
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003546-96.2023.4.03.6128
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: "GERENTE EXECUTIVO INSS JUNDIAI", INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIA VANESSA RODRIGUES HEISS
Advogados do(a) APELADO: LARISSA BERNARDO RODRIGUES - SP433030-A, PRISCILLA RODRIGUES DE ALCANTARA - SP325217-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003546-96.2023.4.03.6128
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: "GERENTE EXECUTIVO INSS JUNDIAI", INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIA VANESSA RODRIGUES HEISS
Advogados do(a) APELADO: LARISSA BERNARDO RODRIGUES - SP433030-A, PRISCILLA RODRIGUES DE ALCANTARA - SP325217-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação em mandado de segurança impetrado por CELIA VANESSA RODRIGUES HEISS contra ato praticado pelo Gerente Executivo de Jundiaí/SP que indeferiu o pedido de concessão do benefício de salário-maternidade, sob fundamento de ausência de qualidade de segurado.
Após deferida a gratuidade da justiça e concedida a medida liminar, sobreveio sentença extinguindo o feito sem resolução de mérito, conforme dispositivo abaixo transcrito:
“Dispositivo. Ante o exposto, como consectário da perda superveniente do interesse processual, JULGO EXTINTO O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, em relação ao pedido principal, com fulcro no artigo 485, IX, do Código de Processo Civil/2015. Sem prejuízo, CONDENO o INSS ao pagamento da multa por atraso no cumprimento da determinação judicial, a ser revertida em favor do impetrante, no valor total de R$ 22.000,00 (vinte e dois mil reais), com atualização a partir desta data. Descabe condenação em honorários advocatícios, nos termos do art. 25 da Lei nº 12.016/2009. Custas na forma da lei. Após o trânsito em julgado e cumpridas as cautelas de praxe, arquivem-se. P.I.”
Apela o INSS e requer o recebimento do apelo no duplo efeito e a revogação da pena de multa e, subsidiariamente, sua redução, forte no princípio da razoabilidade e vedação ao enriquecimento sem causa. Ainda, aduz que a condenação tem conteúdo próprio de ação de cobrança, de caráter condenatório, incompatível com o rito mandamental do mandado de segurança. Suscita o prequestionamento.
Com contrarrazões.
O MPF opinou pelo prosseguimento do feito.
É o relatório.
KS
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003546-96.2023.4.03.6128
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: "GERENTE EXECUTIVO INSS JUNDIAI", INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIA VANESSA RODRIGUES HEISS
Advogados do(a) APELADO: LARISSA BERNARDO RODRIGUES - SP433030-A, PRISCILLA RODRIGUES DE ALCANTARA - SP325217-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o apelo e presentes os demais requisitos de admissibilidade recursal.
Com o presente julgamento, fica prejudicado o pedido de recebimento do apelo no duplo efeito.
O mandado de segurança é ação civil de rito sumário especial, destinado a proteger direito líquido e certo da violação efetiva ou iminente, praticada com ilegalidade ou abuso de poder por parte de autoridade pública (ou agente de pessoa jurídica no exercício das atribuições do Poder Púbico), diretamente relacionada à coação, de vez que investida nas prerrogativas necessárias a ordenar, praticar ou ainda retificar a irregularidade impugnada, a teor do disposto no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, art. 1º da Lei nº 1.533/51 e art. 1º da atual Lei nº 12.016/09.
Trata-se de meio processual destinado à proteção de direito evidente prima facie e demonstrável de imediato, sendo indispensável prova pré-constituída à apreciação do pedido. A necessidade de dilação probatória torna inadequada a via mandamental.
SALÁRIO-MATERNIDADE
O salário-maternidade está previsto no art. 7º, XVIII, da Constituição Federal de 1988, nos arts. 71 a 73 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e nos arts. 93 a 103 do Decreto n.º 3.048, de 6 de maio de 1999, consistindo, segundo Sérgio Pinto Martins, "na remuneração paga pelo INSS à segurada gestante durante seu afastamento, de acordo com o período estabelecido por lei e mediante comprovação médica" (Direito da Seguridade Social. 19ª ed., São Paulo: Atlas, 2003, p. 387).
O benefício é devido à segurada da Previdência Social durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, nos termos do art. 71, caput, da Lei nº 8.213/91.
