D.E. Publicado em 21/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso autoral, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANA LUCIA JORDAO PEZARINI:10074 |
Nº de Série do Certificado: | 3826AEADF05E125A |
Data e Hora: | 07/06/2018 15:04:48 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007053-56.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação da parte autora tirada de sentença que, em autos de concessão de aposentadoria por idade, com aproveitamento de tempos de trabalho rural e urbano, julgou extinto o feito sem resolução do mérito, quanto ao pedido de reconhecimento do período de 1971 a 1981, tendo em vista a ocorrência da coisa julgada, e julgou improcedente o pedido de aposentadoria (fls. 158/160).
Em seu recurso, pugna a autoria, preliminarmente, pela anulação da sentença, afastando-se a coisa julgada, tendo em vista que os pedidos das ações são diversos. No mérito, requer a reforma da decisão combatida, ao argumento de existência de início de prova material da atividade rurícola, corroborada por prova testemunhal harmônica, a ensejar o reconhecimento do labor rural que, aliado ao trabalho urbano desempenhado, leva à concessão do almejado beneplácito (fls. 166/176).
Com contrarrazões (fl. 179), subiram os autos ao Tribunal.
VOTO
Conheço do recurso de apelação, uma vez que cumpridos os requisitos de admissibilidade, conforme o artigo 1.011 do novo CPC.
O fenômeno da coisa julgada, óbice à reprodução de ação anteriormente ajuizada (art. 337, VII, NCPC), impõe a extinção do processo sem o julgamento do mérito, nos termos do art. 485, V e §3º, do diploma legal supramencionado.
Compulsando os autos, verifica-se que a parte autora propôs outra ação previdenciária, anteriormente à presente (processo nº 0005382-12.2010.4.03.6302), perante o Juizado Especial Federal de Ribeirão Preto/SP, em 03/05/2010, visando à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural. O pedido foi julgado improcedente, mantida a sentença pela Turma Recursal, transitando em julgado o acórdão em 27/02/2013 (fls. 112/120).
No caso da presente ação, proposta em 20/05/2016, a parte autora elaborou pedido distinto, qual seja, a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida (fls. 01/04).
A extinção do processo por repetição de demandas exige a chamada "tríplice identidade". E há coisa julgada quando se repete ação com decisão já transitada em julgado, considerando-se idênticas as ações que possuem as mesmas partes, pedido e causa de pedir, conforme dicção dos §§ 1º, 2º e 3º do artigo 337 do NCPC.
Agregue-se que, naquela senda, foi recusada a aposentadoria pretendida, à míngua do preenchimento do quesito imediatidade e por insuficiência probatória. Destarte, não restou, pura e simplesmente, afastado o desempenho do labor rural no reportado interstício.
Desse modo, arredado o óbice avivado e com fulcro no art. 1.013, §3º, I, NCPC, passo a analisar o pleito, que versa sobre a concessão de aposentadoria por idade, com aproveitamento de tempos de trabalho rural e urbano.
A modalidade de jubilamento postulado pela autoria vem consagrado no § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.213/91, na dicção da Lei nº 11.718/2008, e é, tradicionalmente, denominado híbrido ou misto, haja vista a permissão legislativa quanto à contagem de tempo desempenhado em mister rural, em consórcio a outros interstícios contributivos atinentes a categorias de segurado diversas, de sorte a adimplir, com referido somatório, o lapso de carência, delimitado a partir da aplicação da tabela progressiva constante do artigo 142 da Lei nº 8.213/91. Quanto ao quesito etário, remanesce assinalado em 65 anos (homem) e 60 anos (mulher).
Ao prever tal espécie de aposentação, teve o legislador ordinário por fito salvaguardar os interesses dos exercentes de ofício rural que, em sua jornada profissional, de forma transitória ou permanente, vieram a galgar ocupações distintas, notadamente de natureza urbana, circunstância que, eventualmente, empecer-lhes-ia a outorga de aposentadoria por idade de trabalhador rural, relegando-os a verdadeiro limbo jurídico, à constatação de que desempenharam labor urbano por expressivo lapso temporal ou bem teriam abandonado a atividade campestre antes do atingimento etário ou da vindicação da benesse. É-lhes propiciada, nessa medida, a contabilização do tempo laboral desenvolvido no campo, ainda que de forma descontínua, conjugando-o ao afazer urbano, na busca do atendimento à carência legal. Desimporta, aqui, investigar-se do predomínio de atividades rurais no histórico laboral do requerente do benefício; tampouco, apurar-se se, quando da dedução do requerimento, o solicitante ainda estava a labutar no campo.
Vale ponderar, ainda, que, ao contrário do que sucede na aposentadoria por idade de trabalhador rural, na modalidade híbrida encontra aplicabilidade o artigo 3º, § 1º, da Lei nº 10.666/2003, mercê do qual a perda da qualidade de segurado, anteriormente ao atingimento da idade exigida, não é de molde a obstar a outorga do benefício, contanto que seja alcançada a carência exigida. Precedente deste Tribunal nesse diapasão: AC 00038436520164039999, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, TRF3, SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 23/06/2016.
