Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6165405-73.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
30/04/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/05/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LEI
8.213/1991. ADICIONAL DE 25%. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
- A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, cumprida a carência mínima, quando
exigida, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício
de atividade que lhe garanta a subsistência, ao passo que o auxílio-doença destina-se àquele que
ficar temporariamente incapacitado para o exercício de sua atividade habitual.
- Demonstrada a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade laborativa e
cumpridos os demais requisitos, com acréscimo do adicional de 25% previsto no artigo 45 da Lei
n. 8.213/1991, a partir do último requerimento administrativo (02/01/2019).
- Juros de mora, correção monetária e custas processuais fixados na forma explicitada.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS em percentual mínimo a ser definido na fase de
liquidação.
- Apelação provida. Sentença reformada.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6165405-73.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: EDILSON RODRIGUES DA SILVA
Advogados do(a) APELANTE: HOSANA APARECIDO CARNEIRO GONCALVES - SP226575-N,
AGOSTINHO ANTONIO PAGOTTO - SP70339-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6165405-73.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: EDILSON RODRIGUES DA SILVA
Advogados do(a) APELANTE: HOSANA APARECIDO CARNEIRO GONCALVES - SP226575-N,
AGOSTINHO ANTONIO PAGOTTO - SP70339-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso de apelação interposto por EDILSON RODRIGUES DA SILVA em face da r.
sentença que, em ação visando a concessão de aposentadoria por invalidez, com acréscimo de
25% (vinte e cinco por cento), a partir do requerimento administrativo, julgou improcedente o
pedido.
Em razões recursais, a parte autora requer a reforma da sentença, sustentando que a doença de
que padece não exige o cumprimento de carência.
Decorrido, “in albis”, o prazo para contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6165405-73.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: EDILSON RODRIGUES DA SILVA
Advogados do(a) APELANTE: HOSANA APARECIDO CARNEIRO GONCALVES - SP226575-N,
AGOSTINHO ANTONIO PAGOTTO - SP70339-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A teor do disposto no art. 1.011 do Código de Processo Civil, conheço do recurso de apelação,
uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade.
Discute-se o direito da parte autora a benefício por incapacidade.
Nos termos do art. 42 da Lei n. 8.213/91, a aposentadoria por invalidez é devida ao segurado
que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio-doença é devido ao segurado temporariamente incapacitado, nos termos
do disposto no art. 59 da mesma lei. Trata-se de incapacidade "não para quaisquer atividades
laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da
Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe,
Porto Alegre, 2005, pág. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o
trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra
atividade que garanta a subsistência - aposentadoria por invalidez, ou a incapacidade temporária
- auxílio-doença, observados os seguintes requisitos: 1 - a qualidade de segurado; 2 -
cumprimento da carência de doze contribuições mensais - quando exigida; e 3 - demonstração de
que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da
Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento
dessa doença ou lesão.
No caso dos autos, realizada a perícia médica judicial em 15/05/2019, o laudo apresentado
considerou o autor, nascido em 26/08/1973, trabalhador rural, com ensino médio, incapacitado ao
trabalho habitual, de forma total e permanente, por ser portador de “esclerose múltipla” (Id
104428343, p. 2/7).
O perito ainda destacou que o requerente necessita do auxílio de terceiros para realizar as
atividades da vida diária.
O início da incapacidade foi fixado em 01/01/2019.
Quanto aos requisitos qualidade de segurado e carência, os registros constantes do CNIS
demonstram que a parte autora verteu contribuições, como contribuinte individual, nos períodos
de 01/04/2007 a 31/01/2014, 01/01/2016 a 31/01/2017, 01/11/2017 a 31/12/2017 e de 01/10/2018
a 31/10/2018 (Id 104428353, p. 1).
Ainda no que se referem à manutenção da qualidade de segurado e carência, dispõem os artigos
15, II, e 151 da Lei n. 8.213/1991 (in verbis):
“Art 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
(...)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração”
“Art. 151. Até que seja elaborada a lista de doenças mencionada no inciso II do art. 26, independe
de carência a concessão de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez ao segurado que,
após filiar-se ao RGPS, for acometido das seguintes doenças: tuberculose ativa, hanseníase,
alienação mental, esclerose múltipla, hepatopatia grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia
irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose
anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante),
síndrome da deficiência imunológica adquirida (aids) ou contaminação por radiação, com base
em conclusão da medicina especializada”. (gn)
In casu, verifica-se que à época do surgimento da incapacidade o demandante detinha qualidade
de segurado, cabendo destacar, ademais, que a patologia que o acomete dispensa o
cumprimento da carência, consoante se infere do referido dispositivo legal.
