
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012854-25.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: ELISAMA SOARES DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE SIMEAO DA SILVA FILHO - SP181108-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012854-25.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: ELISAMA SOARES DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE SIMEAO DA SILVA FILHO - SP181108-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido, com fundamento na incapacidade laborativa da parte autora, condenando o INSS a pagar o benefício de AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA desde 21/05/2018, data da cessação do benefício, observada a prescrição quinquenal, com a aplicação de juros de mora e correção monetária e ao pagamento de honorários advocatícios, antecipando, ainda, os efeitos da tutela, para implantação imediata do benefício.
Em suas razões de recurso, alega a parte autora, em síntese:
- cerceamento de defesa, eis que o laudo pericial foi produzido por médico não especialista e pelo indeferimento de realização de nova perícia na especialidade neurologia;
- que o laudo pericial não pode prevalecer, pois omitiu sua incapacidade total e permanente para o exercício de atividade remunerada, bem como a necessidade de assistência permanente de outra pessoa;
- que não se pode determinar a cessação de beneficio de auxilio doença sem a realização de perícia médica judicial ou administrativa.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Egrégio Tribunal.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012854-25.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: ELISAMA SOARES DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE SIMEAO DA SILVA FILHO - SP181108-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Em razão de sua regularidade formal, recebo o(s) recurso(s), nos termos do artigo 1.011 do CPC/2015.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por incapacidade permanente, nova nomenclatura da aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio por incapacidade temporária, antigo auxílio-doença (artigo 59).
E a nomenclatura “auxílio por incapacidade temporária” é um termo guarda-chuva, que abriga não apenas aqueles casos de incapacidade temporária, mas também os de incapacidade definitiva para a atividade habitual, sendo que o primeiro cessa com a recuperação da capacidade laboral do segurado e o último, com a sua reabilitação para outra atividade que lhe garanta a subsistência (artigo 62), podendo, ainda, se o segurado for considerado insusceptível de reabilitação, ser convertido em aposentadoria por incapacidade permanente (parágrafo 1º).
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em 15/02/2023 constatou que a parte autora, operadora de logística, idade atual de 38 anos, está temporariamente incapacitada para o exercício de atividade habitual, como se vê do laudo pericial (ID 293980380):
“VI - DISCUSSÃO E CONCLUSÃO: Após anamnese psiquiátrica e exame dos autos concluímos que a pericianda não apresenta sintomas e sinais sugestivos de desenvolvimento mental incompleto, demência ou psicose. A autora é portadora de retardo mental leve e de transtorno depressivo recorrente, episódio atual grave sem sintomas psicóticos. O retardo mental leve corresponde a uma amplitude aproximada do QI entre 50 e 69 (em adultos, idade mental de 9 a menos de 12 anos). Provavelmente devem ocorrer dificuldades de aprendizado na escola. Muitos adultos serão capazes de trabalhar e de manter relacionamento social satisfatório e de contribuir para a sociedade. Apesar do retardo mental a autora conseguiu trabalhar até desenvolver sintomas depressivos e ser afastada do trabalho. O transtorno depressivo recorrente caracteriza-se por períodos de sintomas depressivos, de duração variável, geralmente de seis a oito meses, seguidos de intervalos assintomáticos, também de duração variável. A doença decorre de tendências hereditárias que podem ser despertadas por algum acontecimento ao longo da vida. A intensidade das fases em que há depressão é variável podendo haver desde sintomas leves até sintomas graves. No caso em questão não parece haver fatores agravantes para a evolução da doença indicando possibilidade de controle. Os sintomas depressivos presentes no momento do exame pericial são graves sem sintomas psicóticos. Nos episódios típicos de cada um dos três graus de depressão: leve, moderado ou grave, o paciente apresenta um rebaixamento do humor, redução da energia e diminuição da atividade. Existe alteração da capacidade de experimentar o prazer, perda de interesse, diminuição da capacidade de concentração, associadas em geral à fadiga importante, mesmo após um esforço mínimo. Observam-se em geral problemas do sono e diminuição do apetite. Existe quase sempre uma diminuição da autoestima e da autoconfiança e frequentemente ideias de culpabilidade e ou de indignidade, mesmo nas formas leves. O humor depressivo varia pouco de dia para dia ou segundo as circunstâncias e pode se acompanhar de sintomas ditos "somáticos", por exemplo, perda de interesse ou prazer, despertar matinal precoce, várias horas antes da hora habitual de despertar, agravamento matinal da depressão, lentidão psicomotora importante, agitação, perda de apetite, perda de peso e perda da libido. O número e a gravidade dos sintomas permitem determinar três graus de um episódio depressivo: leve, moderado e grave. São essenciais para o diagnóstico da depressão: humor depressivo (que não muda conforme os estímulos da realidade), falta de interesse, lentificação psicomotora e anedonia. Para determinarmos os graus de depressão utilizamos duas classes de sintomas que devem durar pelo menos quinze dias: 1) sintomas A que incluem humor deprimido e/ou perda de interesse e prazer e/ou fadiga ou perda de energia e 2) sintomas B que incluem redução da atenção e da concentração e/ou redução da autoestima e da autoconfiança e/ou sentimento de inferioridade, de inutilidade ou de culpa excessiva e/ou agitação ou lentificação psicomotora e/ou alteração do sono e/ou alteração do apetite e alteração do peso. Na depressão leve o indivíduo apresenta dois sintomas A e dois sintomas B. Na depressão moderada, dois ou três sintomas A e pelo menos seis no total. Na depressão grave, três sintomas A e, pelo menos, cinco sintomas B. Vamos então classificar o grau de depressão da autora utilizando estes critérios: dos sintomas A, a autora apresenta: humor deprimido, perda de interesse e perda de energia (três sintomas A) e dos sintomas B, ela apresenta: redução da autoestima, redução da capacidade de atenção e de concentração, sentimento de inferioridade e alteração do sono (quatro sintomas B). Ou seja, a autora é portadora no momento do exame de episódio depressivo de moderado a grave. Esta intensidade depressiva não permite o retorno ao trabalho, mas se trata de patologia passível de controle com medicação e psicoterapia. Incapacitada de forma total e temporária por dez meses quando deverá ser reavaliada. Data de início da incapacidade, pelos documentos anexados aos autos, fixada em 2018 quando recebeu benefício previdenciário. Autora afastada inicialmente por problema ortopédico. Com base nos elementos e fatos expostos e analisados, conclui-se: Caracterizada situação de incapacidade laborativa temporária (dez meses), sob a ótica psiquiátrica.”