Depreende-se que para a concessão do referido benefício é necessário que a beneficiária possua a qualidade de segurada e comprove a maternidade.
O artigo 71 da Lei Previdenciária, em sua redação original, apenas contemplava a empregada, urbana ou rural, a trabalhadora avulsa e a empregada doméstica como beneficiárias do salário-maternidade. Este rol foi acrescido da segurada especial pela Lei n.º 8.861, de 25 de março de 1994 e posteriormente, com a edição da Lei n.º 9.876, de 26 de novembro de 1999, foram contempladas as demais seguradas da Previdência Social.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é:
"denominação legal indicativa da condição jurídica de filiado, inscrito ou genericamente atendido pela previdência social. Quer dizer o estado do assegurado, cujos riscos estão previdenciariamente cobertos."
(Curso de Direito Previdenciário - Tomo II. 2ª ed., São Paulo: LTr, 1998, p. 626).
Apenas as seguradas contribuintes individuais, (autônomas, eventuais, empresárias etc.) devem comprovar o recolhimento de pelo menos 10 (dez) contribuições para a concessão do salário-maternidade. No caso de empregada rural ou urbana, trabalhadora avulsa e empregada doméstica tal benefício independe de carência. coibido por ilegalidade ou abuso de poder, levados a efeito por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público
A trabalhadora em regime de economia familiar, considerada segurada especial, também não necessita comprovar o recolhimento de contribuições previdenciárias, bastando apenas demonstrar o exercício da referida atividade nos 12 (doze) meses anteriores ao início do benefício, ainda que de forma descontínua, nos termos do art. 39, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.
Neste sentido o entendimento de Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari:
"Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de um salário-mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos doze meses imediatamente anteriores ao do início do benefício (artigo 39, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91). É que nem sempre há contribuição em todos os meses, continuamente, em função da atividade tipicamente sazonal do agricultor, do pecuarista, do pescador, e de outras categorias abrangidas pela hipótese legal."(Manual de Direito Previdenciário. 3ª ed., São Paulo; LTr, 2002, p. 390).
DO CASO DOS AUTOS
Em razão do nascimento do seu filho ocorrido em 16/06/2023, a Impetrante teve indeferido seu requerimento administrativo de 22/06/2023 para concessão do benefício de Salário Maternidade, pelo que impetrou a presente ação objetivando a implantação do Salário Maternidade.
Alegou a impetrante que, ao contrário do entendimento do INSS, a Impetrante possuía carência e qualidade de segurada para concessão da benesse, haja vista que na data do parto (16/06/2023) encontrava-se dentro do período de graça concedido pelo artigo 15, inciso II da Lei 8.213/91, pois figurou na qualidade de segurada empregada no período de 01/12/2020 a 08/09/2022 junto à empresa EXPO SERVICOS ADMINISTRATIVOS LTDA.
Acolhendo os fundamentos indicados pela impetrante, o MM. Juiz de piso, em decisão datada de 04/07/23 deferiu a liminar para determinar que autoridade coatora implantasse o benefício de salário-maternidade em 30 dias (fl. 76).
Em 15/08/23, a impetrante atravessou petição requerendo a aplicação de multa por descumprimento (fl. 79)
Em 28/08/23, o juízo assim decidiu “(...) Intime-se a autoridade coatora para que, no prazo de 15 (quinze) dias, justifique nos autos o descumprimento da determinação judicial. Na mesma oportunidade deve juntar o comprovante da implantação.” (fl. 81).
Em 12/10/23, a impetrante informou que a ordem não fora cumprida (fl. 85).
Em decisão de 18/10/23, o juízo decidiu: “(...) Oficie-se e intime-se novamente a autoridade coatora para que, no prazo de 10 (dez) dias, implante o benefício em favor da Impetrante, sob pena de multa de R$ 1.000,00 (mil reais) por semana de atraso.”
O gerente do INSS foi intimado em 19/10/23 pelo oficial de justiça (fl. 97).
Em 20/10/23, o INSS peticionou informando o cumprimento da decisão com DDB em 20/10/23 e DIB em 16/06/23 (fls. 99/101).
Em 12.12.23, a impetrante informa que não houve o pagamento (fl. 120).
Em 09/02/24, o Magistrado de primeiro grau proferiu a seguinte decisão (fl. 184):
“Observo que a liminar foi deferida em julho de 2023.
