D.E. Publicado em 06/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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Data e Hora: | 26/11/2018 15:36:50 |
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 0001634-18.2010.4.03.6125/SP
RELATÓRIO
Cuida-se de ação interposta em face do INSS, objetivando o restabelecimento de aposentadoria por invalidez, retroagindo-se a implantação à data do cancelamento administrativo, em 13/07/2009.
A r. sentença julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária a restabelecer aposentadoria por invalidez à parte autora, desde a cessação indevida, em 01/01/2010, discriminados os consectários e antecipada a tutela jurídica provisória. Os honorários advocatícios foram arbitrados em 20% sobre o valor do débito, nos termos da Súmula 111 STJ (fls. 387/394).
No mesmo ato, foi julgado o processo nº 00005597020124036125, distribuído por dependência a este feito, em que a autora busca a declaração de irrepetibilidade das parcelas pagas a título de aposentadoria por invalidez, entre 14/07/2009 e 31/12/2009, cujo ressarcimento a autarquia previdenciária insiste em exigir.
Sem recurso voluntário, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, afigura-se correta a submissão da sentença ao reexame necessário.
De fato, o artigo 475, § 2º, do CPC/1973, com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 10.352/2001, que entrou em vigor em 27 de março de 2002, dispõe que não está sujeita ao reexame necessário a sentença em ações cujo direito controvertido não exceda a 60 (sessenta) salários mínimos.
Nesse sentido, segue o entendimento do e. Superior Tribunal de Justiça:
No caso dos autos, considerando as datas do termo inicial do benefício concedido (01/01/2010) e da prolação da sentença (10/09/2012), bem como o valor da benesse (RMI calculada em R$ 1.839,00 - Hiscreweb), verifica-se que a hipótese em exame excede os 60 salários mínimos.
Passo, pois, à análise da remessa oficial.
Discute-se o direito da parte autora a benefício por incapacidade.
Nos termos do artigo 42 da Lei n. 8.213/91, a aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio-doença é devido ao segurado temporariamente incapacitado, nos termos do disposto no art. 59 da mesma lei. Trata-se de incapacidade "não para quaisquer atividades laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, pág. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) ou a incapacidade temporária (auxílio-doença), observados os seguintes requisitos: 1 - a qualidade de segurado; 2 - cumprimento da carência de doze contribuições mensais - quando exigida; e 3 - demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
No caso dos autos, a ação foi ajuizada em 20/07/2010 (fl. 2) visando o restabelecimento de aposentadoria por invalidez (NB 502.160.774-6), desde a data da cessação administrativa do benefício, ocorrida em 31/12/2009, porque a autora teria retornado voluntariamente ao trabalho, na "Clínica Santa Clara".
Realizada a primeira perícia médica em 10/12/2010, o laudo apresentado considerou que a parte autora, nascida em 07/01/1956, com ensino superior completo (psicologia, porém nunca exerceu a profissão) e comerciante (dona de loja de roupas), não apresenta incapacidade laboral, a despeito de ser portadora de tendinite em ombro direito, sendo que "os sintomas podem ser atenuados com medicamentos e fisioterapia, o que a autora já se encontra fazendo" (respostas aos quesitos 1 e 12 do Juízo, fls. 195/196) (fls. 195/198).
Posteriormente, foi submetida à nova perícia, em 21/05/2012, por médico reumatologista, que concluiu pela incapacidade para o exercício da função de balconista de loja por ser a requerente portadora de algoneurodistrofia e depressão moderada. O perito descreveu a doença como sequela pós-mastectomia radical, radioterapia e quimioterapia, implicando dor crônica, restrição para carga de média a elevada com braço dominante e necessidade de uso crônico de medicamentos para mitigar os sintomas dolorosos que, contudo, não excluem as limitações (fls. 232/234).
O perito definiu tanto o início da doença, como da incapacidade, em 03/09/2003, data em que a vindicante foi submetida à mastectomia.
Acrescentou que "existe incapacidade para a atividade de balconista de loja (por implicar tarefas como levantar mercadorias, carregar caixas, manusear prateleiras, estender roupas para demonstração aos clientes" e ressaltou que "o grau de restrição é moderado/grave em relação ao braço dominante" (respostas aos quesitos do Juízo, fls. 233/234).
