D.E. Publicado em 27/11/2020 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, homologar a habilitação e dar provimento ao recurso para julgar procedente a ação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Relatora para Acórdão
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
Data e Hora: | 09/10/2020 11:26:27 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003603-52.2011.4.03.9999/SP
DECLARAÇÃO DE VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO:
Cuida-se, aqui, de demanda objetivando a concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal e regulamentado pela Lei nº 8.742/93.
Após o trâmite processual cabível, fora noticiado o óbito da parte autora, com a juntada da respectiva certidão, anteriormente à prolação da sentença.
Pois bem.
Dispõe o artigo 21, §1º, da Lei Assistencial que: "O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições referidas no caput, ou em caso de morte do beneficiário".
Logo, resta claro que o benefício em questão tem natureza personalíssima, não podendo ser transferido aos herdeiros pelo óbito do titular, tampouco gerando direito à pensão por morte aos dependentes.
Assim, a morte do beneficiário no curso da ação põe termo final no seu pagamento, sendo que o direito à percepção mensal das prestações vincendas é intransferível a terceiros, a qualquer título. Permanece, todavia, a pretensão dos sucessores de receberem os valores eventualmente vencidos, entre a data em que se tornaram devidos até o falecimento.
No entanto, para a hipótese de pagamento do resíduo ao sucessor, afigura-se como condição essencial e primeira o efetivo reconhecimento do direito ao benefício, o qual, por sua vez, se materializa por meio da prolação de sentença.
Ora, se o passamento da parte autora é anterior ao julgamento da demanda, não há que se cogitar em direito dos herdeiros à percepção de eventuais parcelas em atraso, uma vez que estas sequer chegaram a se incorporar ao seu patrimônio, na medida em que se trata, como anteriormente referido, de direito de natureza personalíssima, intransmissível, pois, por sucessão.
E, nessa toada, o momento da prolação da sentença afigura-se crucial para delimitação de eventual direito sucessório, na medida em que somente com a superveniência de referido provimento jurisdicional, como ato perfeito e acabado que é, o direito se revela, efetivamente, assegurado. A contrario sensu, falecida a parte autora da demanda antes mesmo de ter-lhe reconhecido fazer jus ao benefício, inexiste direito a ser judicialmente tutelado em prol de seus sucessores.
O discrimen merece, aqui, destaque, considerando que o falecimento da parte após a prolação da sentença, com o direito ao pagamento do benefício já reconhecido - ainda que pendente de confirmação pela instância ad quem -, configura hipótese diversa, na qual não mais se trata de pagamento do benefício (cessado com o óbito), e sim de execução do julgado com a apuração das verbas devidas e não pagas, a ensejar - aí sim - o instituto da sucessão hereditária.
Filio-me, por outro lado, quanto à natureza jurídica, ao entendimento de que a obrigação alimentar trata-se de um direito pessoal extrapatrimonial, e tem um fundamento ético-social, pois o alimentando não tem meramente interesse econômico, uma vez que a verba recebida não aumenta seu patrimônio, não servindo também de garantia aos seus credores, sendo por sua vez, uma manifestação do direito à vida, de origem constitucional, com fundamento na dignidade da pessoa humana, e que tem caráter personalíssimo.
Nesse sentido são os ensinamentos de Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, na obra Direito das Famílias:
Maria Berenice Dias também ensina, em seu Manual de Direito das Famílias, que:
Ao meu sentir, se este entendimento vem surgindo no seio do direito de família, cujas relações jurídicas se travam entre particulares, com mais razão ainda deverá ser aplicado nas relações alimentares entre os administrados e o Estado, que tem caráter eminentemente supletivo e deriva justamente do dever que este último possui de, subsidiado pelos recursos originados por toda a sociedade, prover o sustento daqueles que não detém condições de fazê-lo e nem possuam familiares em condições de auxiliá-los.
Diga-se, ainda, em reforço ao entendimento esposado, ser plenamente possível estabelecer um cotejo - ao menos para o que aqui interessa - entre o benefício assistencial e os alimentos, haja vista estes últimos destinarem-se, a exemplo do primeiro, à manutenção da subsistência de quem os reivindica, "quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença", na exata compreensão do disposto no art. 1.695 do Código Civil.
De igual sorte, na esteira da similitude entre ambas as prestações, trago à colação escolio de Maria Berenice Dias, cujo excerto está assim reproduzido:
Em alinhamento a essa corrente, confiram-se precedentes desta Egrégia 7ª Turma:
E, ainda, desta Corte Regional:
Na esteira dos precedentes invocados, entendo que a extinção do feito se mostra, mesmo, medida de rigor.