A autoridade impetrada não cumpriu, havendo nova decisão determinando o cumprimento em 28/08/e 2023.
Em 18/10/2023, houve nova decisão determinando a implantação do benefício, sob pena de multa de R$ 1.000,00 por semana de atraso, em razão da desídia e pouco caso da autoridade administrativa.
Houve informação do INSS de que teria implantado o benefício em 20/10/2023 (id293602320), sem pagamento das parcelas.
Em 22/11/2023 a parte impetrante informou que a afirmação do INSS era inverídica, pois não havia ocorrido a efetiva implantação (id.307577189).
Em 12/12/2023, a parte impetrante juntou telas do INSS (id 304554937) constando que os pagamentos seriam realizados apenas em Juízo.
A impetrante, por sua vez, comunicou que não houve a efetivação de pagamento (id 309887815).
Decido.
Verifica-se, assim, que a liminar concedida nos autos não foi efetivamente cumprida.
Evidente o descaso para com a segurada, que dependia do benefício exatamente no momento de sua maternidade, e o pouco caso para com a Justiça, pois afirmar que implantou e que não vai pagar as parcelas é o mesmo que nada fazer.
Isso porque não se trata de concessão judicial de benefício, mas de decisão em mandado de segurança reconhecendo a violação a direito líquido e certo da impetrante pela autoridade coatora.
Assim, a multa de R$ 1.000,00 por semana de atraso permanece correndo desde 18/10/2023, sem prejuízo de eventual apuração de desobediência do servidor recalcitrante.
Ante o exposto, intime-se a autoridade coatora para que, no prazo de 10 (dez) dias, efetue a liberação das parcelas do benefício da impetrante.
Não havendo o cumprimento, remetam-se as cópias para o MPF, a fim de apuração da conduta.
Após o cumprimento, apresente a parte impetrante o valor devido pelo INSS a título de multa.
Intime-se. Cumpra-se. Oficie-se, COM URGÊNCIA.”
Intimado em 16/02/24 (fl. 194), o gerente executivo do INSS informou (fl. 201):
“(...) Assunto: Informação sobre cumprimento de decisão Referência: Mandado de Segurança nº 5003546-96.2023.4.03.6128
1. À vista da ordem exarada nos autos do Mandado de Segurança impetrado por Celia Vanessa Rodriges Heiss, este Serviço de Gerenciamento de Benefícios da Gerência Executiva em Jundiaí informa ao D. Juízo que, diante da residência da impetrante em Cabreúva, inclusive com indicação de domicílio bancário naquela cidade, de acordo com as regras de abrangência do INSS, o benefício implantado é mantido pela Gerência Executiva Sorocaba, situado na Rua Senador Vergueiro, 166, Jd. Vergueiro, Sorocaba/SP, CEP 18030-108, email gexsor@inss.gov.br.
2. À vista das regras do Instituto relacionadas à manutenção de benefício, esta Gerência Executiva não tem competência nem autorização sistêmica para realizar certos procedimentos em benefícios não pertencentes à sua abrangência, entretanto, informa a este D. Juízo que encaminhou o ofício judicial recebido à Gerência Executiva Sorocaba para ciência e adiantamento das providências.
3. Sem mais para o momento.” (g.n.)
Em 10.03.24, a impetrante informou que “até a presente data não houve a liberação das parcelas do benefício” (fl. 202)
À vista das informações do INSS de FL. 201, o MM. Juiz de piso decidiu (fl. 205):
“Tendo em vista a informação de id 317294924, de que o órgão mantenedor do benefício é a Gerência Executiva de Sorocaba, intime-se aquela autoridade, instruindo o mandado com cópia da decisão de id 314240232, para que, no prazo improrrogável de 5 (CINCO) dias, efetue a liberação das parcelas do benefício da impetrante. Não havendo o cumprimento, remetam-se as cópias para o MPF, a fim de apuração da conduta. Após o cumprimento, apresente a parte impetrante o valor devido pelo INSS a título de multa. Intime-se. Cumpra-se. Oficie-se, COM URGÊNCIA. JUNDIAÍ, 12 de março de 2024.”
Cumprida a intimação do INSS da ordem acima em 18/03/24 (fls. 215).
