C. STF no Tema 555 de repercussão geral. Na hipótese de o segurado apresentar PPP indicativo de sua exposição a determinado agente nocivo e inexistindo prova de que o EPI, embora possa atenuar os efeitos prejudiciais, seja capaz de neutralizar totalmente a nocividade do ambiente laborativo, é de rigor reconhecer a especialidade do labor. Além disso, ficou pacificado que inexiste EPI capaz de neutralizar ou minimizar os efeitos nocivos do agente ruído. Precedentes.
(...)
- Preliminares rejeitadas, apelação da parte autora parcialmente provida e apelação do INSS não provida.”.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0000630-11.2016.4.03.6003, Rel. Desembargador Federal Leila Paiva Morrison, julgado em 27/09/2023, DJEN DATA: 04/10/2023)
Desta feita, a decisão agravada não merece reparos no tocante ao reconhecimento da atividade especial desempenhada nos interregnos de 25/07/1991 a 20/02/1995 e de 01/01/2001 a 18/11/2003.
MULTA
Postula o agravado a imposição à autarquia da multa prevista no § 4º., do artigo 1.021, do CPC, que assim dispõe:
"Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal.
(...)
§ 4º Quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa."
A orientação do Eg. STJ, é no sentido de que a aplicação da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC/2015 "não é automática, não se tratando de mera decorrência lógica do não provimento do agravo interno em votação unânime. A condenação do agravante ao pagamento da aludida multa, a ser analisada em cada caso concreto, em decisão fundamentada, pressupõe que o agravo interno mostre-se manifestamente inadmissível ou que sua improcedência seja de tal forma evidente que a simples interposição do recurso possa ser tida, de plano, como abusiva ou protelatória (...)". (AgInt nos EREsp 1120356/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/08/2016, DJe 29/08/2016.
Verifica-se, portanto, que em regra, descabe a imposição da referida multa em razão do mero improvimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não ocorreu no caso.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
Em relação ao pedido formulado pela parte autora, acerca da condenação do INSS por litigância de má-fé, entendo tampouco comportar acolhimento.
As hipóteses de ocorrência da litigância de má-fé encontram-se disciplinadas no artigo 80, do Código de Processo Civil, segundo o qual:
Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que:
I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;
II - alterar a verdade dos fatos;
III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal;
IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo;
V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;
VI - provocar incidente manifestamente infundado;
VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.
Excetuadas as circunstâncias previstas no dispositivo, o exercício do direito de ação, de per si, não é suficiente para caracterizar a litigância de má-fé, independentemente do êxito ou não da pretensão.
A caracterização do dever de indenizar, em razão do referido instituto, impõe a verificação concreta de intenção da parte de obstruir o trâmite regular do processo, de modo a configurar uma conduta desleal por abuso de direito.
In casu, verifica-se que a autarquia previdenciária não incidiu em comportamento apto a se amoldar em quaisquer das hipóteses de cabimento da condenação pleiteada, uma vez que somente exerceu seu direito de impugnar o julgado.
Neste sentido, colaciono a ementa dos seguintes precedentes:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE DISSENSO PRETORIANO. ACÓRDÃOS CONFRONTADOS QUE CONVERGEM SOBRE A COMPROVAÇÃO DA TEMPESTIVIDADE NO AGRAVO INTERNO INTERPOSTO PERANTE ESTA CORTE SUPERIOR. INAPLICABILIDADE DE MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO DE RECORRER. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.
1. No acórdão embargado, da Quarta Turma, restou assentado que a ora agravante não comprovou, na interposição do agravo interno perante aquele Colegiado, a tempestividade do seu recurso especial.
2. O paradigma indicado, AgInt no AREsp n. 1.029.286/SP, da Segunda Turma, afirma na mesma linha de entendimento do acórdão objeto da divergência que esta Corte Superior admite a comprovação posterior da tempestividade do recurso especial, em virtude de feriado local ou da suspensão de expediente forense no tribunal de origem, quando da interposição do agravo interno.
3. Inexistência de dissenso pretoriano, pois os acórdãos confrontados convergem sobre a possibilidade de, excepcionalmente, ser comprovada a tempestividade do recurso especial pela parte interessada nas razões do agravo interno interposto contra decisão singular que inadmitiu o apelo nobre nesse aspecto.
4. Inaplicabilidade da multa por litigância de má-fé, suscitada na impugnação ao presente recurso, porque descabida a referida sanção quando exercitado o regular direito de recorrer e não verificada a hipótese de manifesta inadmissibilidade do agravo interno ou litigância temerária. Precedentes da Corte Especial.