Portanto, demonstrada a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade laborativa
e cumpridos os demais requisitos, é devido o benefício da aposentadoria por invalidez.
O autor também faz jus ao acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) previsto no artigo 45 da Lei
n. 8.213/1991, porquanto o laudo pericial atestou que o mesmo necessita da assistência de
terceiros para a prática dos atos da vida diária.
Quanto ao termo inicial, denota-se que a parte autora formulou três pedidos de requerimento
administrativo, respectivamente, em 14/02/2017, 10/10/2018 e 02/01/2019 (Id 104428333, p. 1, Id
104428342, p. 1 e Id 104428339, p. 1).
Por sua vez, a documentação médica coligida aos autos atesta que desde 2018 o autor já estava
acometido da patologia constada no exame médico pericial (Id 104428344, p. 1).
A referida documentação, emitida em 01/04/2019, também destaca a intolerância do autor à
medicação, bem como a não melhora do quadro clínico. Ademais, o laudo/relatório médico,
expedido em 15/04/2019, relata perda de força física generalizada progressiva e a
semidependência do autor de terceiros para a realização de atividade da vida diária (Id
104428339, p. 1).
Nesse contexto, os elementos probatórios carreados aos autos permitem concluir que a parte
autora já apresentava incapacidade na data do último requerimento administrativa, que ocorreu
em 02/01/2019 (Id Id 104428342, p. 1).
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE
870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97,
com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios
aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos
de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos
quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional
da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-
tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de
poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei
nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a
redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das
condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de
poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade
(CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação
de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Por derradeiro, assinale-se que o STF, por maioria, nos termos do voto do Ministro Alexandre de
Moraes, decidiu não modular os efeitos da decisão anteriormente proferida, rejeitando todos os
embargos de declaração opostos, conforme certidão de julgamento da sessão extraordinária de
03/10/2019.
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros e à
correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão
exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso, incidirão juros de mora e correção monetária em
conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE
870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Deve o INSS arcar com os honorários advocatícios em percentual mínimo a ser definido na fase
de liquidação, nos termos do inciso II do § 4º do art. 85 do Código de Processo Civil, observando-
se o disposto nos §§ 3º e 5º desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas
vencidas até a data da decisão concessiva do benefício, nos termos da Súmula n. 111 do
Superior Tribunal de Justiça.
Está o instituto previdenciário isento do pagamento de custas processuais, consoante o art. 4º,
inciso I, da Lei Federal n. 9.289/1996, art. 6º, da Lei do Estado de São Paulo n. 11.608/2003.
Excluem-se da isenção as respectivas despesas processuais, além daquelas devidas à parte
contrária.
Os valores já pagos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de
quaisquer benefícios inacumuláveis, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Ante a natureza alimentar da prestação, oficie-se ao INSS com cópia dos documentos
necessários, para que sejam adotadas medidas para a imediata implantação do benefício,
independentemente de trânsito em julgado, conforme requerido no apelo autoral.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para julgar procedente
o pedido, concedendo-lhe o benefício de aposentadoria por invalidez, com o acréscimo de 25%
previsto no artigo 45 da Lei n. 8.213/1991, a partir do último requerimento administrativo
(02/01/2019), e fixar consectários nos termos da fundamentação supra, abatidos eventuais
valores já recebidos.
É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: Cuida-se de apelação interposta em
face de sentença que julgou improcedente o pedido da parte autora, condenando-a ao
pagamento de verba honorária, observada a gratuidade de justiça.
O e. Relator deu provimento à apelação para determinar a concessão de aposentadoria por
incapacidade permanente, desde o último requerimento administrativo (2/1/2019), com o
acréscimo de 25% previsto no artigo 45 da Lei n. 8.213/1991.
Em que pesem os fundamentos expostos no r. voto, ouso divergir e, a seguir, fundamento:
Conheço da apelação, em razão da satisfação de seus requisitos.
Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício por incapacidade laboral.