Ante o exposto, divirjo da eminente Relatora e, pelo meu voto, nego provimento à apelação, mantendo hígida a r. sentença de primeiro grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 03/06/2019 11:23:54 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003603-52.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de apelação interposta por Rosangela Pereira Pimenta e Outros em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício assistencial de prestação continuada - LOAS.
Processado o feito, sobreveio sentença julgando improcedente o pedido e que motivou a interposição de recurso pela autora.
Em 19/10/2011, em virtude da ausência de intervenção obrigatória do MPF, a sentença foi anulada e os autos retornaram ao Juízo de origem, julgando-se prejudicado o recurso da autora.
Noticiado o falecimento da autora - ocorrido em 16/06/2009 - os herdeiros requereram sua habilitação, pleito que foi deferido à fl. 223 e ensejou a interposição de agravo retido pelo INSS.
Com o óbito da autora, a r. sentença julgou extinto o processo sem julgamento do mérito, sob o fundamento de que se trata de benefício personalíssimo.
Em suas razões recursais, os apelantes sustentam que fazem jus ao recebimento das parcelas em atraso a que a autora teria direito enquanto viva.
Pedem o retorno dos autos ao Juízo a quo para realização de novo julgamento, com apreciação do mérito ou que seja dado provimento ao recurso reconhecendo-se o direito da falecida Maria Luiza Crupellati Pereira ao recebimento do benefício da data do ajuizamento da ação até a data do seu óbito.
Regularmente processado o feito, com contrarrazões, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
Certificado pela Subsecretaria da Sétima Turma, nos termos da Ordem de Serviço nº 13/2016, artigo 8º, que a apelação foi interposta no prazo legal e, ainda, que a parte autora é beneficiária da justiça gratuita.
Parecer do MPF pela extinção do processo sem julgamento do mérito, em razão da impossibilidade de sucessão do direito personalíssimo manejado nestes autos.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
Dúvidas não subsistem sobre o caráter personalíssimo do benefício de prestação continuada - LOAS, de sorte que, apenas pode ser requerido pelo portador de deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, não podendo ser transferido aos herdeiros em caso de óbito, tampouco gerando o direito à percepção do benefício de pensão por morte aos dependentes.
Nesse sentido, o artigo 21, §1º, da Lei Assistencial dispõe que:
O comando normativo é claro. Como o benefício em comento tem natureza personalíssima, não pode ser transferido aos herdeiros em virtude do óbito do titular, não gerando direito à pensão por morte aos seus dependentes.
É inquestionável, portanto, que o benefício cessa com o óbito do beneficiário, sendo intransferível a terceiros a qualquer título o direito à percepção mensal das prestações vincendas.
Contudo, o que não pode ser transferido é o direito à percepção mensal do benefício, pois a morte do beneficiário coloca um termo final em seu pagamento.
Controverte-se sobre eventual direito dos sucessores ao recebimento dos valores vencidos entre a data em que se tornaram devidos e o óbito.
Comungo do entendimento de que o benefício de amparo social, mesmo sendo vantagem de natureza personalíssima, pode ser pago aos herdeiros, ainda que o requerente tenha falecido no curso do processo porquanto os valores devidos e não recebidos em vida por ele integram o seu patrimônio e o direito às parcelas atrasadas (resíduos) é inquestionável, de sorte que seus sucessores podem se habilitar no eventual crédito decorrente.
Portanto, com a superveniência do óbito do requerente, remanesce o interesse jurídico dos herdeiros ou sucessores nos resíduos não recebidos por ele em vida, não sendo hipótese de extinção automática do processo.
Nessa esteira, o Exmo. Des. Federal Mairan Maia, em sua tese de Livre- Docência discorre no tópico 7.1.4.3, intitulado "AS REGRAS DA SUCESSÃO LEGÍTIMA, AS ESTRUTURAS FAMILIARES CONTEMPORÂNEAS E A VONTADE", p. 253/256.
Sobre a questão, em sessão realizada em 14/09/2016, por ocasião do julgamento do processo 0176818-18.2005.403.6301, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) firmou entendimento de que a morte do requerente do benefício de amparo social não deve impedir a verificação do mérito do pedido, notadamente se comprovada a existência de requerimento administrativo que possa ensejar pagamento retroativo do benefício, entre a Data da Entrada do Requerimento (DER) e a Data do Óbito.
Assim, os valores a que faria jus o titular do benefício e que não foram recebidos em vida por ele integram o seu patrimônio e são passíveis de transmissão aos herdeiros.
O direito a atrasados pelo titular está assegurado pelo parágrafo único, do art. 23 do Decreto nº 6.214, de 26.09.2007 (regulamenta o artigo 36 da Lei 8.742/93) que dispõe :
Assentado, portanto, que as parcelas vencidas até a data do óbito do requerente e não usufruídas são passíveis de serem transmitidas aos seus sucessores, remanesce a pretensão deles ao recebimento dos valores eventualmente devidos e não pagos.