Em 20/03/24, por meio de oficio 20/2024, a agência executiva do INSS de Sorocaba informou que os valores devidos à impetrante estavam liberados com previsão de pagamento em 2/4/24 (fls. 217/219):
“1. Em cumprimento à determinação judicial, cumpre-nos informar que os créditos decorrentes do benefício de salário maternidade devidos à impetrante Célia Vanessa Rodrigues Heiss foram gerados e estarão disponíveis no Banco Crefisa, Filial Cabreúva, a partir de 02/04/2024, conforme histórico de crédito anexado ao presente.
2. Cumpre destacar que, em virtude de restrições sistêmicas para emissão dos créditos no benefício de número 210.215.132-2, foi necessária a concessão de outro benefício, cujo número é 212.359.477-0. Entretanto, tal medida não prejudica a segurada, bem como o seu recebimento.
3. Assim, diante do atendimento da ordem judicial, era o que tínhamos para informar.” (g.n.)
Após, em 10/04/24, a impetrante requereu a condenação do INSS ao pagamento de multa de R$ 22.000,00 (fl. 221), levando em consideração a decisão prolatada em 18/10/2023 que determinou que o INSS implantasse o benefício no prazo de 10 dias, sob pena de multa de R$1.000,00 por semana de atraso.
Sobreveio sentença de fls. 224/225, que reconheceu a perda superveniente do interesse de agir em relação ao pedido principal, uma vez que, com a implantação do benefício e pagamento do respectivo valor, restara superada a mora administrativa anterior em que incorria a autoridade impetrada. Condenou o INSS à multa por semana de atraso na implantação do benefício, conforme decisão concessiva da liminar.
O INSS, em suma, pede seja afastada a multa aplicada, forte no princípio da razoabilidade e vedação ao enriquecimento sem causa.
A MULTA DIÁRIA é o meio coercitivo criado para o cumprimento de obrigação e encontra amparo no §1º do artigo 536 do Código de Processo Civil/2015, que conferiu ao Magistrado tal faculdade, como forma de assegurar efetividade no cumprimento da ordem expedida.
Essa medida inibe o devedor de descumprir a obrigação de fazer, ou de não fazer, e visa assegurar a observância das ordens judiciais, bem como garantir a efetividade do direito reconhecido em prazo razoável.
Fato é que a pessoa responsável pelo cumprimento da ordem não pode ser obrigada a fazer o impossível, pois não se pode falar em apuração de responsabilidade funcional ou na exigência da multa, se quem deveria cumprir a obrigação logo que tomou conhecimento da ordem, deu cumprimento imediato.
Ainda, há que se ressaltar o fato de que a multa é informada pela cláusula rebus sic stantibus. Não faz coisa julgada, por isto há a necessidade de se intimar aquele que deverá cumprir a obrigação para se poder exigir a multa, bem como há que se perquirir o porquê da não implantação do benefício, pois se a ordem de implantação do benefício fora cumprida, não haverá base fática para a incidência da multa.
Nessa linha, não obstante a Fazenda Pública também esteja sujeita à multa diária, diante de dificuldades operacionais e da necessidade de tempo para adoção das adequações necessárias ao ordenamento da atuação administrativa, é necessário se verificar se houve resistência injustificada ao cumprimento da obrigação para fins de aplicação da multa.
Aliás, com o advento de situação diversa nos autos, pode haver exoneração, majoração ou minoração do quantum inicialmente imposto, o que deve ser aferido caso a caso.
Assim, o valor arbitrado pode ser reduzido, nos termos do que preceitua o artigo 537, §1º e seguintes do CPC, quando se verificar que foi estabelecido de forma desproporcional ou quando se tornar exorbitante, podendo gerar enriquecimento indevido.
Inclusive pela literalidade da Lei (art. 537 §1º do CPC), a jurisprudência pátria tem entendido pela possibilidade de redução da astreinte quando se mostrar desproporcional em relação ao bem da obrigação principal.
Essa Corte, por sua vez, compartilha da possibilidade de redução do valor da multa diária, ainda que posteriormente à sua instituição, conforme precedentes citados ao final deste voto.
Na hipótese vertente, a despeito do atraso no pagamento, desde decisão de 18/10/23 até 20/03/24, o fato de a impetrante ter protocolado requerimento administrativo em agencia em Jundiaí, quando a agência da unidade orgânica da autora seria em Sorocaba, pois domiciliada em Cabreúva, conforme se infere das informações constantes dos ofícios do INSS, não afasta a obrigação de o INSS cumprir a determinação judicial, mas, pelo conteúdo desses mesmos ofícios, é possível verificar que contribuiu para maiores entraves administrativos à implementação do benefício.
