
| D.E. Publicado em 21/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0019089-04.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação da parte autora tirada de sentença que, em autos de concessão de aposentadoria por idade, com aproveitamento de tempos de trabalho rural e urbano, julgou improcedente o pedido inicial, condenando-a ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em R$ 800,00, observada a gratuidade judiciária (fls. 88/89).
Em seu recurso, pugna a promovente pela reforma da decisão combatida, ao argumento de existência de início de prova material da atividade rurícola, corroborada por prova testemunhal harmônica, a ensejar o reconhecimento do labor rural que, aliado ao recolhimento de contribuições de natureza urbana, levam à concessão do almejado beneplácito (fls. 92/96).
Com contrarrazões (fls. 105/112), subiram os autos ao Tribunal.
VOTO
A modalidade de jubilamento postulado pela autoria vem consagrado no § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.213/91, na dicção da Lei nº 11.718/2008, e é, tradicionalmente, denominado híbrido ou misto, haja vista a permissão legislativa quanto à contagem de tempo desempenhado em mister rural, em consórcio a outros interstícios contributivos atinentes a categorias de segurado diversas, de sorte a adimplir, com referido somatório, o lapso de carência, delimitado a partir da aplicação da tabela progressiva constante do artigo 142 da Lei nº 8.213/91. Quanto ao quesito etário, remanesce assinalado em 65 anos (homem) e 60 anos (mulher).
Ao prever tal espécie de aposentação, teve o legislador ordinário por fito salvaguardar os interesses dos exercentes de ofício rural que, em sua jornada profissional, de forma transitória ou permanente, vieram a galgar ocupações distintas, notadamente de natureza urbana, circunstância que, eventualmente, empecer-lhes-ia a outorga de aposentadoria por idade de trabalhador rural, relegando-os a verdadeiro limbo jurídico, à constatação de que desempenharam labor urbano por expressivo lapso temporal ou bem teriam abandonado a atividade campestre antes do atingimento etário ou da vindicação da benesse. É-lhes propiciada, nessa medida, a contabilização do tempo laboral desenvolvido no campo, ainda que de forma descontínua, conjugando-o ao afazer urbano, na busca do atendimento à carência legal. Desimporta, aqui, investigar-se do predomínio de atividades rurais no histórico laboral do requerente do benefício; tampouco, apurar-se se, quando da dedução do requerimento, o solicitante ainda estava a labutar no campo.
Vale ponderar, ainda, que, ao contrário do que sucede na aposentadoria por idade de trabalhador rural, na modalidade híbrida encontra aplicabilidade o artigo 3º, § 1º, da Lei nº 10.666/2003, mercê do qual a perda da qualidade de segurado, anteriormente ao atingimento da idade exigida, não é de molde a obstar a outorga do benefício, contanto que seja alcançada a carência exigida. Precedente deste Tribunal nesse diapasão: AC 00038436520164039999, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, TRF3, SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 23/06/2016.
Quanto à demonstração do labor rural, há de se operar à luz dos contornos arraigados na jurisprudência, tais os seguintes:
- é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
- são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014);
- possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
- indisputável a existência de início de prova material contemporâneo a, quando menos, quinhão do período rural por testificar-se (v. Súmula TNU 34; cf., também, RESP 201200891007, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, DJE 19/12/2012, apreciado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, donde se colhe ser dispensável que o princípio de prova documental diga respeito a todo o interregno a comprovar, admitindo-se que aluda, apenas, à parcela deste);
- tratando-se de aposentadoria híbrida, despiciendo quer o recolhimento de contribuições previdenciárias relativamente ao tempo rural invocado pela autoria, à moda do que sucede em sede de aposentadoria por idade de trabalhador rural (RESP nº1497086/PR, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 06/04/2015), quer a demonstração do exercício da labuta campesina ao tempo da oferta do requerimento administrativo do benefício (AgRg no RESP 1.497.086/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, STJ - Segunda Turma, DJe 06/04/2015; RESP 201300429921, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, STJ - Segunda Turma, DJe 10/09/2014).
Ao caso dos autos, pois.
A parte autora, nascida em 18/01/1953, adimpliu o requisito etário em 18/01/2013, incumbindo-lhe demonstrar o exercício de atividades rurícola e urbana por, no mínimo, 180 meses.