No caso concreto, a autora faleceu após a instrução processual, remanescendo o interesse processual já que o provimento jurisdicional ainda é necessário e útil.
Nessa esteira, são os julgados desta Corte Regional que trago à colação:
Por conseguinte, dou provimento ao recurso e, com fulcro no artigo 1.013, §3º, inciso I, do CPC, ingresso na análise do mérito.
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas com deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que hospedou em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com previsão de tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
Concebida dentro de uma perspectiva do Estado Social de Direito, a Constituição valoriza e protege os direitos sociais básicos, estabelece normas pragmáticas, enfim, apresenta conteúdo contrário ao de uma Constituição do Estado Liberal, afastando-se do repouso, do formalismo e do divórcio entre Estado e Sociedade.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas voltadas ao amparo de pessoas em situação de miséria.
A estrutura do Estado brasileiro insculpida no texto constitucional está informada pelos direitos e valores nela declarados, que necessitam de permanente conformação com às demandas sociais. Como destaca Paulo Bonavides, seguindo o norte das constituições democráticas, a Constituição brasileira carrega traços do conflito, dos conteúdos dinâmicos, do pluralismo, da tensão sempre renovada entre igualdade e a liberdade.
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve ser compreendido.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei 13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a presença de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, eis que devem ser considerados, também, para a perfeita análise da situação de vulnerabilidade do requerente, fatores sociais e o meio em que a pessoa com deficiência vive, isto é, um conjunto de circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, em linhas gerais, considera como hipossuficiente para consecução deste benefício pessoa cuja renda por pessoa do grupo familiar seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
Andou bem o legislador, ao incluir o § 11 no artigo 20, com a publicação da Lei 13.146/2015, normatizando expressamente que a comprovação da miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente possam ser comprovadas por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício, consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp 319.888/PR, 1ª Turma, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no REsp 1.514.461/SP, 2ª Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp 1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008).
Para efeito da mensuração da renda per capita, o Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, instituído pelo Decreto nº 6.214/2017, definiu Grupo Familiar em seu artigo 4º, assim dispondo:
Art. 4º. Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
(...)
V- família para cálculo da renda per capita: conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto;
(...)
Mencionado artigo também normatizou, em seu inciso VI e §2º, as rendas que poderão ser excluídas no cômputo da renda familiar, bem como as que devem ser consideradas nesse cálculo, vejamos:
(...)
VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios de previdência pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pro-labore, outros rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do artigo 19.
(...)
§ 2º - Para fins do disposto no inciso VI do caput, não serão computados como renda mensal bruta familiar:
I - benefícios e auxílios assistenciais de natureza eventual e temporária;
II - valores oriundos de programas sociais de transferência de renda;
III - bolsas de estágio supervisionado;
IV - pensão especial de natureza indenizatória e benefício de assistência médica, conforme disposto no art. 5º;
V - rendas de natureza eventual ou sazonal, a serem regulamentadas em ato conjunto do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do INSS; e
VI - rendimentos decorrentes de contrato de aprendizagem.
(...)
Por fim, cabe uma última ponderação, que é a consideração feita ao artigo 19, mencionado no inciso VI do artigo supracitado:
Art. 19. O Benefício de Prestação Continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos neste Regulamento.
Parágrafo único. O valor do Benefício de Prestação Continuada concedido a idoso não será computado no cálculo da renda mensal bruta familiar a que se refere o inciso VI do art. 4º, para fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada a outro idoso da mesma família.
De acordo com esse artigo, se algum dos membros do Grupo Familiar receber igual benefício assistencial, referido benefício deve ser excluído da renda per capita familiar.
O STJ, em sede de Recurso Repetitivo, já sedimentou o entendimento de que a mesma regra deve ser aplicada, por analogia, também para quando houver benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo.
Vejamos:
Nesse sentido, os julgados desta C. Corte Regional (7ª Turma, Ap 2015.03.99.030993-0, Rel. Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 24/10/2016; 7ª Turma, Ap 2014.03.00.013459-1, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, DJ 27/04/2017; 8ª Turma, ApReeNec2013.61.39.001566-7, Rel. Des. Fed. Tania Marangoni, e-DJF3 04/09/2017).
CASO CONCRETO
Maria Luiza Crupelatti Pereira apresentava deficiência física incurável e incapacitante, conforme diagnosticado no laudo pericial de fls. 65/70, realizado em 08/09/2007.
A perícia foi conclusiva no sentido de que a autora é portadora de obesidade mórbida; gigantomastia; hérnia abdominal e ulceras varicosas, doenças que são irreversíveis, de tratamento complexo, com alta taxa de morbidade e mortalidade.