Ainda, conforme assevera o INSS em seu apelo, a redução acentuada do número de funcionários, em função de aposentadorias em massa, questões técnicas referentes aos sistemas ainda em processo de desenvolvimento, recursos escassos para resolução imediata dos problemas, o tempo necessário para adoção das adequações necessárias ao ordenamento da atuação administrativa, de fato, demonstram o porquê da não implantação do benefício no prazo.
Todavia, deferido prazo razoável ao cumprimento da determinação judicial, o atraso passou de cinco meses, o que não pode ser desconsiderado e indica haver, diante do descumprimento da ordem de implantação do benefício, resistência injustificada ao cumprimento da obrigação para fins de aplicação da multa.
Nesse consoar, a multa é devida, passando-se à análise da razoabilidade do valor fixado.
Em se tratando de obrigação de fazer é facultado ao magistrado impor multa diária ao réu, mas o prazo para o cumprimento da obrigação deve ser razoável e o valor da multa deve ser compatível com a obrigação a ser cumprida.
Ou seja, o valor da multa diária por descumprimento de ordem judicial, este deve ser razoável e proporcional, guardando correspondência com a obrigação principal.
Considerando que o valor relativo aos quatro meses de salário-maternidade, que se buscava receber por meio da implantação do benefício pelo INSS, soma o total de R$ 5.632,00, o valor da multa cominatória fixada em R$ 22.000,00 é excessivamente desproporcional à obrigação a ser cumprida.
Nesse consoar, não se justifica o valor de R$ 1000,00 (mil reais) por semana, o qual se revela excessivo, devendo ser reduzido para R$ 100,00 (cem reais) por semana, limitado ao máximo total de R$ 2.000,00 (dois mil reais), pois sua imposição tem por escopo compelir o devedor a satisfazer a obrigação e não vilipendiar o Erário e dar ensejo ao enriquecimento sem causa.
Sobre o tema, confira-se a jurisprudência, inclusive em feito de relatoria deste magistrado:
“PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA COMINATÓRIA. INSS. VALOR EXCESSIVO. REDUÇÃO. VALOR TOTAL/LIMITAÇÃO. 1. A multa tem natureza inibitória objetivando o cumprimento da obrigação de fazer imposta ao INSS. Consoante jurisprudência do E. STJ, é cabível a cominação de multa diária - astreintes - contra a Fazenda Pública, na hipótese de descumprimento de obrigação de fazer, como é o caso da obrigação de implantar benefício previdenciário. 2. A multa diária imposta no valor de R$ 300,00, limitada ao valor de R$ 10.000,00, é excessivo não compatível com a obrigação imposta ao INSS, razão pela qual deve ser reduzida para R$ 100,00 por dia de atraso, limitada a R$3.000,00, haja vista que sua imposição tem por escopo compelir o devedor a satisfazer a obrigação e não vilipendiar o Erário. 3. Apelação do INSS parcialmente provida.” (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0032696-94.2010.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal JOSE DENILSON BRANCO, julgado em 27/06/2024, DJEN DATA: 03/07/2024)
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MULTA. ATRASO NO CUMPRIMENTO DA ORDEM. PRAZO EXÍGUO. REDUÇÃO DO VALOR DIÁRIO ARBITRADO. POSSIBILIDADE. ARTIGO 537 DO CPC. - A multa diária é o meio coercitivo criado para o cumprimento de obrigação e encontra amparo no §1º do artigo 536 do Código de Processo Civil/2015, que conferiu ao Magistrado tal faculdade, como forma de assegurar efetividade no cumprimento da ordem expedida. - Essa medida inibe o devedor de descumprir a obrigação de fazer, ou de não fazer, e visa assegurar a observância das ordens judiciais, bem como garantir a efetividade do direito reconhecido em prazo razoável. - Efetivamente, até mesmo pela literalidade da Lei (art. 537 § 1º do CPC), a jurisprudência pátria tem entendido pela possibilidade de redução da astreinte quando se mostrar desproporcional em relação ao bem da obrigação principal. - No que tange ao prazo estabelecido, em que pese ser ideal o cumprimento imediato, sabe-se que a implantação do benefício demanda procedimentos em setores diversos da Administração, de modo que, entendo razoável o prazo de 30 (trinta) dias para tanto. - De outro lado, quanto ao valor da multa diária por descumprimento de ordem judicial, este deve ser razoável e proporcional, guardando correspondência com a obrigação principal. Diante dessas características, não se justifica o valor de R$ 200,00 (duzentos reais) diários, o qual se revela excessivo, devendo ser reduzido para R$ 100,00 (cem reais) por dia de atraso, pois sua imposição tem por escopo compelir o devedor a satisfazer a obrigação e não vilipendiar o Erário. - Agravo de instrumento parcialmente provido.” (TRF 3ª Região, 9ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5001842-65.2024.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, julgado em 24/05/2024, Intimação via sistema DATA: 03/06/2024)