Relata a autora, na inicial, que desde quando tinha 12 anos de idade passou a trabalhar nas lides campesinas, junto com os pais, situação que perdurou por mais de 20 anos no Estado de Minas Gerais. Depois, mudou-se para Sertãozinho, onde passou a trabalhar no corte de cana, na maior parte do tempo, sem registro em carteira. Recentemente, passou a trabalhar como doméstica.
No intuito de denotar a labuta campesina, desenvolvida, consoante aduz, por cerca de vinte anos, desde 1965 (quando completou 12 anos), a demandante apresentou rescisão de contrato de trabalho, em nome de seu pai, relacionado a serviços gerais na atividade agropecuária, de 1985 (fl. 19), bem como CTPS em nome próprio, com registro de dois vínculos empregatícios de natureza rural, o primeiro com datas de entrada e saída ilegíveis, e o segundo referente ao período de 27/05/1985 a 24/09/1985 (fls. 17/18).
No que concerne aos documentos em nome dos genitores, é cediço que o C. Superior Tribunal de Justiça assentou o entendimento no sentido de que os documentos em nome de terceiros, como pais, cônjuge e filhos, são hábeis a comprovar a atividade rural em regime de economia familiar, onde dificilmente todos os membros da família terão documentos em seu nome, posto que concentrados, na maioria das vezes, na figura do chefe da família. Confira-se, a propósito: EREsp 1171565/SP, Terceira Seção, Relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05/3/2015; REsp 501.009, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 11/12/2006; REsp 447655, Quinta Turma, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJ 29/11/2004).
Evidenciada a presença, in casu, de princípios de prova documental do labor rural, passo à análise da prova testemunhal, colhida em audiência realizada em 03/03/2016 (mídia digital de fl. 114).
Entretanto, a imprecisão dos testemunhos colhidos impede a outorga do benefício vindicado.
Deveras, Arlindo Oliveira disse que conhece a autora há cerca de trinta e cinco anos, vale dizer, desde 1981, afirmou que sua esposa e a requerente sempre trabalharam juntas na lavoura de cana, para José Rui, na Fazenda São Geraldo, até 8 anos atrás; nunca presenciou trabalho urbano da autora; acrescentou que sua esposa faleceu há 5 anos e, desde então, não tem mais notícias sobre o trabalho da vindicante.
Por sua vez, Marlene Rodrigues relatou conhecer a vindicante há trinta e cinco anos, eis que ambas residem na Cohab III. Contudo, apenas afirmou, de forma vaga e imprecisa, que a autora sempre trabalhou como rurícola, até 5 anos atrás, sem maiores esclarecimentos. Ainda, afirmou que a requerente sempre trabalhou nas lides rurais, nunca em atividades urbanas, o que discrepa dos registros no CNIS, que revelam diversos recolhimentos de contribuições previdenciárias, como empregada doméstica, no período intermitente de 04/1989 a 04/1999 (fl. 58).
Ora, os testigos são destituídos de credibilidade, uma vez que dizem conhecer a autora há mais de três décadas, afirmando que ela jamais se dedicou ao labor urbano, ao passo que o compulsar dos autos denota o exercício da atividade doméstica por longo período, no interregno de 1989 a 1999, podendo-se concluir que as testemunhas não têm conhecimento necessário acerca do histórico profissional da autora.
Frise-se que os depoimentos colidem com as alegações declinadas pela própria autora na inicial, onde relata o exercício de labor rurícola por cerca de 20 anos, iniciado aos seus 12 anos de idade (portanto, em 1965), perdurando, assim, até 1985, enquanto as testemunhas informar que a conhecem a partir de 1981 e que o trabalho campesino se estendeu até 2011.
Assim, a prova oral produzida se revela imprestável a corroborar o início de prova material de atividade rural desempenhada pela autoria.
Os únicos lapsos passíveis de serem computados são os períodos de atividade urbana constantes no CNIS (vínculos intermitentes de 1989 a 1999), insuficientes, também, à concessão de aposentadoria por idade urbana.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO.
É o voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | ANA LUCIA JORDAO PEZARINI:10074 |
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| Data e Hora: | 07/06/2018 15:05:19 |