O expert concluiu que a autora apresenta incapacidade total e permanente para os atos ordinários do dia a dia.
Por sua vez, o estado de miserabilidade da família foi atestado pelo estudo social realizado em 13/11/2008 (fls. 94/96).
O artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na aferição da miserabilidade.
A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, que não obsta a comprovação da insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova.
Portanto, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser aferida caso a caso.
O grupo familiar era composto por Devair (59 anos), sem vínculos empregatícios e com renda diária de R$ 25,00. A autora possui 05 filhos. Rosimeire, com 32 anos, reside na casa dos fundos da requerente, tem 04 filhos pequenos e trabalha como faxineira, auferindo renda mensal de R$ 227,00. Letícia, filha de Rosimeire, recebe pensão do genitor no valor de R$ 120,00. Cláudio (30 anos, solteiro) é aposentado por invalidez recebendo benefício no valor de um salário mínimo. Cleber (26 anos, solteiro) é portador de doença mental e não exerce atividade laborativa 9foi interditado por força de sentença transitada em julgado em 19/08/2013 - fl. 196). Rosangela (24 anos) é casada com Oséias, 33 anos, servente de pedreiro, sem vínculo empregatício, obtém renda diária de R$ 25,00. Cleiton (27 anos), vive em união estável e é funcionário da Usina Nova Aliança.
Por ocasião da visita domiciliar, a assistente social verificou que a autora reside com o esposo Devair, o filho Cleber, a filha Rosangela, o genro Oséias e a neta que é menor de idade.
Segundo o estudo social, a autora mora em casa própria, com 02 quartos, sala, cozinha e banheiro. O teto só é forrado com madeira em um dos quartos. Em dias de chuva forte a água atinge a parte interna da residência. As paredes e os móveis estão desgastados e não há aparelhos eletrônicos modernos. O imóvel se apresenta com aspecto físico insatisfatório, necessitando de reformas. A família não está cadastrada em programas sociais e não recebem auxílio comunitário. A autora precisa fazer uso de uma pomada dermatológica para melhora do quadro de feridas, no valor de R$ 120,00 que não tem como custear.
Ao término do estudo social, a assistente social deixa assentado que a autora não possui renda própria e demonstra ser desprovida de recursos materiais para manutenção do seu tratamento de saúde, bem como, de outras necessidades básicas. Finaliza dizendo que: "os recursos obtidos pela família também são insuficientes, a atual renda familiar, composta pelo salário do esposo da requerente e o do genro, não é capaz de atender todas as necessidades dos integrantes."
Para fins de composição do grupo familiar, ressaltando que a ação foi ajuizada em 13/09/2005, a autora vivia sob o mesmo teto com o esposo, dois filhos (sendo um filho doente, sem condições de exercer atividade remunerada, o que foi corroborado por posterior interdição - sentença com trânsito em julgado em 19/08/2013 - fl. 196 e que, inclusive, deu ensejo à concessão de LOAS em seu favor com DIB em 24/11/2005), um genro (sem vínculos empregatícios constantes do CNIS) e uma neta pequena. O esposo auferia renda diária de R$ 25,00, totalizando R$ 500,00. Considerando que o salário mínimo em 2008 era R$ 415,00 forçoso concluir que a renda mensal familiar per capita era inferior a ¼ do salário mínimo.
Com base no conjunto fático probatório dos autos, vejo que a situação de extrema vulnerabilidade social restou demonstrada, não possuindo a parte autora meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Comprovados os requisitos legais necessários à concessão do benefício, a procedência da ação era de rigor.
TERMO INICIAL
Nos termos da jurisprudência pacífica do Eg. STJ, o termo inicial para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada é a data do requerimento administrativo ou, na sua ausência, a partir da citação.
Confira-se:
No caso sub examen, ausente pedido administrativo (ação ajuizada em 13/09/2005), o termo inicial deve ser fixado a partir da citação e deverá ser pago até a data do óbito da autora, em 28/05/2009 (fl. 165).
Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
Tal índice deve ser aplicado ao caso, até porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado.
E, apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, portanto, aplicam-se, (1) até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e (2.2) a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
No que se refere às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, tanto no âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça Estadual de São Paulo (Lei 9.289/96, art. 1º, § 1º, e Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/2003).
Tal isenção, decorrente de lei, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
Ante o exposto, homologo a habilitação e dou provimento ao recurso para julgar procedente a ação e condenar o INSS a pagar o benefício assistencial, na forma do expendido.
É o voto.
Juntem-se, aos autos, os extratos CNIS em anexo, como parte integrante desta decisão.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
Data e Hora: | 27/02/2019 18:38:32 |