Quanto à demonstração do labor rural, há de se operar à luz dos contornos arraigados na jurisprudência, tais os seguintes:
- é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
- são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014);
- possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
- indisputável a existência de início de prova material contemporâneo a, quando menos, quinhão do período rural por testificar-se (v. Súmula TNU 34; cf., também, RESP 201200891007, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, DJE 19/12/2012, apreciado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, donde se colhe ser dispensável que o princípio de prova documental diga respeito a todo o interregno a comprovar, admitindo-se que aluda, apenas, à parcela deste);
- tratando-se de aposentadoria híbrida, despiciendo quer o recolhimento de contribuições previdenciárias relativamente ao tempo rural invocado pela autoria, à moda do que sucede em sede de aposentadoria por idade de trabalhador rural (RESP nº1497086/PR, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 06/04/2015), quer a demonstração do exercício da labuta campesina ao tempo da oferta do requerimento administrativo do benefício (AgRg no RESP 1.497.086/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, STJ - Segunda Turma, DJe 06/04/2015; RESP 201300429921, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, STJ - Segunda Turma, DJe 10/09/2014).
Ao caso dos autos, pois.
A parte autora, nascida em 09/11/1954 (fl. 8), adimpliu o requisito etário em 09/11/2014, incumbindo-lhe demonstrar o exercício de atividades rurícola e urbana por, no mínimo, 180 meses.
No intuito de denotar a labuta campesina, sem registro em carteira, desenvolvida, consoante aduz na exordial, entre 14/11/1971 e 01/11/1981, 08/06/1984 e 08/04/1985, 07/12/1985 e 03/06/1987, 01/08/1987 e 09/03/1994, 30/06/1995 e 30/09/1995, nas Fazendas Contendas, São Miguel, Santa Elisa, São João e São José, totalizando 18 anos, 10 meses e 25 dias, a demandante trouxe à baila os seguintes documentos, em que seu cônjuge exsurge qualificado como "lavrador":
Ocorre, contudo, que a imprecisão dos testemunhos, colhidos em 09/03/2017, impede a outorga do benefício vindicado (fl. 184).
A testemunha Antonio de Oliveira Souza declarou que conhece a requerente há mais de 30 anos. Informou que trabalharam juntos em duas fazendas (Fazenda Olho D'Água e Fazenda São José, de Fernando Martins de Barros) e que a autora parou de trabalhar há, aproximadamente, dez anos.
De seu turno, Lázaro Antonio de Oliveira afirmou conhecer a autora há 40 anos e que trabalharam juntos na Fazenda São José, de Fernando Martins de Barros, onde o testigo trabalha desde 1972, mas não soube informar em que período a vindicante lá laborou.
Sonia Aparecida Bianco asseverou que conhece a autora há mais de 30 anos; esta atualmente é "do lar", mas trabalhou na roça e no "Brejeiro"; trabalharam juntas no "São Bento (Fazenda Olho DÁgua)" e no "Figueiredo", há 40 anos; mais recentemente, trabalharam no "Brejeiro", que fechou há 30 anos e a autora não continuou a trabalhar depois disso.
Também prestou depoimento a própria autora e declarou que parou de trabalhar há 15 anos, por motivos de saúde, passando a "limpar casas"; seu último trabalho foi na Fazenda São José, de Fernando Martins de Barros. Sempre trabalhou sem registro em CTPS, desde os 12 anos de idade.
A prova oral é, portanto, duvidosa em relação aos períodos trabalhados, não sendo possível divisar, com mínima segurança, se os locais e períodos mencionados pelos testigos coincidem com as alegações da autora na exordial, ou seja, insuficiente à comprovação do desempenho de labor rural no lapso exigido pela lei.
Dessa forma, mesmo diante da existência de anotações, em CTPS (fls. 16/20) e CNIS (fl. 69), de vínculos empregatícios rurais e urbanos nos interregnos de 03/11/1981 a 04/07/1984 (Companhia Nuporanga de Alimentos - abatedouro de aves), 09/04/1985 a 28/09/1985 (Agro Pecuaria Sta. Catarina - Fazenda Contendas), 25/11/1985 a 06/12/1985 (Fazenda São Miguel), 04/06/1987 a 01/09/1987 (Fazenda Santa Elisa), 10/03/1994 a 04/04/1994 (Fazenda São João) e de um recolhimento como contribuinte individual de 01/10/2001 a 31/10/2001, não se verifica satisfeito o lapso de carência reclamado (180 meses), sendo de rigor o indeferimento do pleito inicial e, de conseguinte, a mantença da sentença de improcedência.
Diante da sucumbência recursal e da regra prevista no § 11 do art. 85 do NCPC, considerando a devida majoração da verba honorária, seu percentual passa a ser fixado em 12% sobre a base cálculo considerada pelo Juízo a quo.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA, mantida a r. sentença que julgou improcedente o pedido formulado, observada a sucumbência recursal.
É o voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANA LUCIA JORDAO PEZARINI:10074 |
Nº de Série do Certificado: | 3826AEADF05E125A |
Data e Hora: | 07/06/2018 15:04:45 |