Na petição inicial, o autor alega ter “nascido e criado na zona rural, e sempre se dedicou ao
trabalho rural” e, posteriormente, “transferiu-se para o meio urbano, onde continuou seu trabalho
constante”. Alega que foi diagnosticado com “CID 37.9/56.7.9 Desmielinizante do Sistema Central
(ELA)” e, em razão da gravidade de sua doença, está total e permanentemente incapacitado para
o trabalho.
Com a inicial, apresentou cópia de um relatório médico (sem data - Id. 104428334) e cópia do
requerimento administrativo do benefício, apresentado em 14/2/2017, indeferido por “Falta de
Período de Carência – MP nº 767/2017” (Id.104428333).
A cobertura do evento incapacidade para o trabalho é garantia constitucional prevista no Título
VIII, Capítulo II, da Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da Constituição Federal
(CF/1988), cuja redação atual é dada pela Emenda Constitucional n. 103, publicada em
13/11/2019 (EC n. 103/2019):
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência
Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: I - cobertura dos eventos de
incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; (...)”.
Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da
CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
A aposentadoria por invalidez, atualmente denominada aposentadoria por incapacidade
permanente (EC n. 103/2019), é devida ao segurado que for considerado permanentemente
incapaz para o exercício de quaisquer atividades laborativas, não sendo possível a reabilitação
em outra profissão.
Nos termos do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, o benefício será devido ao segurado que, estando
ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de
reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e será pago enquanto
perdurar esta condição.
Por sua vez, o auxílio-doença, atualmente denominado auxílio por incapacidade temporária (EC
n. 103/2019), é devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o trabalho e, à
luz do disposto no artigo 59 da Lei n. 8.213/1991, "não para quaisquer atividades laborativas, mas
para (...) sua atividade habitual" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro
Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, p. 128).
São requisitos para a concessão desses benefícios, além da incapacidade laboral: a qualidade de
segurado, a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida, bem como a
demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social (RGPS).
Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as
condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de benefício por incapacidade
permanente ou temporária. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei
n. 8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer
natureza, ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).
O reconhecimento da incapacidade laboral, total ou parcial, depende da realização de perícia
médica, por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil (CPC). Contudo,
o Juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos
pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos
autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) são pertinentes a esse tema.
Súmula 47 da TNU: “Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez”.
Súmula 53 da TNU: “Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social”.
Súmula 77 da TNU: “O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais
quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”.
No caso em análise, os dados Cadastro Nacional do Seguro Social (CNIS) informam o
recolhimento de contribuições, como contribuinte individual, nos seguintes períodos: (i) 4/2007 a
1/2014, (ii) 1/2016 a 1/2017, (iii) 11/2017 a 12/2017 e (iv) 10/2018.
De acordo com a perícia médica judicial, o autor (nascido em 1973, qualificado no laudo como
trabalhador rural), está total e permanentemente incapacitado paro o trabalho, por ser portador
de“esclerose múltipla”.
O perito fixou o início da incapacidade laboral em janeiro de 2019, baseado nos documentos
médicos apresentados, e apontou, ainda, a necessidade permanente de auxílio de terceiros para
realizar as atividades da vida diária.
Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial.
Muito embora o perito tenha fixado a data de início da incapacidade laboral em 1/2019, os demais
elementos de prova permitem convicção no sentido de que o autor já estava total e
permanentemente incapacitado muito antes disso.
Como dito acima, o próprio autor, na petição inicial, alega ter efetuado o requerimento
administrativo em 14/2/2017, por estar acometido da doença apontada na perícia que o impedia
de trabalhar, tanto que o indeferimento administrativo se deu em razão da falta do cumprimento
da carência e não por ausência de incapacidade laboral” (Id. 104428333).
Ademais, como veremos, ele deixou de efetuar recolhimentos para o sistema previdenciário já em
1/2014 e não apresentou documentos médicos antigos.
O único relatório médico acostado à inicial (Id. 104428334) está incompleto, já que consta, ao
final do documento o indicativo “segue” de continuação em outra folha e não possui data.
De qualquer forma, trata-se de documento que instruiu a inicial e, portanto, é bem anterior à DII
fixada na perícia, o qual já declarava a existência de “histórico de prejuízo de fala e prejuízo de
motricidade dos membros inferiores, com comprometimento psíquico (...) com início dos sintomas
há pouco mais de um ano (...)”.