Ainda, em seus esclarecimentos adicionais, o expert assentou que: "(b) A conclusão pericial deste médico é diversa daquela anterior constante dos autos porque: (b1) evidenciou-se no exame clínico clara atrofia de musculatura de membro superior direito, diversamente da impressão pericial constante do outro laudo; (b2) a menção de renovação de CNH da autor constante do laudo anterior não mencionava a restrição imposta pelo DETRAN para condução de veículos normais (indicando veículos adaptados); (b3) o exame de termometria apresentado depois da perícia anterior documenta com precisão as alterações do sistema nervoso autônomo (simpático); (b4) as restrições em membros superiores não decorrem primariamente de achados ortopédicos em exames de imagem, mas decorrem de linfedema sequelar pós-cirúrgico e lesão do sistema nervoso autônomo"
Realizada audiência no dia 13/06/2012, foi apresentado, ainda, laudo médico verbal pelo perito psiquiatra, que narrou: "a autora era comerciante até 2003, quando, em 09/2003, submeteu-se a cirurgia de mastectomia radical, com esvaziamento de mama direita em virtude de diagnóstico de neoplasia, evoluindo com dores crônicas de membro superior direito; inicialmente, procurou ocupar-se, principalmente com visitas a seu filho cirurgião dentista; sentiu necessidade de permanecer circunscrita em sua casa, por sentir-se cerceada das atividades sociais, o que levou ao quadro depressivo; procurou acompanhamento psiquiátrico e hoje é medicada com antidepressivos, ansiolíticos e estabilizadores de humor; ao exame apresenta face depressivo, humor depressivo, ideação de menosvalia e conduta histriônica, tendência a isolamento social."
E em respostas aos quesitos formulados pelo juízo, respondeu, em síntese, que a autora é portadora de transtorno de personalidade histriônica e transtorno depressivo leve, fixando a DID em 2011 e não apresenta incapacidade laborativa para a função de comerciante, considerando-se apenas a depressão leve; necessita de ajuste do tratamento medicamentoso e psicoterapia (mídia de fl. 243).
Neste ponto, cumpre ressaltar que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em caso semelhante, decidiu pela possibilidade de consideração de todos os laudos médicos, consoante o seguinte precedente:
Ademais, não se deve perder de vista os esclarecimentos adicionais do perito, a remarcar o agravamento das moléstias suportadas pela demandante, decorrente de linfedema sequelar pós-cirúrgico, compatível com a conversão, na seara administrativa, do auxílio-doença concedido em aposentadoria por invalidez.
Por sua vez, os dados do CNIS revelam que a parte autora manteve seguidos vínculos trabalhistas entre 01/1977 e 09/2002, como empregada na seara urbana, passando a contribuinte individual de 01/12/2002 a 30/04/2003. Entre 01/05/2003 e 30/11/2003 recolheu também como contribuinte individual, porém o vínculo teve como origem a empresa "Êxito Comércio de Confecções Ourinhos", da qual era sócia a autora, consoante contrato social de fls. 257/262.
A requerente recebeu auxílio-doença entre 15/10/2003 e 15/02/2004 (NB 502.135.995-5), benefício este que foi convertido (administrativamente) em aposentadoria por invalidez em 16/02/2004 (NB 502.160.774-6).
Ademais, é certo que a concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de neoplasia maligna independe de carência (art. 26 , II, primeira parte, c.c. art. 151, ambos da Lei de Benefícios) e, em nenhum momento, houve perda da qualidade de segurado da autora.
De outro giro, consta das cópias do processo administrativo de fls. 18/137 e 249/385 que, em razão de "denúncia de retorno ao mercado de trabalho", na "Clínica Santa Clara", foi realizada pesquisa por funcionária da agência da Previdência Social com quatro testemunhas, duas delas funcionárias da referida clínica, concluindo o INSS, em 14/07/2009, que a ora autora frequenta diariamente a clínica, permanecendo na sala da gerência e, portanto, "trabalha no local indicado" (fls. 320/321).
Defendeu-se a autora naquele processo, ao argumento de que seus filhos, cirurgiões dentistas, são os proprietários da Clínica Santa Clara, onde realiza tratamento dentário, além de visitá-los regularmente naquele local.