No caso, a autora impugnou a conclusão do laudo pericial nos seguintes pontos: 1) foi produzido por médico não especialista em neurologia; 2) omitiu sua incapacidade total e permanente para o exercício de atividade remunerada; 3) deixou de observar sua necessidade de assistência permanente de outra pessoa.
No entanto, o laudo em questão foi realizado por profissional habilitado, equidistante das partes, capacitado, especializado em perícia médica, e de confiança do Juízo, cuja conclusão encontra-se lançada de forma objetiva e fundamentada, não havendo que se falar em realização de nova perícia judicial. O juízo levou em consideração, para formação de seu convencimento, a documentação médica colacionada aos autos, bem como atendeu às necessidades do caso concreto, possibilitando concluir que o perito realizou minucioso exame clínico, respondendo aos quesitos formulados.
E, ainda que o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõe o artigo 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.
De se ter em consideração que o laudo médico pericial proferido em juízo, embora nem sempre apresente conclusão indene de dúvidas, via de regra é a principal fonte de verificação da capacidade/incapacidade laboral, devendo ser afastado somente nos casos em que haja flagrante contraditório entre laudos periciais ou quando houver provas robustas e contundentes apresentadas pela parte requerente, que refutem a sua conclusão. Somente em tais casos é que se pode, por parte do julgador, acolher o pedido de impugnação, determinando nova perícia ou concedendo benefício, conforme o caso.
Frise-se que não configura cerceamento de defesa a ausência de manifestação ou o indeferimento de realização de nova perícia, vez que o juiz é o destinatário das provas, cuja valoração e pertinência depende somente de sua avaliação. No caso, o juiz considerou a conclusão do laudo pericial, que não vislumbrou incapacidade total e permanente, o que, por si só, afasta a necessidade de assistência permanente de terceiros.
Por outro lado, é do entendimento da Corte Superior e desta c. Turma que "a pertinência da especialidade médica não consubstancia pressuposto de validade da prova pericial, podendo o juiz nomear médico com especialidade diversa das patologias alegadas pela parte (REsp 1514268; 27/11/2015; Rel. Min. CAMPBELL MARQUES; 2ª Turma). Portanto, o fato de médico ter concluído perícia na área de psiquiatria, e não em neurologia, não é de sorte a justificar a nulidade da r. sentença por cerceamento de defesa.
Logo, as alegações da autora não têm o condão de afastar as conclusões do expert, de forma que fica afastada, assim, a questão preliminar.
Considerando que a parte autora, conforme concluiu o perito judicial, não está incapacitada de forma total e definitiva para a atividade laboral, não é de se conceder a aposentadoria por incapacidade permanente, devendo ser mantido o auxílio por incapacidade temporária já concedido pela sentença.
No tocante ao termo final do auxílio por incapacidade temporária, a Lei nº 8.213/91 recomenda, nos casos em que a incapacidade é apenas temporária e há possibilidade de recuperação da capacidade do segurado para a atividade habitual, como nos autos, a fixação, quando da concessão do benefício, de um prazo estimado para a sua duração (artigo 60, parágrafo 8º), estabelecendo que, não sendo fixado esse prazo, o INSS poderá cessar o benefício no prazo de 120 dias (parágrafo 9).
Assim, deve subsistir a sentença na parte em que fixou o prazo de duração do benefício, até porque embasada em conclusão da perícia judicial, cumprindo ao segurado, se entender que não está em condições de retornar ao trabalho, requerer, na esfera administrativa, a prorrogação do seu benefício.
Relativamente ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que ser discutido ou acrescentado aos autos.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso e mantenho íntegra a r. sentença.
É O VOTO.
/gabiv/jb
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO: AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. REQUISITOS PREENCHIDOS. RECURSO DESPROVIDO.
1. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por incapacidade permanente, nova nomenclatura da aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio por incapacidade temporária, antigo auxílio-doença (artigo 59). Assim, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
2. Considerando que a parte autora, conforme concluiu o perito judicial, não está incapacitada, de forma total e definitiva, para a atividade laboral, não é de se conceder a aposentadoria por incapacidade permanente, sendo mais adequado o auxílio por incapacidade temporária já concedido pela sentença.
3. Considerando que o auxílio por incapacidade temporária foi concedido com base na incapacidade temporária e que a decisão judicial fixou um prazo estimado para duração do benefício, poderá o INSS, nos termos dos parágrafos 8º e 9º do artigo 60 da Lei nº 8.213/91, cessar o auxílio-doença após o decurso desse prazo, cumprindo ao segurado, se entender que não está em condições de retornar à atividade laborativa, requerer, na esfera administrativa, a prorrogação do seu benefício.
4. Recurso desprovido.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