Além disso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou entendimento no sentido de que a prova
técnica prestar-se-ia unicamente para nortear o convencimento do juízo quanto à pertinência do
novo benefício, mas não para atestar o efetivo momento em que a moléstia incapacitante se
instalou.
Confira-se (g.n):
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO
INICIAL DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CITAÇÃO
VÁLIDA. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC.
1. O tema relativo ao termo inicial de benefício proveniente de incapacidade laborativa já foi
exaustivamente debatido nesta Corte, a qual, após oscilações, passou a rechaçar a fixação da
Data de Início do Benefício - DIB a partir do laudo pericial, porquanto a prova técnica prestar-se-ia
unicamente para nortear o convencimento do juízo quanto à pertinência do novo benefício, mas
não para atestar o efetivo momento em que a moléstia incapacitante se instalou.
2. Atualmente a questão já foi decidida nesta Corte sob o rito dos recursos repetitivos (art. 543-C
do CPC), restando pacificada a jurisprudência no sentido que "A citação válida informa o litígio,
constitui em mora a autarquia previdenciária federal e deve ser considerada como termo inicial
para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida na via judicial quando ausente a
prévia postulação". (REsp 1.369.165/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Seção,
DJe 7/3/2014).
3. Recurso especial parcialmente provido”. (REsp 1311665/SC, Rel. Ministro ARI PARGENDLER,
Rel. p/ Acórdão Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/09/2014, DJe
17/10/2014)
Nessas circunstâncias, os demais elementos de prova permitem convicção no sentido de que a
incapacidade laboral do autor remonta à data do requerimento administrativo do benefício.
Ocorre que naquela data (DER em 14/2/2017), o autor não havia cumprido a carência mínima
exigida à época para a concessão de benefício por incapacidade laboral.
Consoante dados do CNIS acima descritos, após o último recolhimento efetuado em 1/2014, o
autor perdeu a qualidade de segurado, quando expirado o "período de graça" previsto no artigo
15 da Lei n. 8.213/1991.
Depois disso, ele somente retornou ao sistema previdenciário a partir de 28/11/2016, quando
efetuou o recolhimento de quatro contribuições, pertinentes às competências de 1/2016 a 5/2016,
todas pagas em atraso.
No dia 31/1/2017, efetuou o recolhimento de mais sete contribuições, também a destempo,
pertinentes às competências de 6/2016 a 12/2016.
A única competência paga tempestivamente refere-se à competência de 1/2017, paga no dia
15/2/2017.
Ou seja, após ter perdido a qualidade de segurado, o autor efetuou tempestivamente apenas uma
contribuição (1/2017), antes de efetuar o requerimento administrativo em 14/2/2017.
Por oportuno, destaco que, à luz do artigo 27, II, da Lei n. 8.213/1991, somente serão
consideradas, para o cômputo de carência, as contribuições realizadas a contar da data de
efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso, não sendo consideradas para este fim as
contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores, no caso dos
segurados contribuinte individual.
Nesse cenário, verifica-se que houve a perda da qualidade de segurado e posterior retorno da
parte ao sistema previdenciário.
Assim, a questão controvertida deve ser analisada em consonância com as significativas
mudanças legislativas referentes à qualidade de segurado e novo período de carência, trazidas
pelas Medidas Provisórias n. 739/2016; 767/2017; pela Lei n. 13.457/2017 e, ainda, pela Medida
Provisória n. 871/2019 e pela Lei n. 13.846/2019.
Uma das principais alterações promovidas pelas Medidas Provisórias (MP) n. 739/2016 e
767/2017, e reproduzida na Lei n. 13.457/2017 e posteriormente na MP n. 871/2019, está na
revogação do parágrafo único do artigo 24 da Lei n. 8.213/1991, que permitia a utilização das
contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado para o cômputo da carência do
benefício, após o recolhimento de 1/3 (um terço) das contribuições exigidas para esse fim:
“Art. 24. (...) Parágrafo único. Havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições
anteriores a essa data só serão computadas para efeito de carência depois que o segurado
contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número
de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser
requerido".
À luz do citado dispositivo, o segurado que perder a sua qualidade após a cessação das
contribuições e o decurso de eventual período de graça, quando retornar ao RGPS deverá
cumprir integralmente o período de carência a partir das novas contribuições, para a obtenção
dos benefícios previdenciários que exigirem o cumprimento da carência, como é o caso do
benefício de auxílio-doença.