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ASTREINTES. ENTENDIMENTO ESTADUAL NO SENTIDO DA NECESSIDADE DE REDUÇÃO DO VALOR EXECUTADO. MONTANTE DESPROPORCIONAL. CONCLUSÃO FUNDADA EM FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. POSSIBILIDADE DE REVISÃO DA MULTA. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o art. 461 do Código de Processo Civil de 1973 (correspondente ao art. 537 do novo CPC) permite ao magistrado, de ofício ou a requerimento da parte, afastar ou alterar o valor da multa quando este se tornar insuficiente ou excessivo, mesmo depois de transitada em julgado a sentença, não havendo espaço para falar em preclusão ou em ofensa à coisa julgada (Súmula 83/STJ). 2. A redução da multa foi feita com base na apreciação fático-probatória da causa, porquanto a segunda instância entendeu como elevada a quantia executada. Essa conclusão atrai a aplicação da Súmula 7/STJ. 3. Agravo interno desprovido.” (AgInt no AREsp 1354776/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/02/2019, DJe 13/03/2019)
“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS A EXECUÇÃO. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. MULTA PECUNIÁRIA. PAGAMENTO DOS ATRASADOS. VALOR EXORBITANTE. - É sabido que a multa pecuniária (astreinte) imposta para que o devedor cumpra a obrigação de fazer pode ser fixada de ofício pelo Juízo da execução ou a requerimento da parte, mesmo que seja contra a Fazenda Pública, devendo ser revertida para a parte credora. - Com intimação em 13.01.2009 e reimplantação do benefício em 21.01.2009, excluindo o exíguo prazo de 48 horas estipulado, deve ser mantida a condenação do embargante pelo atraso no cumprimento da decisão judicial por apenas 06 dias, não restando caracterizada a recusa em cumprir a obrigação, ante o pagamento dos valores retroativamente. - Nos termos do § 6º do artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, o valor da multa pode ser revisto, de ofício. Inclusive, o comportamento do destinatário da ordem deve ser levado em conta pelo juiz ao dimensionar o valor da multa, mesmo posteriormente à sua instituição. - No caso, o valor de R$ 1.000,00 de multa diária é exorbitante e deve ser reduzida para R$ 100,00 (cem reais), de forma que o embargante deve ser condenado ao pagamento de multa moratória no valor de R$600,00 ao embargado, devidamente atualizado. - Apelação que se dá parcial provimento.” (TRF da 3ª Região - Proc. n. 0001833-93.2013.4.03.6138 - 7ª Turma - Rel. Des. Fed. FAUSTO DE SANCTIS - data do julgamento: 26/6/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/07/2017)
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. TÍTULO EXECUTIVO. MULTA. AFASTAMENTO. ATRASO RAZOÁVEL NA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO PROVIDO. 1.A imposição de multa como meio coercitivo para o cumprimento de obrigação encontra amparo no §1º do artigo 536 do Código de Processo Civil de 2015, que conferiu ao magistrado tal faculdade como forma de assegurar efetividade no cumprimento da ordem expedida. 2.Essa multa pode ser a qualquer tempo revogada ou modificada, de acordo com o poder discricionário do magistrado, nos termos do art.537, §1º do CPC/2015. 3. A imposição de multa cominatória não pode servir ao enriquecimento sem causa, devendo se levar em conta, portanto, que apesar do atraso, o benefício foi implantado em prazo razoável.” 4. Agravo de instrumento provido. (TRF3ª Região, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO / SP 5015008-43.2019.4.03.0000, Relator(a) Desembargador Federal DIVA PRESTES MARCONDES MALERBI, Órgão Julgador 8ª Turma, Data do Julgamento 12/12/2019, Data da Publicação/Fonte e - DJF3 Judicial 1 DATA: 16/12/2019).