5. Recurso improvido.
(AgInt nos EAREsp 961.962/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, CORTE ESPECIAL, julgado em 24/10/2018, DJe 09/11/2018)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. TEMA 1.124/STJ. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INOVAÇÃO RECURSAL. PRECLUSÃO. INTERESSE DE AGIR. AGRAVO INTERNO CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ NÃO CONFIGURADA.
(...)
- No que diz respeito ao pedido feito em contrarrazões pela agravada, para condenação da agravante em litigância de má-fe, tal pedido não comporta acolhimento, em razão da inocorrência do instituto. Para que fique caracterizado o dever de indenizar, em decorrência de referido instituto, impõe-se a verificação concreta de conduta desleal da parte e o efetivo prejuízo ocasionado à parte contrária. No caso, verifica-se que o comportamento da autarquia não se enquadra em quaisquer das hipóteses de cabimento da condenação almejada, haja vista que somente exerceu seu direito de recorrer, no tocante aos cálculos que entendeu incorretos, nos termos em que permitido no Codex.
- Agravo interno conhecido em parte e desprovido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu conhecer em parte do agravo interno e negar-lhe provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
(ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP nº 0004857-16.2018.4.03.9999, Relatora Desembargadora Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, 7ª Turma, julgado em 05/07/2023, DJe 07/07/2023)
Assim, conclui-se que a autarquia atuou de modo a lhe garantir uma prestação jurisdicional favorável, e não protelatória, pelo que não há que se falar em litigância de má-fé.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e nego provimento ao agravo interno.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. POSSIBILIDADE. ATIVIDADE ESPECIAL. LAVOURA CANAVIEIRA. SUJEIÇÃO A AGENTES QUÍMICOS. SÍLICA CRISTALIZADA. EPI EFICAZ. RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE DEVIDA. AGRAVO DESPROVIDO.
- Recurso conhecido, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade recursal.
- Sopesando o disposto no art. 932, II, IV e V, do CPC, e aplicando analogicamente a Súmula n.º 568, do C.STJ, entendo cabível o julgamento monocrático no presente caso, já que este atende aos princípios da celeridade processual e da observância aos precedentes judiciais.
- A interposição do agravo interno (artigo 1.021 do CPC) possibilita a submissão do feito a julgamento pelo órgão colegiado, inclusive com possibilidade de sustentação oral pela parte interessada (art. 7º, § 2º-B da Lei 8.3906/94), pelo que restam resguardados os princípios da colegialidade e da ampla defesa. Precedentes desta Corte.
- Conforme ressaltado na decisão monocrática, o reconhecimento da especialidade dos interstícios em questão se deu em virtude do conjunto probatório carreado aos autos, em especial a prova documental apresentada.
- É possível o reconhecimento da especialidade dos períodos em que o segurado laborou na lavoura de cana-de-açúcar, em razão do enquadramento nos itens 1.2.11 do Anexo III do Decreto n.º 53.831/64, 1.2.10 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79, 1.0.17 do Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 e 1.0.17 do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, uma vez que tais atividades expõe o trabalhador à produtos químicos nocivos, dentre eles, os hidrocarbonetos presentes na fuligem resultante da queima da palha da cana, além de inseticidas, pesticidas e defensivos agrícolas. Precedentes desta C. 7ª Turma.
- O agente nocivo sílica cristalizada tem seu enquadramento no item 1.0.18 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997 e do Decreto nº 3.048/1999, inclusive por se tratar de substância relacionada no Grupo I da LINACH (Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos/Agentes confirmados como carcinogênicos para humanos - prevista na PORTARIA INTERMINISTERIAL MTE/MS/MPS Nº 9, DE 07 DE OUTUBRO DE 2014 - DOU 08/10/2014), o que, por si só, é suficiente para a demonstração do prejuízo à saúde do trabalhador.
- Ainda que haja informação sobre a utilização de EPI eficaz, não há nos autos prova da real neutralização do agente agressivo ou da mera atenuação de seus efeitos. Portanto, não há que se falar em descaracterização da insalubridade, consoante entendimento pacificado pelo E. STF, quando do julgamento do ARE n.º 664335, em sede de repercussão geral (Tema n.º 555).
- Incabível, na espécie, a multa prevista no § 4º., do artigo 1.021, do CPC, conforme orientação do Eg. STJ.
- As hipóteses de ocorrência da litigância de má-fé encontram-se disciplinadas no artigo 80, do Código de Processo Civil. In casu, verifica-se que a autarquia previdenciária não incidiu em comportamento apto a se amoldar em quaisquer das hipóteses de cabimento da condenação pleiteada, uma vez que somente exerceu seu direito de impugnar o julgado.
- Matéria preliminar rejeitada. Agravo interno desprovido.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