Essa regra constou expressamente do parágrafo único do artigo 27 da Lei n 8.213/1991, incluído
pela MP 739/2016:
“Art. 27. (...) Parágrafo único. No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de
carência para a concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e de
salário-maternidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com
os períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25”.
Contudo, essa regra teve vigência apenas no intervalo de 7 de julho de 2016 (data da publicação
da MP 739/2016) a 4 de novembro de 2016.
A partir de 5 de novembro de 2016, com a ausência da conversão da MP em lei, voltaram a viger
as regras anteriores.
Todavia, dois meses depois, em 6 de janeiro de 2017, entrou em vigor a Medida Provisória n.
767, que novamente revogou o parágrafo único, do artigo 24, da Lei n. 8.213/1991. Além disso, o
texto que a MP 739/2016 havia criado para o parágrafo único, do artigo 27, da Lei n. 8.213/1991
passa, com a MP 767/2017, a constar do novo artigo 27-A da Lei n. 8.213/1991:
“Art. 27-A. No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão
dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e de salário-maternidade, o
segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com os períodos previstos
nos incisos I e III do caput do art. 25”.
O dispositivo reitera a principal consequência advinda com a revogação do artigo 24, consistente
na exigência de cumprimento integral da carência para os referidos benefícios, após a eventual
perda da qualidade de segurado.
Entretanto, essa ainda não foi a norma definitiva sobre a matéria. Durante a tramitação legislativa
de conversão da MP 767/2017 na Lei n. 13.457/2017 (com vigência a partir de 27 de junho de
2017), manteve-se a revogação do parágrafo único, do artigo 24, da Lei n. 8.213/1991, mas o
conteúdo do artigo 27-A foi modificado, para se exigir o recolhimento de metade das contribuições
exigidas para a carência dos benefícios por incapacidade (para todos os segurados) e do salário-
maternidade (para as seguradas contribuinte individual e facultativa). Vejamos:
“Art. 27-A. No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão
dos benefícios de que trata esta Lei, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à
Previdência Social, com metade dos períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25
desta Lei”.
A partir de 18 de janeiro de 2019, nova Medida Provisória entrou em vigor (MP n. 871/2019), com
vigência de seis meses, passando-se a exigir, novamente, o cumprimento integral da carência
após a perda da qualidade de segurado.
Em 18 de junho de 2019, essa MP foi convertida na Lei n. 13.846/2019, e o artigo 27-A foi
novamente modificado, passando a ter a seguinteredação:
"Art. 27-A Na hipótese de perda da qualidade de segurado, para fins da concessão dos benefícios
de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez, de salário-maternidade e de auxílio-reclusão, o
segurado deverá contar, a partir da data da nova filiação à Previdência Social, com metade dos
períodos previstos nos incisos I, III e IV docaputdo art. 25 desta Lei."
Em consequência, durante o intervalo compreendido entre 6 de julho de 2016 e 27 de junho de
2019, o RGPS brasileiro teve seis regras distintas acerca do número de contribuições necessárias
para readquirir as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado sendo que, desde
18 de junho de 2019, há mais outra regra em vigor.
Nesse passo, tendo em vista que o requerimento administrativo do benefício foi apresentado em
14/2/2017, aplicam-se as disposições previstas na MP 767/2017 então vigente, segundo a qual,
havendo perda da qualidade de segurado, é necessário o recolhimento mínimo de doze
contribuições para a concessão do benefício.
Como dito, no caso em concreto, após a perda da qualidade de segurado, o autor somente
efetuou o recolhimento de uma contribuição tempestiva, antes de efetuar o requerimento
administrativo e, portanto, não cumpriu a carência mínima exigida por lei para a percepção do
benefício.
Destaca-se, ainda, o fato de que as doenças apontadas pelo laudo pericial não autorizam a
concessão do benefício independentemente do cumprimento da carência, a teor do artigo 26, II,
da Lei n. 8.212/1991.
Por fim, ressalto que, ainda que a enfermidade do autor dispensasse o cumprimento da carência,
também não seria possível a concessão do benefício, uma vez que seu reingresso ao sistema
previdenciário ocorreu com doença e incapacidade laboral preexistentes, situação que também
impede a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente, ainda que consideradas as
datas dos requerimentos administrativos apresentados em 10/10/2018 e 2/1/2019, nos termos do
disposto no artigo 42, § 2º, da Lei n. 8.213/1991.