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MULTA DIÁRIA POR ATRASO. I - É pacifico o entendimento jurisprudencial no sentido de que não perde a qualidade de segurado a pessoa que deixou de trabalhar em virtude de problemas de saúde (precedentes da Corte). II - Em se tratando de obrigação de fazer é facultado ao magistrado impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, na forma do parágrafo 4º, do art. 461, do CPC, mas o prazo para o cumprimento da obrigação deve ser razoável e o valor da multa deve ser compatível com a obrigação a ser cumprida. III - Apelação e remessa oficial parcialmente providas.” (TRF3, AC 200003990440495, Rel. Sergio Nascimento, j. 16.09.02)
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO. MULTA DIÁRIA POR DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CITAÇÃO DO EXECUTADO. VALOR EXCESSIVO. REDUÇÃO. 1. A multa diária imposta ao executado para assegurar o adimplemento de obrigação de fazer - implantação de benefício previdenciário - incide após o término do prazo fixado pelo juiz, do qual foi cientificado o devedor por meio da citação. 2. O valor da multa diária deve ser compatível com a obrigação (CPC, art. 461, § 4º), sob pena de redução pelo juiz da execução, caso seja excessiva. 3. Agravo parcialmente provido.” (TRF1, AG 199801000051840, Rel. Magnólia Silva da Gama e Souza, DJ 03/09/2001).
COBRANÇA DE VALORES
É de se esclarecer que, em mandado de segurança, as parcelas decorrentes do direito reconhecido que se vencerem a partir da impetração podem ser objeto de execução nos mesmos autos.
De outro lado, a cobrança das parcelas anteriormente vencidas entre a data do requerimento administrativo e a data da impetração do presente mandado de segurança devem ser reclamadas administrativamente ou pela via judicial própria, o se depreende do quanto disposto no enunciado da Súmula 271, do C. STF e precedentes da mesma Corte (MS 31690, Min. Rel. Celso de Mello, j. 11.2.14).
CUSTAS E HONORÁRIOS
Custas na forma da lei. Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos das Súmulas 512 do STF e 105 do STJ e do disposto no artigo 25 da Lei nº 12.016/2009.
PREQUESTIONAMENTO
Por fim, a sentença não ofendeu qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestiomento.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para reduzir o valor da multa para R$ 2.000,00 (dois mil reais) em sua totalidade, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. BENEFÍCIO DE SALÁRIO-MATERNIDADE. MULTA. ATRASO NO CUMPRIMENTO DA ORDEM. REDUÇÃO DO VALOR DIÁRIO ARBITRADO. POSSIBILIDADE. ARTIGO 537 DO CPC.
- A multa diária é o meio coercitivo criado para o cumprimento de obrigação e encontra amparo no §1º do artigo 536 do Código de Processo Civil/2015, que conferiu ao Magistrado tal faculdade, como forma de assegurar efetividade no cumprimento da ordem expedida.
- Essa medida inibe o devedor de descumprir a obrigação de fazer, ou de não fazer, e visa assegurar a observância das ordens judiciais, bem como garantir a efetividade do direito reconhecido em prazo razoável.
- Efetivamente, até mesmo pela literalidade da Lei (art. 537 § 1º do CPC), a jurisprudência pátria tem entendido pela possibilidade de redução da astreinte quando se mostrar desproporcional em relação ao bem da obrigação principal.
- Quanto ao valor da multa diária por descumprimento de ordem judicial, este deve ser razoável e proporcional, guardando correspondência com a obrigação principal. Diante dessas características e das dificuldades operacionais e necessidade de tempo para adoção das adequações necessárias ao ordenamento da atuação administrativa, não se justifica o valor de R$ 22.000,00 a título de valor total da multa diária pelo atraso de cinco meses, o qual se revela excessivo, devendo ser reduzido para R$ 2.000,00 (dois reais), pois sua imposição tem por escopo compelir o devedor a satisfazer a obrigação e não vilipendiar o Erário.
- Apelação do INSS parcialmente provida.
