Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 621842 / SP
0051140-30.2000.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
24/06/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/07/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO: PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE
RECURSAL. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA DO BENEFÍCIO. LOAS. DEFICIÊNCIA E
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADAS.
I - A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, o qual
afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e
fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a
60 (sessenta) salários mínimos (art. 475, inciso I e parágrafo 2º). Desta forma, considerando o
valor do benefício e o lapso temporal desde a sua concessão, a hipótese dos autos não
demanda reexame necessário.
II - Considerando que o benefício foi concedido em 28/06/2001, o objeto da presente ação fica
restrito à eventual condenação da Autarquia no período anterior, ou seja, de 04/09/1997 (data
da citação) a 27/06/2001 (véspera do implemento administrativo do benefício). Observa-se a
ocorrência de carência superveniente, dado o desaparecimento do interesse processual, na
modalidade necessidade, no que diz respeito apenas à condenação na implantação do
benefício após 27/06/2001.
III - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
IV - O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas
portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
tê-la provida por sua família. O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, atualmente, define o conceito
de pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas.
V - O artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na aferição da
miserabilidade.
VI - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de
miserabilidade, que não obsta a comprovação da insuficiência de recursos para prover a
manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova.
VII - Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social
a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser
aferida caso a caso.
VIII - Segundo o laudo de fl. 76, Tiago Antunes é portador de deficiência neuropsicomotor e está
incapacitado para a vida independente. De igual sorte, o assistente técnico do INSS
diagnosticou o autor com retardo psicomotor (microcefalia), estando incapacitado para qualquer
atividade, de forma total e permanente (fls. 66/67)
IX - Com base no conjunto fático probatório dos autos, a situação de extrema vulnerabilidade
social restou demonstrada, não possuindo a parte autora meios de prover à própria manutenção
ou de tê-la provida por sua família.
X - Consta do atestado de composição do grupo e renda familiar para portador de deficiência
que o grupo familiar em é composto pelo autor, seus genitores e mais dois irmãos menores de
idade e a renda provém do trabalho do seu pai, no valor R$ 240,00. Segundo o estudo social de
fls. 159/160 (visita domiciliar realizada em 28/08/2007, ou seja, 10 anos após o ajuizamento da
ação), o autor reside com seus genitores (mãe analfabeta e lavradora e pai com a 4ª série do
ensino fundamental e desempregado) e dois irmãos, todos menores de 21 anos de idade e o
núcleo familiar é sustentado pela renda auferida pela genitora do autor, no valor estimado de R$
350,00 mensais, enquanto formalmente empregada. Residem em casa própria, construída de
alvenaria, com 04 cômodos simples e inacabados, sem muitos móveis e utensílios. A situação é
precária. O pai está desempregado e a renda da família é insuficiente para suprir despesas com
alimentação, contas de água e energia elétrica, medicamentos e cuidados especiais com o
autor que, segundo a genitora, giram em torno de R$ 400,00.
XI - O conjunto probatório dos autos revela que a renda familiar é insuficiente para cobrir os
gastos ordinários, assim como os tratamentos médicos necessários e os cuidados especiais
reputados imprescindíveis á preservação da integridade física da parte autora.
XII - Comprovados os requisitos legais necessários à concessão do benefício, a procedência da
ação era de rigor.
XIII - Quanto aos honorários periciais, não foi o INSS condenado ao seu pagamento.
XIV - Os honorários advocatícios devem ser mantidos, a despeito de fixados em 10% sobre o
valor da condenação, à mingua de recurso do INSS.
XV - Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido
pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a
aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
XVI - Tal índice deve ser aplicado ao caso, até porque o efeito suspensivo concedido em
24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de declaração opostos contra o referido julgado
para a modulação de efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas
quanto à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, o que deverá ser observado na fase
de liquidação do julgado.
XVII - Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº
1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso
de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
XVIII - Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos daqueles adotados quando do julgamento do RE nº 870.947/SE, ou, ainda, se ela
deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los,
inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento do Egrégio STF, em sede de
repercussão geral.
XIX - Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, portanto, aplicam-se, (1) até a
entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça
Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da
condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE,
realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros
moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos
termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009;
e (2.2) a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-E.
XX - Reexame necessário não conhecido. Desprovido os recursos. De ofício, fixo os critérios de
juros de mora e correção monetária, nos termos expendidos.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do reexame
necessário, negar provimento aos recursos e, de ofício, fixar os critérios de juros de mora e
correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.