Realizada perícia médica, a cargo de médico da própria autarquia, em 30/10/2009, este concluiu que a autora não estava incapacitada; identificou "a patologia como tratada, não tendo deixado sequelas que a impedissem de realizar atividades laborais de secretária e/ou gerente administrativa", afirmando, ainda, que "a patologia em questão (C50) é passível de tratamento ambulatorial e com grande possibilidade de desempenho de atividade laboral, desde que não haja esforços físicos exacerbados" (fl. 349).
Concluiu o INSS que a autora teria recebido, indevidamente, a aposentadoria por invalidez, entre 14/07/2009 e 31/12/2009, cassando-lhe o benefício (fl. 385).
Nos presentes autos, a requerente apresentou contratos sociais da "Clínica Odontológica Santa Clara S/C Ltda", em que figuram como sócios seus quatro filhos, bem como documentos que comprovam a filiação (fls. 139/157).
E a despeito da presunção de legitimidade do ato administrativo que implicou a cessação do benefício, dada a ausência de incapacidade, não está afastada a possibilidade de revisão em juízo, mediante realização de prova em contraditório por médico equidistante das partes, em datas posteriores ao cancelamento do benefício.
Ora, os laudos periciais foram elaborados por peritos de confiança do juízo, trazendo elementos suficientes para análise acerca da incapacidade, tais como, descrição da patologia diagnosticada, seus sintomas e época do início da invalidez, tendo o expert procedido a entrevista e exame clínico no periciando, bem como à análise de exames complementares, para fundamentar sua conclusão.
O INSS, de seu turno, limitou-se a apresentar sua contestação, acompanhada de cópias do CNIS da requerente, pugnando pela improcedência do pedido, ao argumento de que não estaria comprovada a incapacidade e o cumprimento do período de carência (fls. 182/186).
E, segundo a regra geral de distribuição do ônus probatório, prevista no art. 333, I, do CPC/73 (art. 373, I, do NCPC), incumbe à autarquia comprovar a alegação de retorno voluntário ao trabalho. Nesse sentido, o entendimento doutrinário:
Desse modo, agiu com acerto a r. sentença ao determinar o restabelecimento, em favor da demandante, da aposentadoria por invalidez, desde sua cessação administrativa em 01/01/2010, uma vez que a incapacidade laborativa apresentada pela autora advém desde então (segundo a perícia, desde 03/09/2003 - fl. 233).
Averbe-se que o INSS considerou indevida a aposentadoria a partir de 14/09/2009 (data da realização da pesquisa, com testemunhas, acerca do retorno ao trabalho pela autora, fl. 320/321), mas pagou à segurada as parcelas devidas até 31/12/2009.
Observo que o Processo nº 2012.61.25.000559-4 (apenso aos presentes autos), consistente em ação declaratória de inexigibilidade de débito (parcelas pagas à autora entre 14/07/2009 e 31/12/2009), foi julgado procedente, a fim de anular a cobrança administrativa imposta à autora relativamente à restituição das mencionadas parcelas. A sentença, prolatada em 10/09/2012, restou irrecorrida, não sendo caso de submissão à remessa oficial, tendo em vista o reduzido valor da causa.
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e à correção monetária não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso, incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Ademais, a pendência de apreciação, pelo STF, de Embargos de Declaração no citado RE, remarca a sujeição da questão da incidência da correção monetária ao desfecho do referido leading case.
Os honorários advocatícios devem ser reduzidos para 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da decisão concessiva do benefício, consoante § 3º do artigo 20 do Código de Processo Civil de 1973 (vigente no momento da publicação do decisum), Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e jurisprudência desta 9ª Turma. Cumpre destacar, nesse ponto, que não se aplica ao caso em análise disposto no artigo 85 do NCPC, tendo em vista que a sentença impugnada foi publicada antes do início de sua vigência.
Quanto às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, nos termos das Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03 (Estado de São Paulo). Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Os valores já pagos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de quaisquer benefícios por incapacidade, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL, para fixar os honorários advocatícios nos termos da fundamentação supra, explicitando os critérios de incidência de juros de mora e correção monetária.
É como voto.
ANA PEZARINI
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