Nesse sentido estão os seguintes precedentes:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 42, §
2º, DA LEI Nº 8.213/1991. DOENÇA PREEXISTENTE À FILIAÇÃO AO REGIME GERAL DE
PREVIDÊNCIA SOCIAL. REEXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ.
1. Demonstrado nos autos, que a incapacidade laboral é anterior à filiação ao Regime Geral de
Previdência Social, não faz jus o segurado à aposentadoria por invalidez, conforme o artigo 42, §
2º da Lei 8.213/1991.
2. Rever o entendimento do Tribunal de origem quanto a existência da incapacidade laborativa do
autor, antes mesmo de sua filiação junto ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS,
demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, providência sabidamente incompatível com
a via estreita do recurso especial. (Súmula nº 7/STJ).
3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg no Ag 1329970 / SP AGRAVO
REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2010/0132461-4 Relator(a) Ministro MARCO
AURÉLIO BELLIZZE (1150) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA Data do Julgamento
17/04/2012 Data da Publicação/Fonte DJe 31/05/2012)
"PREVIDENCIÁRIO - AGRAVO LEGAL - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ – AUXÍLIO-
DOENÇA - PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADA - OCORRÊNCIA - DOENÇA PRÉ-
EXISTENTE I. Para concessão de aposentadoria por invalidez é necessário comprovar a
condição de segurado, o cumprimento da carência, salvo quando dispensada, e a incapacidade
total e permanente para o trabalho. O auxílio-doença tem os mesmos requisitos, ressalvando-se a
incapacidade, que deve ser total e temporária. II. Considerando que as patologias diagnosticadas
são de caráter crônico e degenerativo, restou evidenciado que, ao ingressar ao Regime Geral da
Previdência Social, na qualidade de contribuinte facultativo, no período de 01/07/2003 a 06/2004,
a autora já estava incapacitada. III. Considerando a data da incapacidade fixada nos autos
(meados de 08/2008), e a última contribuição vertida pela autora (09/06/2004 - 06/2004), teria
sido consumada a perda da qualidade de segurada, conforme disposto no art. 15, II, e §4°, da Lei
8.213/91, uma vez que também não houve o recolhimento das quatro contribuições necessárias,
após tal perda, nos termos do art. 24, par. único, da LBPS. IV. Agravo legal improvido.” (AC -
APELAÇÃO CÍVEL - 1056095 Processo: 0039855-64.2005.4.03.9999 UF: SP Órgão Julgador:
NONA TURMA Data do Julgamento: 03/10/2011 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:17/10/2011 Relator:
DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS)
Manifestada a incapacidade laboral prévia à refiliação da parte, já iniciada com premeditação ao
requerimento de concessão de benefício, irrelevante será eventual agravamento do quadro
clínico.
A solidariedade legal tem via dupla: todos devem contribuir para a previdência social, quando
exercem atividade de filiação obrigatória, para que todos os necessitados filiados obtenham a
proteção previdenciária.
Nesse passo, a manutenção da sentença é medida de rigor.
Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, suspensa, porém,
a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de
beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, nego provimento à apelação.
É o voto.
DALDICE SANTANA
Desembargadora Federal
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LEI
8.213/1991. ADICIONAL DE 25%. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
- A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, cumprida a carência mínima, quando
exigida, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício
de atividade que lhe garanta a subsistência, ao passo que o auxílio-doença destina-se àquele que
ficar temporariamente incapacitado para o exercício de sua atividade habitual.
- Demonstrada a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade laborativa e
cumpridos os demais requisitos, com acréscimo do adicional de 25% previsto no artigo 45 da Lei
n. 8.213/1991, a partir do último requerimento administrativo (02/01/2019).
- Juros de mora, correção monetária e custas processuais fixados na forma explicitada.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS em percentual mínimo a ser definido na fase de
liquidação.
- Apelação provida. Sentença reformada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por maioria,
decidiu dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator, que foi
acompanhado pela Juíza Federal Convocada Leila Paiva e pelo Desembargador Federal Gilberto
Jordan (4º voto). Vencida a Desembargadora Federal Daldice Santana, que negava provimento à
apelação. Julgamento nos termos do disposto no art. 942, caput e § 1º, do CPC
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
